Autor Tópico: Näïkìmlyìïà  (Lida 1686 vezes)

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Offline Quereu

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Näïkìmlyìïà
« Online: 03 de Março de 2007, 03:17:59 »
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A capacidade criativa da morfologia inglesa é patética se comparada com o que encontramos em outros idiomas. O substantivo inglês aparece em exatamente duas formas (duck e ducks), o verbo em quatro (quack, quacks, quacked, quacking). Em italiano e espanhol moderno cada verbo tem por volta de cinqüenta formas; em grego clássico, trezentas e cinqüenta; em turco, dois milhões! Muitas das línguas que mencionei, como esquimó, apache, hopi, kivunjo, e a língua americana de sinais, são conhecidas por essa prodigiosa capacidade. Como elas fazem isso? Eis um exemplo do kivunjo, a língua banto que, como foi dito, faz o inglês parecer um jogo de damas em comparação com o xadrez. O verbo “Näïkìmlyìïà” que significa “Ele está comendo aquilo para ela”, compõe-se de oito partes:

•   N-: um marcador que indica que aquele é o foco daquele ponto da conversa.
•   -ä-: marcador de concordância do sujeito. Identifica que aquele que come pertence à Classe I das dezesseis classes de gênero, “humano singular”. (Lembre-se que, para o lingüista, gênero significa classe, não sexo.) Outros gêneros aplicam-se a substantivos relativos a vários humanos, objetos finos ou extensos, objetos que aparecem em pares ou grupos, os próprios pares ou grupos, instrumentos, animais, partes do corpo, diminutivos (versão pequena ou mimosa das coisas), qualidades abstratas, lugares precisos ou genéricos
•   -ï-: tempo verbal presente. Os outros tempos em banto podem se referir a hoje, mais cedo hoje, ontem, não antes do que ontem, ontem ou antes, no passado remoto, habitualmente, em andamento, consecutivamente, hipoteticamente, no futuro, num tempo indeterminado, ainda não e às vezes.
•    -kì-: marcador de concordância do objeto, nesse caso indicando que a coisa comida pertence à Classe 7 de gênero.
•   -m-: marcador de benefactativo, indicando em benefício de quem a ação está ocorrendo, nesse caso um membro da Classe I de gênero.
•   -lyì-: um marcador “aplicativo”, indicando que o conjunto de protagonistas do verbo aumentou pela adição de uma função, nesse caso a benefactativa. (Em termos de analogia, imagine que, em português tivéssemos de adicionar um sufixo ao verbo assar quando ele é usado em Assei um bolo para ela em contraposição ao usual Assei um bolo.)
•   -à-: vogal final, que pode indicar modo indicativo versus modo subjuntivo.

Se multiplicarmos a quantidade de possíveis combinações dos sete prefixos e sufixos, termos um resultado de meio milhão, e é essa a quantidade de possíveis formas para cada verbo na língua. Com efeito, Kivunjo e línguas semelhantes constroem toda uma sentença dentro de uma única palavra complexa, o verbo.





Extraído do livro O instinto da linguagem, de Steven Pinker
A Irlanda é uma porca gorda que come toda a sua cria - James Joyce em O Retrato do Artista Quando Jovem

Raphael

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #1 Online: 03 de Março de 2007, 03:23:12 »
Maravilhoso!!!!

Vou ver se compro "Como a mente funciona". Ele(Pinker) é muito inteligente.

Offline Wolfischer

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #2 Online: 03 de Março de 2007, 20:19:11 »
E eu estava achando húngaro complicado...
Vou continuar com meu estudo de tupi, também tem sutilezas mas não parece tão complexo.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #3 Online: 03 de Março de 2007, 22:08:02 »
Fico curioso sobre como as linguagens diferentes poderiam afetar o desempenho geral do cérebro, de forma análoga a diferentes linguagens de computador terem suas vantagens para determinados tipos de aplicações, ou diferenças entre sistemas operacionais. Já tinha pensado nisso há algum tempo atrás, antes de saber de diferenças tão drásticas assim... me parece que de fato tem gente pesquisando coisas nesse sentido, lembro de ter lido sobre idiomas que tem trocentas palavras para variações tonais que normalmente chamaríamos todas de branco, e "matemáticas" em que há menos números.

Offline Wolfischer

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #4 Online: 03 de Março de 2007, 23:45:04 »
O domínio de algumas línguas orientais, como o chinês, facilita o cálculo matemático. A forma como os números são expressos nestes idiomas torna automática uma "visualização" das operações.

As diferenças de nomes para cores existem mesmo, nem sempre tão extremas como as alegadas dezenas de nomes para branco. Em russo há duas palavras para azul, em tupi há uma só palavra para designar azul e verde.

Offline Rodion

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #5 Online: 04 de Março de 2007, 02:11:16 »
O domínio de algumas línguas orientais, como o chinês, facilita o cálculo matemático. A forma como os números são expressos nestes idiomas torna automática uma "visualização" das operações.

As diferenças de nomes para cores existem mesmo, nem sempre tão extremas como as alegadas dezenas de nomes para branco. Em russo há duas palavras para azul, em tupi há uma só palavra para designar azul e verde.

sim, sobre isso há uma matéria mui interessante;
http://www.economist.com/science/displaystory.cfm?story_id=8548630
pena que é só pra assinantes.
tenho na versão impressa, alguém tem interesse em que eu transcreva?

o comecinho:
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Languages divide the spectrum up in different ways. Welsh speakers use “gwyrdd” (pronounced “goo-irrrth”) as a general word for green. Yet “grass” literally translates as “blue straw”. That is because the Welsh word for blue (“glas”) can accommodate all shades of green. English-speaking anthropologists affectionately squish “green” and “blue” together to call Welsh an example of a “grue” language. A few of them think grue languages are spoken by societies that live up mountains or near the equator because ultraviolet radiation, which is stronger in such places, causes a progressive yellowing of the lens. This, the theory goes, makes the eye less sensitive to short wavelengths (those that correspond to the green and blue parts of the spectrum). Unfortunately, though the Welsh do live in a hilly country, it is hardly mountainous enough—let alone sunny enough—to qualify.

The ultraviolet theory, however, is just one idea among many in the debate about the psychology of colour.

a matéria faz referência aos trabalhos de terry regier, da universidade de chicago, paul kay, de berkeley, e vicky drivonikou, da universidade de surrey, inglaterra. se alguém tiver interesse em procurar...
« Última modificação: 04 de Março de 2007, 02:19:34 por Bruno »
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #6 Online: 04 de Março de 2007, 03:33:22 »
O domínio de algumas línguas orientais, como o chinês, facilita o cálculo matemático. A forma como os números são expressos nestes idiomas torna automática uma "visualização" das operações.

Interessante. Ouvi dizer também que, por mais dominante que se seja num novo idioma além do primeiro, a tendência é pensar em matemática com o primeiro idioma...

Imagino se não valha a pena talvez imaginar um "esperanto", um idioma "artificial", voltado para otimização do pensamento. Idéias de FC...

Eriol

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #7 Online: 04 de Março de 2007, 08:18:45 »
aprender geometria em grego deve ser uma piada...

Offline Dbohr

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #8 Online: 04 de Março de 2007, 08:36:46 »
Interessantíssimo o artigo, Bruno! Eu gostaria de ler inteiro, se você pudesse mandar.

Minha esposa é de Belém do Pará. Ela falava de vez em quando nas "cores oblíquas" do Rio de Janeiro, onde moramos, e eu não entendia direito o que ela queria dizer. Depois de algum esforço percebi que ela se referia à maneira que a inclinação da luz solar ao longo do ano mudava os tons das cores. Em Belém a inclinação é quase sempre a mesma o ano inteiro. Nunca tinha parado para pensar nisso e achei fascinante!

Offline Quereu

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #9 Online: 04 de Março de 2007, 11:22:07 »
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Dentre o “fluxo caleidoscópio de impressões” de Whorf, a cor é decerto a que mais atrai a atenção. Segundo ele, vemos objetos com diferentes matizes, dependendo do comprimento de onda da luz que elas refletem, mas os físicos dizem que o comprimento de onda é uma dimensão contínua com nada que demarque vermelho, amarelo, verde, azul, etc. As línguas diferem em seu inventário de palavras para cores: em latim não existem o cinza e o marrom comuns; a língua navajo junta azul e verde numa palavra única,o russo tem palavras distintas para azul-escura e azul-celeste; os falantes de Shona empregam uma só palavra para os verdes amarelados, e outra para os verdes azulados e os azuis não arroxeados. Se quiserem podem completar o raciocínio. É a linguagem que coloca divisões no espectro; Júlio César confundiria alhos com bugalhos.

Embora para os físicos a separação entre cores não tenha fundamento, para os fisiologistas ela tem. Os olhos não registram os comprimentos de onda da mesma maneira como um termômetro registra a temperatura. Neles existem três tipos de cones, cada um com um pigmento diferente, e os cones estão ligados aos neurônios de um modo que faz com que os neurônios respondam melhor a manchas vermelhas sobre um fundo verde ou vice-versa, azul sobre amarelo, preto sobre branco. Por maior que seja a influência da língua, para um fisiologista seria ridículo pensar que ela poderia atingir a retina e modificar as reações entre as células ganglionares.

Na verdade, os seres humanos do mundo inteiro (assim como os bebês e os macacos, no que a isso se refere) colorem as palavras com a percepção usando a mesma paleta, e isso limita o vocabulário que eles desenvolvem. Embora as línguas discordem sobre o conteúdo da caixa de com sessenta e quatro lápis de cor – os vários tons de umbra, os turquesas, os fúcsias –, concordam muito mais quanto à caixa de oito cores – os vermelhos de carro de bombeiro, os amarelos-limão da grama. Falantes de diferentes línguas unanimemente consideram esses tons os melhores exemplos de suas palavras para cor, desde que a língua tenha uma palavra para a cor desse setor do espectro. E, quando as línguas diferem nas suas palavras para as cores, diferem de forma previsível, e não de acordo com o gosto idiossincrático de algum cunhador de palavras. As línguas estão organizadas mais ou menos como a linha de produtos Crayola, das cores mais básicas às mais estranhas. Se uma língua tiver duas palavras para cor, serão para designar preto e branco (que geralmente abrange escuro e claro, respectivamente). Se tiver três, serão para designar preto, branco e vermelho; se tiver quatro, preto, branco, vermelho e/ou amarelo, ou verde. Com cinco incluirá verde e amarelo; seis, azul; sete, marrom; mais que sete, roxo, rosa, laranja ou cinza. Mas o experimento decisivo foi realizado no planalto da Nova Guiné com os Dani do vale grande, um povo que fala uma das línguas preto-e-branco. A psicóloga Eleanor Rosch descobriu que os Dani aprendiam mais rápido uma nova categoria de cor baseada no vermelho do que outra baseada em outra cor. A maneira como vemos cores determina como aprendemos as palavras e não o contrario.


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Offline Dr. Manhattan

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #10 Online: 04 de Março de 2007, 12:49:26 »
Interessante! E o texto acima para ser mais um prego no caixao da Hipótese Sapir-Worf. É uma pena. Embora esteja errada, é uma idéia interessante.
Outra coisa: li um artigo recente na Sciam sobre a visao dos pássaros. Sabe-se que muitos pássaros vêem também no ultravioleta. Aliás, se as cores visíveis para um humano correspondem a um espaço tridimensional (ou seja, com pigmentos sensíveis a comprimentos de onda de 560, 530 e 424 nm), o espaço de cores dos pássaros tem 4 dimensoes (370, 445, 508 e 565 nm). Ou seja, nao só os pássaros conseguem ver mais tonalidades que nós, mas eles também conseguem ver cores que nem conseguimos imaginar!
Mais outra coisa: é interessante como as pessoas que vivem em latitudes temperadas parecem ter uma noçao mais intuitiva de Norte-Sul. Alguem (nao lembro quem, infelizmente) disse que isso tem a ver com as mudanças sazonais de luz e do nascer e pôr do sol. Acho que isso explica porque, quando em Fortaleza, as pessoas me olhavam como se eu fosse um alienígena quando eu dizia coisas como "minha casa fica ao norte de bairro tal".
You and I are all as much continuous with the physical universe as a wave is continuous with the ocean.

Alan Watts

Offline Wolfischer

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #11 Online: 04 de Março de 2007, 18:29:08 »
Interessante. Ouvi dizer também que, por mais dominante que se seja num novo idioma além do primeiro, a tendência é pensar em matemática com o primeiro idioma…

Imagino se não valha a pena talvez imaginar um "esperanto", um idioma "artificial", voltado para otimização do pensamento. Idéias de FC…
Meu primeiro idioma foi o alemão, mas não consigo fazer contas mentalmente em alemão (a inversão das dezenas e das unidades atrapalha muito), provavelmente isso é porque não cheguei ao estágio matemático antes de aprender português.

Offline Rodion

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #12 Online: 04 de Março de 2007, 21:07:36 »
Interessantíssimo o artigo, Bruno! Eu gostaria de ler inteiro, se você pudesse mandar.

Minha esposa é de Belém do Pará. Ela falava de vez em quando nas "cores oblíquas" do Rio de Janeiro, onde moramos, e eu não entendia direito o que ela queria dizer. Depois de algum esforço percebi que ela se referia à maneira que a inclinação da luz solar ao longo do ano mudava os tons das cores. Em Belém a inclinação é quase sempre a mesma o ano inteiro. Nunca tinha parado para pensar nisso e achei fascinante!

ok, no fim de semana vejo se o disponibilizo.
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Offline Geotecton

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #13 Online: 14 de Agosto de 2011, 10:11:16 »
Interessantíssimo o artigo, Bruno! Eu gostaria de ler inteiro, se você pudesse mandar.

Minha esposa é de Belém do Pará. Ela falava de vez em quando nas "cores oblíquas" do Rio de Janeiro, onde moramos, e eu não entendia direito o que ela queria dizer. Depois de algum esforço percebi que ela se referia à maneira que a inclinação da luz solar ao longo do ano mudava os tons das cores. Em Belém a inclinação é quase sempre a mesma o ano inteiro. Nunca tinha parado para pensar nisso e achei fascinante!

ok, no fim de semana vejo se o disponibilizo.

Ei Dbohr, o forista disponibilizou o artigo?
Foto USGS

Offline uiliníli

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Re: Näïkìmlyìïà
« Resposta #14 Online: 15 de Agosto de 2011, 22:17:51 »
Deus existe! Graças a Deus hoje temos que aprender inglês, e não banto :shock:

 

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