Retirado do blog da soninha, vereadora de são paulo pelo PPS
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O nome do jogo é retaliaçãoPor onde eu começo?
Por 2004.
Eu já tinha sido eleita, mas ainda não tinha tomado posse.
Vim à Câmara conversar com um vereador do PT, que começou a me contar o que eu encontraria pela frente.
Ele se divertia com as histórias, como se fossem de um passado distante, já tornado folclórico depois de tanto tempo. Mas falava do presente.
Disse, entre outras coisas: “Sabe Fulano? Disse que ia votar em Sicrano para presidente e, no dia da eleição, votou em Beltrano. Sicrano perdeu. E eles aqui não perdoam duas caras, não perdoam traição. Tem que ter palavra. Sabe o que aconteceu? Fulano virou um pária na Casa. Não aprova nem nome de rua”.
Fiquei pasma.
Como assim, “um pária na Casa”? Quem é “a Casa”? Os vereadores todos concordaram com isso, isolaram o cara, não deixaram que ele aprovasse mais nada?
Corta para 2007.
Como eu contei alguns dias atrás, houve eleição para a Mesa Diretora no sábado e apenas uma Chapa foi inscrita. Não era a minha Chapa. Entre todos os candidatos, eu votaria em apenas um deles, mesmo que houvesse outra pessoa disputando o cargo.
Não parece nada de mais, parece? Vereadores são eleitos para, entre várias outras coisas, votar. É a essência do Parlamento -- e da democracia. Surgem as divergências, há uma votação, a maioria vence. Você nunca presumiria que é proibido votar diferentemente da maioria.
Não na Câmara Municipal...
A única pessoa presente que não votou no presidente re-eleito fui eu; outros vereadores não vieram. Eu não quis fazer assim porque em geral prefiro vir e registrar minha opinião, mesmo que seja mais incômodo.
Assim que terminou a votação, duas rádios presentes (Jovem Pan e Eldorado) entrevistaram o presidente e perguntaram o que ele achava da minha abstenção. Respondeu: “Eu desconheço a vereadora Soninha”. O repórter da Pan questionou: “Como desconhece, o sr. é o presidente, ela é representante eleita...”. “Ela é pouco atuante, ela mudou de partido...”.
Podia ser só um momento de irritação e destempero, mas não era.
Na terça-feira, havia Sessão Extraordinária. Na pauta, projetos de vereadores em torno dos quais havia acordo. É assim que funciona: de tempos em tempos, as lideranças das bancadas acertam entre si que serão votados PLs de todos os vereadores. Cada um escolhe um projeto seu, eles entram na pauta e a votação é simbólica - “Os vereadores favoráveis permaneçam como estão... Aprovado”.
Se houver alguma proposta muito, mas muito polêmica, as lideranças não deixam que vá a votos – avisam antes o vereador e pedem para que ele escolha outro projeto. Porque, tendo acordo, o projeto será aprovado, entende? Os vereadores que quiserem podem registrar seu voto contrário, mas é sabido que a maioria será a favor.
Pois muito bem: havia um acordo para que cada vereador aprovasse um PL antes do fim do ano (“Porque ano que vem, sabe como é...”, admitem – é ano de eleição e o ritmo dos trabalhos cai muito). Escolhi, na minha cota, um projeto apresentado na Comissão de Legislação Participativa pela ONG Voto Consciente. O projeto determina que todos os órgãos da administração municipal publiquem, na internet, a lista de nomes de seus servidores, concursados ou de livre escolha. Uma informação que já é pública – toda nomeação sai no Diário Oficial – mas que seria organizada de modo a facilitar o acompanhamento e controle pela população.
O projeto era polêmico? Bom, em princípio não – ninguém me pediu para retirá-lo da pauta e escolher outro.
Assim, na terça-feira, ele foi a votos. Mas o vereador Agnaldo Timóteo, do PP, pediu votação nominal. Alguns vereadores não votaram, o Centrão se absteve, 11 vereadores (entre PT e PSDB) votaram a favor. Sem ter maioria absoluta contra ou a favor dele, o projeto ficou pendente.
Quem conhece a Casa, sabe: aí tem. NUNCA se pede votação nominal em projeto de vereador, porque “tem acordo”. Tanto é que, muitas vezes, votam-se dezenas de projetos com o plenário quase vazio, já que a votação é simbólica.
Eu mesma não estava – e fiquei perplexa, pensando o que fazer. Tentando entender exatamente qual era o problema, qual era o recado. Logo imaginei que era represália por não ter votado na Chapa da Mesa, mas como poderia provar? E que adiantaria?
Percebendo o clima da Casa, o líder do PSDB pediu para adiar todos os seus projetos. (O PSDB, exceto pelo ver. Gilson Cardoso, também não votou na Chapa). Se os projetos fossem a votos ali, possivelmente teriam o mesmo tratamento.
Tentei não fazer nada de cabeça quente. Logo depois a sessão foi suspensa. Encontrei outros vereadores fora do plenário, que contaram conversas bobas de provocação – como o seguinte diálogo, cheio de sarcasmo: “Presidente, o vereador Carlos votou no senhor?”. “Não, ele não participa de acordo. E eu nem queria o voto dele. Pra que?”. A conversa aconteceu à mesa da confraternização de Natal, com o vereador Carlos sentado exatamente na frente deles. Ou seja, a idéia era mesmo infernizar.
Qual seria a extensão disso? Será que era só uma demonstração de força, um modo de dizer: “Se a gente não quiser, você não aprova mais nada aqui”? (Afinal, o presidente também disse às rádios: “Quem manda nesta Casa é o Centrão”). Alguns vereadores acharam que era “só” isso mesmo, e asseguraram que, no dia seguinte, os projetos voltariam normalmente à pauta e seriam votados conforme o acordado anteriormente.
Eu não botei muita fé, mas não quis declarar guerra sem ter certeza de que ela tinha sido declarada. Se fosse só um tiro de advertência, deixa pra lá... Foram votadas dezenas de projetos e eu podia ter obstruído todos eles, mas deixei rolar. Esperei o dia seguinte.
Ele veio, e os projetos estavam todos pautados, bonitinhos. O meu era o último.
Adivinhem.
Os do PSDB foram aprovados “nos conformes”, o do “vereador Carlos” (que é o Neder, do PT), também. Chegou o meu e... Agnaldo Timóteo pediu votação nominal, 18 vereadores se abstiveram, 17 foram favoráveis (do PT, do PSDB, do PPS e do PDT) e o projeto continuou pendente.
E aí ficou evidente que era guerra mesmo, e só sobrei eu contra “rapa”
Continuou a sessão. Na pauta, um substitutivo de um projeto assinado por mim e pelo vereador Bezerra (PSDB), na “cota” dele. É o PL que cria o Conselho Municipal de Juventude). Zum-zum-zum no plenário, o presidente avisa, bem alto: “Não vai passar”. Procurei a liderança do PSDB e pedi para retirarem minha assinatura do projeto. Nunca fiz a menor questão de assinatura... Importante era o projeto ser aprovado.
Na hora de votar, o presidente ainda perguntou: “De quem é o substitutivo”? “È do vereador Carlos Bezerra”. Aí foi a votos, em votação simbólica, e passou.
Havia repórteres na Casa, que me procuraram para falar sobre o fato de meu projeto ser o único não aprovado. Pensei que talvez fosse inútil falar sobre a retaliação, porque ninguém confirmaria. Mas me enganei. Antes de falar comigo, estiveram com o presidente, que não se fez de rogado: “É boicote, sim. Ela não entende como a Casa funciona, não participa de acordo...”
Tudo isso apenas porque cometi a “loucura” de não votar na Chapa Única? Incrível. Acordo, então, é compulsório... Você não pode discordar??
Para terminar a noite, fomos ver quais de nossas emendas ao orçamento haviam sido incluídas no texto final. Algumas entraram, outras não.
Tentando explicar como funciona: os vereadores podem fazer modificações – emendas – ao orçamento, dizendo “vou tirar 100 mil reais daqui, porque estão sobrando, e destinar 50 mil para um projeto de fomento ao circo e 50 mil para a reforma de um Centro de Atendimento Psico-Social que está em estado precário”. Não vai dar tempo de explicar tudo agora porque preciso sair, mas eliminaram algumas emendas minhas, usando uma alegação absurda. Juro que amanhã eu concluo.
O fim de ano promete. Ho, ho, ho... "
http://gabinetesoninha.zip.net/arch2007-12-16_2007-12-22.html#2007_12-19_22_47_11-3368664-0