Autor Tópico: Arqueologia e responsabilidade  (Lida 1076 vezes)

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Arqueologia e responsabilidade
« Online: 29 de Março de 2009, 16:29:14 »
Arqueologia e responsabilidade

Nos últimos anos a arqueologia tem se transformado profundamente, mas não em seus aspectos “científicos”. Nenhuma grande teoria surgiu, nenhum método revolucionário, nenhuma descoberta de “arromba”, mas, mesmo assim, a arqueologia vem mudando.

Há alguns dias um amigo meu, professor universitário, me chamou para um café. No bate papo me contou que um grupo de professores de uma universidade pública paulista pretende abrir um curso de graduação para formar arqueólogos. Ele, como “consultor” do projeto veio conversar comigo a respeito da carreira e do “mercado de trabalho” para o arqueólogo no Brasil, pois, embora não seja uma arqueólogo de formação, trabalho há vários anos na área.

Fiz para ele um breve comentário a respeito das mudanças na carreira e o quanto isso está associado às mudaças do mundo em geral, sobretudo em seus aspectos sociais.

Diferentemente das ciências “duras” a arqueologias é uma ciência que vive do contato com os povos. Apesar de estudar culturas que existiram há muito tempo, as vezes milhares de anos, a arqueologia vive profundamente no contato e do contato com povos distintos.

Até algumas décadas o arqueólogo, diante de um desconhecimento e da insipiente valorização do “patrimônio cultural”, podia se deslocar para quase qualquer parte do planeta, realizar suas escavações contratando locais por preços modicos e retornar tranquilamente para sua universidade sem ter que dar maiores esclarecimentos para ninguém.

A primeira mudança ocorreu quando os países passaram a adotar medidas mais rígidas no controle de seu patrimônio histórico e arqueológico, o que se fez em função de um processo de valorização do mesmo.

Em verdade os arqueólogos jamais se preocuparam realmente com a dimensão ética de seu trabalho por conta própria, sempre que o fizeram foi em função de pressões externas. A mudança nas legislações nacionais a respeito do patrimônio foi a primeira dessas circunstâncias, obrigando os cientistas a se questionarem a respeito do direito dos povos em manter sua própria memória, materializada em objetos.

Mas a coisa se complicou exponencialmente depois disso.

Quando os “profetas da globalização” e da “pós-modernidade” surgiram decretando o fim das utopias, das identidades, dos países, enfim, do mundo como o conhecíamos, a primeira - e apressada - conclusão foi a de que os povos do mundo todo se tornariam uma geléia geral de imitadores baratos da cultura estadosunidense. Já estavam prevendo que Mickey Mouse e hamburgueres seriam encontrados e adorados em aldeias nanbikwaras, em utus e tutsis, entre uigures, nepaleses, tibetanos ou quechuas.

Mas isso não ocorreu. Ao menos não tão simplóriamente assim e não com os resultados “pacificadores” esperados.

Com a difusão dos meios de comunicação e do acesso a meios não controlados de informação os povos que eram tidos como “em extinção” passaram a acompanhar toda sorte de questionamento a respeito dos poderes dagrandes indústrias e dos países. Junto com a diversão barata produzida nos EUA chegaram também as discussões em fóruns sociais, informações sobre organizações sociais, sobre disputas judiciais em defesa dos direitos humanos, ambientais e afins, o que gerou um efeito cascata entre os povos “tradicionais”.

O resultado para a arqueologia foi uma porta fechada, ou bastante mais restrita.

Grande parte das escavações ocorre em áreas que pertencem a povos tradicionais, ou o que é escavado se remete aos seus antepassados. Deste modo, diante de décadas de indiferença com os problemas das populações vivas, os arqueólogos passaram a ter problemas para pesquisar os mortos.

Do mesmo modo as populações se deram conta de que o patrimônio lhes pertence, que suas identidades estão intimamente ligadas a ele e que não pode dispor dele de modo aleatório. Compartilhar talvez, quando a parceria é boa para ambos - pesquisadores e comunidades - ceder indistintamente provavelmente nunca mais.

E foi o que disse para meu amigo professor: o profissional que hoje sentimos falta não é do “escavador”, do “técnico em arqueologia”. Esse profissional é útil em trabalhos relativamente simples, como em salvamentos em áreas que serão inundadas, ou por onde passarão estradas. O profissional do qual carecemos é o “mediador de conflitos” e “gestor de patrimônio”.

Ou seja, um profissional mais próximo às comunidades, capaz de entender suas demandas e diante de inúmeros protagonistas conseguir ajudar na solução dos conflitos, garantindo o uso responsável do patrimônio.

Recentemente povos andinos reinvindicaram o direito de utilizarem para suas plantações sistemas de irrigação construidos em tempos dos incas. E por que não? Eles são os legítimos descendentes desse povo. O arqueólogo, ou o historiador, tem que atuar nessa situação como um mediador e com um tanto de humildade para reconhecer que a ciência é apenas uma dimensão a ser observada.

Mas, infelizmente, o caminho parece ser longo e as soluções distantes. A maioria dos cursos insiste em formar profissionais para uma carreira absolutamente afundada no autismo acadêmico, incapaz de interagir com a sociedade, indiferente às demandas do outro e arrogante em sua defesa científica.

Alguns bons exemplos surgem aqui e acolá, mas ainda é muito pouco.

http://colunistas.ig.com.br/indianasilva/2009/03/28/arqueologia-e-responsabilidade/

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Re: Arqueologia e responsabilidade
« Resposta #1 Online: 13 de Abril de 2009, 13:47:38 »
Bom mesmo era o Indiana Jones
Não sobrava  nenhum sítio arqueológico por onde ele passava.

 

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