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Os mundos de Karl Popper e o Ciberespaço
« Online: 05 de Janeiro de 2011, 06:36:55 »
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Os mundos de Karl Popper e o Ciberespaço

Autor/-a: Walter Clayton de Oliveira

Texto original


Resumo: Alguns cenários, problemas e promessas de uma sociedade pós-industrial são discutidos, frente às incertezas do ritmo alucinante de mudanças tecnológicas, sociais e políticas pelas quais a humanidade estará passando nos próximos anos, muitas delas certamente causadas pelo rompimento de barreiras culturais, geográficas e econômicas provocado pelo Ciberespaço.


1 Introdução

A Internet cresce a velocidades espantosas e contribui para que cada vez mais a interação entre seres humanos seja mediada pelo computador. Esta convivência digital entre organismos inteligentes (pessoas), conectados por uma estrutura virtual de troca de informações em escala mundial e constante evolução cria o Ciberespaço (BENEDIKT, 1991), ou cyberspace. O Ciberespaço pode transcender potencialmente todas as criações da humanidade, através do suporte à emergência de uma consciência universal, distribuída entre milhares de pessoas que, embora separadas por grandes distâncias físicas, são capazes de reagir em grupo como membros de uma comunidade (vizinhos de bairro, colegas de trabalho, correligionários ou familiares). Será tudo isto realmente válido? Estará o nosso planeta e nossa sociedade se modificando radicalmente em função do desenvolvimento das redes de computadores mundiais ou será este discurso apenas uma crise sintomática.
Karl Popper, um dos filósofos da ciência mais importantes deste século, fornece algumas bases de reflexão, através de seus Três Mundos. O impacto do ciberespaço sobre estes três mundos é discutido a seguir. Popper (1989) afirma que a nossa realidade é formada por três mundos distintos e interligados:
Mundo 1 - o mundo físico em que vivemos. O meio ambiente formado por ecossistemas, plantas e animais;
Mundo 2 - a consciência do indivíduo, seus sentimentos e percepções sensoriais;
Mundo 3 - as estruturas criadas por grupos humanos, como linguagens, empresas, cultura, comércio, inventos, meios de comunicação, etc.
Que novo planeta, homem e humanidade emergirão como conseqüência do inevitável ciberespaço? Qual a relação entre estes mundos e o ciberespaço? Benedikt (1991) traça algumas perspectivas deste processo. Outras perspectivas e questões se seguem.

2 Ciberespaço e o Mundo 3 de Popper

O Mundo 3 de Popper é o que McLuhan (1964) chama de "extensões do homem". São os produtos das sociedades humanas: artes, história, livros, estradas, leis, nações, ciência, tecnologia, relógios, dinheiro, trabalho, televisão, Internet, etc. O Mundo 3 não é a representação físicas de tais produtos, mas sim o significado e o impacto que estes produzem. Cada uma destas construções do Mundo 3 tem ou teve maior ou menor impacto sobre a forma como as sociedades humanas se organizaram e evoluíram.
Posto que o Mundo 3 é um mundo construído em comunidade e manipulado sobretudo de forma simbólica, o ciberespaço oferece suporte natural para desenvolvimento dos componentes deste mundo, e deste modo desempenhará um papel cada vez maior na convivência e sobrevivência do homem na sociedade pós-industrial, onde a cultura, comércio, tecnologia e ciência cada vez mais subjugam o mundo físico (Mundo 1) e influenciam a consciência do indivíduo (Mundo 2).

3 Ciberespaço e o Mundo 2 de Popper


Comunicação e comunidade são essenciais à formação de cognição e inteligência. Neurônios em conexão com outros neurônios e com o mundo exterior formam o pensamento. Abelhas em comunidades formam uma colméia, a qual pode ser vista como um supra-indivíduo. Agentes transacionando em um sistema econômico criam a "Mão Invisível" de Adam Smith (HEILBRONER, 1996).
Os computadores e o ciberespaço também incrementam a interação entre o indivíduo e a máquina, e entre o indivíduo e as comunidades eletrônicas.
Que influência terão sobre a mente humana as personalidades coletivas, virtuais, sistemas de valores, mitos, religiões e mundos criadas pelas comunidades eletrônicas do futuro, que em breve poderão ter uma representação tridimensional, reativa, programável, inesperada ou emergente?
Que novos processos cognitivos serão desenvolvidos na mente do homem, como resultado destas intensas experiências sensoriais digitalizadas, sintéticas e estimuladas através do ciberespaço?

4 Ciberespaço e o Mundo 1 de Popper - Em Busca de uma Humanidade Auto-Sustentável

A convivência entre tecnologia e meio ambiente sempre foi um processo complexo. Na África existem registros pré-históricos de extensas queimadas provocadas pelo homem na busca de espaço para agricultura de subsistência. A expectativa de vida mais longa e maior consumo para a parte industrializada e semi-industrializada do mundo não significou que as condições de vida humana tenha evoluído como um todo. Os imensos danos ecológicos que os grupos humanos, especialmente a indústria, tem paulatinamente impingido ao meio ambiente neste final de século são conseqüências da combinação entre ignorância do delicado equilíbrio ecológico que o nosso planeta apresenta, associada ao aumento populacional e ao aumento da produção e consumo (HART, 1997).
A história da industrialização tem mostrado que as práticas danosas ao meio ambiente e ao homem são primariamente exercidas nos parques industriais, mas também são inexoravelmente transferidas para a periferia ignorante, o que sugere que a opulência atualmente usufruída pelos habitantes dos países mais desenvolvidos é responsável por parcelas significativas destruição ambiental na periferia do capitalismo, com conseqüente empobrecimento das regiões miseráveis do mundo. As péssimas condições em que vivia boa parte da população inglesa no século XIX (HEILBRONER, 1996, p. 73) hoje estão presentes ao redor dos grandes aglomerados urbanos africanos, asiáticos e latino-americanos.
O processo de industrialização como um todo poderia continuar indefinidamente, na esperança de que em uns cinqüenta anos os habitantes destas outras regiões pudessem adquirir condições de vida mais dignas. O "pequeno" detalhe que passa despercebido por muitos é que, ao contrario do ciberespaço, o nosso planeta é fisicamente limitado, e as práticas atuais de produção e consumo poderão em breve reduzir parte considerável da água potável, ar, solo e ecossistemas que formam nosso planeta.
Como o ciberespaço poderia contribuir para criar soluções para este problema? São destacadas duas perspectivas complementares de solução: tecnológica e social.

5 A Solução da Tecnologia


Hart (1997) acredita que o avanço tecnológico e a economia de mercado contribuem para solucionar o problema. O desenvolvimento, uso e disseminação intenso da ciência e tecnologia para manejo de ecossistemas, biotecnologia, nanotecnologia, novos materiais, etc., em escala mundial, contribui para o desenvolvimento de métodos e técnicas de produção e consumo que reduzem o desperdício de matéria-prima e energia em várias áreas da atividade humana, como na: construção civil; em residências; veículos movidos a combustíveis não fósseis ou sem combustão interna; transporte de massa; reciclagem; ecologias industriais; herbicidas e inseticidas inteligentes, etc. A transferência destas tecnologias às regiões subdesenvolvidas do mundo poderia teoricamente se dar através da economia de mercado.
O desenvolvimento do ciberespaço certamente está contribuindo para este avanço tecnológico e para a disseminação dos princípios da economia de mercado.

6 A Mobilização Social e Econômica

Estudos promovidos pelo Banco Mundial (SERAGELDIN; SFEIR-YOUNIS, 1996) indicam a necessidade de mudanças imediatas nas práticas sociais e econômicas, pois a economia de mercado isoladamente não consegue solucionar a questão, e o custo da inação poderá ser catastrófico. Algumas observações são:
• nesta era de governo reduzido e recursos públicos minguados, esforços para promover desenvolvimento sustentável não mais dependem de governos isolados, nem de doadores tradicionais;
• a parceria entre governo, setor privado e investidores parece ser a melhor forma de aumentar recursos escassos;
• as Organizações Não Governamentais (ONGs) podem prover complemento vital à ação dos governos e do setor privado (MAYER, 1997);
• deve-se promover, na medida do possível, estratégias de ação nas quais todos os parceiros envolvidos saiam ganhando, onde por exemplo, a indústria venha a reduzir seus custos e a população consiga melhorar as condições ambientais.;
• a estafa sobre o ambiente é geralmente proporcional ao crescimento populacional;
• a educação da mulher é provavelmente o principal fator para redução do crescimento populacional.
O ciberespaço poderia ser este espaço de mobilização social e econômica? Não existem respostas simples. O papel da ciência e da tecnologia a serviço da humanidade é buscar, por um processo de tentativa e erro, descobrir o caminho para um mundo melhor (POPPER, 1989).

Referências bibliográficas:

BENEDIKT, M. L. (Ed.). Cybespace: first steps. Cambridge [USA]: MIT Press, 1991. 436p.

HART, S. Beyond greening: strategies for a sustainable world. Harward Business Review, Jan-Feb 1997. p.66-76.

HEILBRONER, R. A história do pensamento econômico, 6.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1996. 319p.

MAYER, C. The political economy of NGOs and information sharing. World Development, v.25, n.7. England: Elsevier, 1997. p.1127-1140.

MCLUHAN, M. Understanding Media: the extensions of man. New York: The New American Library. 1964. 318p.

POPPER, K. Em busca de um mundo melhor. Lisboa: Fragmentos, 1989.

SERAGELDIN, I.; SFEIR-YOUNIS, A. (Eds.) Effective financing of environmentally sustainable development: proceedings of the third annual world bank conference on environmentally sustainable development. WA, USA: The World Bank, 1996.
Na leitura do livro Em busca de um mundo melhor, o mundo 3 se apresenta muito semelhante com o conceito de virtual da teoria de Levy.. E mais ainda com a filosofia virtual, de Deleuze, influência muito grande na obra do primeiro  :?
« Última modificação: 05 de Janeiro de 2011, 06:48:54 por Adriano »
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

 

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