Notícias Sábado, 21 de maio de 2005
JC e-mail 2771, de 19 de Maio de 2005.
Dia Mundial da Física: Remando contar a maré do Big Bang
Hoje, a tese defendida por Novello, a do Universo eterno, prevalece
Ana Lucia Azevedo escreve para ‘O Globo’:
O físico Mário Novello sabe muito bem como é duro remar contra a maré. Principalmente, se a maré em questão é a do Big Bang, o famoso modelo sobre a origem do Universo.
Hoje, a tese defendida por Novello, a do Universo eterno, prevalece. Porém, ele mais uma vez aposta na mudança e vê uma nova revolução em curso na física. A Humanidade poderá mudar, uma vez mais, a forma como vê a si mesma e ao mundo.
No ano passado, Novello ganhou o título de doutor honoris causa da Universidade Claude Bernard de Lyon — o último físico agraciado com o título foi o russo Andrei Sakharov (1921-1989), prêmio Nobel em 1975 e o mais famoso dissidente da ex-União Soviética.
Ele divide seu tempo entre as pesquisas no Instituto de Cosmologia, Relatividade e Astrofísica do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e os livros que escreve para não cientistas, como ‘Máquina do tempo’ (Jorge Zahar Editor) e ‘Os jogos da natureza’ (Campus/Elsevier).
Por muito tempo seu trabalho foi visto como herético. Você desafiava o conceito do Big Bang, a explicação mais difundida sobre a origem do Universo. O que mudou?
Mário Novello: Muitos estudos mostraram que a hipótese do Universo eterno é muito mais factível do que a de um Cosmo como o do Big Bang, com um início estabelecido há uns poucos bilhões de anos. Durante a década de 90 ficou claro que o Big Bang foi um começo, mas apenas dessa fase de expansão do Universo. O Big Bang não foi o início de tudo.
Por quê o Big Bang se tornou tão difundido?
Novello: Porque é um conceito poderoso. Ele virou uma espécie de mito científico da criação. Substituiu o Paraíso, Adão e Eva por átomos e moléculas. A física trouxe a cosmogonia para a ciência.
Se o Big Bang não foi o início de tudo, o que havia antes?
Novello: Há numerosos modelos. Mas eles concordam que antes do Big Bang havia o vazio. Mas esse vazio é o vazio de matéria, de tudo que chamamos indistintamente de coisas. Mas isso não vale para estrutura espaço-tempo. Por isso, pelas leis da gravitação, esse vazio primordial era instável e sujeito a colapsar. A matéria e a energia surgiram devido à interação gravitacional que fez o vazio colapsar. Foi o colapso do nada. Com a gravitação, o nada gerou tudo-o-que-existe.
Esses conceitos são muito complexos, distantes dos fatos cotidianos...
Novello: Sim, é verdade. Uma parte da física está cada vez mais voltada para coisas que não fazem parte do cotidiano. Mas a física também nos impõe novos desafios. À medida que nosso conhecimento sobre o Universo e as leis que o regem aumenta, somos desafiados a mudar nossa visão de mundo. Nosso cérebro está treinado para pensar em matéria/energia e espaço/tempo. Mas a explicação sobre a origem do Cosmo que começa a emergir não se encaixa na nossa forma de pensar e à nossa linguagem.
Nos últimos anos temos visto a ciência se aproximar como nunca da ficção. Um dia seremos capazes de viajar no tempo?
Novello: Teoricamente, é possível. Precisamos encontrar atalhos no espaço-tempo que os físicos apelidaram de buracos de minhoca. Hoje, não conseguimos nem chegar a alfa-centauro, a estrela mais próxima de nosso Sol. É uma distância praticamente impossível de percorrer. Mas se entrássemos num buraco de minhoca poderíamos chegar à alfa-centauro em segundos. Os atalhos viabilizariam não só viagens no tempo quanto a exploração do Universo. Parece ficção, mas hoje faz parte da ciência.
Como descobrir buracos de minhoca no Universo?
Novello: Os buracos de minhoca são como máquinas do tempo capazes de nos transportar em viagens que levariam dezenas de milhares de anos, para o passado ou para o futuro, em segundos. Para achá-los, precisamos modificar certas conseqüências de algumas leis da física.
A física passa por uma nova revolução?
Novello: A cosmologia está reformando nossa forma de ver o Universo. Temos dificuldade para perceber esta revolução porque estamos imersos nela. Precisamos aprender a pensar de maneira diferente, mas não sabemos ainda muito bem como.
Como é essa nova visão?
Novello: É uma revolução que começou no final do século XX. Chegamos a fenômenos que não podem ser explicados pelas leis que conhecemos, que desafiam princípios básicos como os do eletromagnetismo tradicional. Talvez vá surgir um novo Einstein que nos ajude a entender melhor a nova estrutura que está em marcha.
(O Globo, 18/5)
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Notícias Sábado, 21 de maio de 2005
JC e-mail 2771, de 19 de Maio de 2005.
Dia Mundial da Física: O desafio monumental de decifrar o Universo
Esse conhecimento mais profundo que, em tese, permitiria até mesmo as viagens no tempo, só será possível com novas teorias ou, quem sabe, um novo Einstein
Roberta Jansen escreve para ‘O Globo’:
Conciliar dois dos principais legados de Albert Einstein, a física quântica e a relatividade geral, criando uma teoria unificada e mais consistente para explicar os fenômenos da natureza, é um dos maiores desafios da física atualmente, concordam especialistas.
Segundo cientistas, entretanto, teorias tão ou mais revolucionárias que as de Einstein, que apresentassem novas concepções sobre o espaço-tempo, precisariam advir para a solução do impasse.
À medida que novos fenômenos, escalas, domínios da natureza e tecnologias surgirem, teorias mais amplas serão necessárias para explicá-los, acreditam.
‘Quando se considera a idéia de Einstein, da gravidade ligada à geometria do espaço-tempo, é preciso olhar o que acontece com o espaço-tempo numa escala muito abaixo da microscópica, tão distante da nossa quanto a do Universo’, sustenta o físico Moysés Nussenzveig, explicando por que é difícil unificar a teoria quântica à da relatividade geral.
‘Estamos falando de distâncias e tempos tão curtos, tão pequenos, que é difícil conceber acesso a essas escalas em laboratório. E nessas escalas, o conceito de espaço-tempo precisa ser revisto.’
Por enquanto, aponta Nussenzveig, não há teoria consistente para se chegar a essas escalas. A Teoria das Cordas, que tenta fazer isso, é a mais conhecida e mais aceita atualmente, mas, segundo os especialistas, ainda é embrionária.
‘Estamos caminhando para uma tecnologia que envolve sistemas cada vez mais microscópicos’, constata o físico Luiz Davidovitch.
‘Disso resulta que começamos a lidar com aplicações da física quântica no nível microscópico, aplicações que lidam com propriedades quânticas que intrigaram Einstein durante muitos anos.’
A solução de tal problema é considerada fundamental a médio prazo, sobretudo num momento em que a nanotecnologia desponta como uma das mais promissoras áreas da física, em áreas que vão da eletrônica à biologia. A nanotecnologia lida com escalas atômicas e moleculares, ainda assim, mais de 30 ordens de grandeza acima da gravidade quântica.
Outro importante desafio da física, na análise dos especialistas, diz respeito justamente a sua relação com a biologia.
‘Cada vez mais constatamos que mecanismos moleculares biológicos básicos são diretamente influenciados pela física’, aponta Davidovich.
‘Por isso, acredito que a física terá um papel cada vez mais importante na biologia, ajudando a explicar características de moléculas e sistemas biológicos.’
Outro grande problema em aberto a intrigar os cientistas diz respeito ao ínfimo conhecimento que se tem do Universo.
‘Se por um lado a física nos permitiu explicar desde fenômenos em escala subnuclear até do Universo, por outro, descobertas recentes mostram que tudo aquilo que tratamos na física seria apenas 4% do que está contido no Universo’, diz Nussenzveig.
‘Há a matéria escura e a energia escura sobre as quais há conjecturas.’
Esse conhecimento mais profundo que, em tese, permitiria até mesmo as viagens no tempo, só será possível com novas teorias ou, quem sabe, um novo Einstein.
(O Globo, 18/5)