Essa questão da Lei de Say é interessante. A maior parte da teoria clássica (ou "liberal") se assenta tendo a Lei de Say como pressuposto firme, enquanto a maior parte do keynesianismo se baseia na negação da validade geral dessa lei.
A Lei de Say afirma que "a oferta cria sua própria demanda", ou seja, quando uma determinada quantidade de produtos ou serviços é produzida, todos os fatores envolvidos na produção (em última instância os trabalhadores e empresários) são remunerados, ou seja, recebem uma determinada renda. A soma total dessa renda será igual ao valor total dos bens e serviços produzidos, ou seja, as pessoas envolvidas na produção terão uma renda total que permite comprar toda essa produção. Olhando o mercado como um todo, concluimos que nunca haverá superprodução ou sub-produção, pois a quantidade de bens disponíveis será sempre igual à renda total recebida por todos os fatores de produção envolvidos na produção dos mesmos.
Essa é a Lei de Say. Keynes a contesta, argumentando do seguinte modo:
Da renda recebida pelos fatores de produção (trabalhadores e empresários, em última instância), uma parte será usada para comprar os produtos e serviços que foram produzidos no mercado, ou seja, para consumo. Uma outra parte será poupada. Daí, uma parte dos bens e serviços produzidos terá que necessariamente não ser bens de consumo, mas investimentos; caso contrário, uma parte dos bens e serviços não será comprada e portanto sua produção terá que ser diminuída, acarretando desemprego dos fatores que estiveram envolvidos na produção dessa parte.
Normalmente, a quantidade de investimentos feitos tende a cobrir esse hiato que fica entre o total de bens produzidos e o total consumido, ou seja, uma parte dos fatores de produção não produz bens de consumo,mas de capital.
Quando a renda é baixa, ela tende a ser gasta toda em bens de consumo. À medida que a renda vai aumentando, uma parte da mesma vai progressivamente sendo destinada à poupança, e assim sucessivamente. Acompanhando esse incremento na poupança, há incremento nos investimentos. Porém, à partir de um certo ponto, a quantidade de poupança e capital disponíveis é tão grande que a "eficiência marginal do capital" (grosso modo, a perspectiva de lucratividade dos investimentos) vai diminuindo, fazendo com que a quantidade de investimentos não aumente o suficiente para cobrir o hiato provocado pela crescente poupança. Nesse momento, ocorre desequilíbrio entre oferta e demanda, ou seja,a Lei de Say não atua.
A consequência disso, segundo Keynes, é que parte da produção não será comprada, fazendo com que a produção seja diminuída, desempregando-se fatores de produção. Esse desemprego tende a diminuir mais ainda a demanda efetiva, criando um círculo vicioso. É a recessão.
Keynes considera a recessão algo inevitável, e ele defende que o Estado pode atuar para retardar a sua chegada, ou para acelerar a recuperação. A receita básica é cobrir o máximo possível o hiato entre produção e consumo com investimentos estatais. Ele também diz que qualquer tipo de gasto em bens de consumo, mesmo suntuários (bens de luxo, obras faraônicas, etc) tende a retardar a chegada da recessão, por manter os fatores de produção "ocupados" funcionando, mantendo os bens e "valores" em circulação, sem ociosidade.