Autor Tópico: João Cândido  (Lida 579 vezes)

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Offline Luiz Souto

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João Cândido
« Online: 05 de Junho de 2008, 21:44:29 »
REPARAÇÃO HISTÓRICA


  Chico Alencar
   O Globo
   26/05/2008
     
  Com 98 anos de atraso, um decreto legislativo concebido pelo senador Rui Barbosa, em 1910, vai passar a vigorar de verdade: trata-se da concessão de anistia post-mortem a João Cândido e demais participantes da Revolta da Chibata, que eclodiu em 22 de novembro daquele ano. O projeto, de iniciativa da senadora Marina Silva (PT/AC), que terá a merecida alegria de aprová-lo definitivamente no seu retorno à Casa, é uma denúncia da traição do governo do Marechal Hermes, que acenou com o perdão dos revoltosos para que eles depusessem armas. E um anúncio de que a justiça histórica é sempre possível, mesmo que demore quase um século.

O motim da marujada naquela que era, no início do século passado, uma poderosa Armada, teve objetivo de dignidade humana: o fim dos castigos corporais na Marinha do Brasil. Motivo nobre e atual: na verdade, João Cândido, alcunhado de "Almirante Negro", liderou um movimento contra a tortura. Esta, ao contrário da praticada na ditadura de 1964/1984, tinha estatuto legal, determinando-se sangrentas chibatadas e "bolos" na palma das mãos para quem não obedecesse estritamente às ordens superiores.

Os marinheiros rebelados mostraram perícia incomum no manejo dos vasos de guerra, e as autoridades da então capital da República ficaram assustadas. "Como estes analfabetos, negros e mulatos na sua maioria, ousam agir assim, e com tal destreza?" - indagavam. Canhoneiras apontadas das águas da Guanabara para os prédios do poder, restou aos seus donos a negociação. O senador Rui, que até então defendera os castigos, reconheceu que os rebeldes "tinham sido fiéis à sua idéia, tinham sido leais uns com os outros e desinteressados na luta contra a situação terrível em que estavam colocados, com necessidades irrecusáveis".

Herdeiros do autoritarismo imperial, os dirigentes da nossa singular República sem povo, oligárquica, reagiram tão logo puderam, após o aparente reconhecimento dos pleitos dos insurretos: todos os líderes foram presos. Os que sobreviveram à masmorra foram condenados à miséria para o resto de suas vidas. João Cândido, que faleceu esquecido e pobre, aos 89 anos, tornou-se vendedor de peixes no antigo entreposto da Praça XV. "Depois da cadeia, ainda tentei trabalhar no mar, mas fui sempre muito perseguido, até na Marinha Mercante", testemunhava ele.

Desta luta inglória, agora oficialmente reconhecida como constitutiva da nossa História, restou, apesar da cruel repressão, a abolição dos castigos corporais como método de manutenção da hierarquia militar. Falta o reconhecimento daquele que "tem por monumento as pedras pisadas do cais", como canta o belíssimo (e censuradíssimo, quando lançado) samba de João Bosco e Aldir Blanc, "O Mestre-Sala dos Mares".

Estátuas e monumentos de nossa cidade, quase sempre, homenageiam os dominantes de cada época, em função da leitura parcial que se faz do nosso processo histórico. É chegada a hora de se valorizar os lutadores do povo, que reagiram às injustiças. No velho cais do Paço e das barcas, onde a estátua do monarca D. João VI pontifica, há lugar para João Cândido e sua simbologia. Salve o Almirante Negro! 

http://www.chicoalencar.com.br/chico2004/artigos_do.php?codigo=571
Se não queres que riam de teus argumentos , porque usas argumentos risíveis ?

A liberdade só para os que apóiam o governo,só para os membros de um partido (por mais numeroso que este seja) não é liberdade em absoluto.A liberdade é sempre e exclusivamente liberdade para quem pensa de maneira diferente. - Rosa Luxemburgo

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