Apesar da reportagem estar bem relacionada à ciência, preferi colocar aqui por causa da abordagem voltada ao viés econômico.
Associada da GM lança etanol de lixo e guru do DNA cria micróbio que come CO² e expele metano
Biotecnologia está criando os combustíveis do futuro, que usam até excremento humano como matéria-prima
Nada mais preocupante que estes tempos de petróleo a mais de US$ 110 o barril, instabilidade política em vários países petroleiros, dólar em queda, e quanto mais cai mais sobe o preço da energia no mundo. O terror que vai tomando a hipótese de aquecimento da Terra pela descarga de poluentes na atmosfera. A crise bancária nos EUA, a inflação global dando as caras. Parecem sinais de praga bíblica.
Isso é o que a maioria lê, escuta e vê. Poucos sabem, porém, que essa nova idade das trevas, que engorda a conta de escritores de ficção e dos estúdios de Hollywood, assim como provoca arrepios de satisfação nos inimigos do livre mercado, está longe de acontecer.
Não por que se vai racionar o uso de petróleo, o álcool de cana será o combustível verde do futuro, a China tomará o lugar dos EUA e o capitalismo renascerá prestando tributo ao dirigismo estatal e à ditadura, conforme o modelo chinês. Até pode dar o pior. Mas não pelo que já se conhece das novas tecnologias de energia limpa tão e até superiores aos combustíveis fósseis, além de baratas e muito mais democráticas. Que tal o lixo urbano movendo carros? É por aí.
Primeiro a tecnologia: ela usa como matéria-prima qualquer tipo de resíduo orgânico - de pneu velho a lixo urbano, capim e bagaço vegetal, de grão a excrementos humanos e de gado. Será o fim dos nababos do petróleo do Oriente Médio, trocados por cocô. Sério!
Porcarias assim se encontram em todo lugar. A chave do processo é a transformação do lixo orgânico em síntese de gás, syngas, como é chamado pelos seus desenvolvedores. O gás é bombeado a um reator preenchido com bactéria sintética, isto é, produzida e patenteada, que o devora e expele uma mistura de álcool e água. Na etapa final se separa a água, limpa como da fonte, e se tem o etanol com 99,7% de pureza. Coisa de Júlio Verne? Não, de gente pé no chão.
De investidores em tecnologia, o outro lado de Wall Street – até fisicamente, pois é uma gente mais comum na Califórnia e em locais ensolarados dos EUA -, associados a cientistas, e convênios com as universidades e laboratórios oficiais, o único elo com o governo americano, já que as pesquisas são em boa parte privadas.
Álcool por R$ 0,46
O projeto já entrou em fase piloto, provando o custo de conversão de qualquer resíduo orgânico em etanol celulósico por menos de US$ 1 o galão, R$ 0,46 o litro.
Testado no Argonne National Laboratory da Universidade de Chicago, ligado ao Departamento de Energia dos EUA, o etanol de resíduos produziu 84% menos gás carbônico que os derivados de petróleo e gerou 7,7 vezes mais energia que a usada para produzi-lo, contra o mixo múltiplo de 1,3 do álcool de milho, o equivalente americano ao extraído da cana-de-açúcar no Brasil.
Para derrubar a OPEP
Os usineiros brasileiros que se cuidem, e tratem de apressar as pesquisas para a produção de etanol celulósico derivado da cana. O risco é grande de serem varridos do mercado. O engenho dos EUA é da empresa Coskata Energy, baseada perto de Chicago, à qual já se associou a General Motors, que entrou com tudo na tecnologia flex para tentar recuperar seu antigo esplendor tomado pela Toyota.
O chairman da GM, Rick Wagoner, que ascendeu na montadora depois que presidiu a filial brasileira, diz que a Caskade desenvolveu uma tecnologia de fato “breakthrough”, inovadora, capaz de cortar a dependência de petróleo dos EUA. As implicações são imensas.
Gás gerado por vida
A Coskata começa a abastecer a GM no fim do ano com uma planta piloto e prevê a primeira usina comercial para 2011, podendo ser antes, com 375 milhões de litros/ano, e mais dez na seqüência.
Se fosse uma iniciativa isolada, poderia se duvidar do otimismo. Mas começou uma corrida em que o ganhador leva tudo. Em disputa, a tecnologia “matadora” do petróleo e do gás natural. É o que propõe o geneticista Craig Venter, que se notabilizou pelo seqüenciamento do genoma humano. Sua empresa Synthetic Genomics, com investimento da British Petroleum, criou literalmente vida para fazer metano.
Venter criou um processo semelhante ao da Coskata: micróbio que consome gás carbônico (CO2) e expele combustível. Etanol num caso, gás natural no outro. Venter deu 18 meses para o combustível estar lançado. Não revelou o custo, mas depois que a Coskata anunciou o seu surgiu o benchmarking de preço, e ele será daí para menos, sem relação com o preço do petróleo. Uma revolução está começando.
As implicações do que virão são previsíveis. O petróleo não será abandonado, mas perderá a majestade. Países que dependem dele como o ar que se respira, tipo Arábia Saudita e Venezuela, ficarão sem rumo. A tentacular estatal russa Gazprom, que tem sido usada pelo governo de Vladimir Putin para vergar a Europa de joelho, parece ser o que mira a BP ao bancar o projeto de Venter. É jogo bruto.
A questão não é mais se as tecnologias novas virão. Mas quando e quais vencerão. É nisso que líderes empresariais como Andy Grove, fundador da Intel, e Jeff Immelt, chefão da GE, botam fichas para tirar os EUA da crise e dar um nó nos competidores.
É para matutar porque tais visionários vêem a China como parceira e não um rival a derrubar. O custo da energia para países pobres será marginal, a poluição diminuirá. E o Brasil neste fantástico mundo novo? Melhor saber isso do que as histórias de dossiê disso e daquilo.
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