Autor Tópico: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras  (Lida 1366 vezes)

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Offline Buckaroo Banzai

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mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Online: 21 de Setembro de 2005, 19:19:52 »
Estava imaginando... seria possível que existam mudanças nas interpretações de textos religiosos tenham decorrentes de modificações no significado de certas palavras, ao mesmo tempo em que esses termos não são "atualizados" nos livros religiosos?

Por exemplo, num livro religioso está o termo "X", que em dado momento da história significou "1". Passou o tempo, e X ficou sendo usado para significar 3, e 1 agora é Y. Mas nos livros religiosos continua X onde sempre esteve X, em vez de atualizar pelo significado, colocando um Y... e agora interpretam esse X como sendo 3 mesmo, e não 1, que era o significado original.

Será que isso ocorre?

Offline Rodion

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Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #1 Online: 21 de Setembro de 2005, 19:23:08 »
provavelmente. a bíblia tem muitas palavras e muitos anos de existência.
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Offline Diego

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Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #2 Online: 21 de Setembro de 2005, 20:01:34 »
tb acredito q sim...

mas teriamos q ter acesso a alguma pesquisa q mostre alguma coisa nesse sentido acontece...
e tb alguma coisa se perde ou é mudado na tradução do texto...

Offline Cara Estranho

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Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #3 Online: 21 de Setembro de 2005, 20:41:59 »
Em As Mais Famosas Lendas, Mitos e Mentiras da História (livro de um cara chamado Richard Shenkman), há um pequeno capítulo dedicado à Bíblia onde ele mostra algumas passagens que ganharam interpretações diferentes com o passar do tempo, tipo Jonas e o "peixe grande": segundo Shenkman, "ser engolido por um peixe grande" e toda aquela coisa de ficar no ventre do peixe em aramaico equivaleria ao nosso "entrar numa fria" ou "se ferrar"; ainda hoje na Síria (país que usa o aramaico) essa expressão tem sentido figurado, não significa que o cara foi literalmente engolido por um peixe ou mamífero aquático... apenas foi posto em uma situação difícil.
Meu maracatu pesa uma tonelada!

Offline Luis Dantas

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Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #4 Online: 21 de Setembro de 2005, 23:40:39 »
Pelo que sei, aconteceu sim, com a palavra grega para "moça".  O sentido da palavra mudou com o tempo, e por esse motivo Isaías 7,14 (creio) deixou de ser visto como uma profecia referente a Isaías 8 e passou a ser uma profecia de que o Messias nasceria de uma Virgem... há um tópico a respeito por aqui.
Wiki experimental | http://luisdantas.zip.net
The stanza uttered by a teacher is reborn in the scholar who repeats the word

Em 18 de janeiro de 2010, ainda não vejo motivo para postar aqui. Estou nos fóruns Ateus do Brasil, Realidade, RV.  Se a Moderação reconquistar meu respeito, eu volto.  Questão de coerência.

Offline Pensador Amazonense

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Re: Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #5 Online: 30 de Setembro de 2005, 02:13:12 »
Citação de: cara estranho
Em As Mais Famosas Lendas, Mitos e Mentiras da História (livro de um cara chamado Richard Shenkman), há um pequeno capítulo dedicado à Bíblia onde ele mostra algumas passagens que ganharam interpretações diferentes com o passar do tempo, tipo Jonas e o "peixe grande": segundo Shenkman, "ser engolido por um peixe grande" e toda aquela coisa de ficar no ventre do peixe em aramaico equivaleria ao nosso "entrar numa fria" ou "se ferrar"; ainda hoje na Síria (país que usa o aramaico) essa expressão tem sentido figurado, não significa que o cara foi literalmente engolido por um peixe ou mamífero aquático... apenas foi posto em uma situação difícil.

Isso também pode ser explicado, com mais lógica, pelo contrário. Ou seja, que o sentido da expressão tenha derivado do relato bíblico. Isso é muito comum. Vejam: uma fonte literária bastante difundida (lembremos que o aramaico é falado hoje somente entre a população cristã da Síria) contém um episódio bastante conhecido onde alguém é engolido por um peixe e se dá mal por isso. Que surja uma expressão "ser engolido por um peixe" com o sentido de "entrar numa fria" não seria nada improvável.

Processo semelhante ocorre, em muito menor escala, aqui no Brasil, onde as vezes se diz que fulana "engravidou do Espírito Santo", significando que a gravidez não pode ser explicada por uma origem normal. Seria um absurdo supor que num passado distante a expressão "engravidar do Espírito Santo" significava cometer um ato ilícito que resulta numa situação constrangedora para se explicar, no caso, uma gravidez, e que com o passar do tempo ganhou o sentido de ter sido fecundada sobrenaturalmente pela terceira pessoa da Trindade.

As expressões lingüísticas, em geral, evoluem do específico para o geral. Faz mais sentido que a expressão "ser engolido por um peixe" tenha tido o seu significado ampliado para abranger quaisquer dificuldades enfrentadas do que o contrário.

Offline Pensador Amazonense

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Re: Re.: mudanças lingüísticas e rigidez de escrituras
« Resposta #6 Online: 30 de Setembro de 2005, 02:29:36 »
Citação de: Luis Dantas
Pelo que sei, aconteceu sim, com a palavra grega para "moça".  O sentido da palavra mudou com o tempo, e por esse motivo Isaías 7,14 (creio) deixou de ser visto como uma profecia referente a Isaías 8 e passou a ser uma profecia de que o Messias nasceria de uma Virgem... há um tópico a respeito por aqui.

O que aconteceu foi o seguinte. O termo usado em Isaías tem o sentido de "mulher jovem", mas seu contexto cultural, histórico e lingüístico lhe davam outras acepções, além da estritamente etimológica. Significava habitualmente mulher ainda não casada e, portanto, virgem. A interpretação primária da profecia de Isaías não pode ter esse sentido (uma virgem conceberá), pois se refere a uma mulher casada. Mas, segundo o princípio da dupla interpretação, quase sempre uma profecia possui mais de um significado, e mais de um cumprimento. O primeiro cumprimento ocorre como um sinal de que o segundo cumprimento também ocorrerá. Os teólogos chamam isso de tipo (símbolo) e antítipo (simbolizado).

Quando, na era helenística, a Bíblia foi traduzida para o grego, os tradutores da Septuaginta traduziram o termo hebraico por "virgem", captando-lhe assim o sentido mais profundo que a passagem possui. Fizeram isso provavelmente porque não encontraram alguma palavra no grego que possuísse os dois sentidos (mulher jovem e mulher virgem). Assim sendo, deram prioridade ao mais importante. Vejam que, com isso, a passagem de Isaías ficou incoerente, pois fala que uma virgem conceberá, mas a mulher que concebeu (como cumprimento imediato da profecia) não era mais virgem. Ou seja, os tradutores sabiam o que estavam fazendo. Foi uma decisão consciente. É errado supor que eles cometeram um erro. Os tradutores da Septuaginta estavam muito mais próximos do original do que nós, viviam num tempo em que o hebraico ainda era uma língua viva, e sua decisão certamente serve como referência para nós.

Mateus cita corretamente quando escreve "uma virgem conceberá", pois as citações do Antigo Testamento feitas no Novo Testamento seguem a Septuaginta. Quanto às traduções para o português, tem havido controvérsia entre os tradutores e entre os membros, a meu ver desnecessariamente. Isso porque o português, assim como o hebraico, possui uma palavra que engloba os dois sentidos. É a palavra "moça". Que, como bem sabemos, em alguns Estados possui o sentido de mulher jovem, e em outros possui também o sentido de mulher virgem. Seria a tradução perfeita! Na passagem de Isaías constaria a palavra "moça", traduzindo com perfeição os sentidos do original, e em Mateus apareceria a palavra "virgem", conforme a Septuaginta. Mas não conheço nenhuma tradução que adote essa minha solução.

 

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