Autor Tópico: "Estão deixando uma herança ruim para 2011"  (Lida 430 vezes)

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"Estão deixando uma herança ruim para 2011"
« Online: 20 de Dezembro de 2009, 02:52:25 »
"Estão deixando uma herança ruim para 2011"

O economista José Roberto Mendonça de Barros, que foi secretário de Política Econômica na era FHC, é um dos raros colaboradores do governo anterior vistos com simpatia pela atual gestão. Embora não seja alinhado com os chamados desenvolvimentistas, ele também não é tido como um ortodoxo radical. Fica no meio do caminho. Mas hoje, apesar de seu temperamento calmo, ele tem ficado cada vez mais preocupado com um fator: a expansão dos gastos públicos na reta final do governo Lula. E alerta para riscos de inflação, déficit alto em contas correntes e limitação do crescimento.

"Estão contratando um problema do tamanho do Estado, que está ficando gigantesco e mais ineficiente ainda", disse ele à DINHEIRO. Ele alerta que a economia doméstica está a caminho do aquecimento excessivo e que a conta vai ser paga a partir de 2011. Leia a seguir sua entrevista à DINHEIRO.

DINHEIRO - Qual é o seu cenário para a economia em 2010?
JOSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS -
O nosso cenário internacional é construtivo. O mais importante é que, em relação à economia americana, achamos que existe uma recuperação sustentável, com crescimento lento ainda, abaixo do potencial, mas sustentável - o que é o principal. É um panorama diferente do traçado por Paul Krugman, que esteve no Brasil há poucos dias e está extraordinariamente preocupado com a chance de uma segunda queda da economia americana.

DINHEIRO - Por que essa diferença?
BARROS -
Estamos convencidos de que os Estados Unidos devem crescer algo em torno de 2,5% em 2010. Destaco alguns aspectos que apontam para a sustentabilidade do crescimento americano. Primeiro, o bom desempenho das exportações, com a forte desvalorização do dólar. Depois, a volta de investimentos em setores importantes, como o de energia. No de serviços, há uma enorme disputa na área de TI entre Google, Microsoft e Apple sobre como usar essa geração de celulares inteligentes da melhor forma possível. É uma briga de gigantes, que têm caixa e estão investindo um bocado. Finalmente, tem havido uma redução mais acelerada do estoque de casas nos EUA, e o último dado do mercado de trabalho trouxe uma surpresa: em novembro, o desemprego líquido ficou praticamente estável.

DINHEIRO - E quanto aos países emergentes?
BARROS -
No mundo emergente, a bonança não é a mesma para todos. Há um grupo, que inclui a Ásia, os países petroleiros e agora o Brasil, em que o crescimento neste final de ano e no ano que vem vai ser bastante forte. Mas existe outro grupo que está atrapalhado, com países bálticos, Europa Oriental, Grécia, Rússia, Argentina, Venezuela e México. Por essas discrepâncias, o PIB mundial deve crescer em 2010, mas não tanto, em torno de 3%.

DINHEIRO - Os gastos públicos no Brasil são uma ameaça?
BARROS -
Em meio às medidas de combate à crise, aumentamos muito o gasto com funcionalismo público, ao passo que os investimentos no desenvolvimento da economia cresceram muito pouco. E certamente vamos pagar um preço por isso, que vai ser cobrado a partir de 2011.

DINHEIRO - Mas, para o ano que vem, um crescimento de 5% do PIB brasileiro é viável?
BARROS -
É viável, com os setores de construção civil residencial e segmentos de bens duráveis de consumo puxando o crescimento. Mas não acredito que essa taxa seja sustentável ao longo dos anos. O complicado é que a economia doméstica está indo no caminho do aquecimento excessivo em 2010. Não é óbvio hoje ainda, mas, na velocidade com que o governo está gastando, não tenho dúvida de que vamos ter pressões inflacionárias, que vão ser talvez mais relevantes em 2011, mas que já começam a aparecer no ano que vem. Daí porque o Banco Central deveria aumentar os juros em 2010.

DINHEIRO - O sr. acredita numa alta de quanto da Selic?
BARROS -
Creio que um total de dois pontos percentuais e meio entre meados de junho de 2010 e final de 2011.

DINHEIRO - Alta de juros mesmo em ano eleitoral?
BARROS -
Sim, porque o que tem custo político no aperto monetário é o reflexo sobre o crédito ao consumidor, e isso demora um pouco a aparecer.

DINHEIRO - O fato de 2010 ser ano eleitoral traz preocupações especiais?
BARROS -
Não costumo ser muito enfático, mas tenho que dizer que estou extremamente preocupado com isso. Nós temos o setor público, principalmente o federal, todo voltado para aumentar gastos, como se os recursos fossem ilimitados. Estão contratando um problema do tamanho do Estado, que está ficando gigantesco e mais ineficiente ainda, e isso vai nos dar muita dor de cabeça. Não tenho dúvida de que teremos pressões inflacionárias mais significativas em 2011 e uma situação fiscal muito mais apertada, o que pesa contra o ritmo de crescimento nos anos seguintes. E os mercados devem começar a perceber essa tendência já em 2010.

DINHEIRO - Como o sr. avalia as possibilidades para a América Latina de modo geral no pós-crise?
BARROS -
Olhando para a América Latina, comparando Brasil e Argentina - e acho que nisto está a essência da crise do Mercosul -, o que nós temos é que, desde os anos 1990, o Brasil, diferentemente da Argentina, foi se abrindo para o mundo, o que, do ponto de vista da indução ao crescimento, envolve muito mais aspectos positivos que negativos. A Argentina está cada vez mais fechada ao resto do mundo e, como resultado, vai importar carne, trigo, perdendo completamente a capacidade competitiva. Então, não dá para pensar em mercado comum quando temos um país crescendo e outro definhando.

DINHEIRO - O crescimento da economia global tende a ser mais lento por vários anos?
BARROS -
Sim, até a completa digestão dessa crise. Nesse contexto, os mercados internos ficam mais importantes, o que não é ruim para o Brasil, que tem um grande mercado interno. Mas um aspecto que compromete o crescimento é que a questão fiscal na imensa maioria dos países ficou muito pior. Ora, para não gerar um problema inflacionário - e aí certamente seria uma segunda crise de proporções razoáveis -, a dívida pública precisa ser revertida. E não tem outra forma de fazer isso que não seja aumentar impostos ou reduzir gasto público.

DINHEIRO - E quanto ao preço do dólar no ano que vem?
BARROS -
O dólar deve recuperar um pouco do valor que perdeu em relação às outras moedas. Não volta ao que era antes da crise, porque a moeda americana foi muito danificada nesse processo, mas sobe um pouco, para cerca de R$ 1,80 ou até R$ 1,90. Isso porque, com a perspectiva de recuperação dos Estados Unidos, o receio de retomada de um processo inflacionário a partir de 2011 começa a pesar daqui a seis meses e o Federal Reserve deve dar sinais de que vai apertar um pouco a política monetária.

DINHEIRO - Que problemas ainda são os mais graves no Exterior?
BARROS -
Muitos. Primeiro, o sistema financeiro tem que digerir ainda um bocado de erros, como nos setores imobiliário e de cartão de crédito. Alguns países, como a Grécia, mostram ainda ter riscos soberanos, que refletem problemas antigos. O que uma crise faz é expor as fragilidades construídas no passado. E é exatamente o que vemos hoje. O raciocínio também vale para as empresas. A maioria das companhias em dificuldade enfrenta essa situação não pela crise sozinha, mas por ter acumulado problemas ao longo de sua história.

DINHEIRO - O que representou a quebra do sistema financeiro global?
BARROS -
Foi praticamente o fim de uma era. Daqui para a frente, o cenário vai ser outro, nós não sabemos exatamente como será - mais desigual entre os países, certamente. Os efeitos são profundos. Há, por exemplo, a entrada definitiva da questão ambiental, da sustentabilidade, nas estratégias das empresas e nas estruturas de mercado.

DINHEIRO - Como a sustentabilidade poderá mudar a agenda das empresas?
BARROS -
Um dos pontos centrais é o do baixo carbono. Isso no resto do mundo é para valer, envolve mudanças na estrutura de demanda. Por exemplo, todas as principais indústrias químicas globais estão procurando produtos derivados do etanol, que não tem enxofre. Outro exemplo são os projetos de se fazer diesel a partir do caldo da cana-de-açúcar. Tudo isso para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Obviamente, com o tempo, esses itens passarão a ter muito valor.

DINHEIRO - As empresas brasileiras estão preparadas para essa nova era?
BARROS -
Acho que sim. Não é geral: há empresas ainda tão apertadas de caixa que não têm como fazer nada. Mas a maior parte está em boas condições. Falta é regulação. Na área de energia, por exemplo, as agências estão sendo lentamente destruídas. O que é uma pena, porque a regulação é necessária para dar certo suporte ao mercado.

DINHEIRO - Então, em termos de política, a sustentabilidade no Brasil ainda fica muito mais no discurso do que na prática?
BARROS -
Sim. Em relação à energia, por exemplo, o que foi feito na prática no Brasil? Foram termelétricas a carvão e óleo diesel. Ou seja, impossível estar mais na contramão do mundo. Há uma dicotomia. Por um lado, esforço das empresas e do próprio BNDES de dar suporte à mudança e, por outro, iniciativas governamentais como essa das termelétricas. É meio esquizofrênico.

http://www.terra.com.br/istoedinheiro/edicoes/637/estao-deixando-uma-heranca-ruim-para-2011texto-que-aparece-no-158757-1.htm

"That's what you like to do
To treat a man like a pig
And when I'm dead and gone
It's an award I've won"
(Russian Roulette - Accept)

 

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