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Entrevista-desabafo do senador Pedro Simon, a grande referência moral do Congresso: “Os bons homens já morreram”; “O PT apodreceu”; “Mensalão será o maior momento da história do Supremo”; “Só há saída com mobilização do povo.”O senador diz que a qualidade do Parlamento na média é muito ruim, os líderes políticos só pensam em cargos e que a presidente Dilma não vai conseguir acabar com o fisiologismoO senador Pedro Simon é um iluminado. Fundador do MDB , participou da oposição à ditadura militar, cerrou fileiras pelas Diretas Já e foi um dos protagonistas da ofensiva que resultou no impeachment do então presidente Fernando Collor.Com meio século de vida pública, esse gaúcho de Caxias do Sul e 82 anos de idade teria motivos de sobra para festejar a atividade política. Mas ele não vê razões para celebrar.Simon é hoje um retrato acabado do desânimo com a classe política e com o fisiologismo que governa a relação entre o Poder Executivo e o Congresso. O desalento só é deixado de lado quando o senador fala da mobilização popular como a sua derradeira esperança para mudar as atuais regras do jogo. O senhor foi um dos maiores críticos do PT no governo. Que avaliação faz da administração da presidente Dilma?Estou gostando muito, principalmente quando a presidente diz que não vai aceitar o toma lá dá cá. Esse é o grande fato novo na política. Ela já afastou ministros e tem mostrado que quer um entendimento, mas não aceita imposição.O caso mais típico foi o do PR. Sete senadores do partido deixaram a base porque queriam e não conseguiram continuar mandando no Ministério dos Transportes. Nos governos anteriores, quando isso acontecia, o presidente capitulava. A Dilma quis mostrar que existe um novo método de governar. Isso levou a um choque com os comandos partidários e do Congresso, porque o troca-troca viciou: vota-se aqui, ganham-se as emendas, vota-se ali, nomeia-se o fulano. O senhor acredita que a presidente vai acabar mesmo com o toma lá dá cá?Não acredito. Pode até melhorar um pouco, mas acabar não. O que não pode mais, e a presidente está sinalizando nessa direção, é os caras colocarem interesses pessoais acima dos interesses da pátria e da sociedade. É difícil mudar essa prática de uma só vez.Fazer isso exige mais jogo de cintura. A Dilma não pode ser durona, bater na mesa. Vejo-a dizendo que se entende muito com o presidente do Congresso, o senador Sarney. A primeira pessoa a quem ela deveria fazer um apelo é o Sarney. Ele indicou dois ministros do Maranhão. Onde está a racionalidade de ele e o PMDB , o meu partido, terem dois ministros do Maranhão? Por que Sarney abriria mão de poder? O Rui Barbosa é o nosso grande patrono no Senado, mas como político foi um homem de derrotas. Perdeu duas vezes a eleição para presidente da República e não tinha influência no governo.Quem mandava e elegia presidentes era o (José Gomes) Pinheiro Machado (gaúcho e um dos mais influentes políticos da Primeira República, foi assassinado em 1915), de quem hoje ninguém fala. O Sarney está mais para Pinheiro Machado do que para Rui Barbosa. Vai acabar esquecido pela história. O que o senhor achou da comparação entre a situação de Dilma e a do ex-presidente Collor?Tem um lado que é correto. Ele, muito vaidoso, não ligou para o Congresso, não ligou para os empresários e não ligou para as Forças Armadas. Era o rei.Mas não foi por isso que ele foi cassado. Foi cassado pelas bandalheiras que a gente encontrou. O tesoureiro da campanha pagava as contas dele, da mulher, os luxos da família — tudo com dinheiro roubado.A Dilma não está valorizando muito o Congresso, mas não fez coisa errada. O senhor elogia o governo e critica o ministério. Não é contraditório?O ministério é fraco, um dos piores que já vi. Antes, colocavam-se no ministério os melhores nomes do Parlamento.Hoje, o ministério consegue ser pior do que a média do Parlamento, que beira a mediocridade.No esforço de eleger Dilma Rousseff presidente, valeu tudo. O Lula fez acordo aqui e ali, e houve uma despreocupação com relação à seleção dos nomes. Houve também irresponsabilidade dos partidos na indicação dos ministros.O PMDB indicou um rapaz que tinha pago conta de motel com dinheiro público. Aliás, o PMDB não. Volta e meia se publica que a bancada do Senado exige algo para o ministério. Mentira. Nunca nos reunimos para escolher um cargo. Essa decisão foi tomada pelo presidente do Senado e pelo líder da bancada falando em nome de todo mundo. Como o PMDB se transformou na marca do fisiologismo?Deus me perdoe, mas é porque os bons homens se foram: Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Teotônio Vilela, Miguel Arraes, Mario Covas.Se esses tivessem ficado e outros tivessem morrido, o Brasil seria diferente. Se analisarmos no contexto do Congresso, ocorreu mais ou menos a mesma coisa.Aquele pessoal que iniciou o PT está todo fora. Faz falta aquele PT que se comportava de maneira competente como oposição.O partido hoje é de uma gente que não sei de onde veio. Aliás, oposição hoje também não existe mais, o que é muito ruim para o país.O senhor não está pessimista demais com o momento político?Os poderes estão todos nivelados por baixo. O Judiciário, que sempre esteve em um nível bem superior, foi rebaixado nos últimos tempos a um patamar igual ao nosso, do Parlamento. É avaliado bem abaixo da presidente Dilma e igual ao Legislativo. Nada o anima?Há alguns sinais que me animam. Estou há cinquenta anos na vida pública e — tirando as lutas pelas Diretas Já e pela Anistia — não vi momento tão interessante como o que estamos vivendo agora.O povo conseguiu sensibilizar e pressionar pela aprovação da Lei da Ficha Limpa. Votamos porque o povão pressionou, entrou nas redes sociais e estava na rua. O Supremo votou porque a gurizada estava lá na porta.Esse é um fato novo que muda tudo. Por quê?Um bando de gente já não vai poder ser candidato. O PMDB , por exemplo, está recomendando aos diretórios evitar indicar nomes com problemas com a Justiça.É o primeiro passo para terminar com a maior maldição do Brasil, que é a impunidade.Porque a maldita diferença entre nós e o mundo civilizado é que, quando o cara é condenado, aqui ele recorre à segunda, terceira, quarta, quinta, sexta instâncias, até o Supremo. Nesse espaço de tempo, o crime prescreve e ninguém é condenado.Na Europa e nos Estados Unidos, se for condenado, vai para a cadeia. Pode recorrer, mas está na cadeia. O que falta para que os avanços sociais que estamos experimentando cheguem à política?Para derrubar a ditadura, avançamos quando a sociedade avançou. O mesmo aconteceu no impeachment. Ele só deu certo porque o Collor pediu ao povo para ir para a rua de verde e amarelo, e o povo foi de preto, de luto.As grandes mudanças só ocorreram quando o povo participou.Não se espere nada do Congresso, do Legislativo e do Executivo se o povo não estiver à frente.Mas o Congresso não deveria exercer esse papel catalisador?Eu trouxe um mar de gente para a vida pública: jornalistas intelectuais, membros de tribunal. Mas na última eleição não trouxe ninguém.Estavam todos com nojo.As pessoas estão se afastando da política. É aquilo que o doutor Ulysses dizia quando reclamavam da qualidade do Congresso: “Esperem para ver o próximo”. Estamos caminhando nesse sentido.Com essa história do nosso amigo senador (Demóstenes Torres), estou recebendo um bolo de cartas e telefonemas dizendo que agora só falta eu. É o pessimismo das pessoas.Eu botava as duas mãos no fogo pelo Demóstenes. Ele era um exemplo de competência parlamentar. O senhor faz algum prognóstico sobre o destino político dele?Com todo o respeito, se as coisas que estão aí se confirmarem, ele deve ir para casa. Se tudo isso for verdade, o senador é um excelente ator.Mas tenho obrigação de esperar as explicações dele antes de qualquer julgamento. O fundamental é o Congresso sair ileso, o Senado mostrar transparência.O Demóstenes está pedindo para analisarem, julgarem e fazerem o que tem de ser feito. Se as acusações forem provadas, não há outro caminho que não a renúncia ou a cassação.Demóstenes Torres: "Eu punha as duas mãos no fogo por ele (...) Mas se as denúncias forem comprovadas, não há outro caminho a não ser a renúncia ou a cassação" Por que o senhor diz que há um nivelamento por baixo das instituições?As instituições foram vulgarizadas nos últimos anos, principalmente no governo do PT.Todos os meses vocês fazem reportagens demonstrando casos de corrupção e não acontece nada.O cara não é condenado e também não é absolvido. No Judiciário, surgem denúncias sobre juiz que vende sentença, outro que recebeu não sei o quê, e não acontece nada. Como vamos aceitar isso?Aparece uma notícia como aquela do Fantástico, completa, indiscutível. Se não tomar cuidado, o diretor do hospital vai acabar demitido, e o jornalista vai para a cadeia, porque no Brasil termina assim. O poder corrompe?Parece que a tentação é grande. Eu vi o início do PT. Os caras andavam de pé descalço, caminhavam pelas ruas fazendo campanha em troca de nada, era um troço sensacional.Nos oito anos do Fernando Henrique, o PT foi um baita de um partido na oposição, até exagerado.Aí foi para o governo e ofereceu ao carinha de chinelo, que trabalhava feito doido em troca de comida, um cargo de 9 000 reais. Então apodreceu. O poder corrompe, sim.O poder total corrompe totalmente. O PT desmontou, desapareceu. Se o Lula tivesse posto o Waldomiro Diniz na rua quando ele apareceu na televisão recebendo dinheiro do Carlinhos Cachoeira e tratando de porcentuais, não teria havido o mensalão.Eu entrei com pedido de CPI, mas o Lula e o Sarney lutaram para não deixar criá-la. Fomos ao Supremo e depois de um ano ganhamos, mas era tarde. Quem mudou mais, o PT ou o PMDB?Eu diria que os dois ficaram muito parecidos — para pior. O PMDB deixou passar vários trens da história. O pior que aconteceu com o PMDB foi a maldade que o Tancredo fez conosco. Nosso acordo não previa a morte do Tancredo. Ele morre e deixa o Sarney.Ali o nosso destino mudou. Tancredo presidente, todos os governadores, com exceção do de Sergipe, eram do PMDB , tínhamos a maioria na Câmara e no Senado. Era uma grande oportunidade. Com o negócio do Sarney, mudou tudo.Já me convidaram até a sair do partido. Mandaram uma carta com muita elegância dizendo que se eu saísse seria numa boa, ninguém ia me pedir o cargo. Eu disse que não ia sair, porque eles estavam de intrusos e eu fundei o partido. O senhor falou da queda da qualidade das instituições de maneira geral. Isso se aplica ao Supremo?Eu não diria isso, mas lá também há indícios dessa vulgarização sobre a qual falei. O Lula nomeou para a corte um advogado dele e do PT na campanha. Esses fatos não são bons. Tem de haver mais rigor nessa seleção.Esse ministro, o Dias Toffoli, com todo o respeito, não poderia ser nomeado. No processo de indicação dele, fui para a tribuna na hora e disse para o Lula adiar a sua escolha. Agora, descobre-se que ele teria uma namorada que atuou na defesa de um dos homens do mensalão, e ele mesmo trabalhava no governo junto a pessoas do mensalão.E ele não se dá por suspeito? Isso não me passa pela cabeça. Qual será a importância do julgamento do mensalão para o Brasil?Vital. O relator foi muito sério, muito competente. Faço um apelo a ele para ser o mais breve possível, porque temos de votar neste ano. Vai ser a coisa mais triste do mundo se prescrever e não for votado. Esse julgamento será o maior momento da história do Supremo.Isso não quer dizer que tenha de condenar ou absolver, mas é preciso fazer um julgamento de gabarito, de peso, de seriedade. O importante é julgar.Eu tenho convicção de que se vai julgar com a consciência e não tenho dúvida de que pelo Brasil inteiro as pessoas vão estar olhando.Este é seu último mandato?Em tese, sim. Não pretendo concorrer de novo. Na próxima eleição estarei com quase 85 anos e prefiro sair vivo a sair morto