Autor Tópico: Pajelança no consultorio  (Lida 676 vezes)

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Offline Zizou

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Pajelança no consultorio
« Online: 23 de Outubro de 2006, 13:25:21 »
Pajelança no consultório
Franklin Rumjanek critica o espaço que a homeopatia vem ganhando no Brasil

O que faz com que, hoje, um(a) médico(a) se especialize em homeopatia? O fato de negar a ciência? Já é antiga a polêmica sobre esse método não convencional de tratar as mais variadas patologias, que vão desde a asma até o câncer. Isso tudo baseado em premissas que contrariam todos os princípios estabelecidos pela ciência.

Resumidamente, a homeopatia, enunciada por Hipócrates há quase 2.500 anos e estruturada pelo médico alemão Christian Friedrich Samuel Hanneman (1755-1843), tem como base a cura pela similitude. Isso significa tratar as doenças com substâncias que reproduzem em pessoas sadias sintomas semelhantes àqueles observados nos indivíduos doentes. Deve-se, por exemplo, tratar a dor de cabeça com algo que produza dor de cabeça.

Por si só, essa estratégia já atropela a lógica, mas a coisa não pára aí. Para obter efeito, os compostos ativos têm que ser submetidos a diluições tão grandes (chamadas de dinamizações, nas quais agitam-se vigorosamente as soluções diluídas sobre uma pequena almofada) que praticamente são eliminados da solução. Para explicar esse paradoxo, os homeopatas argumentam que a dinamização produz aquilo que chamam de memória da água. Em outras palavras, o solvente preservaria em si um legado do composto originalmente empregado na solução. Essa memória seria suficiente para conferir ao solvente propriedades curativas. Aqui, novamente, a incompatibilidade com a química é total.

Embora o debate sobre a homeopatia não seja novo, alguns pesquisadores decidiram colocar um ponto final na questão. Em um estudo bastante abrangente, publicado em 2005 na The Lancet (v. 366, p. 726), respeitada revista sobre pesquisas médicas, Aijing Shang (da Universidade de Berna, na Suíça) e colaboradores compararam 110 ensaios homeopáticos com outros 110 alopáticos. O tratamento alopático, adotado pela medicina convencional, é o oposto do homeopático – ou seja, as drogas ministradas produzem efeitos contrários aos da doença.

Esse trabalho mostrou que o tratamento por homeopatia só alcança sucesso porque seus resultados positivos são conseqüência de viés (erro sistemático e vício) em sua interpretação. Por outro lado, os autores concluíram que o tratamento alopático é menos susceptível ao viés subjetivo de quem o aplica, ou seja, os resultados são interpretados mais objetivamente. Em outras palavras, quando o viés interpretativo era eliminado, o tratamento homeopático tinha apenas efeito placebo. Esse estudo foi tão contundente que o editorial da The Lancet , na edição em que foi publicado, anunciou a morte da homeopatia.

Entretanto, um ano depois, a homeopatia parece continuar ‘forte e sacudida’ (literalmente). A maior parte dos defensores da homeopatia provavelmente optou por ignorar o estudo. Alguns partidários mais articulados chegaram a publicar textos criticando-o, mas usaram argumentos tão convolutos, circulares e enviesados quanto aqueles que empregam na análise de seus próprios resultados.

Uma pesquisa sobre homeopatia na página do Centro Nacional para a Informação em Biotecnologia (NCBI, na sigla em inglês), um portal de busca dedicado a publicações da área biomédica, revela 3.287 ocorrências, das quais 85 referem-se a publicações em 2006. Outra busca na rede mostra que a homeopatia conta com 169 periódicos dedicados a ela – no portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), há pelo menos uma revista citada.

No Brasil a homeopatia vai bem. Segundo a Associação Médica Homeopática Brasileira, o Brasil hospeda hoje o maior número de médicos homeopatas do mundo e também contribui significativamente para sua formação. Instituições de ensino tradicionais (por exemplo, a Universidade de São Paulo) abrigam cursos de homeopatia em sua Faculdade de Medicina. Essa forte presença da homeopatia no Brasil acabou por convencer o Sistema Único de Saúde (SUS) de sua utilidade. É a sagração do disparate. Resta saber agora se esse precedente abrirá o caminho para outras pérolas da medicina alternativa, como cromoterapia, florais de Bach, aromaterapia e bioenergética.


Franklin Rumjanek
Instituto de Bioquímica Médica,
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Revista Ciência Hoje/Setembro 2006
" Meu objetivo é ensinar minhas aspirações a se conformarem com os fatos, em vez de tentar fazer com que os fatos se harmonizem com elas." Thomas Henry Huxley
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Offline Zizou

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Re: Pajelança no consultorio
« Resposta #1 Online: 23 de Outubro de 2006, 13:27:20 »
Só para registrar...essa revista agora está sendo distribuida para os alunos de iniciação científica do CNPQ....bela iniciativa! :ok:
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Offline Luis Dantas

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Re: Pajelança no consultorio
« Resposta #2 Online: 23 de Outubro de 2006, 14:05:22 »
Pessoalmente eu atribuo a popularidade da Homeopatia no Brasil a uma dificuldade cultural de lidar com as limitações (e custos financeiros) da Alopatia.

Em parte é simples "vontade de acreditar".  Os médicos não podem fazer milagre, e isso pode ser difícil de aceitar, tanto pelos pacientes quanto pelos próprios médicos.

Então a Homeopatia surge como uma alternativa, uma forma de se convencer de que se está tendo os benefícios da medicina moderna (ou outros "melhores", "mais naturais", "mais holísticos") sem ter de pagar o (considerável) preço e sem ter de lidar com tantas decisões difíceis.

Nem é tão surpreendente que tantos médicos se interessem pelo assunto; o dilema que eles enfrentam com a situação sócio-econômica do brasileiro não é brincadeira.  O que causa assombro é a falta de questionamento sério a respeito e a pretensão de monopolizar e legitimizar a Homeopatia sem qualquer base verdadeira.
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APODman

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Re: Pajelança no consultorio
« Resposta #3 Online: 23 de Outubro de 2006, 15:14:38 »
O mais incrível é a OMS que possui projetos de incentivo mundiais a integração das terapias alternativas ao sistema de saúde oficial dos paises.

Veja aqui:
http://www.who.int/medicines/areas/traditional/en/index.html

Vá em Publications -> General e leia os arquivos das diretrizes e programas


Entretanto o que se nota é que a OMS não apoia a eficácia da Homeopatia quanto a seus mecanismos de funcionamento, ou mesmo quanto a eficácia da terapia em sí como algo acima do placebo, mas sim que tais terapias alternativas são um "apoio" tendo em vista que trazem conforto emocional ao paciente.

[ ]´s

Offline HSette

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Re: Pajelança no consultorio
« Resposta #4 Online: 23 de Outubro de 2006, 15:47:44 »
Citar
Pessoalmente eu atribuo a popularidade da Homeopatia no Brasil a uma dificuldade cultural de lidar com as limitações (e custos financeiros) da Alopatia.

Penso que esse fator existe, mas não é tão significativo (mesmo porque os produtos homeopáticos também têm um preço elevado).

Conheço várias pessoas com bom grau de instrução e de faixa de renda de média para elevada que embarcam nessa furada.

Fico pasmo!  :'(

Quando apresento argumentos inquestionáveis, costumo ouvir muito essa "pérola":

Tudo bem. Se não fizer bem, mal também não faz.

É de chorar.
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Chaves

Offline Luis Dantas

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Re: Pajelança no consultorio
« Resposta #5 Online: 23 de Outubro de 2006, 16:23:13 »
Conheço várias pessoas com bom grau de instrução e de faixa de renda de média para elevada que embarcam nessa furada.

Fico pasmo! :'(

Quando apresento argumentos inquestionáveis, costumo ouvir muito essa "pérola":

Tudo bem. Se não fizer bem, mal também não faz.

É de chorar.

Também acho... mas isso para mim entra na dificuldade cultural que mencionei.  Nem tudo é nível sócio-econômico.
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