Autor Tópico: Virei um pirata  (Lida 459 vezes)

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Offline Vito

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Virei um pirata
« Online: 16 de Maio de 2006, 17:24:16 »
Pirateei. Não foi por mal.
Pedro Doria


"Nem tudo que passa na televisão sai em DVD. Acaso saísse na Inglaterra, custaria algo no entre 10 e 20 libras. Mais umas 20 de envio. Mais uns 60% de imposto na alfândega brasileira. Além do custo da espera, e isto já é caro demais para um curioso"

Pirateei. Não foi por mal: nem no tempo do Napster, em que baixar uma música era tão fácil quanto abrir um programa, fazer uma busca e descer um arquivo, eu tinha pirateado. Coisas da profissão: você escreve sobre o assunto e, para poder falar as coisas com independência, às vezes tem que se abster de tomar parte de certos fenômenos sociais. E tem que obedecer à lei – mesmo quando não faz sentido, o que não é raro.

Em finais do ano passado, o Channel 4 britânico levou ao ar um documentário em dois episódios chamados A raiz de todo o mal? – com interrogação, mesmo. Nele, o professor e genial biólogo evolucionista Richard Dawkins propõe que os grandes conflitos mundiais em voga passam por intolerância entre gentes, atiçada pela religião. Para Dawkins, a crença em Deus é uma superstição que leva à morte.

Nenhum esforço vai aqui para concordar ou discordar do professor – mas Dawkins é brilhante e eu queria ver o documentário, conhecer o argumento. Vivemos num mundo amplamente conectado. Aqui por esta coluna já andaram algumas das desvantagens desta superconexão. Mas nenhuma vantagem bate a possibilidade de participar de discussões que acontecem no além-mar em tempo real.

A imprensa britânica passou um mês discutindo a opinião de Dawkins – certo ou errado, ele tocou numa ferida aberta, num ponto nervoso e, como cabe a uma velha democracia, disparou uma discussão furiosa. Os ingleses são bons nisso. E, desde outubro, talvez novembro, estou cá esperando o lançamento do documentário do professor em DVD. Lá, naturalmente. Ou nos EUA – nenhuma esperança nos distribuidores brasileiros. E não saía, e não saía.

Nem tudo que passa na televisão sai em DVD. Acaso saísse na Inglaterra, custaria algo no entre 10 e 20 libras. Mais umas 20 de envio. Mais uns 60% de imposto na alfândega brasileira. Além do custo da espera, e isto já é caro demais para um curioso, o filme sairia por uns R$ 150.
Idéias não têm preço, então que não se discuta. Não houve a opção legal. Baixei usando o BitTorrent.

Dentre todos os programas de P2P, de compartilhamento de arquivos para uns, de pirataria para outros, nenhum me parece mais irônico que o Bit Torrent. Porque não são muitos os críticos habilitados a reparar, mas software também é arte. Requer soluções engenhosas, criativas e nada disto adianta se não houver elegância. Quase todo software é literatura de atacado, é filme B – com todo o valor que alguns têm.

BitTorrent, não. Foi escrito por um rapaz chamado Bram Cohen. É um sistema que não permite que qualquer um baixe algo sem estar alimentando a rede também. E como baixam-se arquivos grandes, DVDs inteiros, no momento em que um garoto está baixando seu filme, ele está pegando vários pedacinhos que completam o arquivo final de várias pessoas ao mesmo tempo; enquanto isso, vários estão pegando dele pedacinhos que ele já baixou. Nunca se suga a banda de um só pobre coitado e todos participam. É uma solução não apenas genial como o fato de que funciona imperceptivelmente é indício de elegância.

A Apple está pensando em incluir uma versão de BitTorrent no seu próximo sistema para facilitar a distribuição de upgrades. É mais arte, mais genial do que muito do que se pirateia pela sua tubulação.

Mas que não se discuta aqui o crime evidente de pegar de graça algo que está à venda na loja da esquina. Ainda assim, ao pé da letra da lei, cometi um crime de pirataria: peguei de graça algo cujo direito de cópia tem dono. (Então, cá está um compromisso, pago o preço de mercado do DVD de presto se o Channel 4 exigir.) O que se faz, no entanto, quando você quer uma informação e ela não está à venda? Acesso à informação é direito humano.

Livro não paga imposto para entrar no Brasil. DVD e CD pagam. Por quê? Não tem diferença. Encarece entrada de cultura no País. Por que o Channel 4 – e todo mundo mais – não oferece seu produto à venda pela internet? Baixo o arquivo, queimo o DVD por minha conta. Enquanto isto não for oferecido, qualquer guerra contra a pirataria será inútil.

O tamanho do problema é o seguinte: 1/3 do tráfego da internet é BitTorrent. É uma lei fundamental da rede que, se informação existe, ela circulará, de um jeito ou de outro, pelos seus canos.

Fonte: Estadão
« Última modificação: 16 de Maio de 2006, 17:25:47 por Vito Álvaro »

Offline Diego

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Re: Virei um pirata
« Resposta #1 Online: 16 de Maio de 2006, 17:41:17 »
Exelente texto.

:clap:

 

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