Autor Tópico: Resgatando a ética das mãos da religião  (Lida 1767 vezes)

0 Membros e 1 Visitante estão vendo este tópico.

Offline Eleitor de Mário Oliveira

  • Nível 37
  • *
  • Mensagens: 3.502
  • Sexo: Masculino
    • Lattes
Resgatando a ética das mãos da religião
« Online: 08 de Fevereiro de 2009, 14:34:53 »
Abro este tópico com o objetivo de minar a argumentação teísta de que a moralidade provém da religião. Espero contar com a ajuda dos demais foristas.

Inicio o tópico com um texto de Simon Blackburn analisando o diálogo Êutífron, de Platão.


Citação de: Simon Blackburn

Contra a teoria ética dos mandamentos divinos
por Simon Blackburn
Universidade de Cambridge



O desafio clássico à ideia de que a ética pode ter um fundamento religioso é fornecido por Platão (c. 429-347 a.C.), no diálogo conhecido como Êutífron. Neste diálogo, Sócrates, que está prestes a ser julgado por impiedade, encontra um tal Êutífron, que se apresenta como alguém que sabe exactamente o que é a piedade ou a justiça. De facto, Êutífron está tão seguro de si mesmo que está prestes a instaurar uma acção contra o seu próprio pai por ter causado uma morte.

Citar
ÊUT. Sim, eu diria que o que os deuses amam é pio e sagrado, e que o oposto, que eles odeiam, é ímpio.

SÓC. Devemos investigar a verdade disso, Êutífron, ou aceitar simplesmente a mera afirmação com base na nossa própria autoridade, ou na autoridade alheia? Que dizes?

ÊUT. Devemos investigar; e penso que a afirmação irá resistir ao teste da investigação.

SÓC. Assim o veremos, meu bom amigo, já de seguida. O primeiro aspecto que eu gostaria de começar por compreender é se o pio ou sagrado é amado pelos deuses por ser sagrado, ou se é sagrado por ser amado pelos deuses.


Uma vez colocada esta questão Sócrates não tem dificuldade em chegar a uma das suas alternativas:

Citar
SÓC. E que dizes da piedade, Êutífron? Não será a piedade, de acordo com a tua definição, amada por todos os deuses?

ÊUT. Sim.
SÓC. Por ser pio ou sagrado, ou por outra razão?

ÊUT. Não, a razão é essa.

SÓC. É amado por ser sagrado, e não é sagrado por ser amado?

ÊUT. Sim.

SÓC. E o que é apreciado pelos deuses é por eles amado e está num estado que lhe permite ser por eles amado?

ÊUT. Sem dúvida.

SÓC. Então o que é apreciado pelos deuses, Êutífron, não é sagrado, nem o que é sagrado é amado pelos deuses, como afirmas; mas estas são duas coisas diferentes.

ÊUT. Que queres dizer, Sócrates?

SÓC. Quero dizer que reconhecemos que o sagrado é amado por Deus por ser sagrado, e não que é sagrado por ser amado.

A ideia é que Deus, ou os deuses, não devem ser concebidos como algo arbitrário. Os deuses têm de ser encarados como seres que seleccionam as coisas certas para permitir e proibir. Têm de captar o que é sagrado ou justo, exactamente como nós o fazemos. Eles não podem fazer isto simplesmente por serem poderosos, ou por terem criado tudo, ou por terem o dom de prescrever castigos horríveis e recompensas deliciosas. Isso não faz deles bons. Além disso, obedecer aos seus mandamentos só por causa do seu poder seria servil e interesseiro. Suponha-se, por exemplo, que eu tenho em mente fazer algo mau, como trair a confiança de alguém. Não basta que eu pense «Bom, vejamos, os ganhos são estes, mas agora tenho de ter em conta a hipótese de Deus me castigar fortemente se eu o fizer. Por outro lado, Deus é indulgente e é bastante provável que eu o consiga trapacear através da confissão, ou arrependendo-me mais tarde, à hora da morte…» Estes não são os pensamentos de quem tem um bom carácter. Quem tem um bom carácter é de esperar que pense «Seria uma traição, por isso não o vou fazer». Fim da história. Entrar numa análise de custo-benefício religioso é, numa expressão que o filósofo moral contemporâneo Bernard Williams tornou famosa, ter «um pensamento a mais».

Assim, o desvio pelos caminhos de um deus externo parece pior do que irrelevante. Parece distorcer a própria ideia de um padrão de conduta. Como o filósofo moral Immanuel Kant (1724-1804) afirma, encoraja-nos a agir de acordo com uma regra, mas apenas por medo do castigo ou por causa de outro incentivo qualquer; mas o que realmente queremos é que as pessoas escolham agir por respeito com a regra. Isto é o que a verdadeira virtude exige.



Offline uiliníli

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 18.107
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #1 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 15:02:08 »
Escrevi muito sobre isso em meu blog. Um dos textos eu já postei aqui, que foi minha carta ao Ombudsman da Folha de São Paulo, outro é um em que critico o argumento de que o temor a Deus seria essencial à ética:

A ordem pelo medo

Frequentemente nos deparamos com o batido argumento de que sem Deus não há moral. Geralmente os teístas formulam a questão alegando que sem Deus não há um parâmetro ético absoluto, ao que eu costumo responder mencionando que nossa moral se baseia no princípio de que todo ser humano têm um valor intrínseco que independe da existência ou não de Deus (Vejam os postas "Artigo preconceito na Folha de São Paulo" e "Artigo preconceituoso na Folha (II)").

Entretanto recentemente fui pego de surpresa por uma formulação diferente do argumento baseada não na ética exatamente, mas antes no medo:


Citar
"Não é por nada não, mas uma pessoa que acredita em Deus e mata, ou não acredita nele, e portanto acredita que não será julgado por isto, ou acredita, fazendo desdém da justiça divina, que basicamente é também uma forma de não se acreditar em Deus.
Qualquer religião condena o assassinato, então a pessoa para ser assassino deve primeiro ser ateu para cometer isto, o que não significa que todo ateu comete tais atos."


O autor aqui inverte o argumento tradicional: ele não diz que todo ateu é ou poderia ser assassino, ele diz é que todo assassino é ateu, em outras palavras, se todas as pessoas cressem sinceramente em Deus, não haveria assassinatos. Bom, sem contar os casos óbvios de pessoas que matam em nome da fé, que poderiam ser considerados fatos excepcionais, como argumentar contra isso? Dizer que a maioria da população carcerária ainda é de cristãos não faria muito efeito, ainda poderiam dizer que o cristão antes de cometer o assassinato vira ateu e depois dele, quando se arrepende, volta a ser cristão de novo. ("Provas? Evidências?" eu vou chegar nessa parte depois...)

Bom, eu não sou um assassino e nem pretendo ser. Tampouco sou psicólogo especializado em como funciona a cabeça de um assassino, ainda mais de um assassino que acredita que será punido após a morte pelo seu ato. Mesmo assim tenho duas hipóteses: a primeira é que ele simplesmente não pensa no assunto. A segunda é que ele ainda acredita que pode ser perdoado. Vamos discutir a segunda somente:

Todo cristão sabe que é pecador e que não pode viver uma vida imaculada, o único ser humano (?) perfeito foi Jesus. Sendo assim, a salvação só é possível porque Deus perdoa tudo, desde as pequenas faltas até os maiores pecados, contanto que você se arrependa sinceramente e tenha fé. De fato, muitas igrejas cristãs pregam que a fé é o único caminho para a salvaçãao, independente das boas obras. Outras dão valor às boas obras e à fé, e elas também reconhecem o perdão mesmo para os atos mais hediondos. Poucas são aquelas que admitem somente as boas obras como requisito para a salvação, portanto, é defensável que os cristãos que matam creiam que poderão compensar o assassinato através da fé e do arrependimento tardio, ou até que imaginem Deus possa entender os seus motivos (quem sabe Deus não seja um relativista?)

O argumento acima pode ser útil para discussões tête-à-tête, ao vivo, quando você não tem os infinitos recursos da internet à mão para resolver a discussão com algo mais eficiente do que argumentos: as evidências. De fato eu só perdi tempo comentando a questão do perdão para dar uma resposta mais amigável e satisfatória ao nosso interlocutor, pois para falar a verdade, nós não tínhamos nenhuma obrigação de responder o argumento de que 'para ser assassino é preciso ser ateu' para começo de conversa. Isso porque essa afirmação é verificável e, portanto, quem a invoca tem o ônus da prova. Teríamos todo o direito do mundo de em vez de responder calma e pacientemente simplesmente perguntar "Provas? Evidências? Estatísticas? Cadê?"

Teríamos o direito de respoder assim, com outra pergunta, curto e grosso. Mas será que deveríamos? Eu, pessoalmente, acho que não. Existem, infelizmente, muitos preconceitos, muita desinformação sobre os ateus na sociedade. Cada conversa que temos sobre isso é uma oportunidade valiosa de fazer um pouquinho mais para tentar dissipar esse problema. Eu tento ser sempre tão paciente e simpático quanto possível com os teístas quando converso sobre ateísmo. Inclusive, já fiz muitos amigos assim, tanto que um dos meus melhores amigos é um católico carismático dos mais devotos. Claro que não consegui desconvertê-lo de sua religião, mas ao menos é uma pessoa a menos que vai achar que todo ateu é um monstro. Quem sabe um dia na igreja não comecem a falar mal dos ateus e ele diga "Olha, não é bem assim, eu tenho um amigo que é ateu e ele é um cara legal."

Por isso, acho saudável dar a eles o benefício da dúvida e, quando possível, aceitar até a inversão do ônus da prova. Como eu disse antes, com a internet à mão podemos desmontar essa teoria não com um reles argumento, mas com evidências. Encontrei recentemente no Atheist Nexus (comunidade virtual para ateus e agnósticos, apelidada carinhosamente de "o Orkut dos ateus," eu recomendo!) uma notícia de jornal que reproduzirei traduzida para o português logo abaixo. A notícia é de setembro de 2005, um pouquinho antiga, portanto, e diz que países mais religiosos tendem a ter índices maiores de assassinato, aborto, suicídio e promiscuidade sexual, todos ações condenadas pela maioria das religiões cristãs. Por mais que seja tentador jogar essas conclusões na cara dos teístas invertendo-se a acusação, porém, eu recomendo cautela! O artigo abaixo merece algumas críticas, que formularei mais adiante.

    Do The Times:

    27 de setembro, 2005
    Sociedades pioram 'quando têm Deus de seu lado'

    Por Ruth Gledhill

    A crença religiosa pode causar danos à sociedade, contribuindo com altas taxas de homicídio, aborto, promiscuidade sexual e suicídio, de acordo com pesquisa publicada hoje.

    De acordo com o estudo, crença e culto a Deus não apenas não são imprescindíveis para uma sociedade saudável, como também podem de fato contribuir com problemas sociais.

    O estudo contraria o ponto de vista dos crentes de que a religião é necessária para prover fundamentos éticos e morais para uma sociedade saudável.

    Ele compara a performance social de países relativamente seculares, como o Reino Unido, com os Estados Unidos, onde há mais crentes em um criador do que na teoria da evolução. Muitos conservadores evangélicos nos EUA consideram o darwinismo um mal à sociedade, pois creem que ele inspira o ateísmo e a amoralidade.

    Muitos cristãos liberais e crentes de outras fés sustentam que a crença religiosa é socialmente benéfica, acreditando que ela ajuda a baixar as taxas de crime violento, assassinato, suicídio, promisscuidade sexual e aborto. O benefício da crença religiosa à sociedade já foi descrito como seu "capital espiritual". Mas o estudo alega que a devoção de muitos nos EUA pode na verdade contribuir com todas essas mazelas.

    O artigo, publicado no Journal of Religion and Society, um periódico acadêmico dos EUA, reporta: "Muitos americanos concordam que sua nação carola é um caso excepcional, abençoado por Deus, uma cidade luminosa no alto de uma colina que se mantém como um exemplo impressionante para um mundo cada vez mais cético.

    "Em geral, altas taxas de crença e culto a um criador estão correlacionadas com taxas mais altas de homicídio, mortalidade juvenil e de jovens adultos, taxas de infecção por DST, gravidez de adolescentes e aborto nas democracias desenvolvidas.

    "Os Estados Unidos são quase sempre a mais disfuncional das democracias desenvolvidas, às vezes espetacularmente mais."

    Gregory Paul, o autor do estudo e cientista social, usou dados do Social Survey Programme, Gallup e outros institutos de pesquisa para atingir suas conclusões.

    Ele comparou indicadores sociais como taxas de homicídio, aborto, suicídio e gravidez na adolescência.

    O estudo concluiu que os EUA são a a única democracia próspera do mundo onde as taxas de homicídio ainda são altas, e as nações menos devotas foram as menos disfuncionais. Paul ainda disse que as taxas de gonorreia em adolescentes nos EUA eram cerca de 300 vezes maiores do que nos países democráticos menos devotos. Os EUA ainda sofriam de uma alta taxa de infecções por sífilis em adolescentes e adultos única entre os países desenvolvidos, conforme o estudo sugeriu.

    Segundo Paul, "O estudo mostra que a Inglaterra, apesar de todos os seus problemas sociais, está se saindo bem melhor do que os EUA na maioria dos indicadores, mesmo sendo uma nação bem menos religiosa do que a América."

    Ele disse que a disparidade era ainda maior quando os EUA eram comparados com outros países, incluindo França, Japão e os paíeses escandinavos. Estas nações foram as mais bem sucedidas em reduzir as taxas de homicídio, mortalidade precoce, doenças sexualmente transmissíveis e aborto, ele acrescentou.

    Paul atrasou o lançamento do estudo até agora devido ao Furacão Katrina. Ele disse que a evidência acumulada por uma grande quantidade de estudos sugere que a religião de fato pode contribuir com mazelas sociais. "Eu suspeito que os europeus repudiam cada vez mais a fraca performance social dos estados cristãos", ele acrescentou.

    Ele disse que a maioria das nações ocidentais se tornaria mais religiosa somente se a teoria da evolução pudesse ser derrubada e a existência de Deus provada cientificamente. Da mesma forma, a teoria da evolução não encontraria apoio majoritário nos EUA a não ser que houvesse um marcante declínio na crença religiosa, disse Paul.

    "As democracias não-religiosos, pró-evolução, contradizem a máxima que uma sociedade não pode gozar de boas condições a menos que a maioria dos cidadãos creiam ardentemente em um criador moral.

    "O medo generalizado de que sociedade sem Deus devem enfrentar um desastre social está, portanto, refutado."




A maior crítica que faço à notícia é quanto ao seu título, que dá a entender que maior crença religiosa implica em sociedades mais disfuncionais. Se a metodologia do estudo se limitou a comparar os EUA com outros países desenvolvidos do mundo, então não se pode chegar a essa conclusão. Os EUA são um país excepcional em muitos sentidos, de forma que não se pode estabelecer se a relação entre a religiosidade e seus indicadores sociais é de causação ou se é uma mera correlação aleatória. Por exemplo, os Estados Unidos são a única democracia desenvolvida a adotar um sistema presidencialista, em vez de parlamentarista, e nem por isso seria sensato culpar o presidencialismo pelas altas taxas de homicídio. Por que não foi feita uma comparação entre países mais religiosos da própria Europa, como Itália, Espanha e Portugal, com outros menos religiosos, como Suécia, França e Alemanha? Como diz o ditado, uma só amostra é má estatística, e não se pode concluir que a religião contribui com mazelas sociais com base somente no caso americano.

Se a notícia não permite concluir que a religião é socialmente ruim, ao menos ela permite uma conclusão que ainda é interessante para nós: altas taxas de religiosidade não impedem comportamentos socialmente nocivos, como o homicídio. Nem mesmo o ad hoc de afirmar que as pessoas deixam de acreditar em Deus ou na punição divina quando vão cometer um ato contraditório com as suas crenças se sustenta mais agora, pois como explicar que em um país altamente religioso como os EUA haja mais "ateus temporários" agindo contra os mandamentos de suas igrejas do que nos países desenvolvidos da Europa e no Japão, onde há muito mais ateus em tempo integral?

Se é que é possível tirar alguma conclusão, eu diria que o medo inspirado pela perspectiva da punição eterna não contribui para o bem estar pessoal e social tanto quanto a educação e o entendimento. O ateísmo tira de nós Deus como referência para os valores morais e como Grande Irmão cósmico, nos vigiando constantemente e nos punindo por nossas faltas. Porém, se engana quem pensa que no lugar fica só um grande vazio. Assim como a natureza, segundo Aristóteles, tem horror ao vácuo, o ser humano geralmente não se contenta com o niilismo. Assumimos então a responsabilidade de buscar referências não através da fé e do medo, mas da razão e do entendimento. E elas são muito mais fortes e sólidas.

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #2 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 18:22:30 »
Citar
Abro este tópico com o objetivo de minar a argumentação teísta de que a moralidade provém da religião.
Acho que isto basta: Há ateus e "sem religão" detentores de uma sólida moral, de um ótimo bom costume.


Nem moral, nem ética depende de qualquer crença. Só isto.



Moral: Que tem bons costumes. Conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada.

Offline Hugo

  • Nível 31
  • *
  • Mensagens: 1.917
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #3 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 22:42:40 »
Uso o argumento de David Hume na sua obra Tratado da Natureza Humana, em que ele afirma que a Moral é natural, isto é, não provêm da razão e sim, é inato ao ser humano:

"Portanto, visto que a moral tem influência nas ações e nas afeições, segue-se que ela não pode provir da razão; com efeito a razão, por si só, conforme já provamos, nunca pode ter tal influência. A moral desperta as paixões e produz ou impede as ações. A razão por si só não tem qualquer poder neste domínio. Portanto as regras morais não são conclusão da nossa razão." (Livro III, Parte I, Seção I-Tratado da natureza Humana)

Conclusão: somos morais naturalmente.
"O medo de coisas invisíveis é a semente natural daquilo que todo mundo, em seu íntimo, chama de religião". (Thomas Hobbes, Leviatã)

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #4 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 22:48:19 »
"somos morais naturalmente".

E para dar uma pitada a mais, gustave le bon: "O hábito é a segunda natureza que se sobrepõe a primeira".  :)

Offline uiliníli

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 18.107
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #5 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 22:49:31 »
Discordo dessa abordagem. Estou com Comte-Sponville, que sugere que inclinações naturais, mesmo quando são boas, não têm valor moral; a moral está justamente na escolha racional de agir contra nossas inclinações naturais quando elas são más ou egoístas ou favorecem a inércia.

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #6 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 22:55:42 »
"mesmo quando são boas, não têm valor moral"

Então teremos uma discussão semântica...? Então não existe uma moral natural, se é que entendi...? Acho que vamos ter que trabalhar com exemplos. Será que só há moral por contrariarmos algo ruim que exista em nós? :)

Offline uiliníli

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 18.107
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #7 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 23:07:42 »
É que se já temos uma inclinação para agir de maneira 'boa' nós não realizamos realmente uma escolha moral. Somos como um cachorro ou outro animal que realiza uma ação 'boa', mas pode-se dizer que um cão é moral? Creio que não, o cão age conforme seus instintos, ele não tem realmente uma escolha. Se agimos bem porque a bondade é nosso primeiro impulso, nós apenas seguimos a correnteza. A virtude verdadeira está na escolha, está em agir bem apesar das nossas tendências naturais.

Offline Hugo

  • Nível 31
  • *
  • Mensagens: 1.917
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #8 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 23:10:50 »
Acho que o uiliníli defende a moral Kantiana. Seria isso?

Kant, na Obra A Fundamentação da Metafísica dos Costumes, procura determinar o princípio suprema da moralidade e ele diz:

"Não é possível conceber coisa alguma no mundo, ou mesmo fora do mundo, que sem restrição possa ser considerada boa, a não ser uma só: uma boa vontade"

Conclusão: nossa razão, coragem, etc. não são boas em si, mas seu valor vai depender do uso que se faça delas.
"O medo de coisas invisíveis é a semente natural daquilo que todo mundo, em seu íntimo, chama de religião". (Thomas Hobbes, Leviatã)

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #9 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 23:17:09 »
Então é só questão de ponto de vista, já que a prática de tal ato - moral - é que será julgado.

Offline uiliníli

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 18.107
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #10 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 23:28:00 »
Acho que o uiliníli defende a moral Kantiana. Seria isso?

Kant, na Obra A Fundamentação da Metafísica dos Costumes, procura determinar o princípio suprema da moralidade e ele diz:

"Não é possível conceber coisa alguma no mundo, ou mesmo fora do mundo, que sem restrição possa ser considerada boa, a não ser uma só: uma boa vontade"

Conclusão: nossa razão, coragem, etc. não são boas em si, mas seu valor vai depender do uso que se faça delas.

Não exatamente a moral kantiana, mas minha moral certamente deve muito a Kant :ok: Kant pregava o dever moral acima de tudo, por exemplo, você deve dizer a verdade em qualquer situação, mesmo que seja para entregar um amigo que esteja em sua casa escondido de assassinos. Eu me identifico mais com o que Sponville chama de "ética da responsabilidade", que leva em consideração tanto as intenções quanto as consequências previsíveis de suas ações.

Eu não posso pensar em uma ética que seja independente da liberdade. Se a única coisa que conta são as consequências então uma jaca que cai na cabeça de um assassino ameaçando um inocente poderia ser considerada uma heroína.

Então é só questão de ponto de vista, já que a prática de tal ato - moral - é que será julgado.

Se você pensar só no julgamento dos outros, tudo bem. Mas você mesmo se julgaria moral se agisse corretamente pelas motivações erradas? Ou sem motivação alguma? A moral é como qualquer realização: você não tem méritos se não tiver realmente se esforçado e desejado o resultado que alcançou.


Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #11 Online: 08 de Fevereiro de 2009, 23:56:29 »
Citar
"Ou sem motivação alguma? A moral é como qualquer realização: você não tem méritos se não tiver realmente se esforçado e desejado o resultado que alcançou".

Concordo, apesar de ter feito algumas coisas sem motivação alguma... No caso em negrito, se um ato moral tiver que conter as duas coisas ao mesmo tempo (esforço e desejo), acho que devemos rever muitos dos nossos conceitos fálicos hehehe....  :hihi: Iria criticar, falando que poderia ter apenas um dos dois e ser um ato moral, mas aí estaria mais para hipocrisia do que uma moral....

No caso de haver "moral natural", mesmo que não tenha um exemplo em mente agora, é como falei: Pode ser modificada com o hábito. Acho que David Hume, citado pelo Hugo, percebeu isto quando diz "Portanto, visto que a moral tem influência nas ações e nas afeições, segue-se que ela não pode provir da razão; com efeito a razão, por si só. Ações movidas pelo meu instinto pode ser uma moral válida, já que, naquele intervalo mínimo de tempo, eu desejei e me esforcei para salvar alguém, por exemplo. Isto seria uma exemplificação de uma "moral natural", concorda que seria uma moral válida?


Offtopic: Eu passei quase dez anos para enviar essa mensagem.... Eu tô lesaaaaaado, hoje......

Offline uiliníli

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 18.107
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #12 Online: 09 de Fevereiro de 2009, 00:15:43 »
Esse caso seria o de um esforço físico, Mussain. Fazer um esforço físico para se obter um fim que é de seu interesse direto é o mínimo que se espera de uma pessoa saudável.

A não ser que você precisasse ter lutado contra o medo ou contra a indiferença, não sei se podemos considerar moral lutar por um fim que seja de seu interesse - pelo menos não é algo que consideraríamos tão moral quanto uma ação desinteressada. O esforço a que eu estava me referindo era antes um esforço de caráter, um esforço mental, um esforço de liberdade para superar nossas resistências naturais - como o medo e a indiferença, que já citei antes.

Quem está agindo moralmente: o médico que salva uma vida durante seu expediente, afinal, esse é o trabalho dele; ou o médico que se arrisca para salvar uma vida mesmo "à paisana", fora do seu expediente, sem ganhar nada em troca?

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #13 Online: 19 de Fevereiro de 2009, 10:46:48 »
Putz.... Acho que demorei um pouco...... E nem sei se deu pra entender a mensagem anterior....... Mas continuando:

O segundo, acho. Ele não tem obrigação de salvar ninguém, mas mesmo assim se dispôs a fazÊ-lo. Mas.... O que vc quis dizer com isto?

Offline Memphis Belle

  • Nível 20
  • *
  • Mensagens: 653
  • Sexo: Feminino
  • O Amor vence todos os obstáculos !
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #14 Online: 19 de Fevereiro de 2009, 15:28:58 »
Dante e demais colegas, como teísta que sou  e já tendo pertencido durante anos a fio à religião católica, digo sem medo de errar ou generalizar.A religão católica não tem ética, somente pessoas ligadas a ela e de modo muitro singular é que a possuem.E a isso, eu estendo outras tantas religiões.
Que os religiosos de plantão lancem a primeira pedra :twisted:
"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele ou por sua origem, ou sua religião.
Para odiar, as pessoas precisam aprender.
E se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto.
A bondade humana é uma chama que pode ser oculta, jamais extinta."
(Nelson Mandela)

Offline Mussain!

  • Contas Excluídas
  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 8.228
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #15 Online: 19 de Fevereiro de 2009, 15:42:28 »
Para mim qualquer religião que afirme "vc vai para um lugar cheio de fogo, dor e tortura eterna se não crer no que digo" não é digna de respeito........ Só serve para separar multidões e iludir com falsas promessas........

Offline lusitano

  • Nível 35
  • *
  • Mensagens: 2.886
  • Sexo: Masculino
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #16 Online: 25 de Março de 2009, 17:49:38 »
Caríssimos:

Numa sociedade - seja ela qual for - todas as crianças são submetidas a um programa educativo. E isso inclui naturalmente, todos os valores éticos e morais existentes na mesma. Só dessa forma é possível haver compatibilidade e "convivência harmoniosa", entre os diferentes individuos nela existentes.

__________________________________________________________
especulativamente - artur.
Vamos a ver se é desta vez que eu acerto, na compreensão do sistema.

_______________________________________
Especulando realismo fantástico, em termos de
__________________________
paralogismo comparado - artur.

Offline Bruno Coelho

  • Nível 04
  • *
  • Mensagens: 40
Re: Resgatando a ética das mãos da religião
« Resposta #17 Online: 05 de Abril de 2009, 00:02:09 »
Os valores moral a serem cultivados devem ser desatrelados da religião o quanto antes , ter uma vida ética  buscando um bem comum se livrando dos dogmas.

 

Do NOT follow this link or you will be banned from the site!