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Analistas políticos que aplicam-se à bola de cristal sempre erram. Aliás, todos os que se aplicam à referida esfera translúcida, tropeçam gravemente. Há um livro traduzido pela Editora Unesp sobre as traquinagens de cientistas (ou ex-cientistas) na astrologia. O nível de algumas universidades brasileiras desceu tanto que nelas existem cursos e “pesquisas” astrológicas. E dinheiro escorre dos cofres públicos em prol da idiotia delirante. Certa feita escrevi que, a seguir a tendência populista atual, breve os diplomas seriam distribuídos em comícios. E se eles fossem entregues entre números circenses? A ciência seria fácil, leve, agradável, não exigiria esforço intelectual ou ético. Bastariam os truques. Num país que recebe o último lugar do mundo no ensino da matemática, é crime aplicar verbas estatais em patifarias noéticas. O título do livro citado? A Impostura Científica em Dez Lições, de Michel de Pracontal. Ocorrem diferenças entre cientistas e charlatães da astrologia e quejandos. Os primeiros “não param de questionar, revisar hipóteses, corrigir teorias”. Já os que se dizem alternativos em relação à “ciência oficial” mostram-se “mais dogmáticos do que os denunciados por eles”. Nem sempre o charlatão é apedeuta. Nem todo analfabeto é “estadista”, como Lula é apresentado no impagável livro de Aloizio Mercadante, Brasil: primeiro Tempo. A metáfora futebolística do título mostra a distância entre o “estadista” e o demagogo. Nem todo charlatão fugiu da escola. Alguns, os que obtem maior sucesso, conhecem técnicas, teorias, métodos, doutrinas e dominam o jargão científico. Vejamos o caso de Joël Sternheimer. Formado em física, ele diz ter descoberto algo sensacional previsto por Pitágoras, Platão e aceito no século 18 pelo músico Rameau: o universo é composto segundo escalas musicais! Para Sternheimer, a massa das partículas estáveis da natureza se repartem como as notas da gama cromática temperada do Ocidente. Se acrescentarmos as partículas instáveis, o conjunto forma uma gama mais fina, síntese das gamas ocidentais e orientais. Proclama o descobridor que “a maioria das partículas deixa um traço visível numa câmara com bolhas (que persistam pelo menos alguns átimos), procedem de uma tonalidade em lá menor, do qual ômega-menos é a dominante. Se tais partículas seguem a gama introduzida por Bach, a música que elas produzem (centrada na dominante) é mais próxima de Mozart, um tanto parecida com a de Satie (e não duvidando, se incluirmos as partículas instáveis, se forem empregados intervalos próprios às músicas, orientais)”. A “descoberta” parte de uma coincidência numérica: as massas das partículas têm uma repartição que recorda a dos intervalos musicais. Daí, a fantasia conduz a varinha mágica do expositor. Tais devaneios foram apresentados na mais prestigiosa instituição acadêmica francesa: o Colégio de França (Cf. Joël Sternheim, “Musique des particules élémentaires”, comunicação ao Seminário de Física Matemática do Colégio de França, janeiro de 1984). Os que estudam o campo, sabem que foi efetivado pelo expositor do seminário um abuso metafórico. Mas quem se preocupa com análises empíricas, controles e experiências? É tão mais sugestivo acreditar que vivemos e nos desenvolvemos imersos em música... Somos entes musicais ! Corações se movem, sentimentos reverentes despertam e logo temos uma nova linha para o “esboço inteligente” do universo. Inteligente e belo. Todas as vias para a prova da existência divina são fornecidas. Pobre Aquino, prosaico e difícil… Eu me esquecia: o expositor não pensa em termos teológicos. Ele pediu patente de seu trabalho na França e promete construir instrumentos acústicos e eletrônicos que permitem tocar a música das partículas. E os tais instrumentos até que funcionam, abrindo novos campos para a criação artística. Mas o que provam ? No caso, trata-se de expansão poética próxima às da “física” romântica alemã, francesa e inglesa do século 19. Mas semelhantes delírios passam dogmaticamente para as chamadas ciências humanas e são acolhidos na filosofia acadêmica. Nesta última, professores e professoras famosos aplicam-se a “teorizar” sobre a relatividade e números matemáticos, como foi o caso da Dra. Marilena Chaui. Pega no bote por um colega especialista, o recurso dos seus áulicos foi dizer que o referido crítico era tucano. Logo… Mas pior que a Dra. Chaui é o imenso batalhão dos que, na filosofia e nas ciências humanas usam o jargão e o prestígio das ciências para parolar sobre coisas desconhecidas pelo público. Um trabalho útil e ético de profilaxia foi realizado pelos corajosos Alan Sokal e Jean Bricmont num livro impagável, impiedoso e verdadeiro (Cf. Imposturas intelectuais, o abuso da ciências pelos filósofos pós-modernos). Claro que o escrito é maldito na Associação Nacional de Pós-graduação em Filosofia e demais cenáculos. Mas este é um assunto conexo, mas diferente.