Autor Tópico: Agora falta apenas descobrir a pólvora.  (Lida 1165 vezes)

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Offline Donatello

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Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Online: 17 de Agosto de 2008, 01:05:44 »
RIO - Uma prática difundida entre policiais emperra logo no início praticamente todos os inquéritos sobre mortes em confrontos (autos de resistência): ao chegar à delegacia, eles costumam informar que as vítimas eram ligadas ao tráfico, mesmo quando elas sequer têm antecedentes criminais. É o que informa a reportagem de Antônio Werneck, publicada no jornal O Globo deste domingo.

Foi assim no caso do estudante Hanry Silva Gomes de Siqueira, de 16 anos. Morto por PMs no Lins durante suposta troca de tiros em 2002, ele foi tratado como traficante. Ninguém investigou. O caso acabaria arquivado como tantos outros, não fosse a coragem da mãe do jovem, a dona-de-casa Márcia de Oliveira Jacinto. Decidida a provar que o filho era inocente, ela levou dois anos investigando o crime e mais quatro pedindo justiça. Na semana passada, entrou de cabeça erguida no Tribunal de Justiça depois de desvendar a farsa: os dois PMs que mataram o estudante e simularam um tiroteio começaram a ser julgados por homicídio qualificado.

Autos de resistência: 4 mortos por dia
Longe de ser exceção, histórias como a de Hanry acontecem em todo o estado e estão nos registros de autos de resistência, sobretudo em favelas. A morte em confronto é tratada como legítima defesa no registro policial, mesmo quando as circunstâncias apontam o contrário. De janeiro de 2006 a abril deste ano, 2.895 pessoas morreram supostamente enfrentando a polícia no estado, segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP) - uma média de três mortos por dia. Este ano, de janeiro a abril, foram 492 casos - quatro mortos por dia ou um a cada seis horas .

Continuação (com direito a ler os meus comentários e os do autor da frase na assinatura)em O Globo Online
« Última modificação: 17 de Agosto de 2008, 11:16:11 por Donatello van Dijck »

Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #1 Online: 17 de Agosto de 2008, 14:51:15 »
Pois não é que só agora, postando e lendo os comentários lá no site de O Globo, é que fui me dar conta das razões de tão repentina descoberta do Óbvio Ululante por parte das empresas da família Marinho? Não conseguia entender o porquê de um jornal que nunca se eximiu de dar como verdade absoluta e inquestionável a versão da polícia sobre os tiroteios em favela, sem nunca se questionar sobre coisas como:
- Como um tiroteio com 12 traficantes mortos só resulta na apreensão de 2 pistolas?
- Porque é tão mais comum que sobreviventes de tiroteio entre polícia e traficantes ser dado como estudante ou operário do que mortos?
- Porque policiais retiram sujeitos com dezenas de balaços de fuzil no peito para levar ao hospital?
- Porque é tão comum pessoas fechando avenidas e jurando que o "traficante" trabalhava numa construção na Barra?

de repente, sem mais nem menos, resolveu enxergar o mundo de outra forma?

Logo o jornal da família Marinho, que nunca se eximiu de manchetar coisas como "16 traficantes mortos em Vigário Geral" ou "Fulano de tal morre após trocar tiros com a polícia"? Logo ele dando matéria de capa para uma reportagem que demonstra que grande parte dos mortos pela PM carioca têm a sua caracterização como criminosos forjada pela mesma. Que os processos são terminados pela Civil sem que nem ao menos os parentes da vítima sejam ouvidos (para mostrarem a carteira assinada ou a matrícula do colégio, quando houverem) ou os locais dos supostos tiroteios sejam visitados por peritos/investigadores.

Well, eu não posso negar que fiquei feliz com a notícia (se era para ser descoberta, a pólvora, que fosse tarde antes que nunca). Mas enquanto lia os comentários de um de outro lado meus olhos se abriram. Vejam só: eu reclamando de que os jornalistas demoraram para enxergar o óbvio de que a polícia fluminense é chacineira ao extremo, criminosa até o último fio de cabelo do último inspetor e do último soldado careca lotado na oficina mecânica... e eu mesmo tive de ler um comentário da leitora Andrea Maria Silva para enxergar uma obviedade identicamente absurda de grande: há alguns meses um funcionário da família Marinho foi executado por policiais que afirmaram que o mesmo era criminoso, mantendo esta afirmação até que ficasse provado o contrário. Há inclusive fitas de vídeo mostrando os policiais terminando de matar o moribundo e alterando a cena do crime.

Tá explicado: as Organizações Globo resolveram enxergar as coisas como elas são depois de as coisas como elas são começarem a atingir a casa. Mais ou menos como há alguns meses a imprensa carioca, num rompante, descobriu que haviam milícias comandadas por políciais na Zona Oeste, após dois repórteres de O Dia sofrerem na mão de tais criminosos.

Sorte a nossa que o corporativismo está em todo lugar, e com muita força na imprensa. Se mais uns três ou quatro jornalistas (ou outros empregados da grande imprensa) morrem na mão da PM é bem provável que as coisas acabem melhorando no Rio: diz o ditado que deus escreve certo por linhas tortas... olha que eu acabo acreditando.
« Última modificação: 17 de Agosto de 2008, 18:57:09 por Donatello van Dijck »

Offline Moro

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #2 Online: 17 de Agosto de 2008, 15:27:10 »
Donatello, isso é gravíssimo... Você tirou todas essas conclusões baseados nisto:

Citar
Como um tiroteio com 12 traficantes mortos só resulta na apreensão de 2 pistolas?
- Porque é tão mais comum que sobreviventes de tiroteio entre polícia e traficantes ser dado como estudante ou operário do que mortos?
- Porque policiais retiram sujeitos com dezenas de balaços de fuzil no peito para levar ao hospital?
- Porque é tão comum pessoas fechando avenidas e jurando que o "traficante" trabalhava numa construção na Barra?

ou tem mais alguma coisa?

Da maneira como você postou dá a entender que a polícia carioca sai atirando para todo o lado, matando mais inocentes do que bandidos, e que isso é comum já há algum tempo.

Se isso for verdade, o que está passando na cabeça dos policiais? Eles são diferentes da maioria das pessoas e não tem remorso nem respeito à vida?

“If an ideology is peaceful, we will see its extremists and literalists as the most peaceful people on earth, that's called common sense.”

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Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #3 Online: 17 de Agosto de 2008, 15:40:52 »
Agnóstico, nem a matéria nem eu disse que a polícia só mata inocentes. O que é sim, regra no Rio, é que quando a polícia mata inocentes (o que é, digamos, nada incomum) ela forja as provas para que pareça que não eram. 

Há também inúmeros casos de criminosos, de fato criminosos, mas executados pela polícia sem que seja em troca de tiros. A própria matéria cita um caso destes: aquela chacina na Penha em que um monte de "mortos em tiroteio" tinham sido alvejados pelas costas, e alguns até com tiros na nuca. A matéria dá os números: se não me engano 16 dos 19 mortos foram executados, de acordo com a perícia. Isso só em uma incursão!



Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #4 Online: 17 de Agosto de 2008, 15:46:13 »
Desculpe, não lí a primeira e mais importante frase do seu post.

Nope, eu tirei (e se você ler os comments da matéria vai ver que bem mais cariocas, além de mim) estas conclusões a partir de 29 anos vivendo neste estado. Alguns deles numa favela onde havia tráfico de entorpecentes... Algumas coisas sobre os motivos da minha posição sobre a PM fluminense eu nem acho prudente relatar aqui, mas te passarei por MP, só por ilustração.
« Última modificação: 17 de Agosto de 2008, 16:11:09 por Donatello van Dijck »

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #5 Online: 17 de Agosto de 2008, 16:26:51 »
Longe de querer "defender" a polícia, só fazendo um pequeno contrapeso, para diminuir um pouco essa impressão que pode resultar de ser um clube de assassinos-por-diversão.


Citar
Como um tiroteio com 12 traficantes mortos só resulta na apreensão de 2 pistolas?

Acho que se eu me confrontasse com a policia em situações desse tipo, diversas vezes poderia me parecer mais seguro fugir da polícia do que enfrentá-la até acabarem as balas da minha pistola, ou, fugir depois que tivessem acabado. E em qualquer caso, abandoar a arma, jogar num bueiro, por cima de um muro, qualquer coisa, para não ser apanhado com arma pela polícia. Talvez não possa ter me visto de perto o suficiente para saber que estava envolvido no tiroteio, e mesmo que tivessem me visto suficientemente de perto para reconhecer, ao menos não estaria armado.

Não sei qual é a relevância disso para a situação carioca, mas também tentaria me livrar de camisa e blusa, além de "lavar as mãos" (com água, suor, saliva, esgoto, o que estivesse à disposição), se aquela coisa de teste de pólvora por tiros seja prática comum. Ao mesmo tempo, não sei se isso seria suficiente para evitar que todo mundo fosse preso; talvez uns escapassem, talvez uns não conseguissem "disfarçar" suficientemente bem, e "dessem bandeira" de que estavam no conflito, talvez por roupas características demais até, sei lá.

Então... a menos que a polícia saia fazendo "varreduras" procurando armas em bueiros, no meio de matinhos, córregos, etc... não seria tão inimaginável que se prendesse alguns traficantes desarmados. Não que inocentes não possam acabar indo no meio também.

 
Citar
Porque é tão mais comum que sobreviventes de tiroteio entre polícia e traficantes ser dado como estudante ou operário do que mortos?

Talvez porque seja mesmo mais provável se morrer enfrentando a polícia do que por bala perdida; que pessoas não-confrontando a polícia sejam atingidos de forma menos potencialmente letal, porque a polícia não mirava contra elas.



Citar
- Porque policiais retiram sujeitos com dezenas de balaços de fuzil no peito para levar ao hospital?

Não entendo qual seria a alternativa ideal, além de talvez não haverem sujeitos com dezenas de balaços de fuzil no peito... o que talvez seja meio inevitável nesse tipo de confronto...



Citar
- Porque é tão comum pessoas fechando avenidas e jurando que o "traficante" trabalhava numa construção na Barra?

Não que em diversos casos não pudesse ser mesmo - mas também acho que em parte talvez os traficantes se beneficiem de promover esse tipo de manifestação contra a polícia, e também os não-traficantes, tando por simplesmente não negarem "favores" aos traficantes, quanto pela possibilidade de que haja pressão pública/política para diminuir a ação policial no lugar, o que, ainda que a polícia não seja tão vilã quanto podem fazer parecer, a situação toda do confronto aos arredores de casa não é nem um pouco tranqüila.

Outra possibilidade é alguns familiares e amigos não saberem do envolvimento da pessoa com o crime. Acho isso mais provável do que aparecerem na TV falando "pois é, meu filho era bandido mesmo, não tenho do que reclamar, a polícia tinha que se defender e aos outros habitantes".


A primeira e a última respostas foram coisas que eu simplesmente inventei me colocando no lugar de criminoso e vítima, não sei se tem algo de possivlemente real nisso, só acho uma possibilidade, são coisas que eu possivelmente faria, em qualquer das situações.

Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #6 Online: 17 de Agosto de 2008, 16:52:08 »
Citação de: Buckaroo
Talvez porque seja mesmo mais provável se morrer enfrentando a polícia do que por bala perdida; que pessoas não-confrontando a polícia sejam atingidos de forma menos potencialmente letal, porque a polícia não mirava contra elas.
Faz todo o sentido, concordo com uma única ressalva. As diferenças são muito grandes: se você fizer um apanhado de matérias sobre tiroteios vai perceber que a quase totalidade dos sobreviventes é dada como vítima de bala perdida enquanto a totalidade absoluta dos mortos é dada como tendo envolvimento com o tráfico. O seu raciocínio justificaria sim, disparidades, mas não do tamanho que vemos.

Quantos aos outros, eu discordo:
1- Aceitando a sua hipótese não seriam mortes em troca de tiros. Seriam no máximo execuções de traficantes fugitivos e no mínimo crime.

3- Aqui no Rio os noticiários sempre contêm a frase "morreu ao dar entrada no hospital". É falsa, os tombados já são levados mortos para que haja uma desculpa para se desfazer a cena do crime. Aliás, o caso filmado pelas câmeras de segurança de um posto de gasolina representa a regra geral do modus operandis da polícia fluminense do Rio nestes casos.

4- Ocorre também, de protestos por morte de traficantes de fato. Mas se você vir a um e a outro vai ver que há diferenças. A principal: quando morrem traficantes de fato os favelados não alegam inocência.

Citação de: Buckaroo
clube de assassinos-por-diversão.
Talvez não seja exatamente isto, a nossa polícia. Talvez nem todos os homens de farda tenham este gosto por matar, torturar, chacinar. Alguns (talvez, até a maioria) apenas ache natural tirar o corpo da reta quando numa incursão determinada pelo comando, acabam matando 1,2 ou 5 inocentes por conta de uma ação mal planejada... mesmo que não tivessem intenção de matar estes inocentes quando colocaram os pés na primeira viela da favela. Outros talvez sejam apenas corporativistas: nem passa por suas cabeças prender um colega ou denunciá-los aos superiores. E grande parte, tenho certeza, se contenta com crimes pequenos como extorsão a motorista sem carteira ou agressão física leve a viciados.
« Última modificação: 17 de Agosto de 2008, 16:55:00 por Donatello van Dijck »

Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #7 Online: 17 de Agosto de 2008, 17:01:30 »
Só complementando o item 4, que acho que ficou meio estranha a minha afirmação, explico: manifestações em relação a traficantes mortos geralmente têm caráter de celebração. São cantadas palavras de ordem contra quadrilhas rivais ou contra a polícia (perdoem-me o pleonasmo). Mas não se costuma alegar inocência, pelo contrário, costuma se enaltecer as características criminosas do sujeito.

Offline Eremita

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #8 Online: 17 de Agosto de 2008, 23:17:45 »
Resumindo o que eu tava pensando aqui mas era gigante.
Não acho que a polícia esteja matando inocentes "de propósito"; apenas tentando encobertar os "putz, merda!" quando ocorrem.
Latebra optima insania est.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #9 Online: 18 de Agosto de 2008, 18:29:08 »
Talvez não seja exatamente isto, a nossa polícia. Talvez nem todos os homens de farda tenham este gosto por matar, torturar, chacinar. Alguns (talvez, até a maioria) apenas ache natural tirar o corpo da reta quando numa incursão determinada pelo comando, acabam matando 1,2 ou 5 inocentes por conta de uma ação mal planejada... mesmo que não tivessem intenção de matar estes inocentes quando colocaram os pés na primeira viela da favela. Outros talvez sejam apenas corporativistas: nem passa por suas cabeças prender um colega ou denunciá-los aos superiores. E grande parte, tenho certeza, se contenta com crimes pequenos como extorsão a motorista sem carteira ou agressão física leve a viciados.


Faz todo sentido isso...


E os meus comentários eram também mais ou menos nesse sentido, só que do outro lado... a conclusão não era algo como "pronto, isso explica tudo, a polícia é imaculada, vão cuidar das suas vidas e assistir novela sem se preocupar com nada que está tudo bem", mas apenas algo que talvez deva ser considerado como parcela potencialmente dos números, em vez de se considerar que é tudo corrupção e incompetência.



Eu não entendi muito bem algumas das objeções às "respostas" que eu imaginei, por exemplo, isso de que "seriam no máximo execuções de traficantes fugitivos" -- eu não quis sugerir que isso ocorresse "e tudo bem" em qualquer das respostas, mas também não questiono a possibilidade de isso ocorrer.

Só um esclarecimento sobre os protestos populares, o que eu quis dizer era que talvez os traficantes incentivassem, pedissem como "favor", protestos pelas mortes de gente que normalmente não se teria protestos populares. Não que não possam haver protestos realmente espontâneos (incluindo aqui os por familiares e amigos que não sabiam do envolvimento da pessoa com o crime, bem como inocentes também). Só penso que se eu tivesse considerável poder numa favela seria benéfico incentivar esse tipo de protesto, mesmo que só tivessem morrido realmente culpados, e do pior tipo de gente possível - claro que, não seria isso que as pessoas deveriam alegar, mas que os mortos eram todos inocentes e etc.

Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #10 Online: 19 de Agosto de 2008, 00:17:53 »
Citação de: Banzai
Só um esclarecimento sobre os protestos populares, o que eu quis dizer era que talvez os traficantes incentivassem, pedissem como "favor", protestos pelas mortes de gente que normalmente não se teria protestos populares. Não que não possam haver protestos realmente espontâneos (incluindo aqui os por familiares e amigos que não sabiam do envolvimento da pessoa com o crime, bem como inocentes também). Só penso que se eu tivesse considerável poder numa favela seria benéfico incentivar esse tipo de protesto, mesmo que só tivessem morrido realmente culpados, e do pior tipo de gente possível - claro que, não seria isso que as pessoas deveriam alegar, mas que os mortos eram todos inocentes e etc.
É claro que minha experiência pessoal não é a verdade absoluta, pode acontecer do jeito que você está falando algumas vezes. Mas não é a regra.

Se você vir um monte de gente em desespero na televisão e um cara no meio berrando coisas como "Meu filho era trabalhador, meu filho era trabalhador..." pode apostar dez fichas em onze que ele realmente era. Até porque, como eu já disse em outro tópico, é quase impossível viver em uma favela e não saber quem são os traficantes: um por um; então essa possibilidade de amigos e parentes que achavam que era inocente é quase nula.

Existem sim, como eu disse, manifestações em morte de traficantes: mas nestes casos, contrariando o seu raciocínio, o que mais se faz questão é mostrar que o sujeito era bandido. Aí acontece mesmo o patrocínio da celebração pelos criminosos mas não há exigência de participação (exceto pela declaração de luto: os bares, as igrejas, as festas de 15 anos... tudo é impedido de funcionar, principalmente quando o defunto é um 'chefe do movimento'). Mas ninguém é obrigado a protestar ou a ir ao enterro, geralmente nestes "eventos" só aparecem os correligionários, as pessoas que têm relação mesmo com o tráfico... e o choro de "ele era inocente" é trocado por refrões fazendo alusão aos crimes cometidos pelo morto ou promessas de vingança ...


Citação de: Banzai
Eu não entendi muito bem algumas das objeções às "respostas" que eu imaginei, por exemplo, isso de que "seriam no máximo execuções de traficantes fugitivos"
Dentro do contexto esta seria a única possibilidade. Eu tinha falado sobre ser comum a polícia matar muita gente e encontrar uma ou duas armas mesmo sustentando que os mortos estavam trocando tiros com ela... bem pouco provável. Trocar tiros sem armas é complicado, se o cara jogou a arma no bueiro e saiu correndo e é baleado ele não morreu em troca de tiros, morreu executado: o que é crime mesmo que o morto seja criminoso.

Mas depois lí que você tinha falado sobre o cara sair correndo, jogar a arma no bueiro e mesmo assim acabar sendo preso. Aí ficou conversa de doido, um diz uma coisa o outro refuta outra... acontece às vezes... deixa pra lá :lol:

Citação de: Banzai
E os meus comentários eram também mais ou menos nesse sentido, só que do outro lado... a conclusão não era algo como "pronto, isso explica tudo, a polícia é imaculada, vão cuidar das suas vidas e assistir novela sem se preocupar com nada que está tudo bem", mas apenas algo que talvez deva ser considerado como parcela potencialmente dos números, em vez de se considerar que é tudo corrupção e incompetência.

:ok: Em nenhum momento eu entendi de outra forma... como já falei um tanto de vezes, eu geralmente admiro o modo como você defende suas idéias, mesmo das vezes em que discordo delas.

Buenas noches, a cama me chama... :olheira:
« Última modificação: 19 de Agosto de 2008, 00:20:23 por Donatello van Dijck »

Offline Moro

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #11 Online: 19 de Agosto de 2008, 00:58:57 »
Citar
Se você vir um monte de gente em desespero na televisão e um cara no meio berrando coisas como "Meu filho era trabalhador, meu filho era trabalhador..." pode apostar dez fichas em onze que ele realmente era. Até porque, como eu já disse em outro tópico, é quase impossível viver em uma favela e não saber quem são os traficantes: um por um; então essa possibilidade de amigos e parentes que achavam que era inocente é quase nula.

Não estou tão certo. Bem, não tenho sua experiência em "combate", mas todos já vimos muitos familiares falando bem do filho e este era obviamente criminoso. Na verdade, acho até normal e entendível.
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Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #12 Online: 19 de Agosto de 2008, 12:11:07 »
Citação de: Agnóstico
Bem, não tenho sua experiência em "combate"
Agnóstico, Agnóstico... isto não soou amistoso  :P



Já ouviu aquela música do Bezerra da Silva em homenagem ao Escadinha? É mais ou menos isto : se o cara for mesmo traficante pode até aparecer gente dizendo que ele era um "bom filho" ou que "ajudava aos outros"... alguns pais declaram que o filho se perdeu "pelas más companhias", (porque a má companhia raramente é o filho  ::) ). Mas declarar que o cara não era traficante realmente não é o que a minha relativamente vasta experiência "em combate" demonstra.

Eu sei, foge à lógica... É meio estranho de se compreender (aliás nem eu mesmo sei explicar: talvez fosse um estudo acadêmico); mas é assim que acontece: existem padrões para reações de favelados a morte de traficantes e de não-traficantes, e por vezes estes padrões realmente não parecem muito lógicos a quem vê de fora.

Offline Dbohr

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #13 Online: 19 de Agosto de 2008, 12:45:52 »
Citar
(...) e por vezes estes padrões realmente não parecem muito lógicos a quem vê de fora.

Isto é interessante, pode falar mais um pouco?

Trabalhei próximo a (mas não com) o Alessandro Molon quando ele estava com o Conselho da Comunidade. Segundo advogados que investigavam abusos e maus-tratos aos presos, era preciso ter um filtro muito bom, porque todo mundo ali tem uma historinha triste para contar.

Offline Moro

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #14 Online: 19 de Agosto de 2008, 12:54:42 »
Agnóstico, Agnóstico... isto não soou amistoso  :P

Puts, desculpe. Mas quis dizer que você conhece muito mais a situação pela sua experiência, por isso o "combate"

[ ]s
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Offline Dbohr

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #15 Online: 19 de Agosto de 2008, 13:03:17 »
Minha impressão sobre o caso:

A política de segurança do Rio de Janeiro está equivocada há décadas. Eu não sou contrário ao confronto direto. Só não acho que só o confronto resolva; como, de resto, não tem resolvido.

Some-se a isso a corrupção em setores das duas polícias (se é institucionalizada ou se são algumas maçãs podres eu não tenho como aferir, mas apostaria que há pesada corrupção no comando), na falta de incentivo à solução de casos por investigação e no despreparo e total falta de condições para que o policial honesto faça seu trabalho direito. 

Offline Donatello

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Re: Agora falta apenas descobrir a pólvora.
« Resposta #16 Online: 19 de Agosto de 2008, 13:22:36 »
Citação de: Agnóstico
Puts, desculpe. Mas quis dizer que você conhece muito mais a situação pela sua experiência, por isso o "combate"

[ ]s
Eu estava brincando  :lol:

Dbhor, quando eu estiver em casa eu te respondo (chefes de olho gordo no computador  :hihi:)

 

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