Não é nem exatamente "o que é humano" a questão, mas mais precisamente, que tipo de vida humana deve ser protegida; espermatozóides humanos são vida humana, mas ninguém está se lixando para eles; o mesmo para os óvulos humanos. Se o primeiro adentra o segundo, então para muitos de repente parece que entra o clímax de "assim falou Zaratustra" como trilha sonora, com nuvens se abrindo e lançando um raio de luz divina e todos efeitos especiais típicos de filmes bíblicos e épicos que se imaginar, e de repente se teria uma "vida humana" num sentido muito diferente da vida de gametas ou de células da pele.
Por mais que os motivos possam ser (ou parecer) nobres, sob uma ótica racional/científica do que é o ser humano, isso é um mero absurdo que não podemos ter simplesmente como uma espécie de "luxo moralista". Fora dessa situação especial da concepção, as pessoas comumente valorizam a vida humana dotada de cérebros funcionais, e é essa vida que deve realmente importar. É por si só ridículo se falar em "salvar vidas" de "humanos unicelulares" ou ainda num estado em que é só um bolo de células não diferenciadas, e ainda mais levando em consideração o que essa posição representa como custo para a qualidade de vida de humanos desenvolvidos, com cérebros funcionais.
E se falando da questão do aborto especificamente, ainda tem o contra-senso de que, o "salvar a vida" de uma pré-pessoa em estado citológico/histológico (ou até mais avançado), sob essa perspectiva racional do que é o ser humano, é simplesmente pior do que não "salvar", para essa mesma "pessoa", se levamos em consideração coisas óbvias, como que o preparo psicológico e financeiro são coisas importantes para as pessoas/filhos. "Salvar a vida" nesse caso é análogo a promover maternidade não-planejada de modo geral, que se tenha filhos independentemente de condições financeiras ou psicológicas para tê-los, e isso é sem dúvida pior para alguém do que não vir a existir.
Se é a atividade cerebral que compreendemos como ser o fator crucial para a "humanidade" da vida, então não faz sentido se indagar, como alguns fazem, se o embrião não "preferiria" continuar a viver, se continuasse a viver (pois apenas dessa maneira ele poderia vir a preferir ter completado seu desenvolvimento, em retrospecto), qualquer que fosse a condição que o aguardasse ao nascer, como não consideramos que faça sentido pensar sobre se o óvulo "preferiria" o equivalente, ser fecundado e nascer, mesmo não sendo o melhor momento para se ter um filho sobre a ótica esgoísta e cruel da mesquinha "mãe" menstruísta.