Eu não disse que "é ciência", apenas não é imediatamente charlatanismo, na verdade é quase algo tautológico, apesar de não tão evidente. Costumamos pensar em cultura como algo meio "projetado", em vez de algo com "vida própria".
Não conheço nenhum "trabalho científico" se usando do conceito de memética explicitamente, mas acho que já ouvi falar, embora nem me lembre mais de qualquer detalhe.
O problema todo que vejo está no próprio conceito fundamental da teoria, que é altamente maleável (um comportamento é um meme, uma idéia é um meme; qqer coisa pode ser considerado um meme) recursivo sobre ele mesmo - podemos chegar facilmente a uma recursão infinita : o meme do meme do meme........que constitui a base da memetica.
Acho que não faz sentido uma recursão infinita. Meme é quase que um sinônimo para "cultura," apenas enfatizando a analogia com evolução. Então não é mais questionável do que "cultura", que também poderia ser "questionada" por se dizer que o próprio conceito de "cultura" é cultural, e que o conceito de cultura ser cultural é cultural, e assim indefinidamente.
Um exemplo clássico para "evidenciar" a memeica são os modismos : o bambole pode ter seu sucesso "explicado" pela memética; mas não vejo como a memética explique o próprio surgimento do bambole, nem o seu desaparecimento na população "infectada".amb
Novamente, apenas trocando "meme" por "cultura" e "modismo", acho que se nota que não é um questionamento muito significativo.
"A teoria cultural, postula o modismo, dizendo que haverão coisas que virarão moda, como bambolês, mas nem o modismo, nem a cultura em si, explica o surgimento do bambolê, nem a queda na popularidade."E talvez a noção de "memes" até forneça uma "explicação" razoável, com outros memes, novos ou anteriores, competindo por espaço com os bambolês, e se mostrando mais aptos; modismos passageiros talvez se devam a "nichos psicológicos" vagos na cultura, primeiramente não encontram competição e se alastram, mas não necessariamene evoluem características que conduzam a sua perpetuação mais prolongada no "ecossistema". Um pouco como uma espécie que extingue a si própria por esgotar os recursos ambientais, ou que inicialmente explode populacionalmente para depois ser substituída por espécies não-aparentadas melhor adaptadas.
O que de qualquer forma, não é uma explicação completa, e provavelmente nem mesmo a mais relevante. Acaba sendo quase que só uma forma de frasear a coisa. A psicologia como "ambiente" também precisa ser levada em consideração, e ela não é puramente cultural/memética.
Pior ainda é este julgamento de valor (memes bons e ruins). Dannett, em um video, faz uma analogia de uma formiga que tem um comportamento alterado por um parasita, com a mente infectada por um meme, para justamente falar sobre o que é bom (memes bons) e o que é ruim; como que se o proprio conceito/julgamento do que seja bom ou ruim, também não fosse um meme (segundo a teoria) tornando a teoria totalmente furada para fazer qqer tipo e julgamento.
Novamente, acho que "cultura" simplesmente teria o mesmo problema. O seu questionamento é essencialmente o do relativismo cultural, "não podemos dizer que cultura X é melhor ou pior que Y, porque isso já parte de valores culturais Z."
O que só é problemático se estivermos pretendendo sugerir que a primeira afirmação é uma "verdade universal", em vez de simplesmente aceitar que é algo dentro de um dado conjunto de valores culturais que consideramos melhores.