Que falem os fósseis.
OS FÓSSEIS são os restos de formas antigas de vida, preservados na crosta terrestre. Podem ser esqueletos completos, ou partes deles, tais como ossos, dentes ou conchas. Um fóssil também pode apresentar certos vestígios da atividade daquilo que antes era vivo, tal como uma impressão ou rastro. Muitos fósseis não mais contêm seu material original, mas constituem-se de depósitos minerais neles infiltrados e que assumiram sua forma.
Por que os fósseis são importantes para a evolução? O geneticista G. L. Stebbins comentou um dos motivos principais: “Nenhum biólogo realmente viu a origem, por evolução, de um grupo principal de organismos.”1 Assim, não se observam as atuais coisas vivas na Terra evoluindo em outras coisas.
Não se observa diretamente evolução em grande escala, mas observa-se evolução em menor escala de forma quase banal. Daí a conclusão lógica, apoiada por outros fatos, é que espécies menos similares umas as outras são parentes muito mais distantes.
Os outros fatos que apoiam isso são, essencialmente: a biogênese, ou seja, um ser vivo vir de outro ser vivo, uma célula vir de outra célula, como única forma já averiguada pela qual os organismos vêm a existir.
Não observamos nunca a geração espontânea ou "criação do nada" (ou "ex nihilo", como os criacionistas preferem) de outra forma de vida, e não se tem idéia de como isso poderia ser possível, principalmente no caso de formas de vida complexas, onde considera-se impossível. Assim, se encontra-se uma espécie nova do gênero Canis em algum lugar, assume-se que em vez de ter surgido de repente do nada, descende de ancestral em comum com outras espécies do mesmo gênero, e apenas não havia sido detectada até recentemente. Da mesma forma, se encontrarem uma espécie desconhecida de caniforme ou de carnívoro, que teria um ancestral em comum mais ou menos "recente" com os organismos desse grupo.
Essa lógica, com base apenas na observação dos fatos (e não em tentar se sustentar o fundamentalismo de alguma mitologia de criação) acaba levando a hipótese testável de um ancestral comum universal, ou algo muito próximo disso.
Uma das formas de testar isso, seria tentar organizar os organismos conforme eles pareçam ser mais aparentados, de acordo com o que se sabe sobre parentesco. Isso inclui tanto organismos vivos quanto fósseis.
A probabilidade de se conseguir montar uma "árvore genealógica" dos seres seria baixíssima, considerando que ela não existisse de verdade. Poderia-se montar inúmeras hipotéticas árvores genealógicas distintas, mas sem que nenhuma fosse substancialmente melhor que a outra, todas dessem igualmente "certo". Isso refutaria a hipótese, da mesma forma do que organizar peças de um suposto quebra-cabeças de diferentes formas, sem nenhuma construir uma hipotética figura muito melhor que outra bem diferente, prova que não há um quebra-cabeças real ali, que as peças não tem relação de "parentesco" umas com as outras, mas que são independentes.
E poderia inclusive ter sido a mesma pessoa que desenhou todas as peças, que daria o mesmo resultado, a menos que a pessoa tivesse de fato desenhado uma figura e a recortado em quebra-cabeças. Assim se vê que não faz sentido a freqüente alegação criacionista de que um só criador dos seres produziria exatamente coincidentemente o mesmo resultado das restrições impostas pelo parentesco.
Isso pode ser feito mesmo apenas com os seres ainda vivos, as coisas esperadas por parentesco já sáo suficientes para se concluir com bastante tranqüilidade que os organismos são de fato aparentados. Mais ou menos da mesma forma que um quebra-cabeças não precisa estar totalmente completo para se perceber claramente que é um quebra-cabeças, não só uma coincidência.
Os fósseis, de qualquer forma, apenas corroboram o que é visível já com os seres vivos, ao mesmo tempo em que são encontrados num padrão que vai de acordo com uma longa história de evolução no decorrer das eras, em vez de todos completamente embaralhados, com coelhos vivendo ao lado de dimetrodontes, homens com dinossauros como no desenho dos Flitstones.
Novamente, isso tudo seria uma enorme coincidência se os seres tivessem sido praticamente todos contemporâneos, e fossilizados num único evento de um dilúvio universal para qual a água necessária não existe. Acrescente às coincidências a datação radiativa.
Antes, são todas completas e distintas de outros tipos. Como observou o geneticista Theodosius Dobzhansky: “O mundo vivo não é uma única coleção . . . conectada por uma série ininterrupta de formas intermediárias.”2 E Charles Darwin admitiu: “Uma [contestação] que constitui uma dificuldade evidente, é a distinção bem nítida das formas [vivas] específicas, e a ausência de inumeráveis elos de transição que os liguem entre si.”3
Eu não sei exatamente de que trecho é essa citação de Darwin, de qualquer forma, há afirmações parecidas num capítulo todo chamado "dificuldades com a teoria" ou algo assim. Mas ele não apenas as lista, como também cogita as soluções. Os criacionistas apenas costumam citar as parte em que ele expõe os problemas, e omitir as soluções propostas.
Assim, as distintas variedades de coisas agora vivas não dão apoio algum à teoria da evolução. É por isso que os fósseis se tornaram tão importantes. Julgava-se que, pelo menos, os fósseis fornecessem a confirmação de que carecia a teoria da evolução.
Na verdade, como eu já mencionei anteriormente, a teoria já é bastante satisfeita apenas com os seres vivos. Ainda mais hoje do que na época de Darwin, devido às inovações tecnológicas que permitem mostrar cada vez mais como os organismos compartilham características que não vão de acordo com projetos similares de um mesmo inventor, mas com rastros esperados da reprodução biológica.
O Que Esperar
Caso a evolução fosse factual, a evidência fóssil certamente revelaria a mudança gradual de uma espécie de vida em outra. E isso teria de dar-se, sem considerar que variedade da teoria de evolução se aceita. Mesmo os cientistas que crêem nas mudanças mais rápidas associadas com a teoria do “equilíbrio pontuado” admitem que ainda teriam passado muitos milhares de anos em que supostamente ocorreram tais mudanças.
O equilíbrio pontuado, ao mesmo tempo em que propõe que as transições
entre as espécies se darão de forma mais rápida, propõe, como parte do mecanismo, que isso se dará com uma população
consideravelmente pequena. Assim, a maioria das formas transicionais
entre espécies,
se preservadas, existiriam em pequena quantidade, tanto pelo tamanho da população quanto pelo curto período de transição, em pequenos - e logo difíceis de se encontrar - sítios paleontológicos. Ainda assim, algumas são encontradas.
De qualquer forma, vale ressaltar algo que os fundamentalistas costumam deixar de lado, que é que isso se refere à transicionais
entre espécies apenas, ou seja, uma quantidade de transformação relativamente pequena, longe de dúvida razoável. A mudança entre raças de cães, que todos criacionistas admitem ter evoluído de um ancestral comum, por exemplo, são maiores do que as existente entre muitas espécies proximas, e até maiores do que as diferenças entre alguns gêneros.
Inclusive, a especiação é aceita por diversos grupos fundamentalistas, não apenas por ter sido em alguns casos observada diretamente, mas porque simplesmente não conseguem negar que existem muitas mais espécies do que as possíveis de caberem na arca de Noé. Eles defendem atualmente, diante desse inegável número enorme de espécies, que Noé e as outras pessoas da arca levaram apenas um casal não de cada espécie, mas de cada "tipo" principal de animal, que depois evoluiu muito rapidamente nas espécies vivas e recentemente extintas. Então, por exemplo, em vez de terem sido levados um casal de gatos, um de tigres, leões, onças, leopardos, chitas, pumas, linces, etc, teriam sido levados simplesmente um casal de "felinos genéricos" que evoluiram muito rapidamente nessas e em outras espécies de felinos vivas e recentemente extintas.
Então fica um tanto complicada a posição deles em negar a especiação, o parentesco dessas espécies, apenas no cenário defendido pelos cientistas, e aceitar apenas para o que seria mais de acordo com a mitologia das origens cristâ.
Ainda mais complicado é defender exatamente quais seriam os tais "tipos" originais sem parentesco com outros grupos, porque a mesma linha de evidências que defende o parentesco entre os grupos, defende o parentesco entre eles, levando a um ancestral comum universal.
Esses problemas com os criacionismos de criações especiais são geralmente omitidos porque eles têm sua força não na argumentação de teorias próprias, mas em depredação cultural, científica, em cuidadosamente selecionar e interpretar dados de forma que dêem a entender que a evolução é uma bobagem sem tamanho, ou no mínimo uma religião, que os cientistas são ou idiotas, ou desonestos e dogmáticos. Esperam que muitos entendam que só há duas possibilidades: o seu criacionismo específico, ou "essa maluquice de evolução". Quando na verdade há diversos outros criacionismos, e pode-se inventar diversas outras hipóteses não criacionistas, tão boas quanto qualquer criacionismo, mas todas inferiores à ancestralidade comum universal.
Também, caso a evolução fosse factualmente respaldada, seria de esperar que os fósseis revelassem o início de novas estruturas nas coisas vivas. Deveria haver, pelo menos, alguns fósseis com braços, pernas, asas, olhos, e outros ossos e órgãos em desenvolvimento. Por exemplo, deveria haver barbatanas de peixes transformando-se em patas anfíbias, dotadas de pés e artelhos
E em muitos casos, há. Por exemplo, Ichthyostega, acanthostega, e alguns outros, são peixes com adaptações ou "pré-adaptações" primitivas à locomoção em terra.
Os fundamentalistas muitas vezes dizem que eles são simplesmente outro tipo de anfíbios; não são, de qualquer forma, anfíbios propriamente ditos, que seriam classificados como salamandras ou sapos, mas peixes mesmo, e se anfíbios, apenas no sentido mais abrangente do termo (como "carro anfíbio").
E mesmo que não houvessem tais peixes, novamente, os anfíbios já existentes apenas são uma outra tremenda coincidência, supondo não serem um ramo evolutivo, porque há apenas anfíbios que são algo meio intermediário entre peixes e répteis, e não anfíbios mamíferos, aves anfíbias, não num sentido abrangente, como lontras e pingüins seriam "anfíbios", mas mamíferos que passassem por um estágio larval aquático, com guelras funcionais, e depois se tornassem mamíferos terrestres? Ou peixes, que são apenas peixes, totalmente aquáticos, mas com glândulas mamárias e mamilos para nutrir os filhotes? E animais que realizassem fotossíntese?
Coisas desse tipo não são impossíveis de se inventar, mas não seriam compatíveis com uma história evolutiva.
Em vez disso, se tem seres que podem ser organizados, mesmo apenas com as formas vivas, na seguinte árvore genealógica resumida:
peixes - anfíbios - répteis - mamíferos
|- aves
(se não ficou bastante claro, peixes ramificando-se em anfíbios, esses originando os répteis, que por sua vez originam mamíferos e mais tarde as aves)Que tem características que permitem organizá-los apenas dessa maneira e não de outras, como com mamíferos no meio; e também, mesmo apenas entre as formas vivas, há seres com possíveis características intermediárias, sejam preservadas dos seres ancestrais de outros grupos, ou convergências que podem dar uma idéia de como a transição teria sido. Por exemplo, peixes pulmonados; mamíferos que botam ovos, como répteis (monotremados), e que têm glândulas mamárias rudimentares, primitivas, mas não mamilos. A prole mama lambendo a secreção dos pelos, que sai de glândulas sudoríparas modificadas, para uma secreção mais nutritiva que suor.
e guelras transformando-se em pulmões. Deveria haver répteis com membros dianteiros transformando-se em asas de aves, com membros traseiros transformando-se em pernas dotadas de garras, com escamas transformando-se em penas, e com bocas transformando-se em bicos córneos.
As guelras, pelo que me lembro, não teriam transformado-se em pulmões, mas na mandíbula dos peixes com mandíbula inferior, e posteriromente nos ossos do ouvido dos mamíferos, através de modificação da mandíbula dos répteis. São coisas bastante documentadas em fósseis, algumas dessas ao menos. Peixes pulmonados, existem; mas não sei bem dizer se seria convergência ou não.
Há répteis com membros dianteiros transformando-se em asas de aves: Microraptor, e Archaeopteryx, que é inclusive considerado uma ave, apesar de ter em vez de asas de ave "plenas", asas com garras como as de dinossauros, mas em dedos alongados (meio como os dedos das asas dos morcegos). Na maioria das aves atuais, os dedos estão presentes nos embriões, mas se fundem durante antes da eclosão do ovo. Em uma ou outra, eles demoram mais para se fundir, estando presentes na forma infantil do animal (como numa ave chamada cigana), mas se não me engano as emas também tem dedos nas asas, que nunca se fundem, mesmo na forma adulta.
Archaeopteryx, não tem bico, propriamente dito, mas uma boca de dinossauro, e é ainda assim considerado uma ave, apesar de ter mais características de dinossauro do que das aves modernas.
Veja algumas imagens:
veja
essa foto de um filhote de cigana agarrado à galhos
Esqueleto de um pombo, ave moderna
o dum papagaio, outra ave moderna, que tem a cauda mais comprida:

Agora compare com a cauda do do Archaeopteryx, que é longa não apenas pelas penas, mas pelo esqueleto:

Archaeopteryx

Deinonychus (dromaeosauro)
nesse site ("The Fossil Record: Evolution or "Scientific Creation"") há algumas ilustrações da transição entre répteis e mamíferos primitivos, além de todo um texto sobre o assunto.
Neste respeito, a revista inglesa New Scientist (Novo Cientista) afirma sobre tal teoria: “Ela prediz que uma documentação fóssil completa consistiria em linhagens de organismos que mostrassem contínua mudança gradual, por longos períodos de tempo.”4 Como o próprio Darwin asseverou: “O número de variedades intermediárias, que outrora existiram, [tem de ser] notável.”5
Por outro lado, caso seja factual o relato de Gênesis sobre a criação, então os fósseis não apresentariam um tipo de vida transformando-se em outro. Refletiriam a declaração de Gênesis de que cada tipo diferente de coisa viva só se reproduziria “segundo a sua espécie”. (Gênesis 1:11, 12, 21, 24, 25) Também, caso as coisas vivas tenham vindo a existir por um ato criativo, não haveria ossos ou órgãos parciais, incompletos, nos fósseis. Todos os fósseis seriam completos e imensamente complexos, como são as atuais coisas vivas.
Bem, como eu havia dito anteriormente, tanto há transições diversas, como talvez a maioria dos criacionistas aceitem algum nível de evolução, quando querem salvar a credibilidade do conto da arca; os que negam isso estão entre os mais insanos, seguidos de perto pelos criacionistas geocentristas e pelos criacionistas defensores da Terra achatada.
Ademais, caso as coisas vivas fossem criadas, seria de esperar que aparecessem subitamente nos fósseis, sem conexão alguma com qualquer coisa anterior a elas. E, uma vez comprovada a veracidade disto, que dizer? Darwin admitiu francamente: “Se espécies numerosas . . . tivessem realmente surgido bruscamente, este fato derrubaria a teoria da evolução.”6
Como eu disse anteriormente, não há evidências de que ocorra ou tenha ocorrido geração espontânea ou criações especiais em episódios separados (como defendem os criacionistas que aceitam a idade da Terra cientificamente defendida), nem todos de uma só vez (defendido pelos defensores de uma Terra de apenas 6 mil anos).
O grau de imperfeição do registro fóssil não chega a ser um problema quanto a por em dúvida a ancestralidade comum universal, apenas não nos permite saber nos mínimos detalhes todas as relações de parentesco, da mesma forma que um quebra-cabeças suficientemente completo, ainda que não totalmente, permite concluir que há um quebra-cabeças, que a figura está correta, ainda que não se saiba exatamente onde poderiam se encaixar algumas peças.
Boa parte do texto apenas reafirma esse tipo de coisa, sendo até talvez contraditório dependendo da posição criacionista defendida, então não vou comentar tudo pois seria redundante.
continua no próximo post