Autor Tópico: O censor utópico  (Lida 796 vezes)

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Offline Buckaroo Banzai

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O censor utópico
« Online: 03 de Junho de 2007, 20:22:01 »
"O Globo" 31/05/07

O censor utópico

DEMÉTRIO MAGNOLI

As “Meninas Superpoderosas” não receberão o selo de Programa Especialmente Recomendado para Crianças e Adolescentes. É que Tarcízio Ildefonso, diretor-adjunto do Departamento de Justiça e Classificação Indicativa (Dejus), não aprova a ambientação, em shopping center, da confraternização das heróicas meninas: “Esse gesto é segregacionista, já que nem todos podem fazer compras em shopping, além de ser um estímulo ao consumismo”.

Ildefonso gostaria de que elas celebrassem suas vitórias “no Palácio da Justiça”. Eu, que não nutro a mesma admiração pelos templos do Estado, faria as meninas confraternizarem em praça pública.

Minhas preferências são irrelevantes.

As dele valem ouro: todos os dias, compulsoriamente, ocuparão as telas das redes nacionais de televisão.

Se o Supremo permitir, Ildefonso e seus colegas se tornarão “meninos superpoderosos”.

As suas preferências serão convertidas em selos bilionários ou em supressões irremediáveis porque, através da classificação horária obrigatória, eles têm os meios de destroçar financeiramente produtos culturais moldados para os anunciantes do horário nobre. Os censores da nova era não cortam cenas ou proíbem filmes: eles colocam a mídia eletrônica de joelhos diante do poder de turno.

Na ditadura militar, os chefes da Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP) falavam em nome da moral e dos costumes. Os novos censores renegam seus ancestrais e falam em nome da democracia. Eles acusam os críticos de prestarem serviço às empresas de mídia, como se o princípio do lucro não pudesse conviver com o da censura.

Eles citam Estados democráticos que fazem classificação indicativa, omitindo ritualmente a circunstância decisiva: lá fora, quem classifica são órgãos de auto-regulamentação; aqui, é o governo.

O nome disso é censura.

O Dejus não é o DCDP. Aos olhos dos censores orgulhosos, sexo era sexo e um crânio partido era o que era.

Os censores dissimulados são seres mais complexos. Eles obedecem às regras de um manual parido por “especialistas” que ensina a inserir cada coisa no seu “contexto”. Existe sexo do bem e pura sacanagem.

O tiro e o crânio partido são interpretados à luz dos imperativos de justiça social. O valor de cada cena depende de seus significados políticos e culturais. O DCDP pretendia cercear, amordaçar, calar, proibir. O Dejus almeja falar, moldar, doutrinar, ensinar. O Dejus é Lula em toda a sua glória.

Há anos, o presidente reitera, em incontáveis pronunciamentos, o paralelo entre a nação e a família. Sob essa lógica, ele se apresenta como pai, que trata o povo, “especialmente os mais pobres”, como seus próprios filhos, exercita a paciência mas não renuncia à firmeza, traça limites e sofre ao dizer “não”. A metáfora autoritária da naçãofamília é o alicerce ideológico que sustenta o edifício da nova censura.

Lula não inventou a classificação indicativa, um fruto da articulação entre ongs e intelectuais petistas que pregam o “controle social da mídia”.

Mas o ambiente político no qual floresce o dirigismo cultural está contaminado pela idéia de que a missão do Estado é educar a sociedade. Não se pode confiar na auto-regulamentação da mídia, na crítica pública ou no discernimento das famílias: a consciência nacional deve ser depositada aos cuidados do censor utópico incrustado no Ministério da Justiça.

A visão paternalista acalentada pelo Planalto oferece pretextos para variadas aventuras dirigistas. Meses atrás, os ministérios da Saúde e da Educação produziram uma cartilha de educação sexual destinada a alunos de escolas públicas de 13 a 19 anos que ensina a colocar preservativo e os convida a relatar suas “ficadas”.

Posta diante da objeção de que a cartilha circunda a mediação dos professores e a vontade das famílias interessadas em evitar a iniciação sexual precoce dos adolescentes, Mariângela Simões, diretora do Programa DST/Aids, e responsável pelo material, retrucou que “o foco é o jovem, não a censura que possa vir de um pai”.

O texto da cartilha — com trechos como “Sexo não é só penetração. Seduza, beije, cheire, experimente!” — talvez não passasse pelo crivo do Dejus, mas as duas iniciativas compartilham a fé na virtude do Estado e o desprezo pelo livre arbítrio dos cidadãos.

O ridículo está à solta. Na era da internet de massas, o Ministério da Justiça alega a urgência de proteger as crianças dos perigos da TV nos horários em que os pais estão ausentes, enquanto admira, indiferente, o espetáculo da humilhação cotidiana dos jovens das favelas pela ação do crime organizado e da polícia corrompida.

Há método no absurdo: os doutrinários que ignoram o direito à segurança são os mesmos que usurpam o direito à liberdade.




Não encontrei fonte original, copiei do RV.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: O censor utópico
« Resposta #1 Online: 03 de Junho de 2007, 20:26:41 »
Quanto a cartilhas de educação sexual, não sou exatamente contra, mas acredito que o foco devesse ser em sobre o lado biológico da reprodução, doenças sexualmente transmissíveis e minimamente sobre "aspectos sociais" ou realmente sexuais, como isso de "beije, seduza" etc, para garantir maior aceitação e inclusive utilidade. Um contexto em que algo similar talvez fosse apropriado seria em talvez "erotizar" o uso de preservativo, por exemplo, mas nem sei qual é o teor geral da cartilha mesmo, só vi esse trecho apresentado aí.


Offline Rodion

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Re: O censor utópico
« Resposta #2 Online: 03 de Junho de 2007, 20:31:37 »
canalhas, todos uns canalhas.
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Offline Herf

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Re: O censor utópico
« Resposta #3 Online: 04 de Junho de 2007, 20:52:21 »
Citar
Sob essa lógica, ele se apresenta como pai, que trata o povo, “especialmente os mais pobres”, como seus próprios filhos, exercita a paciência mas não renuncia à firmeza, traça limites e sofre ao dizer “não”. A metáfora autoritária da naçãofamília é o alicerce ideológico que sustenta o edifício da nova censura.

Lula não inventou a classificação indicativa, um fruto da articulação entre ongs e intelectuais petistas que pregam o “controle social da mídia”.

Mas o ambiente político no qual floresce o dirigismo cultural está contaminado pela idéia de que a missão do Estado é educar a sociedade.

Pobre país. Essa mentalidade do estado-pai já está enraizada no povo. Alguns pensam que é irreversível isso, estou tentado a achar também.

O estado manipulador, seja de direita ou de esquerda, manifesta dois ideais contraditórios: o de que o ele deve educar o povo, presumivelmente por julgar que este não tem capacidade para tal e é facilmente manipulável, e o de que todas as classes populares, particularmente as mais pobres e suscetíveis a políticas populistas, devem ter o direito do voto. Eu também penso que não é certo tirar o direito de voto daqueles que não possuem educação formal, mas é interessante que o estado julgue que tais pessoas só sabem escolher por si próprias na hora da eleição, quando o "paizão do povo" vai lá entre eles solicitar votos. E geralmente são estes que decidem a eleição, como ocorreu nas duas últimas.

Offline Spitfire

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Re: O censor utópico
« Resposta #4 Online: 04 de Junho de 2007, 21:07:13 »
E geralmente são estes que decidem a eleição, como ocorreu nas duas últimas.

Geralmente não... sempre. e não só nas últimas, mas em todas que houveram e que tiveram direito de voto.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: O censor utópico
« Resposta #5 Online: 06 de Junho de 2007, 10:19:07 »
Deveriam contra-indicar o futebol, pois exalta a competitividade entre equipes, em vez da colaboração por um fim que beneficie a ambos, a mesma competitividade do capitalismo selvagem, do darwinismo social; ao mesmo tempo, não são todas as pessoas que podem pagar por uma entrada num campo de futebol para assistir a um jogo, ou mesmo assinar canais esportivos, e há aqueles até que não tem dinheiro nem para a tv aberta, ou mesmo para uma bola de futebol.

E o próprio futebol não é o exemplo que vai ajudá-los a sair dessa situação, pelos motivos já mencionados. Em vez disso, induzirá à formação de "times", ou gangues, para conseguir marcar "gols" contra outras equipes rivais - as pessoas roubadas, que muitas vezes, nem são burgueses e muito raramente são americanos, apesar do aumento do turismo.

Marx, se estivesse vivo, teria dito que futebol é o ópio do brasileiro.

É oportuno também lembrar que o futebol não é "nosso", ainda que o nosso país tenha obtido relativo sucesso nesse empreendimento capitalista que só beneficia a uns poucos (há casos de salários individuais que são maiores do que folhas de pagamento de times inteiros). O futebol veio dos colonizadores ingleses, pais dos americanos. A árvore se conhece por seus frutos, e se o fruto da Inglaterra são os assim chamados "Estados Unidos", isso nos dá uma boa idéia de quão nefasto é esse país, e que nada de bom pode vir dele ou de seus habitantes.

 

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