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SÃO PAULO (Reuters) - Quando o escritor português José Saramago começou a escrever "Ensaio sobre a Cegueira", um de seus livros mais conhecidos, perguntou a si mesmo o que aconteceria com o mundo se todas as pessoas passassem a ser cegas.Na noite de quinta-feira, em São Paulo, o ganhador do Nobel de Literatura disse que voltou a questionar o improvável para escrever seu novo romance: e se a Morte deixasse de matar?"Percebi que todos os meus livros, sem exceção, partem do improvável, do impossível", disse o escritor de 83 anos, no lançamento internacional de "As Intermitências da Morte", no Sesc Pinheiros."E descobri isso há muito pouco tempo, há uns dois anos", explicou, completando que, se voltar a escrever, terá que ser mais uma vez sobre o improvável.O novo romance, que está sendo publicado primeiramente no Brasil, em uma parceria com a editora Companhia das Letras, faz uma ode à morte. "No final, descobrimos que a única condição para a vida existir é a morte", disse Saramago, bem-humorado, vestido de terno e gravata escuros.A Morte toma a forma de uma mulher, que resolve fazer greve, chateada por ser tão detestada pelos humanos. O que no início é uma dádiva para uma nação, acaba se transformando num fardo. Os hospitais lotam, não há mais como sustentar o sistema de pensão, as pessoas vão envelhecendo sem parar, sem fim, sem morte."Logo se percebe que é melhor continuar morrendo", afirmou Saramago, contando que a novidade afeta também a Igreja, que começa a fazer manifestos pela volta da morte, e os filósofos, que perdem o rumo.Mas a greve termina e a Morte volta a rondar. O procedimento, no entanto, muda. O futuro morto recebe uma carta e terá então oito dias para arrumar a vida. "Fazer testamento, pagar impostos, pagar dívidas, fazer as pazes com os inimigos, enfim, ir de consciência livre", ironizou Saramago.Até que um dia uma das cartas enviadas volta. Volta diversas vezes e a Morte resolve ir entregá-la pessoalmente. O destinatário é um violoncelista tímido, que recebe o telefonema misterioso da Morte, sem saber no entanto com quem fala.Esse primeiro diálogo dos dois foi dramatizado durante o evento pela atriz Leona Cavalli e pelo Dan Stulbach. Entre a leitura e a palestra de Saramago sobre o novo livro, o violoncelista Johannes Cramsch, da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, interpretou duas peças de Bach.No diálogo, ela admite que falhou duas vezes em entregar em mãos a carta ao rapaz, sem ele saber do que se trata. A conversa vira um flerte, ambos brincando com a morte, sem sabê-lo de fato."É um livro extremamente divertido, o leitor sorrirá muitas vezes, soltará até mesmo uma gargalhada", afirmou o escritor, evitando contar o final do livro e dizendo apenas que finaliza "como se deve, com um encontro do ser e da a morte, olhos nos olhos".
Saramago aderiu à Campanha de Florestas, do Greenpeace, e Intermitências da morte será impresso em papel certificado pelo FSC (sigla em inglês para Conselho de Manejo Florestal). O papel é o Paperfect ®, da Suzano Papel e Celulose, produzido na Unidade de Mucuri, na Bahia, e tem como matéria-prima madeira oriunda de floresta manejada de forma ecologicamente adequada e socialmente benéfica. O processo de produção é controlado do começo ao fim, desde a situação do trabalhador até a manutenção da integridade do ecossistema.