SERÁ O FIM DA POLÍTICA?
Correio do Povo, 01/09/2005
Percival Puggina
Todo pensador que supõe saber para onde marcham, inexoravelmente, a política, a economia e a humanidade, acaba, de algum modo, apontando para aquilo que se convencionou chamar "fim da história". A expressão se tornou mais conhecida quando o filósofo norte-americano Francis Fukuyama se atreveu a escrever um livro com esse título após a queda do Muro de Berlim. Na obra, ele sustentava que havíamos chegado ao ponto extremo da "volução ideológica e à universalização da democracia liberal ocidental como forma final de governo". Tal determinismo não era novidade. Em vieses diferentes já podia ser identificado entre os iluministas, por quem soubesse busca-lo, e ressurge, mais tarde, no pensamento de Hegel, Marx, Rosa de Luxemburgo, Wells e Lênin.
Ao longo das últimas semanas, enquanto a nova classe dominante do país chafurda, seus intelectuais se debruçam sobre o idioma. É isso mesmo. Sobre o idioma. E já conseguiram bons eufemismos: corrupção virou irregularidade, formação de quadrilha virou mero crime eleitoral, caixa dois virou recurso não contabilizado e compra de votos virou negociação política. Ao mesmo tempo, seus porta-vozes tratam de defender o lombo alardeando que os partidos de oposição não têm autoridade para acusar o PT porque tampouco podem exibir uma folha corrida sem máculas. Não duvido de que o argumento funcione para quem disponha de senso crítico em dose escassa. "Pois é, repetirão em coro. Quem são eles para erguer o dedo contra nós!" Foi aí que comecei a me lembrar de Fukuyama.
Primeiro porque a idéia de que os partidos de oposição não têm condições morais de acusar o PT mostra que o velho totalitarismo não morreu em Berlim, mas está vivito e coleante como diriam os castelhanos. Afinal, se nenhum partido pode criticar o PT, só o PT pode fazê-lo. E aquele ancião chamado "partido único" veste fraldas e volta para o berçário. Depois porque a mesma tese, evidentemente, se autodestrói em 2007, quando também o PT, sob o peso das próprias culpas, estará incapacitado a criticar a conduta de quem quer que seja. E chegamos, assim, ao fim da política. Quod erat demonstrandum.