BNDES quer prevenir as seqüelas decorrentes do desemprego ao fim das obras estruturantesAngra 3 vai empregar 9 mil pessoas na obra e, depois de pronta, apenas 400. O problema se repete no paísAs medidas da nova política industrial ainda não foram digeridas, mas ao BNDES, principal gestor dos programas, já ocorre outro tipo de preocupação, além de desonerações fiscais e financiamentos para direcionar os investimentos empresariais: a questão social gerada no curso dos projetos estruturantes.
Sem o planejamento de um tipo historicamente desprezado pelos poderes públicos vai-se num estalo da pujança do surto de renda criada a graves problemas sociais.
Tais projetos, sobretudo de infra-estrutura, atraem enormes levas de mão-de-obra, normalmente não qualificada, para a fase de obras. Uma vez concluída a construção, os projetos demandam poucos e bons empregos.
O que ficará para traz é um passivo social muito difícil de resolver pelos estados e municípios, como favelas, subemprego e demandas por saúde, educação, moradia e segurança que a estrutura de serviços públicos da região não está preparada para atender.
Pegue-se o caso da usina de Angra 3, cuja licença ambiental está prevista para os próximos dois meses, e o início de construção, no segundo semestre. Durante a fase de construção a obra vai empregar 9 mil trabalhadores. Depois de concluída, apenas 400.
Sem planejar a ocupação posterior dessa massa de mão-de-obra praticamente apta apenas para a construção pesada, toda a região de Angra dos Reis, de vocação iminentemente turística, poderá entrar em colapso.
O problema se repete em todo o país. As duas novas hidrelétricas no Rio Madeira, Santo Antonio e Jirau, segundo projeção do BNDES, deverão atrair uma mão-de-obra de 20 mil pessoas para Rondônia, o que irá a 100 mil, incluindo os seus dependentes.
Ambas começam a operar em 2012 e 2013, também gerando empregos permanentes muito abaixo do contingente empregado para construí-las, com o agravante de que Rondônia não tem estrutura para absorver a mão-de-obra que se tornará ociosa, boa parte da qual tende a se fixar na região.
Futuro sem o socialA preocupação com essa agenda não é nova, mas nunca foi assumida por ninguém, já que da obra todos os políticos se beneficiam: quem a anuncia e quem a inaugura. O futuro só entra nos projetos como um valor econômico, jamais social.
Supõe-se que a mobilidade do trabalho seja perfeita, o que é falso, como atestam as ocupações degradadas no entorno de quase todos os pólos industriais surgidos no período de industrialização acelerada nos anos 70. Antes que o dano se torne irreversível é preciso planejar, e é isso o que se propõe a fazer o presidente do BNDES, Luciano Coutinho.
Suape como modeloNa última sexta-feira, Coutinho falou da nova agenda, que traz um avanço de qualidade para o programa de obras do BNDES e do PAC, ao governador de Pernambuco, Eduardo Cunha, e secretários da Fazenda de estados do Nordeste.
Cunha já enfrenta o problema da ocupação desordenada devido ao volumoso programa de investimentos na região do porto de Suape. Em obras ou em projeto há desde um estaleiro de grandes proporções, da Camargo Corrêa, até refinaria da Petrobras e um pólo petroquímico. Uma montadora de carros está no horizonte. Cunha disse a Coutinho que quer implantar logo o novo modelo.
O conceito ambientalO conceito para projetos industriais estruturantes, a definição para obras com grandes impactos regionais, tem um modelo para se inspirar: o das licenças ambientais. As semelhanças são muitas. O que surpreende é que governos e legisladores tenham criado regras ambientais draconianas e ignorado a questão social nela inserida, o que não deixa de evidenciar um viés elitista do ambientalismo.
É oportuna a intervenção cogitada pelo BNDES, já que grande parte dos problemas sociais urbanos decorre de expansão industrial sem o planejamento público que lhe seria inerente para realocar a mão-de-obra mais simples e depois deixada à própria sorte.
Ao capital cabe investir e arcar com os riscos do investimento. O que ocorre depois, porém, é responsabilidade direta dos governantes.
Adiar custará maisUma coisa é um novo pólo industrial no sudeste, onde são maiores as oportunidades de emprego. Outra é numa região remota e de baixa densidade populacional, como Rondônia. Ou no Nordeste, onde a mão-de-obra disponível e quase sempre não treinada excede a oferta de emprego.
Usinas na Amazônia talvez requeiram contratação por prazo definido e custeio de retorno e ajuda para realocação, para evitar a vinda de famílias inteiras. Em áreas de proteção ambiental e por isso de empregos industriais escassos não convém fixar o grande contingente de trabalhadores requerido pela construção de usinas.
No Nordeste é diferente. A população é grande e a região, foco de políticas de desconcentração industrial. Cada projeto estruturante tem de vir acompanhado de um plano diretor de ocupação urbana e de serviços públicos adicionais.
Além disso, os incentivos concedidos no nível regional para a atração de indústrias têm de considerar tal faceta, sob pena de sobrecarregar a estrutura social existente e degradar o nível de vida da região tanto quanto faria um projeto sem preocupações ambientais.
A lógica do BNDES é correta. Ela tem custo, mas adiar o problema custará muito mais.
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