Antes evasivo, Temporão reage à interferência da Igreja. Para o ministro, manifestações contra o aborto têm 'viés machista'. Lísia Gusmão
Do G1, em Brasília
Ao comentar a declaração do Papa Bento XVI de que políticos católicos podem ser excomungados caso apóiem o aborto, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse que "fé não se excomunga" e criticou a interferência da Igreja Católica nas discussões sobre a legalização do aborto.
"O que você não pode querer é prescrever dogmas e preceitos de uma determinada religião para o conjunto da sociedade. Me parece uma coisa descabida", disse o ministro após audiência da Comissão de Assuntos Sociais.
Antes, porém, o ministro José Gomes Temporão havia optado pela diplomacia e evitou críticas diretas a Joseph Ratiznger.
"Sou de formação católica sólida. Isso é uma questão de fé de cada um. O Brasil é um país, aliás, de muita liberdade de expressão religiosa, uma marca da sociedade brasileira", disse, antes da reunião com os senadores.
'Viés machista' O ministro disse que há um viés machista na discussão sobre a legalização do aborto. Afirmou que partem dos homens as manifestações mais contundentes contra o aborto.
"Estou preocupado em ouvir as mulheres. Infelizmente os homens não engravidam, porque se engravidassem tenho certeza que essa questão já estaria resolvida há muito tempo", disse. Segundo Temporão, organizações norte-americanas apontam a realização de 1,1 milhão de abortos por ano no Brasil. Dados oficiais do Ministério da Saúde, informou, indicam que 160 mulheres morreram no ano passado em decorrência de abortos mal feitos.
"Mas eu multiplicaria esses números por cinco", disse o ministro, que não quis, no entanto, defender sua posição pessoal em relação ao tema.
"As discussões no campo da filosofia, no campo da ética, no campo da religião, no campo da moral são legítimas,
mas o ministro tem que estar focado o tempo todo na dimensão da saúde pública. É uma questão de saúde pública que leva à morte, ao sofrimento de milhares de mulheres brasileiras. O ministro tem que estar preocupado com isso".
O debate sobre a legalização do aborto rendeu ao ministro da Saúde um elogioso comentário do senador Heráclito Fortes (DEM-PI), um dos mais ferrenhos oposicionistas do governo.
"A convicção pessoal não pode sobrepor-se à questão de Estado. Embora da oposição, louvo a sua coragem de enfrentar o assunto", disse o senador.
Quebra de patente O ministro da Saúde anunciou que estão em curso negociações para reduzir os custos de outro medicamento que compõe o coquetel anti-Aids. Aos senadores da Comissão de Assuntos Econômicos, José Gomes Temporão disse que o governo recorreu ao licenciamento compulsório porque, da empresa Merck Sharp & Dohme, não veio nenhuma "proposta séria" para baratear o Efavirenz.
"A decisão foi justa, soberana e não oferece nenhuma ameaça aos interesses da indústria farmacêutica. Mas foi um caso isolado", ressaltou o ministro, que não quis revelar o laboratório que negocia com o Brasil a redução dos custos de outro medicamento do coquetel anti-Aids.
"O que eu posso dizer que as negociações estão indo muito bem. Com certeza vão se concluir com um nível satisfatório para o governo brasileiro e para a empresa", afirmou.
Fonte:
http://g1.com.br