Fazer curso gratuito de espanhol na universidade não podia dar em outra coisa... Em nome da nobre missão de aprender o idioma de Cervantes minha penitência é ter que agüentar a propaganda esquerdista escancarada em aulas regadas a Eduardo Galeano e Mafalda. Na aula passada o desprazer que tive foi de ouvir uma musiquinha chulé que me parecia um sertanejo cantado em espanhol e que apresentava uma versão romantizada da colonização espanhola no México.
Maldición de Malinche
(G. Palomares)
Amparo Ochoa
"El cancionero popular"
Del mar los vieron llegar mis hermanos emplumados
Eran los hombres barbados de la profecía esperada
Se oyó la voz del monarca de que el dios había llegado.
Y les abrimos la puerta por temor a lo ignorado.
Iban montados en bestias como demonios del mal
Iban con fuego en las manos y cubiertos de metal.
Sólo el valor de unos cuantos les opuso resistencia
Y al mirar correr la sangre se llenaron de verguenza.
Porque los dioses ni comen ni gozan con lo robado
Y cuando nos dimos cuenta ya todo estaba acabado.
Y en ese error entregamos la grandeza del pasado
Y en ese error nos quedamos trescientos años esclavos.
Se nos quedó el maleficio de brindar al extranjero
Nuestra fe, nuestra cultura, nuestro pan, nuestro dinero.
Y les seguimos cambiando oro por cuentas de vidrio
Y damos nuestras riquezas por sus espejos con brillo.
Hoy, en pleno siglo veinte nos siguen llegando rubios
Y les abrimos la casa y les llamamos amigos.
Pero si llega cansado un indio de andar la sierra
Lo humillamos y lo vemos como extraño por su tierra.
Tu, hipócrita que te muestras humilde ante el extranjero
Pero te vuelves soberbio con tus hermanos del pueblo.
Oh, maldición de Malinche, enfermedad del presente
Cuándo dejarás mi tierra.. cuándo harás libre a mi gente.Observações a respeito da ironia de uma música tão hispanofóbica ser cantada em Espanhol e argumentações sobre o fato de o próprio autor da mesma ter recebido uma herança cultural tanto do colonizador quanto do colonizado à parte, o que eu achei mais interessante foi a história dessa tal maldição de Malinche, um termo que hoje em dia se refere ao fascínio pelo que vem de fora acompanhado pelo desprezo pela própria terra. A Malinche em questão é uma personagem quase desconhecida no Brasil, mas universalmente odiada entre os países de língua espanhola de nosso continente. A pequena biografia que ouvi dela na aula foi altamente desfavorável à pobre menina, classificada como traidora deslumbrada com os estrangeiros que, segundo palavras de minha própria professora, foi "a responsável" pelo massacre dos povos indígenas no continente, como isso não fosse inevitável. De qualquer forma eu a achei uma personagem fascinante e resolvi pesquisar um pouco mais, tendo encontrado este texto sobre o assunto:
http://www.prodiversitas.bioetica.org/malinche.htmFalando resumidamente, trata-se de uma jovem asteca, filha de uma família nobre, que após a morte de seu pai e o novo casamento de sua mãe, que deu à luz a um menino, foi oferecida como escrava pela própria família a comerciantes. Acabou sendo vendida aos maias e em algum tempo aprendeu seu idioma. Quando Cortés chegou ao México ela foi novamente oferecida como escrava, junto com mais 19 meninas, desta vez aos espanhóis, como presente. Cortés já contava com um tradutor do idioma maia, o padre espanhol Jeronimo de Aguilar, que tivera sobrevivido a um naufrágio, mas os astecas e a maioria dos índios não maias se comunicava em nahuatl. Em pouco tempo descobriram que uma daquelas índias que tinham ganhado falava tanto maia quanto nahuatl, dessa forma pôde servir de intérprete do próprio Jeronimo nos primeiros encontros com os emissários de Montezuma.
Convertida ao Cristianismo e batizada como Marina, Doña Marina, como era chamada pelos espanhóis, rapidamente aprendeu o castelhano e se tornou conselheira de Cortés, por quem se apaixonou e mais tarde virou amante, chegando a ter um filho, reconhecido pelo espanhol e batizado Martín Cortés. Apesar de o espanhol já ser casado com uma espanhola à época, aparentemente seus sentimentos pela moça eram recíprocos, tanto que freqüentemente outras mulheres eram oferecidas a Cortés, mas ele sempre as recusava. O nome de Malinche, como ficou conhecida entre os latino-americanos de hoje, não era seu nome verdadeiro, na verdade não era nem a ela que os astecas se referiam como Malinche, mas ao próprio Cortés. Malinche se traduz como "O capitão de Marina", sendo a própria Marina chamada "La Malinche", a mulher do capitão.
O talento para a negociação era uma característica marcante de Marina, que ajudou os espanhóis na tentativa de, a princípio, estabelecer relações amigáveis com o império Asteca e a conquistar aliados entre outros povos indígenas tributados pelos próprios astecas, como os cempolanos, os primeiros índios a se juntarem aos espanhóis na guerra com os astecas, que viria mais mais tarde - e Marina foi hábil em conquistar o apoio de milhares de guerreiros de diversas nações indígenas, sem os quais a conquista espanhola não teria sido possível.
Os astecas tinham muitos inimigos entre seus vizinhos. Esse império subjugava e cobrava tributos das civilizações menores e exigiam pessoas para seus sacrifícios rituais. Essas nações viram nos espanhóis uma oportunidade de se livrarem do jugo asteca, e os próprios espanhóis encontraram nelas um meio de conquistarem esse império e chegarem ao tão desejado ouro. Ironicamente, os próprios astecas selaram seu destino trágico oferecendo ouro e prata aos espanhóis como presentes logo nas primeiras reuniões entre seus emissários - eles literalmente "entregaram o ouro" mostrando ao invasor as riquezas que possuiam em suas terras. Como a Conquista seria inevitável, o papel de Marina foi mais o de acelerar e, de certa forma, até suavizá-la, evitando que ainda mais vidas fossem perdidas.
Após a bem sucedida campanha, Cortés conseguiu casar Marina com um de seus capitães e ela foi levada à Espanha, onde morreu sem deixar mais registros à história, mas seu filho, Martín, "o primeiro mexicano", alacançou altas posições no governo da província, tornando-se Comendador da Ordem de São Tiago, mas acusado de conspiração contra o vice-rei em 1548 foi torturado e executado.