Autor Tópico: Por que os capitais não vêm... e menores abandonados  (Lida 476 vezes)

0 Membros e 1 Visitante estão vendo este tópico.

Offline Rodion

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 9.872
Por que os capitais não vêm... e menores abandonados
« Online: 25 de Janeiro de 2006, 08:24:14 »
Por que os capitais não vêm

Às vésperas de mais uma reunião do Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, e da versão americana do 6º Fórum Social Mundial, em Caracas, a Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) divulgou um balanço do movimento mundial de capitais produtivos - com números desalentadores para a América Latina em geral e o Brasil em especial. Há uma espécie de simetria entre esses dados e a hegemonia da China e, secundariamente, da Índia na agenda deste ano da conferência de Davos, à qual o presidente Lula tomou a duvidosa decisão de não comparecer, abrindo mão da oportunidade de discursar na abertura da sessão dedicada ao comércio global. Menos imediato, pode haver também um nexo entre os números da Unctad e o dilema que parece dividir os participantes do Fórum Social: politizar-se mais, o que significará na prática servir de correia de transmissão do chavismo na América Latina, ou continuar a ser um evento livre da tutela de mentores aboletados no poder.
Os números apresentados pela Unctad mostram que o fluxo dos investimentos diretos aumentou em média 29% no ano passado (e 38% no mundo desenvolvido). A variação em relação a 2004 foi de 13% nos países emergentes, 5% na América Latina - e menos 15% no Brasil. Além disso, o País voltou a ficar atrás do México. Ali ingressaram US$ 17,2 bilhões (4% a menos do que no ano interior, por sinal), ante US$ 15,5 bilhões aqui. A China recebeu cerca do quádruplo disso, acima da França, por exemplo. O investimento estrangeiro é o mais potente motor da integração chinesa à economia mundial (embora parte não desprezível dos recursos aplicados no país não seja propriamente estrangeiro, mas oriundo da miríade de empresas familiares chinesas no exterior, sobretudo nos EUA e na Ásia). De todo modo, ninguém ignora o tripé que sustenta o arranque chinês: crescente capacitação tecnológica, níveis estelares de produtividade - e condições de trabalho similares, para muitos milhões, às dos primórdios da Revolução Industrial no Ocidente.
A cultura, para dizê-lo numa palavra, nunca fará da América Latina uma China tropical.
Mas isso não explica por que o Brasil e os vizinhos, uns mais, outros menos, perderam posições em um ranking que deixa dramaticamente clara ainda uma vez a preferência dos países ricos por seus iguais, no destino dos investimentos privados. (A China é a exceção que confirma a regra.) É altamente provável que o já apenas moderado interesse em aplicar na América Latina tenha se retraído em razão do que se pode denominar 'efeito Chávez' - a percepção de que os latinoamericanos estariam cada vez mais propensos a eleger governos de um estilo terceiro-mundista que já parecia extinto no mundo em desenvolvimento, onde China e Índia são exemplos eloqüentes dos efeitos fantásticos da imunização da economia contra os vírus da ideologia e do nacionalismo 'bandungsiano'.
Por suas inclinações populistas, ou por temor de derrotas eleitorais, o que vem a dar no mesmo, esses governos tendem a ter escasso apreço pela institucionalização dos imprescindíveis marcos regulatórios que de há muito são lana caprina no mundo desenvolvido e que atraem os investidores nos setores produtivos da economia, seja pela segurança que proporcionam, seja pela eliminação de custos irracionais nas suas operações, como os que derivam de entraves institucionais que não são removidos por razões políticas. Quando o investidor em potencial tem a impressão de que aos crônicos obstáculos estruturais à criação de riquezas nesta parte do mundo se soma a ascensão de elites dirigentes que são de uma incompetência exemplar e falam como se quisessem repor a pasta de dentes no tubo, a sua relutância em apostar na América Latina é plenamente compreensível.
A agourenta combinação de um marxismo de Reader´s Digest com o atual surto indigenista na política regional - a floração do atraso em sociedades já de si arcaicas - mais a estridente e anacrônica retórica nacionalista compõem um caso exemplar de desincentivo para o investidor; um breve contra o interesse do capital produtivo por novas oportunidades nessa zona de incertezas. É claro que nesta generalização sabemos distinguir as diferenças entre Brasil e Argentina e a Venezuela, para só ficar nos países que disputam a liderança na América do Sul. Mas lá fora, por enquanto, quem surge como líder é o coronel Hugo Chávez.

Crianças de rua
Ao promover entre outubro e novembro um levantamento do número de crianças de rua em São Paulo, a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social fez uma descoberta surpreendente. Atualmente, existiriam na capital apenas 1.030 meninos e meninas abandonados, vivendo debaixo de viadutos e pontes, banhando-se em chafarizes, pedindo esmolas, usando ou traficando drogas e praticando pequenos furtos. Eles representam somente 0,03% dos 3.126.725 paulistanos com até 17 anos. Muitos deles foram rejeitados por seus pais, perderam qualquer laço familiar, não dispõem de documentos e não sabem o sobrenome.
Para uma cidade de 10,9 milhões de habitantes, segundo as estimativas do IBGE, o número de crianças de rua parece excessivamente baixo. Mas, como lembra o próprio secretário Floriano Pesaro, ele pode ser ainda menor, pois como esses meninos e meninas circulam muito, principalmente pelos bairros mais ricos e onde há grande concentração de casas noturnas, como Pinheiros, Vila Madalena e Moema, elas podem ter sido contadas mais de uma vez.
A esses 1.030 menores abandonados, conforme o levantamento da Prefeitura, somamse outros 3 mil que, diariamente, saem de bairros da periferia e da Grande São Paulo para vender balas, fazer malabarismos e pedir dinheiro em 180 cruzamentos da cidade. Estes meninos e meninas têm casa, moram com os pais e vão à escola. Mesmo assim, levando-se em conta que a região metropolitana tem hoje uma população de 19,7 milhões, esse número também é surpreendentemente baixo.
Por isso, se o levantamento da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social estiver correto, a dimensão do problema é muito menor do que parecia. Em outras palavras, embora as crianças de rua há muito tempo se constituam num dos problemas sociais mais visíveis de São Paulo, seu enfrentamento pode ser bem mais simples e menos oneroso do que se imagina. Em vez de gastar recursos escassos em convênios com organizações não-governamentais, movimentos comunitários e entidades assistenciais, que no conjunto empregam mais gente do que o número de crianças por eles beneficiados, têm alto custo administrativo e apresentam resultados muitas vezes discutíveis, a Prefeitura poderia agir de modo mais racional, com maior eficiência e a baixo custo, por meio de seus próprios órgãos, em colaboração com o Poder Judiciário e o Ministério Público.
O problema é o custo político dessa mudança radical de orientação. Várias das iniciativas já tomadas nesse sentido pela administração municipal acabaram esbarrando na resistência de determinadas ONGs e grupos religiosos. Seja por desvio ideológico ou simples demagogia, seja para não perder os recursos públicos que lhes garantem a sobrevivência financeira, essas entidades costumam apelar para jargões e campanhas fantasiosas. A última 'moda' tem sido classificar pejorativamente como 'higienistas' as ações postas em prática pela Prefeitura com o objetivo de reurbanizar áreas degradadas[isso me lembra do caso do padre lancelotti..], limpar logradouros públicos, evitar assaltos em faróis praticados por meninos de rua e coibir a utilização de crianças abandonadas como
aviões do tráfico.
A Prefeitura dispõe de 5 Centros de Referência da Criança e do Adolescente, que são a porta de entrada de uma rede com 5 casas de acolhida e 32 abrigos. A um custo de R$ 1,5 milhão por mês, essa rede atende não somente meninos e meninas abandonados, mas, também, menores de idade tirados do convívio familiar por determinação judicial ou encaminhados pelo Conselho Tutelar, como manda o Estatuto da Criança e do Adolescente. O objetivo da Prefeitura é terminar 2006 com 11 centros, um para cada Vara de Infância da capital, e desenvolver programas de reinserção social das crianças de rua com entidades assistenciais conceituadas e instituições universitárias, como o Projeto Pixote, vinculado à Universidade Federal de São Paulo.
Para chegar a um número preciso de crianças de rua, a Prefeitura encomendou um censo à USP. Se ele confirmar o surpreendente levantamento feito pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, enfrentar esse velho e angustiante problema será menos difícil do que se pensava.


editorial do estadão, 25/01

grifos e comentários meus.
"Notai, vós homens de ação orgulhosos, não sois senão os instrumentos inconscientes dos homens de pensamento, que na quietude humilde traçaram freqüentemente vossos planos de ação mais definidos." heinrich heine

Offline n/a

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.699
Re.: Por que os capitais não vêm... e menores abandonados
« Resposta #1 Online: 25 de Janeiro de 2006, 16:19:31 »
Gostei.

 

Do NOT follow this link or you will be banned from the site!