Autor Tópico: Economista Maldito  (Lida 661 vezes)

0 Membros e 1 Visitante estão vendo este tópico.

Offline Res Cogitans

  • Nível 14
  • *
  • Mensagens: 335
  • Sexo: Masculino
Economista Maldito
« Online: 16 de Julho de 2005, 18:22:03 »
SÉRGIO DÁVILA / Jornal Folha de São Paulo, 15/06/2005
 
 Em "Freakonomics", Steven Levitt relaciona o modo de operação de traficantes ao de uma rede de fast-food

Economista maldito. Esse é o epíteto de Steven J. Levitt, 38. Como na frase "Steven J. Levitt, economista maldito". Ele é autor de teses polêmicas, como a que conecta a legalização do aborto nos EUA nos anos 70 à queda na criminalidade duas décadas depois. Ou a comparação da estrutura empresarial de uma gangue de vendedores de crack de Chicago à rede de fast-food McDonald's. Ou a afirmação de que ter piscina em uma casa com crianças pequenas é mais perigoso do que ter uma arma de fogo na mesma casa.

Mas Levitt, professor da Universidade de Chicago, formado em Harvard e no MIT, tem outros epítetos mais agradáveis. O "Indiana Jones da economia", dado pelo "Wall Street Journal", por sua capacidade de mergulhar numa pilha de estudos, textos e números e de lá sair com uma tese surpreendente como as acima. Pela primeira vez, ele resolveu reunir tudo num livro, "Freakonomics", que está há sete semanas entre os três primeiros da lista do "New York Times" e chega nesta semana ao Brasil. Escrito em parceria com o jornalista Stephen J. Dubner, 41, do mesmo "Times", brinca com a expressão "Reaganomics", dada à política econômica do governo Reagan nos anos 80. A contração é das palavras "freak" (esquisito, em inglês) e "economics". Ganhador da prestigiosa medalha John Bates Clark, da Associação dos Economistas dos EUA, para o melhor entre seus pares com menos de 40 anos, Steven D. Levitt falou com exclusividade à Folha.

Folha - Por que juntar casos tão diferentes como a semelhança entre uma gangue de drogas e uma grande corporação e a relação do perigo de ter uma piscina e uma arma em casa num mesmo livro?
Steven D. Levitt - Os exemplos de "Freakonomics" são frutos da última década de minha pesquisa. Eu procurei muito até encontrar esses quebra-cabeças interessantes. Encontrei muitos e resolvi alguns deles. O estudo das gangues, por exemplo, começou por acaso, depois de um encontro casual com o um amigo que havia passado muitos anos estudando uma gangue de vendedores de crack em Chicago. Ele tinha uma coleção incrível de dados financeiros, mas não tinha idéia do que fazer com aqueles números. Já o estudo que fiz procurando responder à pergunta sobre o que é mais perigoso ter em uma casa com crianças -se uma arma de fogo ou uma piscina no quintal- começou a me interessar depois da trágica morte de meu filho de um ano, causada por meningite. Eu e minha mulher fizemos parte de um grupo de pais que procuravam lidar com a morte de seus filhos pequenos, e ali, ouvindo diversos relatos, fui atrás dos números. Concluí que é literalmente 100 vezes mais perigoso potencialmente ter piscina em casa do que uma arma, se você tem filhos pequenos.

Folha - Algumas críticas a seu livro dizem que os casos são muito interessantes, mas que o todo carece de unidade, de um fecho. Essa foi uma decisão sua? Se tivesse de escrever a conclusão, qual seria?
Levitt - Quando leio livros, gosto de aprender e gosto de boas histórias. Consigo determinar por mim mesmo o que quero de cada obra. Assim, não queria forçar um tema, mas sim deixá-lo sob a responsabilidade do leitor. Esse é um livro que tem histórias que eu espero que sejam interessantes para as pessoas, com casos comprovados por números, mas também é um livro divertido, que você pode discutir em festas e jantares. Isso é mais do que imagino que possa esperar de um livro.

Folha - A base de um dos casos que o sr. estuda é a legalização do aborto nos anos 70 e o efeito dessa decisão na queda da taxa de criminalidade durante os anos 90 nos EUA. Há um movimento forte hoje em dia no país tentando reverter esta decisão. Pelas suas contas, se isso acontecer, veríamos nova explosão no crime em 20 anos?
Levitt - Acho que, se Roe versus Wade for mesmo revertido e o aborto se tornar de novo ilegal, não, o impacto não seria muito grande. Isso porque ainda seria facultado aos Estados a decisão de fazer ou não abortos legalmente, e a maioria provavelmente manteria a legalidade. Mas, se realmente o ambiente social e moral, não as leis, tornar muito difícil fazer um aborto, especialmente para mulheres solteiras, jovens e pobres, não tenha dúvidas de que isso provocará um aumento na criminalidade.

Folha - Depois de ler o capítulo sobre as semelhanças estruturais entre a gangue de crack de Chicago e uma grande empresa norte-americana, é possível supor que essa similaridade também seria uma das razões pelas quais temos visto tantos casos de corrupção nas altas esferas e o boom de "contabilidade criativa" dessas empresas nos últimos anos?
Levitt - Nas empresas em que o incentivo principal é aumentar os lucros a qualquer custo, seja a do crack seja uma corporação legítima, há também grandes incentivos para corrupção, mentira e truques contábeis. É curioso como alguns acionistas ainda não perceberam isso quando buscam retorno rápido para seus investimentos. Isso posto, precisamos lembrar que apenas alguns casos de corrupção corporativa foram descobertos, apesar de terem sido extremamente noticiados pela mídia. Não acho que as corporações sejam particularmente desonestas, estas talvez representem 1% do que existe por aí.

Folha - Os casos narrados em seu livro podem ser vistos como um choque entre moral e economia, entre como gostaríamos que o mundo fosse e o que é de verdade?
Levitt - Sim.

Folha - Nesse sentido, um bom exemplo desse choque não seria a globalização tal como pensada nos anos 90? O pressuposto era o de que, diminuindo as barreiras entre os países, todos ganhariam. O que se vê, porém, é que os ricos ficaram mais ricos e os pobres devem mais.
Levitt - Não acredito que a globalização seja tão ruim quanto você faz crer. Muitos países pobres lucraram com ela, como os tigres da Ásia, a China e a Índia, que tiveram um crescimento econômico extremamente rápido. Acho que os povos da maioria dos países tendem a preferir a vida em um mundo globalizado, embora essa minha afirmação seja mais difícil de medir. Até as pessoas trabalhando por pouco dinheiro ou em trabalhos perigosos em fábricas preferem essa vida à opção de voltar a viver como camponeses miseráveis, creio.

Folha - Livros como o seu "Freakonomics" e "O Ponto de Desequilíbrio", de Malcolm Gladwell, inauguram um novo gênero? Algo como "economês para as massas" ou "economia de entretenimento"?
Levitt - O que o meu livro e os do Malcolm têm em comum é que ambos transformamos pesquisas científicas sérias e impenetráveis em textos muito acessíveis para o público normal e acho que fazemos isso contando ótimas histórias. Os livros dele estão entre os meus favoritos. Gostaria muito que houvesse mais livros tão bons assim nessa área.

Folha - O que o sr. acha da opinião de seu colega Jeffrey Sachs, que defende que os países ricos devem perdoar as dívidas dos países mais pobres e mesmo doar uma porcentagem maior de seu PIB a eles?
Levitt - Ouvi uma palestra dele na semana passada. Não sei se está certo ou não, mas Sachs é muito inteligente e um apaixonado por essa idéia, e eu respeito muito a luta dele para aliviar os problemas dos países pobres.

Folha - O fato de um popstar como Bono, da banda U2, ter abraçado a causa de Sachs ajuda ou atrapalha? Ele é famoso e bem-intencionado, o que pode atrair a atenção da mídia, mas não tem formação acadêmica, o que pode espantar seus colegas economistas.
Levitt - Bono fez provavelmente muito mais pelos países em desenvolvimento do que qualquer outra pessoa viva, por mais que essa idéia pareça uma loucura. Ele é um ótimo palestrante, sabe do que está falando. Sou um grande admirador dele e, se ele quisesse escrever o prefácio para o meu próximo livro, eu ficaria completamente honrado. Por algum motivo, no entanto, não vejo isso acontecendo.

Folha - E do que tratará seu próximo livro?
Levitt - Posso adiantar três dos temas de que estou tratando, mas não posso dar mais detalhes: quero entender como os congestionamentos de automóveis acabam, pretendo fazer a estatística ajudar a capturar terroristas e procuro saber o que faz as pessoas serem boas no que fazem.

Folha - O sr. não poderia incluir um capítulo sobre o Brasil, que descobrisse como conciliar crescimento econômico, divisão de renda e uma dívida pública que é mais da metade do PIB?
Levitt - Fui duas vezes ao Brasil, a convite de meu amigo Cláudio Haddad, do IBMEC. Aliás, ele fez a gentileza de escrever o prefácio para a versão em português de "Freakonomics" -como eu não consegui o Bono, o Haddad é uma ótima segunda opção (risos). Eu adoraria fazer uma pesquisa sobre como os direitos intelectuais são tratados no Brasil e sobre o crime em algumas áreas do Rio de Janeiro em que a presença da polícia é inexistente, mas nunca consegui encontrar dados suficientes para trabalhar.
"Conhecer a verdade não é o mesmo que amá-la, e amar a verdade não equivale a deleitar-se com ela" Confúcio

Offline Res Cogitans

  • Nível 14
  • *
  • Mensagens: 335
  • Sexo: Masculino
Re.: Economista Maldito
« Resposta #1 Online: 16 de Julho de 2005, 18:23:53 »
Angela Pimenta / Revista Exame, 15/06/2005  
 Em Freakonomics, o americano Levitt usa a teoria econômica para decifrar o cotidiano
Para a maioria dos mortais, estatísticas são um osso duro de roer, coisa que se lê apenas por obrigação. Não fazem parte de um livro que se leve para as férias ou que se dê de presente. Mas estatísticas são a personagem principal do mais original e inspirado livro de economia publicado nos últimos tempos nos Estados Unidos. A começar do título, Freakonomics, trocadilho em inglês entre ciências econômicas e a palavra "freak" -- que tanto significa aberração como entusiasmo. A obra da dupla Ste ven Levitt e Stephen Dubner nada tem de convencional. Freakonomics, que deve chegar às livrarias brasileiras em junho, tornou-se a mais nova onda literária ianque. Já ocupa o segundo lugar da lista de mais vendidos do New York Times. Virou uma febre na internet com um dos mais populares blogs americanos. Semanas antes de seu lançamento, os blogueiros começaram a receber cópias da editora Harper Collins inundando a web de elogios a ele.
Mas, afinal, do que trata Freakonomics? É baseado nas pesquisas de Steven Levitt, professor de economia da Universidade de Chicago que ama as interrogações. Passando a léguas de distância de temas econômicos "normais" como inflação ou taxa de juro, Levitt, que aos 37 anos já ganhou a medalha John Bates Clark, concedida aos mais jovens e brilhantes economistas americanos, se dedica a resolver questões da vida cotidiana. Por exemplo: qual a verdadeira importância dos pais na criação dos filhos? E o que mata mais crianças: piscina ou arma de fogo? Levitt tampouco evita questões controversas: será que a legalização do aborto teve alguma coisa a ver com a queda da criminalidade nos Estados Unidos? O segredo da obra consiste em combinar os estudos de Levitt com a fluência e o bom humor do jornalista Stephen Dubner, que topou o desafio de traduzir uma maçaroca de estatísticas e termos acadêmicos para o leitor comum. De todas as questões tratadas em Freakonomics, a mais polêmica, que tem causado mais discussões nos talk shows americanos, é a que relaciona o direito de aborto à queda dos crimes violentos nas grandes cidades americanas. Ao contrário do senso comum, o mais importante fator para a queda da criminalidade nas últimas décadas não foi o policiamento mais efetivo, o controle de armas ou a expansão econômica dos anos Clinton. Foi a legalização do aborto em todo o território americano nos anos 70.

Na Califórnia, Washington, Alasca e Havaí, uma mulher poderia fazer um aborto legal pelo menos dois anos antes da de cisão da Suprema Corte americana, que em 1973 a estendeu para todos os Estados Unidos. Entre 1988 e 1994, o crime violento naqueles estados caiu 13% em comparação aos demais estados. Nos três anos seguintes, suas taxas de homicídio foram 23% inferiores em relação à média nacional. "Na maioria dos casos, as mulheres que praticavam aborto eram adolescentes, solteiras e pobres", escrevem os autores de Freakonomics. "Os mesmos fatores que levaram milhões de mulheres americanas a fazer aborto também pareciam predizer que, se os seus filhos tivessem nascido, teriam tido uma vida infeliz e talvez criminosa."

Grande parte do livro é dedicada a examinar de que maneira as informações privilegiadas e manipuladas pelos chamados especialistas acabam prejudicando a sociedade. Isso pode acontecer com uma imensa gama de profissionais -- de corretores de imóveis a médicos -- que usam seu saber para aterrorizar o cliente caso ele não siga suas instruções. É como se agissem de maneira semelhante à Ku Klux Klan, sociedade secreta que aterrorizava os negros americanos. Suponha que o dono de uma casa num subúrbio americano contrate um corretor para vendê-la. Do ponto de vista do proprietário, se o corretor se esforçar um pouco, poderá encontrar um comprador que pague, digamos, 3% a mais do que o valor esperado. Numa típica casa de classe média americana, avaliada em 300 000 dólares, 3% a mais significam 9 000 dólares. Sucede que a comissão líquida a ser embolsada pelo corretor é de apenas 150 dólares. A maioria tentará apressar a venda. "Você será um tolo se não vender. Na esquina, tem uma casa bem melhor que a sua pelo mesmo preço encalhada há meses." A grande ameaça da Ku Klux Klan era enforcar negros que não concordassem com a segregação e que insistissem em invadir o espaço "dos brancos". Mesmo quando o número de enforcamentos caiu de 800 para 30, nos anos 40, a Ku Klux Klan continuava dominando o sul do país graças ao terror que infundia. Ironicamente, o golpe certeiro contra os racistas foi dado por um branco, Stetson Kennedy. Ele se infiltrou na organização, aprendeu todos os seus códigos e passou as informações para um seriado de rádio infantil, que diariamente ridicularizava os rituais e palavras de ordem da seita. As crianças americanas por sua vez começaram a recomendar o programa para os pais. A desmoralização foi fatal para a Ku Klux Klan. Se fosse hoje, em vez de rádio, os segredos da organização teriam ido parar na internet. É justamente isso o que está acontecendo com as casas à venda nos Estados Unidos, que ganharam inúmeros sites em que se comparam imóveis e preços. O resultado é que os corretores estão perdendo o poder de manipulação sobre o mercado.
"Conhecer a verdade não é o mesmo que amá-la, e amar a verdade não equivale a deleitar-se com ela" Confúcio

Offline Perseus

  • Nível 22
  • *
  • Mensagens: 895
Re.: Economista Maldito
« Resposta #2 Online: 16 de Julho de 2005, 21:31:42 »
Interessante...Vou colocar o livro deste cara na lista de livros que pretendo over the summer...
"Send me money, send me green
Heaven you will meet
Make a contribution
and you'll get a better seat

Bow to Leper Messiah"

Offline n/a

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.699
Re.: Economista Maldito
« Resposta #3 Online: 16 de Julho de 2005, 22:12:18 »
Interessante mesmo.

Offline Res Cogitans

  • Nível 14
  • *
  • Mensagens: 335
  • Sexo: Masculino
Re.: Economista Maldito
« Resposta #4 Online: 17 de Julho de 2005, 00:24:08 »
eu dei uma lida na amostra grátis (introdução do livro) e também me interessei.
"Conhecer a verdade não é o mesmo que amá-la, e amar a verdade não equivale a deleitar-se com ela" Confúcio

 

Do NOT follow this link or you will be banned from the site!