Autor Tópico: O público e o privado  (Lida 1229 vezes)

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Offline O Grande Capanga

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O público e o privado
« Online: 06 de Fevereiro de 2007, 17:53:42 »
O público e o privado

por Luiz Gonzaga Belluzzo

O individualismo do cidadão remediado é tão visceral, tão patológico e tão tragicamente cômico que é também essencial para uma sociedade baseada na “lei do mais forte”

O desabamento da estação Pinheiros da Linha 4 do Metrô foi um painel de desgraças: narra os percalços da vida contemporânea no Brasil brasileiro. O desastre vai além das intermináveis discussões sobre a qualidade das avaliações geológicas ou desencontros sobre a propriedade (ou impropriedade) das técnicas de escavação de túneis. O povo de São Paulo de Piratininga presenciou uma tragédia humana, urbanística, social e midiática.

Primeiro o óbvio: nas últimas décadas, consolidou-se, entre as camadas dominantes e bem-pensantes, a convicção de que a vida coletiva e os riscos dos cidadãos podem ser resguardados ou administrados pelos critérios do lucro privado. Saiba o leitor que não embarco na maré acusatória fomentada pela mídia do espetáculo macabro. Nem mesmo pretendo descartar a possibilidade de relações virtuosas entre o Estado e o Mercado. Muito ao contrário: julgo que o período glorioso da vida social e do progresso econômico deve seu desempenho às articulações que, na segunda metade do século XX, enlaçaram o público e o privado.

Cuido aqui de um processo de deformação do imaginário social estimulado pelos mesmos que se valem da tragédia para endurecer o indicador ou produzir factóides e inventar personagens. Há quem diga que o lucro é a conquista suprema da raça humana e tudo o que existe ou está para existir deve se submeter às normas do ganho monetário. Alguns brasileiros, da classe média para cima, vêm tentando transformar esse axioma em orientação para a vida prática. Não é de hoje que tentam safar a onça entregando a sua saúde e a de seus filhos à iniciativa dos privados. Não apenas a saúde, mas também a educação, a segurança, a aposentadoria etc.

É claro que o repúdio dessa gente à saúde pública, à escola pública, à segurança pública é um gesto de diferenciação, de distinção em relação aos de baixo, uma espécie de grife que os identifica como consumidores de bom gosto em oposição à rafaméia vestida em andrajos. A grande vantagem dessa atitude é que, de quebra, fica justificado o descumprimento das obrigações coletivas – desde o estacionamento em lugar proibido até a esperteza de furar filas e trafegar pelo acostamento –, ensejando uma espécie de anarquismo de remediados. Há fortes evidências, neste momento, de que, salvo para os de cima – descontados os desabamentos de túneis –, a experiência foi desastrosa.

Quando entro em tais considerações, os amigos me censuram: “Mas você é da classe média”. Respondo: “Com muita honra”. Mas emendo de primeira: “Não sei por quanto tempo”. A verdade é que, de uns tempos a esta parte, a chamada classe média precipita-se ladeira abaixo. É claro que alguns ainda conseguem se agarrar à nave espacial dos mais ricos, que decola célere em direção à economia moderna e globalizada. Mas esses são cidadãos do mundo e só fazem cálculos em dólares porque não acreditam, de fato, que o real seja uma moeda forte.

A coisa degringolou. Os que continuam acreditando nesta balela contam os tostões para pagar dívidas, têm pesadelos com o desemprego ou fecham os seus negócios porque o faturamento mergulha em parafuso. A situação mais dramática é a dos desempregados que, sonhando em ser patrões de si mesmos, não encontram um Estado capaz de construir um ambiente de negócios propício ao bom desempenho dos novos empreendimentos.

 Mas os mitos em que aprendeu a acreditar impedem o cidadão remediado de avaliar as verdadeiras razões de suas decepções. Para ele, o indivíduo é o único responsável por suas desditas. Se quebrou a cara, é porque não teve competência para fazer melhor, não soube vencer os competidores nem ultrapassar as suas circunstâncias. O seu individualismo é tão visceral, tão patológico e tão tragicamente cômico que é também essencial para a reprodução de uma sociedade que funda a sua justificação moral na “sobrevivência do mais forte”.

 Sobrevivem realmente os mais fortes, mas os mais fortes são mais fortes há muito tempo e o resultado da luta competitiva só pode ser a dizimação dos incautos que se julgavam aptos a concorrer. É verdade que alguns conseguem se agarrar à espaçonave que arranca em alta velocidade. Mas a maioria é tragada pelos buracos da vida.
Os planos de saúde, a escola privada, esses pesadelos não foram ainda suficientes para ensinar às vitimas do individualismo as lições da vida. Faltam ainda os ensinamentos da previdência privada. Mas eles não tardarão. Assim, desde as crianças até os velhos, passando pelos de idade adulta, todos poderão provar das delícias do privatismo.

http://www.cartacapital.com.br/edicoes/2007/01/429/o-publico-e-o-privado

Offline Rodion

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Re: O público e o privado
« Resposta #1 Online: 06 de Fevereiro de 2007, 18:23:34 »
alguém dá ortega y gasset pro rapaz ler.
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Eriol

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Re: O público e o privado
« Resposta #2 Online: 06 de Fevereiro de 2007, 18:35:36 »
esse fascista?

Offline Rodion

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Re: O público e o privado
« Resposta #3 Online: 06 de Fevereiro de 2007, 18:39:55 »
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É claro que o repúdio dessa gente à saúde pública, à escola pública, à segurança pública é um gesto de diferenciação, de distinção em relação aos de baixo, uma espécie de grife que os identifica como consumidores de bom gosto em oposição à rafaméia vestida em andrajos.

ou vai ver é só porque os serviços são ruins, mesmo?

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A grande vantagem dessa atitude é que, de quebra, fica justificado o descumprimento das obrigações coletivas – desde o estacionamento em lugar proibido até a esperteza de furar filas e trafegar pelo acostamento –, ensejando uma espécie de anarquismo de remediados. Há fortes evidências, neste momento, de que, salvo para os de cima – descontados os desabamentos de túneis –, a experiência foi desastrosa.
e que non sequitur. então eu não boto meu filho na escola pública pra poder descumprir as leis e afrontar a sociedade?
de qualquer forma, é curioso o rapaz falar nisso quando nas últimas duas décadas os gastos públicos sociais só cresceram, tal qual sua fonte de renda que é o tributo.

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Quando entro em tais considerações, os amigos me censuram: “Mas você é da classe média”. Respondo: “Com muita honra”. Mas emendo de primeira: “Não sei por quanto tempo”. A verdade é que, de uns tempos a esta parte, a chamada classe média precipita-se ladeira abaixo. É claro que alguns ainda conseguem se agarrar à nave espacial dos mais ricos, que decola célere em direção à economia moderna e globalizada. Mas esses são cidadãos do mundo e só fazem cálculos em dólares porque não acreditam, de fato, que o real seja uma moeda forte.
o proletariado só cresce, a burguesia só diminui em número. a idéia não é nova e não se cansou de se mostrar errada no último século inteiro, mas tem gente que não larga, né?

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Mas os mitos em que aprendeu a acreditar impedem o cidadão remediado de avaliar as verdadeiras razões de suas decepções. Para ele, o indivíduo é o único responsável por suas desditas. Se quebrou a cara, é porque não teve competência para fazer melhor, não soube vencer os competidores nem ultrapassar as suas circunstâncias. O seu individualismo é tão visceral, tão patológico e tão tragicamente cômico que é também essencial para a reprodução de uma sociedade que funda a sua justificação moral na “sobrevivência do mais forte”.
o zeitgeist é outro, chapa.
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Fabi

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Re: O público e o privado
« Resposta #4 Online: 06 de Fevereiro de 2007, 20:18:50 »
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O povo de São Paulo de Piratininga presenciou uma tragédia humana, urbanística, social e midiática.
Então é culpa do capitalismo e não da incompetência humana?

Rhyan

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Re: O público e o privado
« Resposta #5 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 08:05:16 »
Não dá pra ler um lixo desse...

Offline Dbohr

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Re: O público e o privado
« Resposta #6 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 08:22:40 »
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Saiba o leitor que não embarco na maré acusatória fomentada pela mídia do espetáculo macabro. Nem mesmo pretendo descartar a possibilidade de relações virtuosas entre o Estado e o Mercado. Muito ao contrário: julgo que o período glorioso da vida social e do progresso econômico deve seu desempenho às articulações que, na segunda metade do século XX, enlaçaram o público e o privado.

Parece-me antes que ele está criticando a idéia que qualquer iniciativa privada é, por default, melhor do que qualquer iniciativa pública. O que, como atesta o buraco de São Paulo, não é verdade.

Não se trata de criticar o capitalismo ou a idéia de livre mercado, mas de fazer valer os seus direitos a um serviço de boa qualidade, seja ele público ou privado.

Offline Quereu

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Re: O público e o privado
« Resposta #7 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 11:56:52 »
Mas o Brasil já é um Estado patrimonialista onde o público de muitos é o privado de poucos. Sabe o que o público tem no Brasil? Privada.

O buraco caiu por incompetência, negligência, imperícia, impudicícia.

O buraco do Brasil é atávico e transcende sistemas econômicos.
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Eriol

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Re: O público e o privado
« Resposta #8 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 12:07:59 »
claro... deve ser uma coisa racial ou o calor dos trópicos...

Offline Rodion

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Re: O público e o privado
« Resposta #9 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 14:53:21 »
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Saiba o leitor que não embarco na maré acusatória fomentada pela mídia do espetáculo macabro. Nem mesmo pretendo descartar a possibilidade de relações virtuosas entre o Estado e o Mercado. Muito ao contrário: julgo que o período glorioso da vida social e do progresso econômico deve seu desempenho às articulações que, na segunda metade do século XX, enlaçaram o público e o privado.

Parece-me antes que ele está criticando a idéia que qualquer iniciativa privada é, por default, melhor do que qualquer iniciativa pública. O que, como atesta o buraco de São Paulo, não é verdade.

Não se trata de criticar o capitalismo ou a idéia de livre mercado, mas de fazer valer os seus direitos a um serviço de boa qualidade, seja ele público ou privado.

dbohr, no caso da cratera, não cabe nem a pergunta 'seria mais eficiente uma empreiteira privada ou pública?'. só existem empreiteiras privadas, se eu não estiver enganado. o exército faz obras públicas, mas duvido que tenham o know-how do metrô…

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Parece-me antes que ele está criticando a idéia que qualquer iniciativa privada é, por default, melhor do que qualquer iniciativa pública. O que, como atesta o buraco de São Paulo, não é verdade.
o que ele quer é criar empatia e amolecer minhas defesas. nem vem.
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Offline Pregador

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Re: O público e o privado
« Resposta #10 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 16:58:07 »
claro… deve ser uma coisa racial ou o calor dos trópicos…

Não... é uma questão moral mesmo.
"O crime é contagioso. Se o governo quebra a lei, o povo passa a menosprezar a lei". (Lois D. Brandeis).

Offline Quereu

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Re: O público e o privado
« Resposta #11 Online: 07 de Fevereiro de 2007, 17:01:34 »
claro… deve ser uma coisa racial ou o calor dos trópicos…

Não… é uma questão moral mesmo.

 :ok:
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