Tópico: Evolução e sexo para procriação

[SenhorZen]

Gente esse tópico é de alguém leigo ok, mas é uma duvida recorrente.

Sempre falam de evolução, que a espécie vai evoluindo a fim de se manter viva. Pois bem, daí tem a procriação, pelo que eu li isso seria o ponto principal. O que eu quero saber é se a teoria da evolução compreende de alguma forma os avanços tecnológicos da ciência como também uma forma de evolução da espécie que domina esse conhecimento.

Por exemplo no caso da procriação. Hoje podemos garantir que a espécie procrie sem necessariamente para isso ser necessário o ato sexual. Esse conhecimento no modo de se fazer uma "cria, é considerado também como parte da evolução da nossa espécie?

[uiliníli]

Acredito que não, acredito que você está misturando o conceito de evolução biológica com o uso cotidiano da palavra evolução, sinônimo de "avanço", "melhoramento".

O que a teoria da evolução fala simplesmente é que os genes dos organismos que têm mais sucesso em se reproduzirem tendem a se espalhar mais pela população. Em outras palavras, evolução é uma mudança na proporção dos genes que existem dentro de uma população, se meios de reprodução artificial não contribuem para mudar a distribuição de genes, eles são irrelevantes para a evolução.

[Buckaroo Banzai]

Se estiver falando de "evolução cultural", pode-se dizer que sim, se não, apenas se esse conhecimento tiver conseqüências significativas na composição das futuras gerações -- como fábricas de bebês a la "admirável mundo novo" ou algo do gênero.


Mas a "evolução cultural" é praticamente uma "outra coisa" na maior parte do tempo. Mesmo as maiores "revoluções" tecnológicas não se supõe seguramente terem tido um "gatilho" biológico.

[Zen]

Olha amigo SenhorZen (nick parecido, quase chará  ), a primeiro vamos por partes e explicar bem o que é evolução.

O tempo todo, as espécies passam por mutações, são mudanças genéticas que dão origens a características diferentes. Ou seja, genótipos expressando fenótipos diferentes.
Isso pode ser algo vantajoso ou não para a espécie , por exemplo. Se uma gazela tem uma característica de patas mais longas talvez ela corra mais rápido, e por isso seja mais difícil de ser abatida pelos predadores, logo os que têm essa característica terão vantagens sobre as gazelas comuns e assim seus descendentes prosperarão acima dos demais até que gerações a frente quase todos tenham essa característica.
Contudo a característica pode ser ruim. Por exemplo, de músculos que se atrofiam depois de certa idade, isso não vai impedir que a gazela sobreviva o bastante pra se reproduzir (lembrando que a própria disputa sexual é uma forma de seleção), mas os seus descendentes morrerão mais cedo por se tornar presas mais fáceis, logo se espera que gerações à frente essa característica venha a desaparecer.

Logo as características boas e ruins aparecer (e na maioria as que aparecem são ruins, pos são muito aleatórias e raramente ampliam uma característica que já é benéfica para o grupo), o que vai dizer se a característica serve ou só atrapalha é o meio onde a espécie  vive.

Já no caso do ser humano, pode ter certeza que descobertas como a Medicina influenciam negativamente a evolução do homem nesse contexto, ora, afinal nós não deixamos nossos deficientes físicos e mentais a própria sorte (a não ser pelo SUS), esperando que a morte os encontre. E tão pouco competimos sexualmente visando às características genéticas boas, ainda que sejamos influenciados pelas belas formas físicas, reconhecemos a necessidade da personalidade, a sociabilidade e até mesmo do status financeiros. Bem, nada mais justo uma vez que a muito o ser humano, dado sua capacidade de raciocínio, o utiliza para se sobrepor sobre a natureza.

Contudo até onde poderemos confiar em nossa capacidade intelectual acima das forças da natureza? Aparecerão situações onde o meio voltará a nos selecionar alem dessa nossa capacidade de resistir?
É possível e talvez já esteja acontecendo. Podemos estar nos tornando mais susceptíveis a algumas doenças que nossos antepassados, assim como eventos apocalípticos podem mudar a nossa interação com o mundo, e dessa forma as decisões que tomamos enquanto evoluímos podem se tornar decisivas.

Por outro lado a nossa capacidade intelectual abre portas, inclusive da terapia gênica e da manipulação genética. Hoje cada vez mais temos ferramentas para mudarmos quem somos geneticamente, e assim alterarmos nossas possibilidades. Mas nós podemos? Devemos? Teremos discernimento para tanto? Só o tempo dirá imagino.   

[Cientista]

Acredito que não, acredito que você está misturando o conceito de evolução biológica com o uso cotidiano da palavra evolução, sinônimo de "avanço", "melhoramento".

E esse "uso cotidiano" não é falso, ilusório? Avanço, melhoramento, em qualquer sentido, é apreensão falsa da realidade. Indica objetivo, intencionalidade mas não só deuses, "nós" também não existimos. Se não, como e em que momento da evolução passou a existir essa "coisa" que chamamos "eu" e que "pomos" (não eu) num status de transcedência à evolução?

O que a teoria da evolução fala simplesmente é que os genes dos organismos que têm mais sucesso em se reproduzirem tendem a se espalhar mais pela população. Em outras palavras, evolução é uma mudança na proporção dos genes que existem dentro de uma população, se meios de reprodução artificial não contribuem para mudar a distribuição de genes, eles são irrelevantes para a evolução.

O que a teoria da evolução fala simplesmente é que os genes dos organismos que têm mais sucesso em se reproduzirem tendem a se espalhar mais pela população.

É analisando construções frasais como essa que podemos observar como o rigor linguístico é fundamental para a expressão e a percepção científicas da realidade. De fato, os genes não, simplesmente, se "espalham" mais. Os genes são os organismos, neste sentido evolutivo, porque os constroem, mas não necessariamente, totalmente -- o ambiente pode modelar os organismos também. E isto torna tudo de uma complexidade indescritível para mentes humanas (normais) porque é possível que surjam condições ambientais de certa permanência que passem a modelar características em todos os organismos, praticamente, assim, coadjuvando ou concorrendo (competindo) com os genes. E estas condições ambientais podem ter origem tecnológica e influenciar, de muitas maneiras, as pressões seletivas até mesmo dentro, unicamente, da espécie humana que "desenvolve" tecnologia. Mas nunca esqueçamos, aqui, que a capacidade humana de desenvolver tecnologia não é equitativa (embora de certo modo, descontando casos extremos, não tanto -- tão pouco equitativa -- quanto a capacidade de desenvolver ciência), o que nos leva ao ponto de concluir que tais diferenças originam-se nos genes. E tudo volta ao mesmo ponto: não são os genes que tendem a se espalhar mais pela população, são os organismos contruídos por eles que tendem a se TORNAR a população e isso vai além da morfologia, sendo aqui que a diferença se torna crucial porque nos leva à pergunta: que população? A humana? Mesmo dentro dela, observo que a tecnologia desempenha papel seletivo. Mas, se não esquecermos que a espécie humana é somente mais uma dentre todas do planeta (com destaque para os primatas, não os que "competem", hoje, com o homem, mas os que competiram com as vertentes evolutivas do homem, no passado), veremos, claramente, a diferença evolutiva que a tecnologia faz. Tecnologia, absolutamente, não é uma emergência não evolutiva da espécie humana.

A evolução caminha por trajetos muito mais amplos e complexos do que qualquer humano foi, provavelmente, capaz de vislumbrar até hoje. Mas o gênio científico de Darwin permitia a ele, já a seu tempo, um vislumbre, pelo menos, da existência dessa complexidade, como ele deixou claramente declarado em sua obra máxima.

Por isso eu sempre insisto que tecnologia (o desenvolvimento dela) é uma expansão/extensão/continuação do processo evolutivo-biológico que ocorre quando organismos complexos passam a interagir mais com o ambiente que apenas absorvendo e excretando, mas a "finalidade" é a mesma.

[uiliníli]

Para mim a tecnologia tem um impacto cultural mais do que biológico, ela depende da educação para continuar existindo a longo prazo, diferentemente das características biológicas que dependem somente da reprodução. Mas, claro, a capacidade de adquirir e transmitir cultura é uma adaptação biológica de nosso espécie.

[Buckaroo Banzai]

Acredito que não, acredito que você está misturando o conceito de evolução biológica com o uso cotidiano da palavra evolução, sinônimo de "avanço", "melhoramento".

E esse "uso cotidiano" não é falso, ilusório? Avanço, melhoramento, em qualquer sentido, é apreensão falsa da realidade. Indica objetivo, intencionalidade mas não só deuses, "nós" também não existimos. Se não, como e em que momento da evolução passou a existir essa "coisa" que chamamos "eu" e que "pomos" (não eu) num status de transcedência à evolução?

Isso a que ele refere só existe mais ou menos no sentido de o que quer que seja que te levou a postar essa mensagem, e como o computador e a tecnologia são úteis a "você" para isso, mesmo que "você" não exista. É só um jeito bem prático de se frasear o "evento" ou "fenômeno", e consideravelmente livre do risco de confusões sobre "não existirmos" e etc.

[Buckaroo Banzai]

Por isso eu sempre insisto que tecnologia (o desenvolvimento dela) é uma expansão/extensão/continuação do processo evolutivo-biológico que ocorre quando organismos complexos passam a interagir mais com o ambiente que apenas absorvendo e excretando, mas a "finalidade" é a mesma.

Sim, mas talvez seja importante ressaltar que tal coisa como o "gene da revolução industrial" "não existe", ou "já existisse" desde o pleistoceno. Daí a "separação" entre biologia e tecnologia. Nossas casas não são como colméias de abelha.