Eucaliptos sob ataque
A Via Campesina decidiu antecipar o aniversário de um ano de sua mais barulhenta ação, a depredação dos laboratórios da Aracruz Celulose, ocorrida em 8 de março de 2006. Militantes da organização, que congrega agricultores e agricultoras sem terra e pequenos proprietários, invadiram ontem quatro áreas de empresas florestais no Estado.
As propriedades ficam em Rosário do Sul, Eldorado do Sul, São Francisco de Assis e Pinheiro Machado. As três empresas com áreas invadidas (Votorantim, Stora Enso e Aracruz) planejam aplicar cerca de US$ 4 bilhões (R$ 8,4 bilhões) no Rio Grande do Sul, em projetos de reflorestamento e em fábricas de papel.
A Via Campesina, multinacional de protestos que tem como principal entidade o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), desdenha esses investimentos. Em seu comunicado à imprensa, nenhuma menção sobre possíveis empregos gerados pelas reflorestadoras.
O movimento aponta motivações ecológicas para invadir as plantações e diz que as três empresas donas das áreas invadidas têm mais de 200 mil hectares, que serão transformados num "deserto verde" de eucaliptos destinados a virar celulose.
O curioso é que parte das terras invadidas ontem pelas mulheres da Via Campesina, em Eldorado do Sul, é uma área de preservação permanente e que deveria seguir intocada, por lei e por padrões ambientais.
A ofensiva de ontem se enquadra na busca do MST por alianças urbanas, notadamente entre ambientalistas. Em 2004, o movimento já havia anunciado o setor de papel e celulose como foco. De lá para cá, já atacou áreas de empresas florestais em Estados como Bahia e Santa Catarina, além do próprio Rio Grande do Sul.
Outro fator que contribui para essa mudança é que as grandes fazendas improdutivas do Estado estão desaparecendo. Em 2005, por exemplo, apenas uma de 66 áreas vistoriadas pelo governo federal foi considerada improdutiva.
As empresas florestais também atraem como empregados safristas que formam a base do MST, seu público militante.
Ações pegaram a Brigada de surpresa
Eis porque a nova bandeira da Via Campesina é atacar as áreas florestais, sob argumento de que no lugar destinado aos eucaliptos poderiam ser assentadas 8 mil famílias de agricultores. Essa busca de novos adeptos tem levado o MST a ações que contradizem sua origem, muito longe do front agrário. Os sem-terra têm atuado em bloqueio de rodovias contra pedágios, em protestos contra bancos e até invadido lanchonetes como o McDonald's, sob argumento de que são imperialistas.
A suposta conversão do MST a teses ambientalistas - uma contradição para uma entidade cujos militantes são seguidamente responsabilizados por desmatamento de áreas invadidas - não espanta estudiosos da questão. Eduardo Filippi, especialista em Economia Ecológica, doutor em Economia pela Universidade de Versalhes (França) e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), assegura que a luta da Via Campesina contra os eucaliptos não é só marketing.
- É uma questão de sobrevivência para o movimento. Alianças como essa são mundiais. Mesmo que o método da quebradeira seja condenável, estão em jogo a visibilidade do MST e o destino dos pequenos agricultores - resume.
As invasões pegaram de surpresa o serviço reservado da Brigada Militar, que só esperava ataques do gênero para o Dia da Mulher, amanhã, exatos 365 dias depois da destruição registrada na Aracruz. Até o entardecer de ontem, duas áreas invadidas já tinham sido desocupadas pelas sem-terra, em São Francisco de Assis e Rosário do Sul. Nas outras duas, os proprietários conseguiram ordem judicial para retirada dos invasores.
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