- Ah, não, pára com isso!
- ?
- Para com isso!
- Hein?
Estava falando dormindo de novo.
-Pára! Pê á, érre á, para!
- Ai não...
- Traz a espoleta! Te mete, te mete Yolanda! TRAZ A ESPOLETA!
- Esse merda me come arrôz e feijão a meia noite! Dá nisso!
Parou. Parou e Dona Iná tentava dormir de novo quando:
- JÁ PODEIS DA PÁTRIA FIII-ILHOS, VER CONTENTE A ,MÃE GENTI-IL
- Ai que inferno.
Sabia que se acordasse uma pessoa que estivesse falando dormindo ela poderia morrer.
Daí levantou e foi pra cozinha fazer palavras cruzadas. Mas antes de calçar as pantufas:
- Diz! Diz agoraaaaaaaaaaa - dizia com as duas mãos próximas da face fazendo aquele gesto típico de italiano. - diz, vadiaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!!!!
Dona Iná foi pra cozinha, com um leve sorriso no rosto. Que maneira ridícula de passar a noite!
....
- Foi quando Aninha soltou o pum que caiu a marquise e matou ela, o Onofre, a Lúcia e o Thiago Jr. Que merda aquilo.
- Imagino...
- Ai, era eu ligando pra tia, pra tio, pra pai. Mãe chorando desesperada! Ai, olha!
- Que horror.
- E depois juntar os pedaços? E colocar num saco e atirar no poço? Olha, que horror!
- Quer mais um Big Mac?
....
- Colhe, colhe! Isso aí!
Não adiantou ficar na cozinha por duas horas, ele continuava falando dormindo.
Dona Iná não poupou facadas. Pena o Júri não ter tido a sensibilidade de entender...
Que maneira ridícula de enviuvar!
...
Dona Leotilde tentou, mas não conseguiu agradar Leôncio, primo de Zuleica, filha do Demétrio da quitanda. Tudo isso por causa de Lívia, nora de Mustafá, primo-segundo de Daniel, sobrinho-tataraneto de Vilma, cunhada de Célio, que ao ligar para Míriam, filha de Jussara, sobrinha de Baidek, neto-adotivo de Nelson, filho de Beth e sobrino-neto de Levi, dizendo que Ânderson, filho de Artur, vizinho de Cléber, casado com Inês, filha de Cristina, irmã de Dida na realidade era filho de Rubens com Nina, filha de Cezar, marido de Dina, filha de Técio, irmão de Tavarez, que não comia ninguém. Que maneira ridícula de contar uma estória.
...
- Depois tivemos que levar as famílias pra reconhecer os corpos!
- Puta, isso é foda!
- Põe foda nisso! As mães chorando de novo. Ai que inferno! Antes eu tivesse ficado em casa. Culpa do Álex!
- Nuggets?
- Não ÁLEX!
- Não, tu quer nuggets?
- Ah, obrigado. Mas tu não para de comer, criatura! Que maneira ridícula de engordar!
...
- Quer uma sacolinha?
- Não, obrigado.
- Mas é melhor, não quer mesmo?
- Não precisa, é só um refrigerante.
- Mas olha, é sempre melhor e menos incômodo...
- Não, não, obrigado mesmo, mas não precisa...
- Por favor!
- Oi?
- Por favor, leve uma sacolinha, é de coração!
Já não estava entendendo mais nada.
- Mas por quê? Não precisa, eu moro do outro lado da rua!
- MAS QUE SACO!!!!!!
Subiu no balcão.
- PEGA ESSA MERDA DESSA SACOLA, CACETE!
- Mas o que é isso? Que falta de respeito!
- Escuta - desceu e ficou de joelhos - eu não agüento mais oferecer as malditas sacolinhas pras pessoas e elas sempre dizem que não precisa! Porque é pouca coisa, ou porque moram perto! EU NÃO AGUENTO MAIS! Eu gasto todo mês pra manter em dia o meu estoque de sacolinhas e vocês malditos e incompreensíveis fregueses não entendem! Simplesmente vestem-se de toda a arrogância que lhes é devida e dizem: "não, não precisa de sacolinha, obrigado!" vocês pensam que são o quê?
- O senhor é doente!
- Sempre tento, tento, tento, ninguém pode dizer que não! Nunca consigo fazer os meus clientes sairem daqui da padaria com as sacolinhas! Personalizei com o nome daqui, não é bonito?
Esfregava na cara do apavorado freguês. Que por sua vez não sabia se saía correndo ou brigava com o cara.
Caíram no chão, rolaram até a entrada. os demais funcionários tentavam separar, mas acabavam apanhando.
Dois dias depois foi encontrado o padeiro em casa sufocado na sacolinha da própria padaria. Suicidou-se por asfixia, que maneira ridícula de se matar...