A propósito do debate sobre a retirada de símbolos religiosos das repartições públicas, alerto para a interpretação equivocada daqueles que propugnam tal medida. O Estado é laico, isso é o óbvio, mas a laicidade não se expressa na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos
Ululante. O que é vedado em um estado laico é o patrocínio de qualquer corrente ideológica(religiosa, filosofica,...), o que claramente ocorre no Brasil quando se gasta o dinheiro público com crucifixos, ou se constroi igrejas e ou outros símbolos religiosos, como as estátuas gigantes de santos, por exemplo. Ninguém defende a
eliminação de símbolos religiosos. A tese do autor não passa de um mero espantalho. O que se critica é o emprego de recursos públicos em simbolos religiosos ou o incentivo ou patrocínio à prática de determinada religião
Tolerância e fomento são coisas totalmente diferentes. Tolerância consiste em neutralidade e não consigo imaginar posição mais neutra do que o não envolvimento, seja de que forma for, do estado em questões de religião.
Em um país que teve formação histórica-cultural cristã é natural que haja na parede um crucifixo e isso não configura discriminação alguma.
Não. Não é natural que um estado que se propõe a ser tolerante com todas as correntes ideológicas ao mesmo tempo patrocine e despenda dinheiro público com uma em especial e isso sim configura discriminação, já que o estado opta por patrocinar apenas uma das muitas expressões religiosas, deixando as demais de fora.
Como isso não pode ser considerado discriminação? Em um estado verdadeiramente laico, a formação histórica religiosa de um país não o impede de respeitar a diversidade de pensamento. Pelo seu argumento, mesmo em um estado laico a religião Xis, por ter prevalência histórica, deve ser mais privilegiada em detrimento das demais, o que é absurdo.
Ao contrário, o pensamento deletério e a ser combatido é a intolerância religiosa que se expressa quando alguém desrespeita ou se incomoda com a opção e o sentimento religioso alheio, o que inclui querer eliminar os símbolos religiosos.
A questão aqui não é a intolerância, não é se incomodar ou não com os simbolos da religião alheia. O que se discute é o fato de em um estado tido como laico uma religião em especial ter prioridade, e inclusive demandar recursos públicos na compra de simbolos a ela afeta, em detrimento de todas as outras correntes ideológicas. Novamente, não se trata de querer eliminar os simbolos religiosos, mas seu uso oficial por parte do estado(espantalho).
Nessa toada, como prenuncia o poema "No caminho, com Maiakóvski", o culto e devoção terão que ser feitos em sigilo, sempre sob a ameaça de que alguém poderá se ofender com a religião do próximo.
Mais espantalho. É justamente esse tipo de comportamento que a laicidade tenta combater. É do conhecimento de todos que a liberdade ideológica historicamente sempre foi combatida e cerceada pela religião. A liberdade de expressão e de pensamento, que perpassa pela laicidade do estado, foi uma construção do iluminismo racionalista do séc. XVIII, dos ideais de igualdade e liberdade oriundas do constitucionalismo francês e americano, em contraposição ao absolutismo do qual a religião foi muro de arrimo. Foi a religião, com seus dogmas e verdades absolutas, com sua intolerância a idéias diferentes, que pregava a ofensa e a heresia por parte dos diferentes. Querer contradizer a história é imaginar, de forma ingênua, a ignorância e a falta de senso crítico por parte de seus interlocutores.
Nesse passo, eu, protestante e avesso às imagens (é notório o debate entre protestantes e católicos a respeito das imagens esculpidas de Santos), tive a ocasião de ver uma funcionária da Vara Federal onde sou Titular colocar sobre sua mesa uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida. Vi tal ato com respeito, vez que cada um escolhe sua linha religiosa. A imagem não me ofendeu, mas sim me alegrou por viver em um país onde há liberdade de culto. Quando vejo o crucifixo na sala de audiências não me ofendo por (segundo minha linha religiosa) haver ali uma "imagem esculpida", mas reconheço nele a recordação de nossa natural e abençoada diversidade religiosa.
Mas uma vez a mesma cantilena. Julga que quem defende a isenção religiosa do estado se sente ofendido pela prática da religião, tentando convencer que isenção e neutralidade é o mesmo que perseguição. Como alguem pode ser sabedor dos sentimentos subjetivos de outrem? Com base em que ele afirma que os que defendem a isenção religiosa do estado se sentem ofendidos pela prática da religião?
Quando vejo o crucifixo na sala de audiências não me ofendo por (segundo minha linha religiosa) haver ali uma "imagem esculpida", mas reconheço nele a recordação de nossa natural e abençoada diversidade religiosa. O crucifixo nas Cortes é, por sinal, uma salutar advertência sobre os erros judiciários e os riscos de os magistrados atenderem aos poderosos mais do que à Justiça
E para isso precisa de imagem alguma? O princípio da justiça não é, por acaso, o fundamento e a razão de ser de todo Direito? Por que deveria ser olvidado pelos magistrados em sua lida contidiana?
Além disso, se a medida for levada a sério, deveríamos também extinguir todos os feriados religiosos, mudar o nome de milhares de ruas e municípios e, ad reductio absurdum, demolir símbolos e imagens, a exemplo, que identificam muitas das cidades brasileiras, incluindo-se no cotidiano popular de homens e mulheres estratificados em variados segmentos religiosos
Aqui o ilustre magistrado, na defesa sega de sua argumentação, esquece-se de um dos princípios mais fundamentais do Direito que é do da razoabilidade. É óbvio que ninguém defende a mudança do nome de cidades e ruas ou a demolição de monumentos. Apesar de a abolição de feriados religiosos fazer bastante sentido em um estado laico, já que se restringem a uma religião específica, em esquecimento das demais. O argumento da maioria não tem fundamento lógico nem legal em um estado democrático, mas puramente político (no sentido eleitoreiro).
Mais uma vez faz uso da falácio do boneco de palha.
Ao meu sentir, as pessoas que tentam eliminar os símbolos religiosos têm, elas sim, dificuldade de entender e respeitar a diversidade religiosa. Então, valendo-se de uma interpretação parcial da laicidade do Estado, passam a querer eliminar todo e qualquer símbolo, e por consequência, manifestação de religiosidade. Isso sim é que é intolerância.
Mais espantalhos, como demonstrado anteriormente.
Os católicos que começaram este país deixaram sua fé cristalizada. Querer extrair tais vestígios afronta o nosso legado histórico. Em certo sentido, querer sustentar que o Estado é laico para retirar os Santos e Cristos crucificados não deixaria de ser uma modalidade de oportunismo de quem não sabe conviver com a religião dos outros. Todos se recordam do lamentável episódio em que um mau religioso chutou uma imagem de Nossa Senhora. Não é menos agressivo não chutar a Santa mas valer-se do Estado para torná-la uma refugiada, uma proscrita.
Não se busca mudar a história. Palha mais uma vez!
Não saber conviver com idéias diferentes é querer impor a sua como a única verdadeira e oficial, por julgá-la melhor do que as dos outros. E é isso que o estado faz ao oficializar certa religião, mesmo sob o argumento da maioria, no qual subtende-se que a maioria tem a razão e por isso deve ser privilegiada.
Mas uma vez tenta convencer que o que está se querendo é a eliminação dos simbolos religiosos. Ideia já demonstrada falsa.
O que se questiona é o apoio
oficial à religião - algo vedado em um estado laico, não a liberdade de culto que dever ser livre e igual para todos, como todas as outras formas de expressão.
Indo além, tal viés ataca todos os símbolos de todas as religiões, menos uma. Sim, uma: a "não religião", e é aqui que reside meu principal argumento contra a moda de se atacar a presença de símbolos religiosos em locais públicos.
Aqui o autor usa o velho argumento, por si só contraditório, da ausência de religião como sendo uma religião, a semelhança da idéia de que a ausência de fé é também fé. Argumentos por si só absurdos que, por não terem sustentação lógica, buscam perverter a própria lógica ao mudar o sentido comum das palavras de forma a adequá-las convenientemente ao que se pretende provar.
A recusa à existência de Deus não é uma opção neutra, mas uma nova modalidade religiosa. Se por um lado temos um ateísmo como posição filosófica onde não se crê na(s) divindade(s), modernamente tem crescido uma vertente antiteísta. Esta nova vertente tem seus profetas, seus livros sagrados e dogmas, faz proselitismo, busca novos crentes (que nessa vertente de fé são os que optam por um credo que crê que não existe Deus algum). Como em todos os credos, há ateus educados e cordatos, e outros nem tanto. Há uma linha intolerante e, como ocorre em todas as religiões iniciantes ou pouco amadurecidas, mostra-se virulenta e desrespeitosa no ataque às demais. Nesse passo, apresenta outra característica de algumas religiões, a arrogância, prepotência e desprezo à capacidade intelectual dos que não seguem o mesmo credo.
Gostaria que o autor me apresentasse o endereço de um único templo da tal religião ateísta.
O problema é que as religiões são historicamente mal acostumadas. Não podem ver seus dogmas questionados que já começam a choramingar, a se fazer de perseguidas, etc., [efeito da sacralidade dos seus dogmas intocáveis]
Na verdade, é a maioria das religiões que não são capazes de conviver com a diferença(o própio autor citou o exemplo do pastor que chutou a santa - gostaria que ele me apresentasse um exemplo sequer de um ateu que tenha feito algo semelhante) e quando confrontadas com uma forma diferente de pensar se acham perseguidas, ameaçadas e tentam reagir, a semelhança do que faz o autor do texto. A simples palavra "ateu" denota um sentido preconceituoso e de marginalização e quando pronunciada provoca um sentimento de despreso e discriminação por parte dos religiosos. "Ateu" sempre foi sinônimo de herege. Por isso alguns filósofos americanos, dentre eles Daniel Dennet, defendem a adoção da palavra
"bright" como alternativa ao termo "ateu", este de conotação histórica claramente perjorativa.
Contudo, o que acontece é que a minoria ateia, historicamente discriminada e perseguida, atualmente tem buscado se mobilizar no sentido de exiguir respeito da sociedade e do estado. Nada mais legítimo, pois são cidadãos como todos os outros, compridores de seus deveres e pagadores de impostos. E isso, infelizmente, tem sido visto pelos religiosos como afronta.
O principal profeta dessa religiosidade invertida (mas nem por isso deixando de ser uma manifestação religiosa) é Richard Dawkins, autor do livro " Deus, um Delírio". Ele está envolvido, como qualquer profeta, na profusão de suas ideias, fazendo palestras e livros, concedendo entrevistas e fazendo suas "cruzadas". A Campanha Out é uma proselitista em favor do ateísmo, tem seu símbolo (o "A"escarlate) e produz camisetas, jaquetas, adesivos, e broches vendidos pela loja online, cuja renda se destina à Fundação Richard Dawkins para a Razão e a Ciência (RDFRS).
Algo não muito diferente de outros profetas e credos. Naturalmente, Dawkins e seus seguidores têm todo o direito de pensarem e professarem qualquer fé ou a falta dela, mas só porque não creem em um Deus, não estão menos sujeitos aos valores, princípios e leis que, se não nos obrigam à fraternidade, ao menos nos impõem a respeitosa tolerância. Não se pode identificar em qualquer símbolo religioso um inimigo nem se tentar cooptar a laicidade do Estado para proteger sua própria linha de pensamento.
Se encaixa no que disse antes. Trata-se de uma minoria exigindo respeito.
Só falta agora o senhor juiz vir defender a imunidade tributária das ONG's e associações em geral, pois tais segmentos sociais, segundo sua própria linha de raciocínio, podem, dessa forma, ser classificados como religiões institucionalizadas.
No caso dos ônibus de Londres é fácil observar o nível de intolerância dos religiosos. Basta ver algo contrário a sua fé, uma única frase é o suficiente, que logo ficam todos eriçados, imperdigados, inquietos,..., gritam e esperneiam e começam a rotular os ateus de tudo quanto têm direito, inclusive de religiosos fanáticos. Vejam só! Os religiosos não estão realmente acostmumados a conviver com a diversidade de idéias.
A eliminação dos símbolos religiosos atende aos desejos de uma vertente religiosa perfeitamente identificada, e o Estado não pode optar por uma religião em detrimento de outras. A solução correta é tolerar e conviver com as diversas manifestações religiosas, incluindo Jesus, Buda, Maomé, Allan Kardec, São Jorge etc., sem que ninguém deva se ofender com isso. Por fim, acaso fosse possível uma opção, não poderia ser pela visão da " minoria" mas da "maioria". O "respeito às minorias" já está razoavelmente assimilado, mas isso não inclui o direito à tirania da minoria.
Em suma, espero que deixem este crucifixo, tão católico apostólico romano quanto é, exatamente onde ele está. A laicidade aceita todas as religiões ao invés de persegui-las ou tentar reduzi-las a espaços privados. Eu, protestante e empedernidamente avesso às imagens esculpidas, as verei nas repartições públicas e saudarei aos católicos, que começaram tudo, à liberdade de culto e de religião, à formação histórica desse país e, mais que tudo, ao fato de viver num Estado laico, onde não sou obrigado a me curvar às imagens, mas jamais seria honesto (ou laico, ou cristão, ou jurídico) me incomodar com o fato de elas estarem ali.
Repete a mesma ladainha: "que os ateus querem eliminar os simbolos religiosos". Falácia!
Tolerar e conviver é muito diferente de patrocinar oficialmente. Segundo a linha de raciocínio do autor, em vez de um crucifixo, as paredes das repartições públicas deveriam ter lugar para os símbolos de todas as religiões praticadas no país (por que privilegiar somente uma religião? A desculpa não é a diversidade religiosa?). Só acho que nesse caso não teríamos paredes suficientes. Não precisa refletir muito para ver o absurdo desse argumento.
Outro absurdo defendido pelo autor é que a ausência de símbolos religiosos nas repartições atende à pretensa "religião ateia", como se uma parede vazia fosse símbolo de alguma coisa. Alguém ao se deparar com uma parede vazia em uma repartição pública será logo capaz de associar tal fato à religião ateia. Lógico, esse é seu símbolo. Não é preciso ser um gênio para perceber que esse argumento não faz nenhum sentido.
De longe a neutralidade é a posição mais acertada em um país que se diz laico e que não faz distinção entre ideologias de qualquer natureza.
Não se trata da tirania da minoria, mas, ao contrário, do respeito à diversidade de idéias.