Autor Tópico: Artigo de Einstein sobre os fundamentos da mecânica quântica  (Lida 732 vezes)

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Offline Eu

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Artigo de Einstein sobre os fundamentos da mecânica quântica
« Online: 29 de Abril de 2008, 19:06:36 »
IV O artigo de A. Einstein: Considerações elementares sobre a interpretação dos fundamentos da mecânica quântica

Como característica principal da atual situação da mecânica quântica, considero a seguinte: quanto ao formalismo da teoria, não há nenhuma dúvida, mas quanto à sua interpretação, o mesmo não pode ser dito. Qual a relação que a função y possui com as coisas concretas, isto é, com as propriedades individuais de um único sistema? Ou melhor, o que afirma a função y com respeito ao ''estado real" de um sistema individual?

Antes que continuemos, pode-se duvidar se esta questão possui em geral algum sentido. De fato, pode-se aceitar o seguinte ponto de vista: ''real" é apenas aquilo que resulta da própria observação, e não algo existindo objetivamente no espaço e no tempo e independente do ato de observação. Se se aceita este ponto de vista claramente positivista, fica evidente que não é necessário fazer nenhuma consideração de como compreender o ''estado real" de um sistema no domínio da teoria quântica. Qualquer esforço parece, pois, ser como uma luta de esgrima contra fantasma.

Esta concepção nitidamente positivista tem, no entanto, produzido uma fraqueza irreparável: geralmente, ela considera sem sentido todas as proposições verbalmente expressas. Até que ponto é correto tomar como provida de sentido, ou o mesmo, como verdadeira ou falsa, uma descrição de um único resultado de observação? Tal descrição não pode estar baseada em mentiras ou em vivências que experimentamos em sonhos ou em alucinações? A distinção entre estar acordado e dormindo possui, em geral, um sentido objetivo? De resto, permanecem como ''reais" apenas as experiências emotivas de um Eu sem qualquer possibilidade de asseverar algo sobre elas. Segundo uma análise puramente positivista, os conceitos empregados nas assertivas mostram-se, sem exceção, como desprovidos de sentido.

Na verdade, os conceitos e os sistemas conceituais independentemente empregados nas nossas proposições são criações humanas, instrumentos auto-criadores, cuja legitimação e valor se baseiam exclusivamente no fato de poderem ordenar ''com proveito" as experiências vivenciais (comprovação= Bewährung). Dito de outra forma, estes instrumentos são legítimos na medida em que eles são capazes de ''explicar" as experiências de vida 1.

A legitimidade dos conceitos e dos sistemas conceituais tem de ser avaliada apenas a partir do ponto de vista da sua comprovação. Isto também vale para os conceitos de ''realidade física", ou seja, para o conceito de ''estado real de um sistema". A priori não existe nenhuma legitimação para postulá-los ou proibí-los como necessários ao pensamento. O que decide é apenas a comprovação. Por trás destes símbolos vocabulares, no desenvolvimento do pensamento físico até o surgimento da teoria quântica, existe um programa que tem se tornado normativo: tudo deve ser reduzido a objetos conceituais, existindo no espaço-tempo, e a relações baseadas em leis que devem ser válidas para estes objetos. Nesta descrição, nada aparece relacionado com um conhecimento empírico referente a estes objetos. Atribui-se à Lua uma posição (relativa a um sistema de coordenadas utilizado) em um determinado instante, independente de as percepções desta posição existirem ou não. Compreende-se este tipo de descrição quando se fala da descrição física de um ''mundo externo real" ou de seus constituintes básicos (pontos materiais, campo etc.).

A legitimação deste programa não foi seriamente posta em dúvida pelos físicos, pois pareceu que tudo que surgia em tal descrição, em princípio, poder-se-ia verificar empiricamente para algum caso particular. Que isto não passa de uma ilusão, foi primeiro demonstrado por Heisenberg de um modo convincente para os físicos no tocante aos fenômenos quânticos.

Desde então, o conceito de ''realidade física" tornou-se problemático. Surgiu, assim, a questão: no fundo, o que a física teórica (por meio da mecânica quântica) procura descrever? e qual sua relação com as leis físicas já estabelecidas? Esta questão foi respondida de modos bem diversos.

A fim de chegar a uma resposta, levemos em conta o que a mecânica quântica tem a dizer sobre sistemas macroscópicos, i.é, sobre objetos que temos a sensação de serem ''diretamente perceptíveis". De fato, sabemos que tais objetos e as leis que os governam são representados pela física clássica com uma certeza quase apodídica. Não duvidamos que exista para tais objetos em cada instante uma configuração espacial (posição) como também uma velocidade (ou impulso), isto é, uma situação real. Isto decorre, como aproximação, da estrutura da mecânica quântica.

Perguntamos: a mecânica quântica implica, por aproximação, a descrição real fornecida pela mecânica clássica para corpos macroscópicos? Ou, caso esta pergunta não possa ser respondida com um simples ''sim", em que sentido ela o faz? Queremos abordar este problema com base em um exemplo concreto.

 

IV.1 O exemplo

O sistema consiste de uma esfera com aproximadamente 1mm de diâmetro que se move entre duas paredes paralelas (distantes mais ou menos 1m uma da outra) ao longo do eixo x de um sistema de coordenadas. Os choques são idealmente elásticos. Neste sistema macroscópico idealizado, imaginamos que as paredes possam ser substituídas por uma energia potencial bem definida em termos apenas das coordenadas dos pontos materiais que constituem a esfera. Supõe-se também que os processos de reflexão não produzam nenhum acoplamento entre a coordenada x do centro de gravidade da esfera e suas coordenadas ''internas" (inclusive as coordenadas de ângulo). Assim, para os nossos propósitos a posição da esfera (abstraindo-se de seu raio) pode ser descrita apenas por x.

Segundo a mecânica quântica, trata-se de um processo com energia fixa. A onda de de Broglie (a função y) é, pois, harmônica no tempo. y é diferente de zero apenas entre x = -/2 e x = +/2. Nos pontos extremos do trajeto, o caráter contínuo é obtido ao se exigir que a função y seja nula fora da região permitida para o movimento da esfera e nos pontos x = ±/2.

A função y é, portanto, uma onda estacionária que pode ser representada, entre x = -/2 e x = +/2, pela superposição de duas ondas harmônicas que se propagam em direções opostas:



ou



Da Eq.(25), vê-se que o fator A tem de ser escolhido como sendo igual em ambos os membros de (24) para que as condições de contorno possam ser satisfeitas nos pontos x = ±/2. Sem perda de generalidade, A pode ser considerado real. Segundo a equação de Schrödinger, b é determinado completamente pela massa m. Ao fator A nada é acrescido ao que já é conhecido.

Para que seja frutífera a comparação do exemplo acima com o correspondente problema clássico, temos ainda de estabelecer que o comprimento de onda de de Broglie 2p/b seja pequeno em comparação com .

Começamos com o significado da função y baseando-nos na interpretação usual, dada por Born, em termos de probabilidade:



Esta é a probabilidade para que a coordenada x do centro de gravidade da esfera esteja localizada em um dado intervalo Dx. Ela é - abstraindo-se de uma ''estrutura fina" de caráter ondulatório [nodos, nos quais W = 0] de cuja realidade física não se duvida - simplesmente cte.Dx.

E quanto à probabilidade dos valores do impulso (ou velocidade) da esfera? Estas probabilidades são obtidas pela expansão de Fourier de y. Se (24) fosse válida de -¥ até +¥, então, (24) já seria a expansão de Fourier desejada. Haveria, portanto, dois valores para o impulso igualmente bem determinados em direções opostas e com a mesma probabilidade. Mas, pelo fato de as duas ondas serem confinadas, elas fornecem para cada membro uma transformada de Fourier contínua com domínio espectral tão estreito quanto maior o número de comprimentos de onda de Broglie contidos na região . Isto segue do fato de serem possíveis apenas dois valores bem definidos do impulso em direções opostas. Estes valores coincidem com os do caso clássico, ambos com igual probabilidade.

Portanto, estes dois resultados estatísticos são, afora os pequenos desvios ocasionados pela estrutura quântica, os mesmos válidos para um ''ensemble no tempo" de sistemas no caso da teoria clássica. Isto acontece desde que a teoria seja inteiramente satisfatória.

Mas, agora levantemos a pergunta: pode esta teoria fornecer uma descrição realista de um caso individual? Esta pergunta terá de ser respondida com um ''não". Para fundamentar esta decisão, é essencial que o sistema individual seja um sistema ''macroscópico", pois, neste caso estamos convictos de que ele esteja em todo instante em um ''estado real" que é aproximada e corretamente descrito pela mecânica clássica. O sistema macroscópico, do tipo considerado por nós, tem assim em todo instante uma determinada posição (a coordenada de seu centro de gravidade) - ou pelo menos o valor médio sobre um curto intervalo de tempo - e um determinado impulso (a menos de um sinal). Nenhuma destas duas características resulta da função y (24). Com a ajuda da interpretação de Born, a partir de y deduzem-se apenas características que se relacionam com um ensemble estatístico de sistemas do tipo em consideração.

O exemplo, acima estudado, mostra que nem toda função y, solução da equação de Schrödinger, corresponde de modo aproximado à uma descrição realista no sentido da mecânica clássica. Isto fica explícito quando se leva em conta uma função y que se origina da superposição de duas soluções do tipo (24), cujas freqüências (ou energias) são bem diferentes uma da outra. A uma tal superposição, portanto, não corresponde nenhum sistema real da mecânica clássica (mas sim, um ensemble estatístico de tais sistemas reais no sentido da interpretação de Born).

À guisa de generalização, concluímos: a mecânica quântica descreve ensembles de sistemas, e não um sistema individual. A descrição por meio da função y constitui, neste sentido, uma descrição incompleta de um único sistema; não é portanto uma descrição realista do estado do sistema.

Observação: poder-se-ia levantar a seguinte objeção à nossa conclusão. O caso considerado por nós, em que a função y possui uma freqüência extremamente bem definida, é um caso extremo para o qual, talvez, a semelhança exigida com o problema clássico pudesse ser desconsiderada de modo excepcional. Se se admite um domínio finito e também pequeno para a freqüência temporal, então pode-se obter, por meio da escolha aproximada das amplitudes e das fases das funções y superpostas, que a função y resultante possui aproximadamente posição e impulso bem definidos. Segundo este ponto de vista, não se poderia procurar restringir àquelas funções y que são apropriadas e assim obter funções y que pudessem ser compreendidas como representação de um único sistema?

Uma tal possibilidade tem de ser posta de lado com base no fato de não se manter com o passar do tempo uma tal situação com posição bem definida.

Por causa de a equação de Schrödinger e de sua interpretação, dada por Born, não levarem a uma descrição realista dos estados de um único sistema, estimula-se naturalmente a procura por uma teoria desprovida de tal limitação.

No momento, há duas tendências nesta direção; ambas se fundamentam na equação de Schrödinger, no entanto, uma leva em consideração a interpretação de Born e a outra não. A primeira remonta à idéia de de Broglie, posteriormente retomada com muita perspicácia por Bohm.

Tal como na investigação original de Schrödinger, onde a equação de onda é deduzida usando analogia com a mecânica clássica (a linearização da equação de Jacobi da mecânica clássica), assim deve também estar fundamentada, por analogia, a equação de movimento de um sistema individual quantizado, descrito por uma solução da equação de Schrödinger. O procedimento é o seguinte: coloca-se y na forma



da qual resulta que R e S são funções reais em termos das coordenadas. A derivada de S com respeito à posição, que dá o impulso ou a velocidade do sistema, deve implicar a evolução temporal do sistema individual.

Uma olhada na Eq.(25) mostra que em nosso caso ¶S/¶x, e também a velocidade, se anulam. De acordo com o nosso exemplo, este resultado é muito importante para levantar uma objeção, já apontada por Pauli há cerca de 25 anos, a esta teoria [de de Broglie-Bohm]. O fato de ser nula a velocidade vai de encontro com a exigência bem estabelecida de que no caso de sistemas macroscópicos o movimento deve coincidir aproximadamente com o movimento descrito pela mecânica clássica.

A segunda tentativa de fundamentar a equação de Schrödinger, como uma descrição realista de um único sistema, remonta aos primeiros estudos realizados por Schrödinger, cuja idéia é resumidamente a seguinte: a função y representa a realidade e não necessita da interpretação de Born. O quadro (Gebilde) pictórico que se faz dos átomos, sobre o qual o campo y devia dizer algo, simplesmente não existe, pelo menos não como um quadro localizado. No caso do nosso sistema macroscópico, isto significa: este sistema, de fato, não existe como tal; em todas as situações, não existe nem de modo aproximado algo como sua posição em determinado tempo. Aqui também é violada, portanto, a condição de que a descrição quântica do movimento de um sistema macroscópico tem de coincidir por aproximação (angenähert) à correspondente descrição fornecida pela mecânica clássica.

O que resulta da nossa investigação é o seguinte: a única interpretação até agora aceitável da equação de Schrödinger é aquela dada pela interpretação estatística de Born. Contudo, esta interpretação não fornece nenhuma descrição realista de um único sistema; ao contrário, ela apenas versa sobre asserções estatísticas de ensembles de sistemas.

Na minha opinião, por princípio, não é satisfatório sustentar uma tal concepção da Física, visto que a descrição objetiva dos sistemas macroscópicos individuais (''descrição realista do estado") não pode ser desprezada sem que a compreensão física do mundo se dissolva de certa forma em um nevoeiro. Finalmente, a concepção inevitável é que a Física tem de fomentar uma descrição realista de um único sistema. A natureza como um todo pode ser pensada apenas como sistema individual (existindo uma vez só, sem necessidade de repetição) e não como um ''ensemble de sistemas".

 

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-47442003000200006&lng=in&nrm=iso&tlng=in



Offline Iconoclasta SP

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Re: Artigo de Einstein sobre os fundamentos da mecânica quântica
« Resposta #1 Online: 30 de Abril de 2008, 13:23:00 »
Esse morreu batendo o pé...

Offline SnowRaptor

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Re: Artigo de Einstein sobre os fundamentos da mecânica quântica
« Resposta #2 Online: 30 de Abril de 2008, 23:54:16 »
Esse morreu batendo o pé...

Não mais que o Planck:
Citação de: [url=http://en.wikipedia.org/wiki/Planck#Quantum_mechanics]Max Planck[/url]
A new scientific truth does not triumph by convincing its opponents and making them see the light, but rather because its opponents eventually die, and a new generation grows up that is familiar with it.
Elton Carvalho

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“Na fase inicial do processo [...] o cientista trabalha através da
imaginação, assim como o artista. Somente depois, quando testes
críticos e experimentação entram em jogo, é que a ciência diverge da
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-- François Jacob, 1997

 

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