Autor Tópico: Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia  (Lida 670 vezes)

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Rhyan

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Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia



Na última terça foi entrevistado na Rede Globo o candidato à presidência da República Pastor Everaldo, que defende um amplo programa de privatizações e, em suas próprias palavras, “o Estado mínimo”.

William Bonner questionou sua adesão ao liberalismo, ao que o candidato reiterava que, apesar de ter estado junto à esquerda brasileira de tradição trabalhista durante a maior parte de sua vida política, sempre acreditou no empreendedorismo e na meritocracia, que teriam sido prejudicados pelo agigantamento do Estado com o governo do PT.

Já o Candidato a Deputado Estadual Paulo Batista tornou-se, ontem, viral nas redes sociais, sendo citados por inúmeros sites incluindo o Terra e o Não Salvo, com seu vídeo do “Raio Privatizador”, onde aparece como um super-herói que dispara um raio laser de seus olhos, com os quais torna grevistas da USP pública em formandos de uma USP privatizada, entre outras façanhas. Seu slogan: “Contra comunista, vote no Batista”.  Ele mostrou em sua página no facebook que seu resultado do Diagrama de Nolan o apontaria como libertário.

Alguém poderia, então, pensar que o liberalismo está em alta na mídia e nas eleições, certo?

Não, não está. Preste atenção nos detalhes, caro leitor, pois o diabo está nos detalhes.

Na mesma entrevista, Pastor Everaldo deixou claro que sua principal defesa é a “da família” e pelo casamento conforme está na Constituição, em clara referência às suas pautas anti-progressistas no que diz respeito às questões LGBT. Além de contrário ao casamento e adoção por homossexuais e ao aborto, também se expressa contrário à legalização de qualquer droga, incluindo a maconha.

Aliás, na page de seu partido no facebook é afirmado explicitamente o ideal de um Brasil conservador, chegando a dizer que “O PSC defende uma sociedade em que a ordem moral tradicional e os costumes sociais sejam respeitados e preservados. Se você também defende esses valores para manter a ordem social, compartilhe!” com a seguinte imagem:


(encontrado na page do partido do candidato aqui)

Há também a sugestão de que importantes conquistas das minorias seriam uma ameaça à família:



(encontrado na page do partido do candidato aqui)

Uma das supostas ameaças à família adviria da Lei nº 12.845/2013. Uma lei que foi criada para proteger vítimas de violência sexual, preservando seu direito de receber atendimento hospitalar, inclusive para a realização do aborto que, nesse caso, é legal no país, mas que, pelo conservadorismo existente aqui, não se permitia fosse realizado pela rede pública de saúde. Mas o Pastor Everaldo deseja revogar essa lei, deixando milhões de mulheres desprotegidas ao negar um direito básico em face da violência sexual sofrida, especialmente as mulheres mais pobres.  Veja na imagem:



(encontrado na page do partido do candidato aqui)

De fato, o suposto “Estado mínimo” do Pastor Everaldo parece ser um “Estado máximo” quando se trata de negar liberdade de ação às minorias e de regular estilos de vida sob a suposta proteção da família.

Por outro lado, em outro vídeo, o candidato Paulo Batista apresenta um cigarro de maconha falante, instigando universitários a fazer greve. O que está sugerido nesse vídeo é uma das bandeiras da campanha de Batista: o fortalecimento da política proibicionista de guerra às drogas, especialmente em uma cruzada para o fim do que denomina como “bolsa crack”, dentro de uma política de “tolerância zero”. Veja por si mesmo:



(encontrado na page do candidato aqui)

A incoerência é até maior porque referida proposta está contida em imagem onde Batista se autoproclama de “candidato da liberdade”. Lembrando que a proposta de “abolição da bolsa crack” deve ser lida conforme a imagem anterior. Veja:



(encontrado na page do candidato aqui)

Em outra imagem, ressalta ainda mais que o substituto à “bolsa crack” é a “tolerância zero”:



(encontrado na page do candidato aqui)

Batista deveria ter lido “Vícios não são crimes” de Lysander Spooner, assistido ao vídeo em que Milton Friedman defende a legalização das drogas, estudado a defesa de Jeffrey Miron (com base em estudos de “economia do crime”) da legalização de todas as drogas, ou ao menos ter lido a HQ de Stuart McMillen contando a história da guerra às drogas, com base na obra do já citado Friedman. Saberia que uma das bandeiras liberais é o fim de uma política que cerceia nossas liberdades, coloca pessoas não violentas atrás das grades (nos Estados Unidos, chegou ao ponto de que algumas foram condenadas a passar o resto de suas vidas em uma prisão) e mata muito mais do que os problemas de saúde relacionados ao abuso dessas substâncias pelo usuário, ao conferir uma fonte rápida de financiamento aos criminosos que passam a controlar este mercado. Não se engane, é Milton Friedman quem nos diz:



Como vimos, o suposto liberalismo desses candidatos é superficial, e, na verdade, eles são candidatos conservadores, não liberais. Mas essa confusão nem é de se estranhar.

Um famoso blogueiro da Veja, Rodrigo Constantino (na imagem que ilustra este texto, o vemos conversando com o Pastor Everaldo), se autodenomina como “liberal sem medo da polêmica”, mas na verdade é um neoconservador. Eu e Carlos Góes já escrevemos texto criticando seu posicionamento conservador em relação à família. E há momentos em que sua posição afunda no mais lamentável, estreito e cego direitismo.

Em face do texto de Miriam Leitão, onde a jornalista relata como foi torturada durante a ditadura militar (espancada brutalmente, jogada em uma sala com uma cobra, atiçaram cachorros contra ela, quando encarou um dos seus algozes levou um soco na cara pelo crime de olhar, a despiram, abusaram sexualmente dela e chegaram no limite do estupro, no final de tudo ainda simularam um fuzilamento) pelo crime de achar que o comunismo era bom em 1972, o que Rodrigo Constantino teve a dizer?

Constantino acha que ela deveria ter pedido desculpas por ter achado que o comunismo era bom quando jovem. Perceba: ela foi torturada grávida, e o mais importante que Constantino acha que tem a dizer é exigir dela um pedido formal de desculpas (sendo que ela apenas acreditava no comunismo, e nunca usou de violência contra ninguém).  E ainda: Constantino nem parece se preocupar com a Lei de Anistia, e com o fato do Estado brasileiro ter desculpado crimes hediondos de seus agentes, como todo liberal consistente deveria se incomodar. Aliás, nem é questão de liberalismo, é mais de humanidade simples ou bom senso mínimo. (Ao final do dia, o Editor da Veja.com pediu que Constantino retirasse o texto do ar)

E isso não é de hoje: no caso do assassinato de Cláudia Silva Ferreira por agentes policiais, cujo único “crime” foi o de estar com um copo de café à mão, e que por isso foi baleada, carregada até a viatura policial na qual seria levada para o hospital, colocada no porta-malas, que abriu no trajeto, de modo que seu corpo ficou preso no para-choque e foi arrastada por cerca de 350 metros pelo asfalto até ser empurrada de volta para dentro do carro, o que Constantino falou sobre isso em seu blog?

Nada.

Na verdade, estou sendo injusto: Há uma única referência. E a referência é apenas para criticar o texto de Erick Vasconcelos onde este denuncia a brutalidade policial e seu pretexto na guerra às drogas. O texto de Constantino tem como título “Legalizar drogas não é panaceia contra o crime. Ou: quando ‘libertários’ mais parecem comunistas“, e sua premissa é de que o Estado policial brasileiro não precisa ser severamente questionado, o que nenhum liberal sério jamais concordaria! (Recomendo que o leitor confira a réplica do Erick)

Curiosamente, no final desse texto, Constantino afirma: “Enfim, tudo isso poderia ser apenas um episódio menor a ser ignorado, não fosse o fato de que um texto absurdo desses fala em nome de muitos “libertários”, que mais parecem jovens saídos diretamente de uma reunião do PSTU ou do PSOL. De “libertários” assim, o movimento liberal não precisa mesmo!”

Sério mesmo? O movimento liberal não precisa é de tanta gente querendo adotar o rótulo de liberal, quando conhece de forma muito superficial essa tradição política e, na verdade, adota uma ideologia contraposta, o conservadorismo e o direitismo.

O liberalismo defende a mudança social e econômica profunda como objetivo final (mesmo quando o gradualismo é definido como meio). De fato, o liberalismo historicamente foi mesmo considerado de esquerda, foi oposição à plutocracia e aos imperialistas de todos os tipos. Como gosto de dizer, “liberalismo fora de contexto, é pretexto“, e o liberalismo deve resgatar seu papel enquanto um movimento inclusivo, libertador e humanitário.

Quanto à política, penso que um representante verdadeiramente progressista, libertário e liberal, deve pautar sua atuação na defesa radical da liberdade pessoal, da justiça social e da economia livre, com uma opção preferencial pelos mais pobres e pelas minorias, e focado na redução de danos gerados pelo próprio Estado. Descrevi um candidato semelhante, no contexto da política estadual e municipal em texto aqui para o Mercado Popular. Mas não encontrei entre os supostos candidatos liberais nenhum que adotasse este perfil – com certeza não no Pastor Everaldo e no Paulo Batista.

Por isso, estes supostos liberais em foco nas eleições e na mídia não representam o liberalismo. Se eles fossem representantes do liberalismo, eu não me consideraria mais liberal, porque de fato seria um posicionamento superficial, incompleto e mesmo prejudicial para lidar com os grandes problemas relativos à liberdade individual e às vulnerabilidades sociais e econômicas. Mas o fato é que eles não são, e o conservadorismo deles deve ser exposto e criticado como tal.



Valdenor Júnior é advogado. Desde janeiro de 2013, escreve em seu blog pessoal Tabula (não) Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart onde discute alguns de seus principais interesses: naturalismo filosófico, ciência evolucionária com foco nas explicações darwinianas ao comportamento e cognição humanas, economia, filosofia política com foco na compatibilidade entre livre mercado e justiça social. Também escreve para o Centro por uma Sociedade sem Estado – C4SS e o Liberzone.

Fonte: http://mercadopopular.org/2014/08/contra-o-conservadorismo-travestido-de-liberalismo-nas-eleicoes-e-na-midia/

Offline João da Ega

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #1 Online: 24 de Agosto de 2014, 10:19:40 »
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Quanto à política, penso que um representante verdadeiramente progressista, libertário e liberal, deve pautar sua atuação na defesa radical da liberdade pessoal, da justiça social e da economia livre, com uma opção preferencial pelos mais pobres e pelas minorias, e focado na redução de danos gerados pelo próprio Estado.

Os libertários/liberais (Parcus, Libertário) aqui do fórum assinam embaixo?
"Nunca devemos admitir como causa daquilo que não compreendemos algo que entendemos menos ainda." Marquês de Sade

Rhyan

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #2 Online: 25 de Agosto de 2014, 14:40:42 »
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Quanto à política, penso que um representante verdadeiramente progressista, libertário e liberal, deve pautar sua atuação na defesa radical da liberdade pessoal, da justiça social e da economia livre, com uma opção preferencial pelos mais pobres e pelas minorias, e focado na redução de danos gerados pelo próprio Estado.

Os libertários/liberais (Parcus, Libertário) aqui do fórum assinam embaixo?

Isso é apenas uma vertente libertária, os Bleeding Heart Libertarians. Esse site é um site BHL. Há amplo debate entre libertários sobre libertarianismo estreito ou denso.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #3 Online: 12 de Abril de 2015, 00:23:16 »
Já o Candidato a Deputado Estadual Paulo Batista tornou-se, ontem, viral nas redes sociais, sendo citados por inúmeros sites incluindo o Terra e o Não Salvo, com seu vídeo do “Raio Privatizador”, onde aparece como um super-herói que dispara um raio laser de seus olhos, com os quais torna grevistas da USP pública em formandos de uma USP privatizada, entre outras façanhas.


Super-homem privatizou parte da muralha da China em "Super-homem 4".

<a href="https://www.youtube.com/v/FGVyXmiLOVc" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/FGVyXmiLOVc</a>

Offline MarceliNNNN

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #4 Online: 12 de Abril de 2015, 14:33:12 »
É fato que atualmente, os ditos conservadores, querem colocar uma máscara liberalista na face, mas fazem um discurso conservador. Quem é leigo na mesma hora assimila que liberalismo é farinha do mesmo saco dos conservadores e ,em razão disso, a esquerda acaba ganhando mais força rs.
« Última modificação: 12 de Abril de 2015, 14:54:55 por MarceliNNNN »

Rhyan

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #5 Online: 12 de Abril de 2015, 14:40:23 »
Estava convencido em votar no Paulo Batista na última eleição. Hoje ele é claramente um conservador-liberal, ou pelo menos foi vender seu peixe numa outra freguesia. Além de ficar amiguinho do filho do Bolsonaro, deu declarações lamentáveis e ainda fica repetindo essa bobagem de "Foro de SP".

Os radicais ancaps anti-votos e os left-libers estavam certos, pelo menos dessa vez.

Rhyan

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #6 Online: 12 de Abril de 2015, 14:43:25 »
É muito comum ver gente associando liberalismo com direita, Mises com Olavo, etc.. É um absurdo. Rothbard escreveu um livro muito bom sobre isso 'Esquerda e Direita', mostra que o liberalismo nasceu na esquerda, Rothbard tentou criar um movimento libertário chamado A Nova Esquerda, ironicamente no final da vida ele foi se aliar aos paleoconservatives.

Offline MarceliNNNN

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Re:Contra o conservadorismo travestido de liberalismo nas eleições e na mídia
« Resposta #7 Online: 12 de Abril de 2015, 15:01:45 »
É muito comum ver gente associando liberalismo com direita, Mises com Olavo, etc.. É um absurdo. Rothbard escreveu um livro muito bom sobre isso 'Esquerda e Direita', mostra que o liberalismo nasceu na esquerda, Rothbard tentou criar um movimento libertário chamado A Nova Esquerda, ironicamente no final da vida ele foi se aliar aos paleoconservatives.

Sem um mínimo de pesquisa, as pessoas associam mesmo. Eu recentemente fiquei adepto das ideias liberais/libertárias e venho pesquisando bastante sobre isso. Não concordo com tudo que eles escrevem, mas claramente eu vejo que as ideias liberais fazem muito mais sentido do que de outras vertentes ideológicas.

 

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