Autor Tópico: "A humanidade alterou de forma permanente o futuro geológico da Terra"  (Lida 474 vezes)

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"A humanidade alterou de forma permanente o futuro geológico da Terra"
« Online: 18 de Dezembro de 2015, 11:27:53 »
http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/blog-do-planeta/noticia/2015/12/humanidade-alterou-de-forma-permanente-o-futuro-geologico-da-terra.html


No ano que vem, geólogos do mundo todo se reunirão para tomar uma decisão formal, de nomenclatura, mas que pode reverberar em toda a sociedade. Um grupo de trabalho apresentará a proposta de mudar a época geológica da Terra. Esse grupo defende que o planeta não está mais no holoceno, a época que começou após a era do gelo. Em vez disso, entrou no antropoceno – a época em que os humanos estão no controle.


Esse grupo de trabalho é liderado pelo pesquisador britânico Jan Zalasiewicz, da Universidade de Leicester, no Reino Unido. Por telefone, Zalasiewicz conversou com ÉPOCA e disse que já há evidências o suficiente mostrando que a humanidade alterou o planeta. É só uma questão de saber se vale a pena ou não oficializar o conceito do antropoceno.



ÉPOCA - O termo antropoceno já está sendo usado por ativistas ou ecologistas. Mas ainda não é uma época formal na história geológica, certo?
Jan Zalasiewicz - O antropoceno está sendo formalmente examinado como uma unidade da escala geológica de tempo. Se ele será aceito como uma nova época, não é uma decisão que deve ser tomada pelo meu grupo. E eu sei que ainda há um debate genuíno, não se o fenômeno geológico do antropoceno existe ou não, isso já há bastante evidência, mas se esse conceito deve ou não ser formalizado.


ÉPOCA - Como surgiu esse conceito do antropoceno?

Jan Zalasiewicz - Bem, isso não começou na geologia. Começou em uma disciplina relacionada. Paul Crutzen, um químico atmosférico, estava analisando mudanças químicas na atmosfera e ele sugeriu esse termo por volta do ano 2000, de forma meio que improvisada, de que as condições do holoceno tinham terminado e que nós estávamos vivendo em condições diferentes. Ele reuniu essas ideias e publicou em um paper na Nature, se não me engano em 2002. E o termo decolou. Começou a ser amplamente utilizado. Era um termo formal representando uma unidade de tempo geológico? Não, não era. Mas estava sendo usado no contexto geológico, como uma época, mesmo em publicações científicas, em áreas de temas que têm alguma relação com geologia. Alguns anos depois, alguns colegas e eu, que somos estatigráficos, começamos a nos perguntar se não havia justificativa, bases, para mudar a época. Em 2008, nós pubblicamos um artigo sugerindo que já havia evidências indicando isso, e fomos convidados para formar um grupo de trabalho internacional. O que estamos fazendo é uma análise científica. Ver se há evidências, bases na geologia para justificar ou não mudar de época. Estamos vendos as críticas também. É um processo científico.

ÉPOCA - Quais critérios e evidências são necessários para formalizar a época do antropoceno?
Jan Zalasiewicz - São os mesmos critérios usados para todas as outras épocas e períodos do passado. Em geologia, nós classificamos tanto o estrato geológico – as pedras, vamos dizer assim – e, em paralelo a isso, nós classificamos o tempo em que essas pedras foram produzidas. E as pedras essencialmente gravam muitos processos ambientais. Nós olhamos para mudanças no padrão das rochas para definir as épocas. No caso do antropoceno, isso pode ser a forma como mudamos o padrão de sedimentação por todo o mundo construindo represas, alterando os cursos dos rios, construindo defesas costeiras, esse tipo de coisa. Isso, no futuro, significará um diferente tipo de estrato geológico. Nós podemos procurar mudanças químicas na rocha. Mudanças como presença de carbono, nitrogênio. Nós podemos procurar evidências de poluição, metais que a gente tirou da terra e se espalharam por terra ou mar. Mudanças biológicas também. Animais, plantas, serão fósseis no futuro. Extinções, que estão começando a assumir uma escala muito grande, e invasão de espécies. Mamíferos e plantas foram transportados por humanos para outros continentes, e essas alterações ficam marcadas no estrato e são praticamente permanentes, alterando o destino de gerações futuras de espécies e plantas. Em resumo, são esses processos.

ÉPOCA - Sobre essa ideia de que mudanças humanas virarão fósseis no futuro: é certo que isso acontecerá, nós temos certeza sobre isso?
Jan Zalasiewicz - Cientistas sempre são muito cautelosos com evidências. Somos céticos por natureza. Mas acredito que é razoavel assumir que, em algumas partes do mundo, há uma chance muito boa de que atividade humana se fossilizará. Por exemplo, cidades como Nova Orleans, Amsterdã, provavelmente Xangai têm grandes chances de que suas fundações sejam fossilizadas, porque elas estão afundando. Esses locais, por conta da geografia, têm grandes chances de ser preservados. Foi dessa forma que paisagens do passado foram preservadas. Por outro lado, se você tiver um pedaço da crosta subindo, como Manchester, na Inglaterra, as mudanças humanas sofrerão com erosão e serão apagadas pelo mar. Mas mesmo nessas áreas pode haver um sinal, presença de metais, da composição química. Só não será tão impressionante quanto paisagens inteiras enterradas. Nós sabemos que esses tipos de coisa aconteceram no passado, então provavelmente funcionará assim no futuro também. É possível, sim, assumir que nossa atual atividade humana será preservada.

Além disso, há o clima e a biologia do planeta. As plantas e os animais do futuro serão diferentes do que seriam se nós não existíssimos e não tivéssemos os modificado. Então no longo, muito longo prazo, ações humanas ainda assim terão modificado o planeta. O exemplo que você procurar talvez seja o que aconteceu com a extinção em massa do cretáceo, quando os dinossauros e muitas outras formas de vida morreram, provavelmente por causa de um impacto no México naquela época. Todos os estratos geológicos datados depois daquela época têm muitos fósseis, mas nenhum de dinossauro. Não é apenas o impacto, mas também a mudança no curso da história geológica. Nós ainda não produzimos uma mudança tão brusca quanto a de um meteoro, mas mesmo assim algumas coisas mudarão de forma permanente no futuro geológico.

ÉPOCA - Também existe um debate sobre quando o antropoceno começou. Nós não temos uma data ainda?
Jan Zalasiewicz - Esse não é apenas um debate do antropoceno, mas um debate que existe em qualquer unidade geológica de tempo: quando um período começa, quando ele termina. Na escala de tempo geológico, as unidades não são definidas por um tempo específico, como num ano, em que todos os dias têm a mesma duração. Nós pegamos um momento no tempo, preservado no estrato geológico em algum lugar, onde algo distinto acontece. E então usamos essa posição como ponto de referência para a demarcação do tempo em todo o mundo. Por exemplo, o começo do período siluriano, há 430 milhões de anos. O exato momento do começo do período é captado no estrato de um pequeno córrego, no sul da Escócia, chamado Dob's Linn. Isso é reconhecido oficialmente para ser usado em todo o mundo. Você precisa combinar os estratos em todo o mundo com essa "golden spike section" na Escócia. E de novo, quando você faz isso em prática, nunca é um valor preciso. São aproximações, é assim que a escala geológica funciona. Mas ainda assim é um sistema bastante funcional.

Nós temos exatamente o mesmo debate sobre o antropoceno. Se ficar claro que as evidências para o antropoceno são boas, de que é um fenômeno real na histórica geológica, que o estrato está mudando o suficiente para marcar uma mudança na época geológica, então nós temos que decidir quando isso começou. Até agora, se você olhar para a maior mudança feita por humanos, são as mudanças associadas à segunda metade do século XX. É a chamada "Grande Aceleração" da economia, da explosão populacional, o início da produção de plásticos, a era nuclear. Uma série de mudanças que podem ser reconhecidas no estrato a partir do 1950-60. Se a gente decidir isso, devemos escolher um momento no tempo, um ano no calendário. Uma possibilidade que nós sugerimos para a discussão é escolher o momento do primeiro teste de bomba atômica.

ÉPOCA - Mas os resultados dessa primeira bomba atômica ficarão marcados no estrato?
Jan Zalasiewicz - Sem dúvida. Eu, você, todo mundo no planeta é ligeiramente mais radioativo. Nós temos pequenas porções de césium, plutônio, etc. Provavelmente, o teste de Almogrado e as bombas de Hiroshima e Nagasaki tiveram impactos locais, mas quando os países começaram a testar as grandes bombas de hidrogênio, partículas radiativas se espalharam por todo o mundo. Assim, se você medir a radiatividade em sedimentos recentes, você consegue saber o momento em que a radiação iniciou. Alguém pode ir para a Antártica e, nas camadas de gelo, poderá identificar que na década de 1950 a radiação começou a aumentar repentinamente. É um sinal, por todo o mundo, que se pode identificar de forma acurada. Como um fenômeno ambiental, essa alteração na radiação pode não ser relevante. Como um marco, é útil.

ÉPOCA - E o aumento das emissões de carbono, não serve como um marco para o antropoceno?

Jan Zalasiewicz - Isso foi sugerido em um artigo publicado há alguns meses por colegas trabalhando com partículas de fumaça. Eles sugeriram que o aumento dessas partículas poderia ser usado como marco para o início do antropoceno. É uma sugestão interessante.

ÉPOCA - Se o antropoceno for formalizado, o que muda?
Jan Zalasiewicz - Na geologia, não muito. É mais uma forma de comunicação entre os geólogos, definindo o termo de forma que podemos ter certeza que os pesquisadores estão dizendo a mesma coisa quando falam do antropoceno. Essa é basicamente a razão para nomear todas as partes da escala de tempo geológica. Mas nós estamos cientes de que há implicações mais amplas em termos das mudanças globais que estão acontecendo. Potencialmente, seria um termo que poderia nos ajudar a lidar com essas mudanças globais. Isso é algo que precisamos avaliar. Não apenas se o antropoceno é real, mas também se formalizar o conceito poderá ajudar, ser útil, ou se seria um problema, se atrapalharia as pessoas que trabalham em outras áreas. Isso é algo novo para nós. Em todas as outras unidades geológicas, só a opinião de geólogos importava. Ter um termo com um uso mais amplo, acho que é uma boa coisa. Coloca a geologia no debate mais amplo. É essa questão que torna a decisão sobre o antropoceno um pouco mais difícil, particularmente mais complicada.

ÉPOCA - Pessoalmente, o senhor acha que já vivemos o antropoceno?
Jan Zalasiewicz - Quanto mais você olha a evidência, mais você percebe que mudanças substanciais estão acontecendo nos registros geológicos no momento. Algumas pessoas acham que é prematuro formalizar o antropoceno, mas mesmo elas concordam que a escala das mudanças provocadas pelos humanos, na velocidade em que as coisas estão mudando, estão resultando numa nova época geológica.

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Offline Peter Joseph

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