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1962: Uma Conferência em defesa da revolução
« Online: 18 de Fevereiro de 2007, 14:46:11 »
16 DE FEVEREIRO DE 2007 - 17h47
1962: Uma Conferência em defesa da revolução

Por José Carlos Ruy


Há 45 anos, no dia 18 de fevereiro, ocorreu uma reunião decisiva para os rumos da organização revolucionária dos comunistas brasileiros. Naquela data, no bairro do Ipiranga, em São Paulo, foi realizada a 5ª Conferência Nacional Extraordinária que reorganizou o Partido Comunista do Brasil. Ela teve a participação de cem delegados, vindos de São Paulo, Guanabara, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, que representavam cerca de 300 militantes que discordavam do rumo reformista que a direção de Luiz Carlos Prestes imprimia, há alguns anos, ao partido.


A Conferência foi o ponto culminante e o desfecho de um intenso debate interno, iniciado em meados da década de 1950, e que se configurou, naqueles anos, na formação de duas tendências dentro do Partido, uma revisionista e outra marxista-leninista.

 


O entrechoque entre os comunistas teve início com as denúcias do ''culto à personalidade'' e os "crimes" de Stálin, durante o 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética, realizado em fevereiro de 1956. Elas representavam a guinada revisionista da nova direção soviética, com Nikita Kruschev à frente, e que preconizava a via pacífica para o socialismo e a coexistência pacífica com as potências imperialistas.

 

A nova orientação soviética teve conseqüências profundas entre os comunistas brasileiros, provocando um debate intenso e passional, que resultou inicialmente na formação de uma tendência liquidacionista, liderada por Agildo Barata e um grupo de intelelectuais, que foram expulsos do partido em 1957.




Mas o debate não acabou ali. Refletindo as mudanças no partido soviético, Prestes aderiu à idéia da necessidade de mudanças semelhantes no Partido Comunista do Brasil, adotando teses inspiradas no ideário revisionista que o PCUS passava a defender.




Ele não foi acompanhado, porém, pela maioria do Secretariado Nacional, entre eles João Amazonas, Maurício Grabois, Diógenes Arruda e Sérgio Holmos. Estava constituído, assim, o contencioso que só seria resolvido mais tarde, com a reorganização do partido.




Para impor as reformas que pretendia, o primeiro passo de Prestes e seu grupo foi afastar da Comissão Executiva e do Secretariado do Comitê Central aqueles dirigentes que insistiam na manutenção de uma orientação revolucionária. Em agosto de 1957 João Amazonas, Maurício Grabois, Diógenes Arruda, Sérgio Holmos perderam seus cargos de direção, embora continuassem membros do Comitê Central. Foram substituídos por Giocondo Dias, Mário Alves, Carlos Marighela e Calil Chade.




A expulsão era vista, pelo grupo revisionista como necessária à aprovação da orientação política que, depois de muitas idas e vindas, acabou cristalizada no documento conhecido como Declaração de Março de 1958, escrito sob inspiração direta de Prestes e à revelia do Comitê Central. Aquela foi a ''certidão de batismo'' do revisionismo, aprovada em uma reunião do Comitê Central realizada naquele mês, com dois únicos votos contrários, os votos de João Amazonas e de Maurício Grabois.




Prestes e seu grupo pretendiam aprovar as mudanças no 5º Congresso do Partido Comunista do Brasil, realizado em agosto/setembro de 1960, no Rio de Janeiro. Ele empenhou-se pessoalmente na eleição dos delegados, tendo por exemplo ido ao Rio Grande do Sul - para onde João Amazonas fora designado para dirigir o partido, depois de sua expulsão do Secretariado Nacional - onde pressionou os delegados à conferência estadual para elegerem delegados ao Congresso alinhados com a orientação revisionista. Mesmo assim, segundo relato posterior de João Amazonas, conseguiu eleger apenas metade dos delegados gaúchos; a outra metade permanecia fiel à orientação revolucionária.




O 5º Congresso não resolveu o impasse, entretanto. O plenário aprovou a orientação adotada pela direção, mas rejeitou as propostas de mudanças de nome e de alterações profundas no Programa e nos Estatutos. Elas eram necessárias, dizia-se, para a legalização do partido; por isso, o plenário autorizou o Comitê Cental a realizar apenas as mudanças exigidas pela lei para a obtenção do registro no TSE.

 


Estava aplainado assim o caminho para a interpretação abusiva daquela autorização pela direção e do rompimento da legalidade partidária. À margem do texto  aprovado pelo Congresso, em 11 de agosto de 1961, e contra ele, a direção prestista adotou um novo programa e estatuto e mudou o nome do partido, de Partido Comunista do Brasil (PCB) para Partido Comunista Brasileiro (PCB). O novo programa era ainda mais moderado do que a Declaração de Março de 1958 e as Resoluções do 5º Congresso, e os Estatutos já não tinham referências ao internacionalismo proletário e ao marxismo-leninismo.




A resposta dos anti-revisionistas foi rápida, e naquele mesmo mês de agosto o bloco dos resistentes enviou um documento ao Comitê Central, intitulado Em defesa do Partido (conhecido como Carta dos Cem); eles não aceitavam a agressão contra as decisões aprovadas em congresso e pediam a convocação de um congresso extraordinário (ou uma conferência) para deliberar a respeito.

 


Foi o pretexto para a resposta dura da direção partidária, que expulsou os principais signatários da Carta dos Cem. A luta interna converteu-se assim em uma verdadeira cisão. Do ponto de vista da legalidade interna partidária, ao romper com decisões congressuais, o grupo de Prestes constituiu na verdade um novo partido. O grupo resistente, por sua vez, convocou imediatamente uma Conferência para debater a situação e reorganizar o partido. Foi a reunião que ocorreu no dia 18 de fevereiro de 1962, e que representava cerca de 10% dos militantes do velho PCB (que teria, na ocasião, pouco mais de 3 mil militantes).




A Conferência elegeu um novo Comitê Central, de 25 membros (do qual participavam oito membros do antigo Comitê Central e militantes que tinham mais de 20 anos de filiação. O novo secretariado foi composto por João Amazonas, Maurício Grabois, Pedro Pomar, Carlos Danielli e Calil Chade. Aprovou um Manifesto-Programa que reafirmava a opção pelo marxismo-leninismo, pelo socialismo e o comunismo, considerando que, ''na presente situação, a principal tarefa do povo brasileiro é a luta por um governo revolucionário, inimigo irreconciliável do imperialismo e do latifúndio, promotor de liberdades, cultura e bem-estar para as massas''. Aprovou também o relançamento d'A Classe Operária, como órgão oficial do Partido e manteve o nome original (Partido Comunista do Brasil), adotando uma nova sigla para diferenciar-se do partido revisionista: PCdoB.




O cenário daqueles acontecimentos foi uma época de acentuada luta de classes no Brasil. A luta dos trabalhadores, camponeses, setores médios, dos nacionalistas e dos democratas, se aprofundava. A direita não aceitava medidas nacionalistas e democráticas tomadas durante o segundo governo Vargas (1951/1954), e os governos Juscelino Kubitschek (1956/1961) e João Goulart (1961/1964), numa resistência conservadora que culminou no golpe militar de 1964.




No campo da esquerda existiam fortes ilusões reformistas, difundidas principalmente pelo PCB dirigido por Luiz Carlos Prestes e seu grupo. Em consequência, nos primeiros anos de reorganização, o  PCdoB promoveu uma luta intensa contra o revisionismo e o reformismo, mesmo a custo de uma política esquerdista marcada por ataques contra o governo Goulart, como reconheceu o documento O golpe de 1964 e seus ensinamentos, de agosto daquele ano. Segundo este documento, ''o grupo de militares que desfechou o golpe não revelava a intenção de entregar o governo nem agora nem depois, em 1967''. A política reformista do PCB foi duramente criticada também, e seu reformismo redundou ''em completo fracasso''.




O grupo que reorganizou o partido em 18 de fevereiro de 1962 era pequeno frente ao verdadeiro rolo compressor representado pelo prestígio de Luiz Carlos Prestes e pela influência da União Soviética. Mas o acerto da opção daquele grupo dirigido por João Amazonas e seus camaradas, que rejeitaram o caminho revisionista e mantiveram o partido na senda do marxismo leninismo e da revolução, foi confirmado pela história e o PCdoB é hoje a principal e a mais forte referência comunista em nosso país, mesmo existindo outras agremiações que reclamam a mesma herança. Como João Amazonas disse, muitos anos depois, a Conferência de 1962 ''representou a continuidade do velho Partido Comunista do Brasil, fundado em 1922, em nosso meio. O povo brasileiro, em especial, o proletariado, pode contar com o Partido na luta decisiva pela transformação da sociedade. O período em que se deu a reorganização do PCdoBrasil foi marcado pela atitude corajosa e revolucionária dos militantes que empreenderam profunda luta teórica e grande ação política em defesa do Partido e dos princípios do marxismo-leninismo. Representou, ao mesmo tempo, a tomada de consciência de que o movimento revolucionário corria sério risco, agora não mais de fora pela ação das forças da reação, mas de dentro''. Foi um marco importante na história do comunismo brasileiro, uma conferência em defesa da revolução.

http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=13610

 

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