Estou recebendo alguns insultos — o que eu tenho com isso? — por conta de mais um dos descalabros ocorridos no Rio ligados à Segurança Pública. Como vocês sabem, onze soldados do Exército tiveram a prisão temporária decretada. Eles detiveram três rapazes no morro da Providência, que é chefiado pelo Comando Vermelho (CV), e os entregaram a traficantes do morro da Mineira, chefiado pela facção Amigos dos Amigos (ADA), rival do CV. Os corpos dos três foram encontrados num lixão. O tenente que comandava a operação e dois soldados confessaram o crime. Segundo disseram, eles decidiram punir os rapazes porque estes teriam desacatado os soldados.
O que o Exército faz no Morro da Providência? Cumpre ordens do Ministério da Defesa, a pedido do Ministério das Cidades, para garantir a execução de obras do PAC. A presença militar no morro foi reforçada. Depois do enterro, moradores foram em passeata até a sede do Comando Militar do Leste para protestar e exigir o fim da presença dos soldados na favela. Houve confronto, e os mais exaltados foram contidos com bombas de gás lacrimogêneo.
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Ninguém sabe quantos corpos o narcotráfico faz por dia. Por ocasião do assassinato de Tim Lopes, a polícia chegou a áreas antes restritas aos criminosos. Encontraram-se verdadeiros cemitérios clandestinos. Tudo é resolvido por lá mesmo, como se fosse um problema da “própria comunidade”, sem “interferência externa”, da polícia ou do Exército. Quando são as forças legais que matam ou, como parece ser o caso, deixam matar, então temos os protestos em penca: ONGs, entidades de defesa dos direitos humanos, OAB...
Não as censuro por isso, não. Se não pudermos contar com a lei, com quem vamos contar? Há que se protestar mesmo! O Exército está lá para oferecer segurança.
Mas por que essa gente é tão seletiva? Justifico o clamor de agora diante das mortes excepcionais. O que não entendo é o silêncio cúmplice diante das mortes rotineiras. Fui claro?
Quando se dá a guerra de facções ou quando um grupo ajusta as contas com aqueles que não cumprem as ordem do comando, o asfalto branco se cala. Fica parecendo que logo ali acima estão, sei lá, os ianomâmis ou alguma tribo isolada, com direito a viver segundo as suas próprias leis. Os que rejeitam que o estado de direito suba o morro — e, lamento dizer, será à força, sim — estão apenas sendo cruéis à sua maneira. Mas, é certo, é para garantir a lei que as Forças Armadas deveriam ocupar o morro, não pra praticar o crime.
Por que faço essas observações? Porque já começo a perceber o narcotráfico a ditar a pauta, opondo uma suposta comunidade vítima da truculência a um suposto Exército assassino. E esse, obviamente, é o falso confronto. O verdadeiro é outro: é o que se dá entre o crime organizado e os cidadãos honestos que moram na favela.
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