Depois que o pessoal do manhattan connection elogiou o filme arrisquei-me a assisti-lo. Ele é, por um lado, excelente, por outro, horrível. O lado excelente é a descrição da vida cotidiana da guerra do Irã contra o Iraque e do pós-guerra. O lado horrível é a descrição da vida pessoal da personagem principal. Na hora em que ela sofre de dor de corno torci para que ela se matasse e o filme acabasse. É das personagens mais aborrecidas que já vi rivalizando com a Ana Karenina. Na Europa nossa heroína preocupa-se no máximo em gastar sua existência em tédio e namoricos e o filme chega a fazer uma leve crítica ao consumismo - e isso é tudo o que tem a dizer do Ocidente. Então ela volta e passa a sofrer com a restrição aos namoricos e falta de lugar para fazer festas. Quanto mais frívolo mais eu gosto, porque ingenuamente achei que tal como Ana Karenina o autor nos brindasse com a morte de personagem tão pífia. Mas ela sobrevive e volta para a Europa. Mas aí o filme acaba.
Fiquei satisfeito de saber que a culpa da situação atual do Irã é da Inglaterra que estimulou o rei a fazer um monarquia ao invés de uma república. Engraçado, porque os EUA fazem de tudo para instalar uma democracia no Iraque a revelia dos muçulmanos que armam atentados em que matam dissidentes para estabelecer uma teocracia. Enfim, o islã interfere em quase todos os aspectos da sociedade iraniana, mas o filme dá aos problemas uma conotação apenas política. O Irã foi destruído pela política imperialista da Inglaterra, por reis egocêntricos e políticos inescrupulosos, jamais por sua religião caduca, destrutiva e violenta. Peculiaríssimo, porque a protagonista, mulher, intelectual, não tece uma crítica sequer à religião quanto ao seu conteúdo, apenas aos seus aspectos mais superficiais, como vestuário e machismo. Os personagens não são religiosos, portanto não é a religião a causa dos problemas do Irã. Há um distanciamento premeditado, quase um laicismo.
Os melhores trechos do filme acontecem quando mostra o autoritarismo sobrepujando a individualidade das pessoas, oprimindo-as. E toda denuncia ao autoritarismo é um libelo à liberdade. A opressão está sempre presente, mas não sei se foi muito bem identificada.