Autor Tópico: Animais Morais - Hélio Schwartsman  (Lida 2812 vezes)

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Offline Herf

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Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Online: 08 de Dezembro de 2007, 17:52:51 »
Uma questão muito desafiadora levantada pelo texto: a partir de que ponto é válido sacrificar os interesses/a vida de um indivíduo em prol dos interesses/das vidas de uma porção de outros indivíduos?

**********

Animais morais

Um dos livros mais instigantes que li este ano é "Moral Minds" (mentes morais), de Marc Hauser, no qual este biólogo evolucionário de Harvard apresenta um modelo bastante convincente de como desenvolvemos um senso universal do certo e do errado.

Trata-se de um tema seminal, que despertou a atenção de alguns dos maiores filósofos de todos os tempos, e está no centro dos mais acalorados debates da atualidade, constituindo o substrato de questões como religião, violência, aborto, eutanásia, liberação das drogas etc.

A tese central da obra de Hauser é a de que a faculdade moral é um instinto. A analogia é com a teoria da gramática universal de Noam Chomsky, que já comentei numa coluna mais antiga. Da mesma forma que nossos cérebros são equipados com um "software" lingüístico, que nos habilita a aprender praticamente "por osmose" o(s) idioma(s) ao(s) qual(is) somos expostos na primeira infância, nossa cachola também já vem com uma moral de fábrica. Não se trata, por certo, de um código penal, uma lista pronta e acabada de todas as ofensas possíveis e as respectivas punições, mas de um conjunto de princípios elementares, comuns a toda a humanidade, e maleáveis o bastante para comportar uma boa gama de variações culturais.

Com efeito, por maior que seja a exuberância dos comportamentos humanos narrados pelos antropólogos, não se conhece cultura que considere positivo matar o próximo, por exemplo. Assim, como regra geral, toda sociedade proíbe o homicídio. Mas uma característica das regras gerais é que elas comportam exceções. E é justamente a lista de exceções à regra geral da proibição do homicídio que dará o caráter de cada sociedade.

A maioria das culturas excusa o homicídio no contexto da legítima defesa (da própria vida ou da de terceiros). Algumas, estendem essa licença à proteção da propriedade. No velho Oeste americano, era legal e legítimo enforcar ladrões de cavalos. Um número não desprezível autoriza assassinatos em defesa da honra. Em alguns grupos, notadamente islâmicos (embora o preceito não esteja no Alcorão nem nos "hadith") espera-se que pais assassinem filhas que se mostrem infiéis a seus maridos. Variações semelhantes ocorrem em relação ao tratamento que diferentes culturas dão ao aborto, ao infanticídio, às presas de guerra etc.

Para ficarmos na analogia lingüística, da mesma maneira que idiomas apresentam características universais --como operar com sujeitos, verbos e predicados--, diferentes sistemas morais também possuem traços básicos comuns, a exemplo da proibição do homicídio, do horror ao incesto, da promoção da família etc. Mas, assim como cada língua, apesar das estruturas profundas comuns, permanece singular, também uma cultura, mesmo mantendo certos padrões universais, difere da outra.

É claro que tanto a razão como as emoções estão presentes em todas as decisões morais que tomamos. Não matamos aquele motoboy imbecil que arrancou o espelhinho de nosso carro tanto porque a maioria de nós tem uma repulsa natural ao assassinato --a emoção produzindo a moral, como defendia David Hume-- e também porque tememos as conseqüências legais de tal gesto --a razão, segundo a concepção de Immanuel Kant. O ponto que Hauser procura enfatizar, entretanto, é que a moral é um instinto, operando independentemente de razão e emoção. Aqui, ele se aproxima das idéias de John Rawls.

Esse é um campo que vem recebendo grande atenção de psicólogos evolucionistas e tem como matéria-prima os dilemas morais. É nesse ponto que os experimentos de Hauser trazem novos e fascinantes "insights". O autor propõe uma série de situações difíceis e nos convida a dar soluções. Também apresenta os resultados de suas entrevistas. São mais de 60 mil pessoas, gente de diversas etnias e com diferentes "backgrounds" que responderam ao questionário "on line" (não chega a ser uma amostra representativa do globo, mas não é um "n" desprezível). Você, leitor, também pode participar, clicando no site do teste.

Vamos ver alguns exemplos: Denise é passageira de um trem cujo maquinista desmaiou. A locomotiva desembestada vai atropelar cinco pessoas que caminham sobre a linha. Ela tem a opção de acionar um dispositivo que faz com que o comboio mude de trilhos, e, neste caso, atinja um único passante. Denise deve acionar a alavanca? Cerca de 90% dos entrevistados cederam à razão utilitária e responderam que sim. É melhor perder uma vida do que cinco.

Hauser então coloca uma variante do problema. Frank está sobre uma ponte e avista um trem desenfreado prestes a abalroar cinco alegres caminhantes. Ao lado dele está um sujeito imenso, que, se lançado sobre os trilhos, teria corpo para parar a locomotiva, salvando os cinco passantes. Frank deve atirar o gordão ponte abaixo? Aqui, a maioria (90%) responde que não, embora, em termos puramente racionais, a situação seja a mesma: sacrificar uma vida inocente em troca de cinco.

A constatação de que as respostas estão além da razão (pelo menos em sua expressão utilitarista) e da emoção é um argumento poderoso em favor do instinto, que é ainda reforçado pelo fato de representantes de grupos bastante diversos terem dado respostas muito semelhantes nestes casos.

Hauser sustenta que nosso "software" moral opera em torno de parâmetros como tipo de ação (se pessoal ou impessoal, direta ou indireta), conseqüências negativas e positivas e, principalmente, a intencionalidade. No fundo o que difere a ação de Denise da de Frank é que o sacrifício do passante solitário é uma espécie de efeito colateral (ainda que antevisto) de uma ação que visava a salvar cinco pessoas. Já atirar o gordão seria um ato intencional, um homicídio ainda que com o objetivo de obter um bem maior. Estamos aqui, se quisermos, diante da materialização empírica do imperativo categórico kantiano, que nos proíbe de usar seres humanos como meio para obter um fim (mesmo que nobre). Se assim não fosse, um médico estaria livre para capturar um sujeito saudável que passasse diante do pronto-socorro e, arrancando-lhe rins, fígado e coração para transplante, salvar a vida de quatro doentes.

Os experimentos mentais podem multiplicar-se e ficar bem mais sofisticados. E se, em vez da vida de cinco pessoas, o que estivesse em jogo fosse uma cidade inteira de 5 milhões de habitantes? Com números assim superlativos não seria lícito matar o gordão mesmo que intencionalmente?

Para além da riqueza de dados e novas perspectivas, "Moral Minds" oferece farta munição para destruirmos algumas "idées reçues" (idéias recebidas) renitentes. Uma falsa crença com a qual sempre me vejo às voltas quando incorro em textos ateus é a de que a religião é a fonte do comportamento moral das pessoas. Besteira. Como Hauser mostra de forma muito competente, a moralidade é tributária de um instinto que se consolidou no homem muitos milênios antes do primeiro padre celebrar a primeira missa. O que a religião fez, além da tentativa de usurpar para si a ética, foi despi-la de seus parâmetros variáveis e congelá-la no tempo, proclamando-a una e eterna. A menos que imaginemos um Deus racista, que faça questão de condenar todos os fores, de Papua-Nova Guiné, (canibais) e todos os faraós ptolomaicos (incestuosos), entre muitos outros povos e grupos que violam comandos bíblicos, temos de concluir que a moral é assunto complicado demais para ficar apenas nas mãos de religiosos.

Hélio Schwartsman
http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u351566.shtml

Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #1 Online: 08 de Dezembro de 2007, 18:18:17 »
Ótimo texto, como de costume vindo do Hélio Schwartsman.  :ok:

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Para além da riqueza de dados e novas perspectivas, "Moral Minds" oferece farta munição para destruirmos algumas "idées reçues" (idéias recebidas) renitentes. Uma falsa crença com a qual sempre me vejo às voltas quando incorro em textos ateus é a de que a religião é a fonte do comportamento moral das pessoas. Besteira. Como Hauser mostra de forma muito competente, a moralidade é tributária de um instinto que se consolidou no homem muitos milênios antes do primeiro padre celebrar a primeira missa. O que a religião fez, além da tentativa de usurpar para si a ética, foi despi-la de seus parâmetros variáveis e congelá-la no tempo, proclamando-a una e eterna. A menos que imaginemos um Deus racista, que faça questão de condenar todos os fores, de Papua-Nova Guiné, (canibais) e todos os faraós ptolomaicos (incestuosos), entre muitos outros povos e grupos que violam comandos bíblicos, temos de concluir que a moral é assunto complicado demais para ficar apenas nas mãos de religiosos.

É uma boa crítica ao argumento de que a religião é necessária a sociedade devido a sua imposição moral aos menos privilegiados destes atributos. A religião já perdeu essa capacidade e a sociedade não precisa dessa instituição para provomer a ética e a moral.

Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Südenbauer

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #2 Online: 08 de Dezembro de 2007, 18:19:47 »
Excelente, como sempre. Só fiquei curioso em saber o argumento dos 10% que não mudariam de trilho.

Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #3 Online: 08 de Dezembro de 2007, 18:21:55 »
Ótimo texto, como de costume vindo do Hélio Schwartsman.  :ok:

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Para além da riqueza de dados e novas perspectivas, "Moral Minds" oferece farta munição para destruirmos algumas "idées reçues" (idéias recebidas) renitentes. Uma falsa crença com a qual sempre me vejo às voltas quando incorro em textos ateus é a de que a religião é a fonte do comportamento moral das pessoas. Besteira. Como Hauser mostra de forma muito competente, a moralidade é tributária de um instinto que se consolidou no homem muitos milênios antes do primeiro padre celebrar a primeira missa. O que a religião fez, além da tentativa de usurpar para si a ética, foi despi-la de seus parâmetros variáveis e congelá-la no tempo, proclamando-a una e eterna. A menos que imaginemos um Deus racista, que faça questão de condenar todos os fores, de Papua-Nova Guiné, (canibais) e todos os faraós ptolomaicos (incestuosos), entre muitos outros povos e grupos que violam comandos bíblicos, temos de concluir que a moral é assunto complicado demais para ficar apenas nas mãos de religiosos.

É uma boa crítica ao argumento de que a religião é necessária a sociedade devido a sua imposição moral aos menos privilegiados destes atributos. A religião já perdeu essa capacidade e a sociedade não precisa dessa instituição para promover a ética e a moral.

E por que não precisa, Adriano?  O que estaria sendo usado para promover a ética e a moral se não é algum tipo de religião?
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Em 18 de janeiro de 2010, ainda não vejo motivo para postar aqui. Estou nos fóruns Ateus do Brasil, Realidade, RV.  Se a Moderação reconquistar meu respeito, eu volto.  Questão de coerência.

Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #4 Online: 08 de Dezembro de 2007, 22:13:51 »
Ótimo texto, como de costume vindo do Hélio Schwartsman.  :ok:

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Para além da riqueza de dados e novas perspectivas, "Moral Minds" oferece farta munição para destruirmos algumas "idées reçues" (idéias recebidas) renitentes. Uma falsa crença com a qual sempre me vejo às voltas quando incorro em textos ateus é a de que a religião é a fonte do comportamento moral das pessoas. Besteira. Como Hauser mostra de forma muito competente, a moralidade é tributária de um instinto que se consolidou no homem muitos milênios antes do primeiro padre celebrar a primeira missa. O que a religião fez, além da tentativa de usurpar para si a ética, foi despi-la de seus parâmetros variáveis e congelá-la no tempo, proclamando-a una e eterna. A menos que imaginemos um Deus racista, que faça questão de condenar todos os fores, de Papua-Nova Guiné, (canibais) e todos os faraós ptolomaicos (incestuosos), entre muitos outros povos e grupos que violam comandos bíblicos, temos de concluir que a moral é assunto complicado demais para ficar apenas nas mãos de religiosos.

É uma boa crítica ao argumento de que a religião é necessária a sociedade devido a sua imposição moral aos menos privilegiados destes atributos. A religião já perdeu essa capacidade e a sociedade não precisa dessa instituição para promover a ética e a moral.

E por que não precisa, Adriano?  O que estaria sendo usado para promover a ética e a moral se não é algum tipo de religião?
Isso por uma questão puramente semântica a qual insiste em qualificar sistemas filosóficos de cunho moral e ético como religião, mesmo sendo seculares. Não compartilho dessa sua preferência linguística.  :wink:
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #5 Online: 08 de Dezembro de 2007, 22:23:08 »
Isso eu sei.  Quero saber é o motivo por que você não gosta de considerar o significado das palavras que usa.

A dedução mais lógica é que seja vaidade de estar "acima dessa coisa manipulativa que é a religião", mas gostaria de ser surpreendido.
« Última modificação: 08 de Dezembro de 2007, 22:25:53 por Luis Dantas »
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Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #6 Online: 09 de Dezembro de 2007, 00:42:15 »
Caso eu fosse considerar a filosofia moral como sendo religião então o ateísmo eu também enquadraria como religião. Principalmente pelos escritos filosóficos de Ludwig Feuerbach e do Barão de Holbach, dois ateus de destaque do período iluminista e com uma grande influência ainda não tão bem avaliada no período contemporâneo.

Além disso a religião na filosofia ocidental é tratada de uma maneira diferente da tratada na cultura oriental. Penso esta ser a maior influência dos significados que atribuo a religião e a filosofia, já que você tem uma grande influência do budismo, de origem oriental.

E claro, também tem o lado da vaidade de escolher o lado certo entre ateísmo e religião, sendo o certo superior ao errado, e no meu pensamento ociental ateísmo e religião são incompatíveis. Mesmo o humanismo secular já não posso dizer que seja uma religião, a não ser por essa ótica oriental.
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #7 Online: 09 de Dezembro de 2007, 01:03:18 »
Caso eu fosse considerar a filosofia moral como sendo religião então o ateísmo eu também enquadraria como religião. Principalmente pelos escritos filosóficos de Ludwig Feuerbach e do Barão de Holbach, dois ateus de destaque do período iluminista e com uma grande influência ainda não tão bem avaliada no período contemporâneo.

Se você quer dizer que o ateísmo comporta religiões, eu concordo. 

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Além disso a religião na filosofia ocidental é tratada de uma maneira diferente da tratada na cultura oriental. Penso esta ser a maior influência dos significados que atribuo a religião e a filosofia, já que você tem uma grande influência do budismo, de origem oriental.

Exagero seu.  Religião não é algo tão diferente assim de um continente para outro.  Nem poderia ser, já que gente é gente.

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E claro, também tem o lado da vaidade de escolher o lado certo entre ateísmo e religião, sendo o certo superior ao errado, e no meu pensamento ociental ateísmo e religião são incompatíveis. Mesmo o humanismo secular já não posso dizer que seja uma religião, a não ser por essa ótica oriental.

Não é uma questão de oriental vs ocidental, Adriano, e nem de certo superior ao errado... é vaidade mesmo.
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Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #8 Online: 09 de Dezembro de 2007, 02:46:27 »
Caso eu fosse considerar a filosofia moral como sendo religião então o ateísmo eu também enquadraria como religião. Principalmente pelos escritos filosóficos de Ludwig Feuerbach e do Barão de Holbach, dois ateus de destaque do período iluminista e com uma grande influência ainda não tão bem avaliada no período contemporâneo.

Se você quer dizer que o ateísmo comporta religiões, eu concordo. 
Não. Quero dizer que o ateísmo seria considerado uma religião, como já discuti em tópicos antigos por aqui. Foi com influência na sua significação de religião. Devido a incompatibilidade de significado com o ateísmo predominante por aqui.

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Além disso a religião na filosofia ocidental é tratada de uma maneira diferente da tratada na cultura oriental. Penso esta ser a maior influência dos significados que atribuo a religião e a filosofia, já que você tem uma grande influência do budismo, de origem oriental.

Exagero seu.  Religião não é algo tão diferente assim de um continente para outro.  Nem poderia ser, já que gente é gente.

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E claro, também tem o lado da vaidade de escolher o lado certo entre ateísmo e religião, sendo o certo superior ao errado, e no meu pensamento ociental ateísmo e religião são incompatíveis. Mesmo o humanismo secular já não posso dizer que seja uma religião, a não ser por essa ótica oriental.

Não é uma questão de oriental vs ocidental, Adriano, e nem de certo superior ao errado... é vaidade mesmo.
Gente é gente? Que argumento mais tosco é esse na defesa de seus significados.  :lol:

As maiores diferenças de cultura hoje em dia estão na divisão oriental e ocidental. Na filosifia isso é muito forte, apesar de certas influências mútuas.

Pode ser que seja vaidade da minha parte, mas não vejo nada de significativo nas suas explanações para que me façam ver diferente, nem tampouco vi da sua parte alguma boa defesa em relação ao tema, nem tampouco vontade. Penso que seja vaidade da sua parte e vaidade por vaidade fico com a minha que me favoreçe mais, já que pecados capitais somente são úteis de evitar dentro das normas da doutrina católica.  :hihi:
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #9 Online: 09 de Dezembro de 2007, 11:47:56 »
Adriano, se você me considera tosco, paciência.  O mundo é imperfeito mesmo.
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rizk

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #10 Online: 09 de Dezembro de 2007, 14:33:16 »
Eu participei da pesquisa, assim como alguns colegas daqui, e fiquei super perplexa :S

E TALVEZ, jovens, não seja nem questão de vaidade nem nada. É que "religiões orientais" estão en vogue, nesse nosso pobre e desmagificado ocidente - entraram em moda como contraponto e crítica da cristandade, "eles não são cristãos mas são bons", mas hoje são parte do repertório new-age junto com terapias alternativas e misticismos diversos. Daí que todo mundo acha o máximo porque não entendeu direito.

Offline Mafalda

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #11 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:20:18 »
    Acho que pelo facto de o cristianismo ter um livro que não é a constituição de uma nação a coisa fica meio confusa, o problema que nas religiões antigas livros como o Hamurabi, o Talmud, tb funcionavam como sistema legal desses povos, hojee em dia com os códigos civis e constituições o papel moralizante mudou das mãos do clero para o Estado, mas mesmo assim acho que a moralidade depende de factores diversos, a religião quando muito é apenas um desses factores. Por exemplo, matar uma pessoa é errado porque a família que perdeu o ente sofre com a perda, então pelo sofrimento que a morte provoca nas pessoas é que faz o acto de matar errado. A religião não tem tem como provocar esse sentimento.
"quem está em todos os lugares ao mesmo tempo, não está em lugar nenhum" (Sêneca)

Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #12 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:26:17 »
Adriano, se você me considera tosco, paciência.  O mundo é imperfeito mesmo.
Não se vitimize, tosco é justificar que a religião é entendida da mesma maneira no oriente e no ocidente porque gente é gente. :biglol:
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #13 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:28:31 »
Adriano, se você me considera tosco, paciência.  O mundo é imperfeito mesmo.
Não se vitimize, tosco é justificar que a religião é entendida da mesma maneira no oriente e no ocidente porque gente é gente. :biglol:


O que te faz pensar que te dou o direito de me fazer de vítima?  Cresça e apareça.  Eu te dou o devido valor.  Não muito mais do que isso.
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Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #14 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:45:22 »
Adriano, se você me considera tosco, paciência.  O mundo é imperfeito mesmo.
Não se vitimize, tosco é justificar que a religião é entendida da mesma maneira no oriente e no ocidente porque gente é gente. :biglol:


O que te faz pensar que te dou o direito de me fazer de vítima?  Cresça e apareça.  Eu te dou o devido valor.  Não muito mais do que isso.
Você se fez de vítima sim.  :x

Fiz uma qualificação a sua justificativa para a significação igual das palavras religião e filosofia moral, e você disse que eu te considero tosco.

Além de que isso não é verdade, respeito e admiro o seu conhecimento. É um forista imporante do fórum e que fez falta durante a sua ausência.

E é para me dar mesmo o devido valor, nem mais nem menos, e sim o justo. Acho que deve agir assim comigo e com qualquer um, sem precisar anunciar isso, pois não é uma grande virtude e sim uma mínima condição de respeito.

Anunciar humildade que eu diria que não é uma boa demonstração desta.  :wink:
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #15 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:46:22 »
Sim, você é injusto comigo.  Mas eu não me rebaixo a achar que isso me vitimiza.  Você não fez por merecer tanto prestígio da minha parte, aliás nem chegou na vizinhança.
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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #16 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:47:56 »
Fiz uma qualificação a sua justificativa para a significação igual das palavras religião e filosofia moral, e você disse que eu te considero tosco.

Além de que isso não é verdade, respeito e admiro o seu conhecimento. É um forista imporante do fórum e que fez falta durante a sua ausência.

Nesse caso, tem muito o que melhorar na sua argumentação.  E, por que não dizer, desapegar de seus conceitos dogmáticos.  Enquanto não o fizer, dificilmente te levarei muito a sério, pois tento tratar as pessoas de igual para igual.
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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #17 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:53:36 »
Sim, você é injusto comigo.  Mas eu não me rebaixo a achar que isso me vitimiza.  Você não fez por merecer tanto prestígio da minha parte, aliás nem chegou na vizinhança.

Dantas, se está se comunicando comigo está me prestigiando. Isso acho importante, mas não cobro isso e nem acho que deva ser uma obrigação.

Se para ser justo com você eu tenha que concordar com suas chacotas para comigo, então eu prefico continuar sendo justo primeiro comigo e rejeitar suas qualificações pejorativas sobre mim. Isso se possível.
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Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #18 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:54:27 »
Possível, não creio que seja, mas o tempo dirá.  Quem sabe o que você pode aprender?  Ou mesmo eu?
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Offline Adriano

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #19 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:57:04 »
Fiz uma qualificação a sua justificativa para a significação igual das palavras religião e filosofia moral, e você disse que eu te considero tosco.

Além de que isso não é verdade, respeito e admiro o seu conhecimento. É um forista imporante do fórum e que fez falta durante a sua ausência.

Nesse caso, tem muito o que melhorar na sua argumentação.  E, por que não dizer, desapegar de seus conceitos dogmáticos.  Enquanto não o fizer, dificilmente te levarei muito a sério, pois tento tratar as pessoas de igual para igual.
Se não quer me levar a sério então me ignore. Não quero ser motivos de chacotas da sua parte por você não me levar a sério.

Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Luis Dantas

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #20 Online: 09 de Dezembro de 2007, 15:57:59 »
Chacotas tem um valor didático.  Te ignorando eu não te prestaria esse favor.
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Em 18 de janeiro de 2010, ainda não vejo motivo para postar aqui. Estou nos fóruns Ateus do Brasil, Realidade, RV.  Se a Moderação reconquistar meu respeito, eu volto.  Questão de coerência.

rizk

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #21 Online: 09 de Dezembro de 2007, 17:36:53 »
Chacotas tem um valor didático.  Te ignorando eu não te prestaria esse favor.
O pior é que é verdade, vide as charges políticas e o estrago que fazem.

Offline Alegra

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Re: Animais Morais - Hélio Schwartsman
« Resposta #22 Online: 13 de Dezembro de 2007, 13:57:07 »
Ótimo texto.

"(...)uma característica das regras gerais é que elas comportam exceções. E é justamente a lista de exceções à regra geral (...)que dará o caráter de cada sociedade." Virou assinatura.  :ok:


Já sinto sua falta. Vá em paz meu lindo!

Offline -Huxley-

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Animais morais
« Resposta #23 Online: 14 de Dezembro de 2007, 16:23:05 »
Animais morais

Hélio Schwartsman

Um dos livros mais instigantes que li este ano é "Moral Minds" (mentes morais), de Marc Hauser, no qual este biólogo evolucionário de Harvard apresenta um modelo bastante convincente de como desenvolvemos um senso universal do certo e do errado.

Trata-se de um tema seminal, que despertou a atenção de alguns dos maiores filósofos de todos os tempos, e está no centro dos mais acalorados debates da atualidade, constituindo o substrato de questões como religião, violência, aborto, eutanásia, liberação das drogas etc.

A tese central da obra de Hauser é a de que a faculdade moral é um instinto. A analogia é com a teoria da gramática universal de Noam Chomsky, que já comentei numa coluna mais antiga. Da mesma forma que nossos cérebros são equipados com um "software" lingüístico, que nos habilita a aprender praticamente "por osmose" o(s) idioma(s) ao(s) qual(is) somos expostos na primeira infância, nossa cachola também já vem com uma moral de fábrica. Não se trata, por certo, de um código penal, uma lista pronta e acabada de todas as ofensas possíveis e as respectivas punições, mas de um conjunto de princípios elementares, comuns a toda a humanidade, e maleáveis o bastante para comportar uma boa gama de variações culturais.

Com efeito, por maior que seja a exuberância dos comportamentos humanos narrados pelos antropólogos, não se conhece cultura que considere positivo matar o próximo, por exemplo. Assim, como regra geral, toda sociedade proíbe o homicídio. Mas uma característica das regras gerais é que elas comportam exceções. E é justamente a lista de exceções à regra geral da proibição do homicídio que dará o caráter de cada sociedade.

A maioria das culturas excusa o homicídio no contexto da legítima defesa (da própria vida ou da de terceiros). Algumas, estendem essa licença à proteção da propriedade. No velho Oeste americano, era legal e legítimo enforcar ladrões de cavalos. Um número não desprezível autoriza assassinatos em defesa da honra. Em alguns grupos, notadamente islâmicos (embora o preceito não esteja no Alcorão nem nos "hadith") espera-se que pais assassinem filhas que se mostrem infiéis a seus maridos. Variações semelhantes ocorrem em relação ao tratamento que diferentes culturas dão ao aborto, ao infanticídio, às presas de guerra etc.

Para ficarmos na analogia lingüística, da mesma maneira que idiomas apresentam características universais --como operar com sujeitos, verbos e predicados--, diferentes sistemas morais também possuem traços básicos comuns, a exemplo da proibição do homicídio, do horror ao incesto, da promoção da família etc. Mas, assim como cada língua, apesar das estruturas profundas comuns, permanece singular, também uma cultura, mesmo mantendo certos padrões universais, difere da outra.

É claro que tanto a razão como as emoções estão presentes em todas as decisões morais que tomamos. Não matamos aquele motoboy imbecil que arrancou o espelhinho de nosso carro tanto porque a maioria de nós tem uma repulsa natural ao assassinato --a emoção produzindo a moral, como defendia David Hume-- e também porque tememos as conseqüências legais de tal gesto --a razão, segundo a concepção de Immanuel Kant. O ponto que Hauser procura enfatizar, entretanto, é que a moral é um instinto, operando independentemente de razão e emoção. Aqui, ele se aproxima das idéias de John Rawls.

Esse é um campo que vem recebendo grande atenção de psicólogos evolucionistas e tem como matéria-prima os dilemas morais. É nesse ponto que os experimentos de Hauser trazem novos e fascinantes "insights". O autor propõe uma série de situações difíceis e nos convida a dar soluções. Também apresenta os resultados de suas entrevistas. São mais de 60 mil pessoas, gente de diversas etnias e com diferentes "backgrounds" que responderam ao questionário "on line" (não chega a ser uma amostra representativa do globo, mas não é um "n" desprezível). Você, leitor, também pode participar, clicando no site do teste.

Vamos ver alguns exemplos: Denise é passageira de um trem cujo maquinista desmaiou. A locomotiva desembestada vai atropelar cinco pessoas que caminham sobre a linha. Ela tem a opção de acionar um dispositivo que faz com que o comboio mude de trilhos, e, neste caso, atinja um único passante. Denise deve acionar a alavanca? Cerca de 90% dos entrevistados cederam à razão utilitária e responderam que sim. É melhor perder uma vida do que cinco.

Hauser então coloca uma variante do problema. Frank está sobre uma ponte e avista um trem desenfreado prestes a abalroar cinco alegres caminhantes. Ao lado dele está um sujeito imenso, que, se lançado sobre os trilhos, teria corpo para parar a locomotiva, salvando os cinco passantes. Frank deve atirar o gordão ponte abaixo? Aqui, a maioria (90%) responde que não, embora, em termos puramente racionais, a situação seja a mesma: sacrificar uma vida inocente em troca de cinco.

A constatação de que as respostas estão além da razão (pelo menos em sua expressão utilitarista) e da emoção é um argumento poderoso em favor do instinto, que é ainda reforçado pelo fato de representantes de grupos bastante diversos terem dado respostas muito semelhantes nestes casos.

Hauser sustenta que nosso "software" moral opera em torno de parâmetros como tipo de ação (se pessoal ou impessoal, direta ou indireta), conseqüências negativas e positivas e, principalmente, a intencionalidade. No fundo o que difere a ação de Denise da de Frank é que o sacrifício do passante solitário é uma espécie de efeito colateral (ainda que antevisto) de uma ação que visava a salvar cinco pessoas. Já atirar o gordão seria um ato intencional, um homicídio ainda que com o objetivo de obter um bem maior. Estamos aqui, se quisermos, diante da materialização empírica do imperativo categórico kantiano, que nos proíbe de usar seres humanos como meio para obter um fim (mesmo que nobre). Se assim não fosse, um médico estaria livre para capturar um sujeito saudável que passasse diante do pronto-socorro e, arrancando-lhe rins, fígado e coração para transplante, salvar a vida de quatro doentes.

Os experimentos mentais podem multiplicar-se e ficar bem mais sofisticados. E se, em vez da vida de cinco pessoas, o que estivesse em jogo fosse uma cidade inteira de 5 milhões de habitantes? Com números assim superlativos não seria lícito matar o gordão mesmo que intencionalmente?

Para além da riqueza de dados e novas perspectivas, "Moral Minds" oferece farta munição para destruirmos algumas "idées reçues" (idéias recebidas) renitentes. Uma falsa crença com a qual sempre me vejo às voltas quando incorro em textos ateus é a de que a religião é a fonte do comportamento moral das pessoas. Besteira. Como Hauser mostra de forma muito competente, a moralidade é tributária de um instinto que se consolidou no homem muitos milênios antes do primeiro padre celebrar a primeira missa. O que a religião fez, além da tentativa de usurpar para si a ética, foi despi-la de seus parâmetros variáveis e congelá-la no tempo, proclamando-a una e eterna. A menos que imaginemos um Deus racista, que faça questão de condenar todos os fores, de Papua-Nova Guiné, (canibais) e todos os faraós ptolomaicos (incestuosos), entre muitos outros povos e grupos que violam comandos bíblicos, temos de concluir que a moral é assunto complicado demais para ficar apenas nas mãos de religiosos.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/helioschwartsman/ult510u351566.shtml

COMENTÁRIOS:

Mais detalhes desse assunto ver "Deus, um delírio" de Richard Dawkins (capítulo 6).

Offline Südenbauer

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Re: Animais morais
« Resposta #24 Online: 14 de Dezembro de 2007, 17:25:10 »

 

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