Especial: "Tetris" 25 anosHá 25 anos um matemático russo que na época trabalhava em um laboratório de pesquisa computacional na União Soviética criou um game de quebra-cabeças tão viciante que em pouco tempo contaminaria o mundo e ditaria tendências por anos na indústria dos videogames. Alexey Pajitnov, no alto de seus 29 anos, havia criado o “Tetris”. O game tornou o Game Boy, da Nintendo, um estrondoso sucesso comercial e pavimentou o caminho para outros jogos do gênero, como “Bejeweled” e “Peggle”.
Hoje, 125 milhões de cópias vendidas depois – uma impressionante marca de 5 milhões ao ano – Tetris é reconhecido como fenômeno cultural no mundo inteiro, deu origem a uma infinidade de cópias e adaptações e pode ser considerado como o marco de nascimento do mercado de games casuais. Apesar da longevidade, o game sobrevive firme e forte em telefones celulares, online em comunidades com o Facebook e até em fliperamas, jogado tanto por fãs que ainda teimam em desafiar a queda de blocos desde sua infância quanto por novos adeptos.
Alexey PajitnovContatos imediatos com quatro blocosSe você acaba de aterrissar no planeta Terra e nunca ouviu falar de “Tetris”, não se desespere: ele é bem simples de entender para qualquer evoluído – de polegar opositor ou não. Sua mecânica de jogo consiste em grupos de até quatro blocos, em diversas formas e cores, que caem verticalmente do alto da tela. Os blocos devem ser rotacionados e ordenados para encaixar quando chegam ao fundo, deixando o mínimo possível de espaços vazios. Assim que uma linha é formada, as peças desaparecem e abrem espaço para novos blocos serem encaixados.
Mas apesar da aparente simplicidade, “Tetris” pode ser um jogo extremamente difícil de dominar, devido principalmente à sequência de formas randômicas em que os blocos aparecem. Também não ajuda o fato da velocidade do jogo aumentar nas fases subsequentes, tornando ainda mais difícil manter sua tela limpa para receber novos blocos. O game não possui final: teoricamente, um jogador experiente poderia jogá-lo eternamente, tornando-o um ótimo passatempo se algum dia a humanidade resolver arremessar astronautas a esmo para explorar o espaço.
PentominoSinal dos tempos“Tetris” pode ser destacado como um dos raros produtos culturais advindos da União Soviética que conseguiu conquistar o Ocidente durante a Guerra Fria. O ritmo viciante de sua corrida pela realização de tarefas consecutivas contra o tempo é considerado um sinal dos tempos que viriam, observado hoje, por exemplo, na constante manutenção das caixas postais de email ou atualizações de Twitter. Como escreveu a professora Janet Murray, da universidade do Texas, “o game mostra o constante bombardeamento de tarefas que demandam nossa atenção e que precisamos de alguma maneira encaixá-las em nossos já atolados calendários, sempre limpando nossas mesas e abrindo espaço para o próximo massacre”.
Outra semelhança com as tarefas do cotidiano moderno é a aleatoriedade em que as formas dos blocos aparecem, o que torna o game completamente imprevisível. Tanto que pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts – ou MIT – determinaram em 2002 que o potencial de combinações do game é tão vasto que seria impossível até mesmo para um computador calcular o melhor lugar para encaixá-los em sua queda. O jogo é louvado na área da ciência da computação por sua elegância matemática, o que provavelmente pode ser creditada à experiência de seu criador.
Alexey Pajitnov era pesquisador da Academia Científica de Moscou na década de 80, e trabalhava em projetos de inteligência artificial e sistemas de reconhecimento automático de voz. Em seu tempo livre, desenvolvia jogos para o computador pessoal Elektronica 60. No dia 6 de junho de 1984 completou o game “Tetris”, inspirado no jogo de quebra-cabeças Pentomino.
“Por toda a minha vida fui aficionado por quebra cabeças, enigmas matemáticos e brincadeiras do tipo”, disse Pajitnov em entrevista recente em Moscou, na Rússia. Segundo ele, “Tetris” foi apenas um dos jogos que ele programou na época. Os outros títulos há muito foram esquecidos.
"Tetris" no Game BoyCortina de ferroApós sua criação, o código base de “Tetris” foi distribuído pelo matemático entre colegas, e rapidamente o game espalhou-se pela círculo de pessoas que possuíam computadores na época em Moscou. Quando eventualmente chegou ao Ocidente logo chamou a atenção de empresários, que começaram lançar versões de “Tetris” para computadores caseiros, dando início a uma epopeia de batalhas judiciais pelos direitos comerciais sobre o jogo.
Para complicar ainda mais, a União Soviética não permitia o sustento de negócios privados, o que levou o Estado a manter os direitos de licença sobre o jogo, e privando Pajitnov de todos os lucros. “No momento em que percebi que gostaria que o game fosse lançado, eu entendi que o poder soviético iria ou me ajudar ou nunca deixar isso acontecer”, disse o matemático.
O Ministério de Exportação de Software e Hardware russo controlou os direitos de licença de “Tetris” por mais de dez anos, finalmente transferindo-os de volta a Pajitnov em 1996, que hoje, aos 54 anos, é um dos donos e co-fundadores da empresa “Tetris Company”, que detém os direitos sobre o jogo ao redor do mundo.
“Não me considero um guru. Sou apenas um simples designer de games que teve muita sorte ao criar um bom jogo. Não tenho nenhuma mensagem séria pra passar, apenas que possuo grande admiração por qualquer trabalho original”, diz Pajitnov, que já foi congratulado com diversos prêmios de honra pela indústria de videogames.
O estrelato via portabilidadeUma das empresas que saíram beneficiadas das batalhas judiciais pelos direitos de publicação de “Tetris” foi a Nintendo. Após a obtenção dos direitos sobre o jogo, a Nintendo atrelou o game ao seu novo dispositivo portátil, o Game Boy, em 1989.
A relação entre o videogame portátil e o jogo de quebra cabeças virtual foi simbiótica. O antigo Game Boy possuía um preço menor que seus concorrentes, pois utilizava uma tela monocromática e um processador de 8 bits, ambos inferiores aos concorrentes – que apresentavam telas LCD coloridas e processadores mais poderosos – mas possuía a vantagem de possuir uma bateria de maior duração. Mesmo assim, a Nintendo precisava atrelar alguma franquia de sucesso ao aparelho se quisesse distingui-lo de seus concorrentes.
Ao invés de apelar para as franquias mais conhecidas da empresa – “Super Mario”, “Donkey Kong” ou “Zelda” – a Nintendo buscava um game que qualquer pessoa pudesse jogar. A solução era Tetris, e com a ajuda do empresário norte-americano Henk Rogers – que ingressou em uma verdadeira odisseia para conseguir os direitos de publicação do game na Rússia – conseguiu disponibilizar o game de graça junto com o Game Boy em seu lançamento.
Com seus gráficos simples e jogabilidade desafiante, com apelo a um vasto público, “Tetris” era uma escolha perfeita para o Game Boy, pois podia ser jogado em qualquer quantidade de tempo, seja em uma fila de banco ou sentado em um ônibus na volta do trabalho – tornando-o ideal para a proposta portátil do aparelho. Segundo especialistas em história dos videogames, tampouco o Game Boy quanto o “Tetris” poderiam ter atingido o grau de sucesso internacional que conquistaram sem a ajuda um do outro.
O legado de “Tetris”Depois da passagem pelo portátil da Nintendo, “Tetris” foi adaptado para inúmeras plataformas e deu origem a uma infinidade de adaptações. O game é responsável por 10% das vendas de todos os games para celulares, estando também disponível para mais de trinta outras plataformas. Em julho de 2008, o game foi lançado para iPhone, tornando-se o aplicativo mais vendido para o aparelho nos primeiros três meses - e permanece até hoje na lista dos 10 aplicativos mais populares da empresa.
Henk Rogers, um dos co-fundadores da empresa Tetris Company, ao lado de Pajitnov e Minoru Arakawa – ex-presidente da Nintendo norte-americana – ainda não cansou de desenvolver versões de “Tetris”, e até hoje dedica boa parte de seu tempo à franquia. Várias dessas versões podem ser jogadas gratuitamente no site
Tetris Friends Online Games.
Pajitnov e Rogers comemoram todo ano o aniversário de “Tetris” tomando uma garrafa de conhaque russo. Segundo o Pajitnov, o game tem tudo para manter sua incrível popularidade por mais 25 anos. “Espero que sim, por que não? A tecnologia sempre está sofrendo mudanças, mas não posso dizer que as pessoas mudam.”
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