Autor Tópico: Gênese do povo judeu  (Lida 1815 vezes)

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Offline Luiz Souto

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Gênese do povo judeu
« Online: 11 de Outubro de 2008, 15:43:06 »
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A complexa gênese do povo judeu

Descobertas arqueológicas e etnográficas recentes revelam: a idéia de que os judeus seriam descendentes diretos de Moisés, Davi e Salomão é uma farsa ideológica. Como tantos outros povos, eles formaram-se num processo histórico rico e contraditório, que envolve múltiplas etnias e não cabe na descrição religiosa e fundamentalista que ainda prevalece

Shlomo Sand


Qualquer israelense sabe que o povo judeu existe desde a entrega da Torá [1]no monte Sinai e se considera seu descendente direto e exclusivo. Todos estão convencidos de que os judeus saíram do Egito e fixaram-se na Terra Prometida, onde edificaram o glorioso reino de Davi e Salomão, posteriormente dividido entre Judéia e Israel. E ninguém ignora o fato de que esse povo conheceu o exílio em duas ocasiões: depois da destruição do Primeiro Templo, no século 6 a.C., e após o fim do Segundo Templo, em 70 d.C.

Foram quase 2 mil anos de errância desde então. A tribulação levou-os ao Iêmen, ao Marrocos, à Espanha, à Alemanha, à Polônia e até aos confins da Rússia. Felizmente, eles sempre conseguiram preservar os laços de sangue entre as comunidades, tão distantes umas das outras, e mantiveram sua unicidade.

As condições para o retorno à antiga pátria amadureceram apenas no final do século 19. O genocídio nazista, porém, impediu que milhões de judeus repovoassem naturalmente Eretz Israel, a terra de Israel, um sonho de quase vinte séculos.

Virgem, a Palestina esperou que seu povo original regressasse para florescer novamente. A região pertencia aos judeus, e não àquela minoria desprovida de história que chegou lá por acaso. Por isso, as guerras realizadas a partir de 1948 pelo povo errante para recuperar a posse de sua terra foram justas. A oposição da população local é que era criminosa.

De onde vem essa interpretação da história judaica, amplamente difundida e resumida acima?

Trata-se de uma obra do século 19, feita por talentosos reconstrutores do passado, cuja imaginação fértil inventou, sobre a base de pedaços da memória religiosa judaico-cristã, um encadeamento genealógico contínuo para o povo judeu. Claro, a abundante historiografia do judaísmo comporta abordagens plurais, mas as concepções essenciais elaboradas nesse período nunca foram questionadas.

Quando apareciam descobertas capazes de contradizer a imagem do passado linear, elas praticamente não tinham eco. Como um maxilar solidamente fechado, o imperativo nacional bloqueava qualquer espécie de contradição ou desvio em relação ao relato dominante. E as instâncias específicas de produção do conhecimento sobre o passado judeu contribuíram muito para essa curiosa paralisia unilateral: em Israel, os departamentos exclusivamente dedicados ao estudo da “história do povo judeu” são bastante distintos daqueles da chamada “história geral”. Nem o debate de caráter jurídico sobre “quem é judeu” preocupou esses historiadores: para eles, é judeu todo descendente do povo forçado ao exílio há 2 mil anos.

Esses pesquisadores “autorizados” tampouco participaram da controvérsia trazida pela revisão histórica do fim dos anos 1980. A maioria dos atores desse debate público veio de outras disciplinas ou de horizontes extra-universitários, inclusive de fora de Israel: foram sociólogos, orientalistas, lingüistas, geógrafos, especialistas em ciência política, pesquisadores em literatura e arqueólogos que formularam novas reflexões sobre o passado judaico e sionista. Dos “departamentos de história judaica” só surgiram rumores temerosos e conservadores, revestidos por uma retórica apologética baseada em idéias preconcebidas.

Ou seja, após 60 anos recém-completos, a historiografia de Israel amadureceu muito pouco e, aparentemente, não evoluirá em curto prazo. Porém, os fatos revelados pelas novas pesquisas colocam para todo historiador honesto questões fundamentais — ainda que surpreendentes, numa primeira abordagem.

Considerar a Bíblia um livro de história é um dos debates. Os primeiros historiadores judeus modernos, como Isaak Markus Jost e Léopold Zunz, não encaravam o texto bíblico dessa forma, no começo do século 19. A seus olhos, o Antigo Testamento era um livro de teologia constitutivo das comunidades religiosas judaicas depois da destruição do Primeiro Templo. Foi preciso esperar até 1850 para encontrar historiadores como Heinrich Graetz, que teve uma visão “nacional” da Bíblia. A partir daí, a retirada de Abraão para Canaã, a saída do Egito e até o reinado unificado de Davi e Salomão foram transformados em relatos de um passado autenticamente nacional. Desde então, os historiadores sionistas não deixaram de reiterar essas “verdades bíblicas”, que se tornaram o alimento cotidiano da educação israelense.

Mas eis que, ao longo dos anos 1980, a terra treme, abalando os mitos fundadores. Novas descobertas arqueológicas contradizem a possibilidade de um grande êxodo no século 13 antes da nossa era. Da mesma forma, Moisés não poderia ter feito os hebreus saírem do Egito, nem tê-los conduzido à “terra prometida” — pelo simples fato de que, naquela época, a região estava nas mãos dos próprios egípcios! Aliás, não existe nenhum traço de revolta de escravos no reinado dos faraós, nem de uma conquista rápida de Canaã por estrangeiros.

Tampouco há sinal ou lembrança do suntuoso reinado de Davi e Salomão. As descobertas da década passada mostram a existência de dois pequenos reinos: Israel, o mais potente; e a Judéia, cujos habitantes não sofreram exílio no século 6 a.C. Apenas as elites políticas e intelectuais tiveram de se instalar na Babilônia, e foi desse encontro decisivo com os cultos persas que nasceu o monoteísmo judaico.

E o exílio do ano 70 d.C. teria efetivamente acontecido?

Paradoxalmente, esse “evento fundador” da história dos judeus, de onde a “diáspora” tira sua origem, não rendeu sequer um trabalho de pesquisa. E por uma razão bem prosaica: os romanos nunca exilaram povo nenhum em toda a porção oriental do Mediterrâneo. Com exceção dos prisioneiros reduzidos à escravidão, os habitantes da Judéia continuaram a viver em suas terras mesmo após a destruição do Segundo Templo.

Uma parte deles se converteu ao cristianismo no século 4, enquanto a maioria aderiu ao Islã, durante a conquista árabe do século 7. E os pensadores sionistas não ignoravam isso: tanto Yitzhak ben Zvi, que seria presidente de Israel, quanto David ben Gurion, fundador do país, escreveram sobre isso até 1929, ano da grande revolta palestina.

Ambos mencionam, em várias ocasiões, o fato de que os camponeses da Palestina eram os descendentes dos habitantes da antiga Judéia [2].


Mas, na falta de um exílio a partir da Palestina romanizada, de onde vieram os judeus que povoaram o perímetro do Mediterrâneo desde a Antigüidade? Por trás da cortina da historiografia nacional, esconde-se uma surpreendente realidade histórica: do levante dos macabeus, no século 2 a.C., à revolta de Bar Kokhba, no século 2 d.C., o judaísmo foi a primeira religião prosélita. Nesse período, a dinastia dos hasmoneus converteu à força os idumeus do sul da Judéia e os itureus da Galiléia, anexando-os ao “povo de Israel”. Partindo desse reino judeu-helenista, o judaísmo se espalhou por todo o Oriente Médio e pelo perímetro mediterrâneo. No primeiro século de nossa era surgiu o reinado judeu de Adiabena, no território do atual Curdistão, e a ele seguiram-se alguns outros com as mesmas características.

Os escritos de Flávio Josefo são apenas um dos testemunhos do ardor prosélito dos judeus: de Horácio a Sêneca, de Juvenal a Tácito, vários escritores latinos expressaram seu temor sobre a prática da conversão, autorizada pela Mixná e pelo Talmude  [3].

No começo do século 4, o êxito da religião de Jesus não colocou fim à expansão do judaísmo, mas empurrou seu proselitismo para as margens do mundo cultural cristão. Cem anos depois, surgiu o vigoroso reino judeu de Himiar, onde atualmente está o Iêmen. Seus descendentes mantiveram a fé judaica após a expansão do Islã e preservam-na até os dias de hoje. Da mesma forma, os cronistas árabes nos contam sobre a existência de tribos berberes judaizadas: contra a pressão árabe sobre a África do Norte, no século 7, surgiu a figura lendária da rainha judia Dihya-el-Kahina. Em seguida, esses berberes judaizados participaram da conquista da Península Ibérica e estabeleceram ali os fundamentos da simbiose particular entre judeus e muçulmanos, característica da cultura hispano-arábe.

A conversão em massa mais significativa ocorreu, no entanto, entre o mar Negro e o mar Cáspio, no imenso reino Cazar do século 8. A expansão do judaísmo do Cáucaso até as terras que hoje pertencem à Ucrânia engendrou várias comunidades que seriam expulsas para o Leste europeu pelas invasões mongóis do século 13. Lá, os judeus vindos das regiões eslavas do sul e dos atuais territórios alemães estabeleceram as bases da grande cultura ídiche [4].

Esses relatos sobre as origens plurais dos judeus figuraram, de forma mais ou menos hesitante, na historiografia sionista até o início dos anos 1960. Depois disso, foram progressivamente marginalizados e, por fim, desapareceram totalmente da memória pública israelense. Afinal, os conquistadores de Jerusalém em 1967 deveriam ser os descendentes diretos de seu reinado mítico, e não de guerreiros berberes ou cavaleiros cazares. Com isso, os judeus assumiram a figura de éthnos específico que, depois de 2 mil anos de exílio e errância, voltava para a sua capital.

E os defensores desse relato linear e indivisível não mobilizam apenas o ensino de história: eles convocam igualmente a biologia. Desde os anos 1970, uma sucessão de pesquisas “científicas” israelenses se esforça para demonstrar, por todos os meios, a proximidade genética dos judeus do mundo inteiro. A “pesquisa sobre as origens das populações” representa hoje um campo legítimo e popular da biologia molecular, e o cromossomo Y masculino ganhou um lugar de honra ao lado de uma Clio judia na busca desenfreada pela unicidade do “povo eleito”.

Essa concepção histórica constitui a base da política identitária do estado de Israel e é exatamente seu ponto fraco. Ela se presta efetivamente a uma definição essencialista e etnocentrista do judaísmo, alimentando uma segregação que mantém a distância entre judeus e não-judeus.

Israel, 60 anos depois de sua fundação, não aceita conceber-se como uma república que existe para seus cidadãos. Quase um quarto deles não é considerado judeu e, de acordo com o espírito de suas leis, esse estado não lhes pertence. Ao mesmo tempo, Israel se apresenta como o estado dos judeus do mundo todo, mesmo que não eles não sejam mais refugiados perseguidos, e sim cidadãos com plenos direitos, vivendo como iguais nos países onde residem. Em outras palavras, um etnocentrismo sem fronteiras serve de justificativa para uma severa discriminação ao invocar o mito da nação eterna, reconstituída para se reunir na “terra dos antepassados”.

Escrever uma nova história judaica, para além do prisma sionista, não é tarefa fácil. A luz que se refrata ao passar por esse prisma se transforma, insistentemente, em cores etnocêntricas. Mas, se os judeus sempre formaram comunidades religiosas em diversos lugares e elas foram, com freqüência, constituídas pela conversão, obviamente não existe um éthnos portador de uma mesma origem, de um povo errante que teria se deslocado ao longo de 20 séculos.

Sabemos que o desenvolvimento de toda historiografia — e, de maneira geral, as da modernidade — passa pela invenção do conceito de nação, que ocupou milhões de seres humanos nos séculos 19 e 20.

Recentemente, porém, esses sonhos começaram a ruir. Cada vez mais pesquisadores analisam, dissecam e desconstroem os grandes relatos nacionais e, principalmente, os mitos da origem comum, caros aos cronistas do passado. Certamente os pesadelos identitários de ontem darão espaço, amanhã, a outros sonhos de identidade. Assim como toda personalidade é feita de identidades fluidas e variadas, a história também é uma identidade em movimento.

[1] Texto fundador do judaísmo, a Torá é composta pelos cinco primeiros livros da Bíblia, ou Pentateuco: Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.

[2] Cf. David ben Gurion e Yitzhak ben Zvi, Eretz Israel no passado e no presente (1918, em ídiche), Jerusalém, Yitzhak ben Zvi, 1980 (em hebraico), e Yitzhak ben Zvi, Nossa população no país (em hebraico), Varsóvia, O Comitê Executivo da União da Juventude e o Fundo Nacional Judeu, 1929.

[3] A Mixná, considerada como a primeira obra de literatura rabínica, foi concluída no século 2 d.C. O Talmude sintetiza o conjunto dos debates rabínicos referindo-se à lei, aos costumes e à história dos judeus. Há dois Talmudes: o da Palestina, escrito entre os séculos 3 e 5, e o da Babilônia, concluído no fim do século 5.

[4] Falado pelos judeus da Europa oriental, o ídiche é uma língua eslavo-germânica, com palavras vindas do hebraico

Shlomo Sand é historiador, professor da Universidade de Tel-Aviv e autor de Comment le peuple juif fut inventé (Como foi inventado o povo judeu), Paris, Fayard, 2008
Se não queres que riam de teus argumentos , porque usas argumentos risíveis ?

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Offline West

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #1 Online: 17 de Outubro de 2008, 11:07:47 »
Diante da tão conhecida história oficial, muída e remuída, que aprendemos nos livros de escola, essa nova versão torna-se até difícil de aceitar.

Contudo, se analisarmos friamente a história, chegamos a velha conclusão de que ela é mera criação humana, que nem sempre (na maioria das vezes) reflete a realidade dos fatos, estando inevitavelmente contaminada pela parcialidade (ainda que inconscientemente) e subjetivismo de quem a relata.

Se essa é for realmente a versão mais próxima da verdeira origem dos jedeus, de tão discordante que é da oficial, a que ponto devemos confiar na história?
"Houve um tempo em que os anjos perambulavam na terra.
Agora não se acham nem no céu."
__________
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"Acerca dos deuses não tenho como saber nem se eles existem nem se eles não
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Entres elas, o fato de que eles nunca aparecem."
__________
Protágoras.Ensaio sobre os deuses. Séc. V a.C.

Offline André Luiz

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #2 Online: 17 de Outubro de 2008, 11:47:42 »
Que é a história senão uma fábula em que todos concordam?" (Napoleão Bonaparte)

Offline Apolo

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #3 Online: 24 de Dezembro de 2008, 23:39:46 »
Como se mito fosse falseavel por carbono-14.

História pra boi dormir.

Não conheçe nada de genese, não conheçe nada de mitologia, não conhece nada de religião: Apenas pensamento moderno circunscrito num fragmento de século.

Offline Eremita

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #4 Online: 26 de Janeiro de 2009, 21:33:33 »
A minha pergunta é a seguinte.

Testes genéticos em populações judaicas revelam o quê? Algum grau de parentesco com egípcios (o que sugere que eles tiveram no Egito e saíram)? Muito parentesco (o que quer dizer que nunca saíram da esfera egípcia)? Ou apenas o esperado de dois povos afro-asiáticos?

De preferência, seria bom fazer testes com iraquianos, pra comparar. Pra mim, a população local é apenas uma dissidência de Ur (exceto os que vieram da Península Européia - meu palpite é que DNA diria que eles são na verdade alemães, franceses e eslavos com complexo de identidade étnica).

Outro detalhe: o hebraico tem algum empréstimo do demócrito, ou de outro idioma característico do Nilo? Se tiver, dá pra saber quando +- os hebreus estiveram lá (isso, se estiveram).
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Offline DDV

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #5 Online: 27 de Janeiro de 2009, 18:13:56 »
A minha pergunta é a seguinte.

Testes genéticos em populações judaicas revelam o quê? Algum grau de parentesco com egípcios (o que sugere que eles tiveram no Egito e saíram)? Muito parentesco (o que quer dizer que nunca saíram da esfera egípcia)? Ou apenas o esperado de dois povos afro-asiáticos?

De preferência, seria bom fazer testes com iraquianos, pra comparar. Pra mim, a população local é apenas uma dissidência de Ur (exceto os que vieram da Península Européia - meu palpite é que DNA diria que eles são na verdade alemães, franceses e eslavos com complexo de identidade étnica).

Outro detalhe: o hebraico tem algum empréstimo do demócrito, ou de outro idioma característico do Nilo? Se tiver, dá pra saber quando +- os hebreus estiveram lá (isso, se estiveram).


Eremita, os estudos mais recentes e consistentes mostram que os antigos hebreus (não os judeus modernos, muito menos os israelenses) são na verdade autóctones da Palestina, não são povos vindos de outra parte em um passado histórico definido.

Essas evidências arqueológicas mostram que sempre houve períodos cíclicos em que pastores nômades se fixavam nas montanhas centrais da Palestina e passavam a se dedicar à agricultura e, após um período médio de 1000 a 2000 anos, essas comunidades sedentárias se dissolviam e voltavam à vida nômade. Houve 3 ondas de sedentarização como essa desde o ano 3000 a.C, sendo a última onda (iniciada por volta do ano 1400 a.C) a que corresponde à formação dos antigos hebreus ou israelitas.

Toda a história dos hebreus antes do período macabeu é bastante obscura, o proprio Flávio Josefo (historiador judeu do século II a.C) parece admitir isso. As reconstruções mais precisas, baseadas na arqueologia, em documentos paralelos da época e em análises textuais da Bíblia apontam com um grau surpreendente de consistência que os textos bíblicos do antigo testamento, como conhecemos hoje, foram pela primeira vez escritos e compilados por volta do século VII a.C, baseados provavelmente em tradições orais. Porém, essa compilação foi oriunda de uma "revolução" de caráter religioso-nacionalista promovida durante o reinado de Josias, na qual o deus Iavé foi sistematicamente imposto como o único que deve ser adorado, no templo de Jerusalém, tentando acabar com todas as outras divindades que coexistiam entre o povo hebreu desde sua origem (havia na verdade um sincretismo entre diversas divindades. Em vários objetos de cerãmica da época, é comum encontrar coisas como Astarot sendo a esposa de Iavé, etc).

Esse movimento, postula-se, tinha também um objetivo pan-israelita: anexar todos os territórios do antigo Reino de Israel (cuja evidências mostram que sempre foi separado do Reino de Judá) ao Reino de Judá, aproveitando um vácuo deixado pela queda dos assírios. (daí histórias como a conquista de Canaã por Josué (Josias?) e o grande e próspero reino unificado de Davi e Salomão, que realmente existiram, mas não há evidência NENHUMA de obras grandiosas em suas épocas).

Todos os textos bíblicos, sejam ou não de história, foram escritos e moldados tendo essas duas ideologias em mente: a supremacia absoluta do deus Iavé sobre todos os demais, e o pan-israelismo. Nessa recosntrução, tudo o que fosse contrário ao moneteísmo foi insultado e demonizado ao extremo. Os reis que trouxeram mais prosperidade ao Reino de Israel (Onri, Acab e Jeroboão II) são satanizados e/ou tiveram suas realizações ignoradas, o o próprio Reino de Israel (muito mais próspero e rico do que Judá jamais foi) é colocado em segundo plano e minimizado.

O Egito e principalmente a Babilônia frustraram esses planos pan-israelitas. Data da época do exílio várias inserções no pentateuco e um acréscimo aos livros dos reis, de uma fonte literária completamente diferente das anteriores, na qual colocam os hebreus como tendo origem na Caldéia (provavelmente para atribuir uma origem "nobre" e "elevada" aos mesmos, visto que Ur era uma das cidades mais ricas e famosas da Cadéia na época) e na qual inserem uma "explicação" do porquê do exílio para a Babilônia (desobediênciaa Iavé, obviamente) e colocam um epílogo de esperança no final do livro dos reis (a reabilitação do rei Joaquim, ou seja, uma promessa de continuidade futura do reino de Judá).
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Offline Eremita

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #6 Online: 27 de Janeiro de 2009, 19:33:11 »
Ah, mas eu queria tanto que os hebreus fossem descendentes dos babilônicos... isso iria quebrar taaaaaaaaaanto a cara do pessoal que cita Apocalipse... :biglol:

Peraí. Isso não sugere que na verdade os descendentes dos hebreus sejam os próprios palestinos? Não é incomum um povo adotar o idioma imperial, e o hebreu era um idioma morto até pouco tempo atrás...
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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #7 Online: 27 de Janeiro de 2009, 19:58:59 »
Ah, mas eu queria tanto que os hebreus fossem descendentes dos babilônicos... isso iria quebrar taaaaaaaaaanto a cara do pessoal que cita Apocalipse... :biglol:

Peraí. Isso não sugere que na verdade os descendentes dos hebreus sejam os próprios palestinos? Não é incomum um povo adotar o idioma imperial, e o hebreu era um idioma morto até pouco tempo atrás...


É o mais provável. Os atuais palestinos são sim descendentes dos judeus que habitavam ali na época do império romano (não há relatos de deportação maciça dos judeus de lá pelos romanos, exceto, talvez, a elite político-econômica e religiosa), os atuais judeus são mais descendentes de alemães, poloneses e russos do que outra coisa.  :)
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Offline Eremita

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #8 Online: 27 de Janeiro de 2009, 20:04:04 »
Então eu tava certo... judeu é europeu com complexo de identidade étnica :biglol:

...será que o mais relevante, dos dois, na guerra, é a)a etnia ou b)a religião?
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Offline André Luiz

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #9 Online: 28 de Janeiro de 2009, 09:08:09 »
Mas os hebreus nao foram expulsos em massa pelos romanos apos a derrota de Bar Kochba ?

E qual foi o impacto dos cruzados na composição étnica dos povos daquela região?

Offline DDV

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #10 Online: 28 de Janeiro de 2009, 09:47:22 »
Mas os hebreus nao foram expulsos em massa pelos romanos apos a derrota de Bar Kochba ?

E qual foi o impacto dos cruzados na composição étnica dos povos daquela região?


Os romanos despovoaram mesmo toda a judéia, trazendo habitantes novos para lá?
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Offline André Luiz

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #11 Online: 28 de Janeiro de 2009, 10:11:43 »
Mas os hebreus nao foram expulsos em massa pelos romanos apos a derrota de Bar Kochba ?

E qual foi o impacto dos cruzados na composição étnica dos povos daquela região?


Os romanos despovoaram mesmo toda a judéia, trazendo habitantes novos para lá?

Provavelmente sim, pelo numero de mortos

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Muitos dos fortes rebeldes tinham sido engenhosamente construídos subterraneamente, tornando-os quase impossíveis de se localizar. Mas, gradualmente, um a um, as legiões seguiram as suas pistas e destruíram-nos — 50 dos mais importantes esconderijos foram destruídos, segundo Cássio Dio, que também diz que 985 vilas judias foram destruídas na campanha e 580 mil judeus mortos pela espada, com muitos mais a morrer de fome.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolta_de_Bar_Kokhba

Offline yud

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #12 Online: 28 de Janeiro de 2009, 13:57:44 »
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E os defensores desse relato linear e indivisível não mobilizam apenas o ensino de história: eles convocam igualmente a biologia. Desde os anos 1970, uma sucessão de pesquisas “científicas” israelenses se esforça para demonstrar, por todos os meios, a proximidade genética dos judeus do mundo inteiro. A “pesquisa sobre as origens das populações” representa hoje um campo legítimo e popular da biologia molecular, e o cromossomo Y masculino ganhou um lugar de honra ao lado de uma Clio judia na busca desenfreada pela unicidade do “povo eleito”.

Essa prática me lembra tanto o Nazismo, e não entendo essa necessidade ideológica de provar a existência de uma "unidade étnica". Um desperdício de tempo de pesquisa.
"You may bury my body, down by the highway side
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Offline Eremita

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Re: Gênese do povo judeu
« Resposta #13 Online: 29 de Janeiro de 2009, 02:41:39 »
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E os defensores desse relato linear e indivisível não mobilizam apenas o ensino de história: eles convocam igualmente a biologia. Desde os anos 1970, uma sucessão de pesquisas “científicas” israelenses se esforça para demonstrar, por todos os meios, a proximidade genética dos judeus do mundo inteiro. A “pesquisa sobre as origens das populações” representa hoje um campo legítimo e popular da biologia molecular, e o cromossomo Y masculino ganhou um lugar de honra ao lado de uma Clio judia na busca desenfreada pela unicidade do “povo eleito”.

Essa prática me lembra tanto o Nazismo, e não entendo essa necessidade ideológica de provar a existência de uma "unidade étnica". Um desperdício de tempo de pesquisa.
Por meu lado, acho isso interessante por ajudar a entender até aonde a coesão religiosa é mais ou menos capaz de forjar uma etnia que as populações genéticas. E só.
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