O mito da neutralidade científica 
JAPIASSU, H 
 
O saber especializado desperta a admiração temerosa por parte daqueles que 
o ignoram. Há todo um respeito admirativo em relação à linguagem científica 
dotada de uma universalidade de direito, habilmente restringida aos 
iniciados. Seu esoterismo protege o segredo, sobretudo pela matematização 
e pela formalização. O poder de dominar a matéria e de fazer coisas, da 
ciência, acarreta, nos não-iniciados, uma atitude de submissão. E é por isso, 
igualmente, que muitos vêem nos cientistas os detentores do “magistério da 
realidade”: só eles estão habilitados a dizer o sentido, a propor a verdade 
para todos, como se fossem taumaturgos ou verdadeiros alquimistas. O que 
se pede a eles, através das vulgarizações, é muito menos um complemento 
de informações do que a forma presente das questões últimas, pois as 
antigas respostas teológicas foram desprestigiadas. Os cientistas são vistos 
como se fossem os proprietários exclusivos do saber, devendo fechar todas 
as “cicatrizes do não-saber” e fornecer os bálsamos para as angústias 
individuais e sociais. 
Essa imagem mítica do cientista ignora que ele faz parte e depende de uma 
estrutura bem real do mundo que o cerca. O mundo científico nada tem de 
ideal, não é uma terra de inocência, livre de todo conflito e submetida apenas 
à lei da verdade universal, isto é, de uma verdade testável e verificável em 
toda parte, através do respeito aos procedimentos de rigor e aos protocolos 
da experimentação. Como se o cientista pudesse ser o detentor de uma 
verdade una que, uma vez formulada em sua coerência, estaria isenta da 
discussão; e como se ele pudesse guardar para sempre a imagem de um 
indivíduo sempre íntegro e rigoroso, jamais sujeito à incoerência das paixões. 
 
JAPIASSU, H. O mito da neutralidade científica. Rio de Janeiro: Imago, 1975. 
p. 116.  
Recebi esse texto na minha aula de filosofia, com a tarefa de comentá-lo. É mole?