Muito se discute se o grande problema é a pobreza ou se apenas a desigualdade social, mesmo não havendo miséria ou pobreza extrema, pode desencadear sérios problemas sociais, como epidemias de doenças e violência. Abaixo um texto com referências a estudos científicos, advogando que não só a privação, mas a privação relativa (desigualdade social) possui sérios efeitos psicológicos e físicos sobre os indivíduos em sociedade, tornando instáveis até mesmo sociedades onde o nível de renda é considerado satisfatório.
Alguns dizem que isto se resume a inveja. Porém, mesmo levando-se em conta tal termo subjetivo e superficial, ainda assim existiria um fenômeno biopsicossocial como causador de tal sentimento e suas consequências sociais, não se restringindo a uma questão de moral ou educação, mas abrangendo toda a biologia humana em interação com o ambiente, inevitavelmente promovendo comportamentos aberrantes, que, sendo assim, trata-se de um assunto que não pode ser simplesmente ignorado ou termos como solução apenas sistemas de punição se quisermos ter algum progresso real na melhoria da qualidade de vida em sociedade. Gostaria de saber qual a opinião de vocês (embasada em fatos e dados) sobre isto.
Saúde Fisiológica
Hoje, os principais problemas fisiológicos da população humana incluem grandes epidemias causadoras de mortalidade, tais como o câncer, doenças cardíacas, derrame, etc. Problemas relativamente menores, que não só reduzem a qualidade de vida, mas também frequentemente precedem essas doenças mais graves, incluem pressão alta, obesidade e outras questões que, embora menos críticas em comparação, ainda são uma parte do processo que pode levar a doenças graves e à morte ao longo do tempo [127]. Novamente, é importante lembrar que a causa dessas doenças "físicas" não são estritamente "físicas" no sentido estrito da palavra, pois estudos modernos demonstram que o estresse psicossocial [128] possui relações profundas com problemas fisiológicos aparentemente desconexos.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, as causas de morte mais comuns em países com renda baixa, média e alta são doenças cardíacas, infecções no trato respiratório inferior, derrame e câncer.[129] Embora cada uma dessas doenças (e muitas outras) possa estar relacionada às causas que serão apresentadas, para simplificar, focaremos nas doenças cardíacas.
Estudo de Caso: Doença Cardíaca
Embora o tratamento das doenças cardíacas tenha levado, recentemente, a um leve declínio global no número de ataques cardíacos e óbitos,[130] o diagnóstico de doenças cardíacas não diminuiu, e alguns estudos regionais mostram que ele está em ascensão, [131] ou em um ritmo de aumento substancial [132]. A Doença Coronária Cardíaca ainda é considerada, globalmente, pela OMS como "a principal causa de morte" [133] e verificou-se que, embora existam fatores genéticos em jogo, 90% das pessoas que morrem "têm fatores de risco influenciados pelo estilo de vida" e, em geral, a doença é considerada amplamente evitável se ajustes no estilo de vida são feitos.
Resumindo, relações já estabelecidas com dietas ricas em gordura, tabagismo, álcool, obesidade, colesterol alto, diabetes e outros fatores de risco nos permitem estender a causa da doença cardíaca, e quando rastreamos as influências, a influência mais profunda e ampla encontrada não tem a ver só com a renda absoluta, mas com o status socioeconômico relativo.
A OMS deixou claro em escala global que, geralmente, níveis socioeconômicos mais baixos geram mais doenças do coração e, naturalmente, mais fatores de risco que conduzem a elas. [135] Isto, por um lado, traça uma relação direta entre a situação econômica e a ocorrência de doenças. Não há nenhuma evidência mostrando que as diferenças genéticas entre grupos regionais possam ser responsáveis por essas variações, e é óbvio que o baixo poder de compra leva as pessoas a estilos de vida que incluem muitos desses fatores de risco.
Um estudo de 2009 no American Journal of Epidemiology chamado "Life-Course Socioeconomic Position and Incidence of Coronary Heart Disease" descobriu que quanto mais tempo uma pessoa permanece em situação de pobreza, maior a sua probabilidade de desenvolver doenças cardíacas [136]. Pessoas que estiveram em desvantagem econômica ao longo da vida demonstraram mais propensidade ao fumo, obesidade, má alimentação e assim por diante. Em um estudo anterior, realizado pelo epidemiologista Dr. Ralph R. Frerichs, com enfoque específico na divisão socioeconômica da cidade de Los Angeles, Califórnia, descobriu-se que a taxa de morte por doença cardíaca foi 40% maior para os homens pobres do que para os mais ricos. [137]
Dado que a nossa tese original considera um elo entre o próprio sistema social e a prevalência de doenças e seus fatores de risco associados, é preciso considerar a relação direta entre estresse e poder de compra.
Começando com o último, que é mais simples, é óbvio que hábitos de saúde ruins ocorrem em ambientes de baixa renda devido à falta de recursos financeiros para uma melhor nutrição, [138] atenção médica [139] e educação. [140] Muitos dos alimentos com alto teor de gordura e alto fator de risco de sódio, por exemplo, que levam a doenças cardíacas, também são os alimentos mais baratos encontrados nas lojas.
Vale notar que o nosso modelo socioeconômico produz bens com base na capacidade de compra da demografia alvo. A decisão de produzir bens alimentícios de baixa qualidade é tomada com base no lucro, e, como a grande maioria do planeta é relativamente pobre, não é nenhuma surpresa que, a fim de atender a esse mercado, a qualidade deva ser reduzida para permitir vendas competitivas. Em outras palavras, há um mercado para cada classe social, e, naturalmente, quanto mais baixa a classe, menor a qualidade. Essa realidade é um exemplo de uma ligação direta entre o sistema social e a causa de doenças. Enquanto educar as pessoas pobres sobre a diferença de qualidade nos produtos alimentares poderia ajudá-las a tomar melhores decisões em relação à alimentação, as restrições financeiras inerentes à sua condição poderiam facilmente tornar essa decisão difícil, se não impossível, pois, mais uma vez, esses produtos são em média mais caros.
Numa época em que a produção de alimentos e a nutrição humana são um fenômeno científico bem entendido quanto ao que funciona ou não - o que é saudável, geralmente, e o que não é - temos que questionar por que a abundância de alimentos deliberadamente insalubres e de métodos industriais prejudiciais ainda existem. O motivo é que a saúde humana não é o objetivo da produção industrial de alimentos e nunca foi, devido ao interesse exclusivo na geração de lucros. Mais informações sobre o transtorno de incentivo inerente à economia de mercado monetário serão fornecidas em ensaios posteriores.
O Fator Estresse
Agora vamos analisar o papel do estresse. O estresse tem mais efeitos sobre a doença cardíaca do que se pensava, e isso não tem a ver somente com o fato estatístico de que as pessoas de baixa renda tem uma tendência a lidar melhor com seus problemas por meio de hábitos como o fumo e a bebida, manifestando pressão arterial elevada e, consequentemente, ignorando a sua saúde e bem-estar por causa da luta constante por renda e sobrevivência. Embora esses fatores sejam evidentes, e, novamente, encontram-se amarrados a uma estratificação inevitável encontrada na Economia de Mercado Monetário, [141] a forma mais prejudicial de estresse vem sob a forma de estresse psicossocial, ou seja, o estresse relativo à interação psicológica com o ambiente social.