Autor Tópico: O paradoxo da retaliação  (Lida 956 vezes)

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Offline Quereu

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O paradoxo da retaliação
« Online: 09 de Novembro de 2006, 05:06:21 »
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Estamos em 1962, e você é o presidente dos Estados Unidos. Acabou de ser informado de que a união Soviética lançou uma bomba atômica sobre Nova York. Você sabe que eles não voltarão a atacar. À sua frente está o telefone para o pentágono, o proverbial botão, com o qual você pode retaliar bombardeando Moscou.

Você está prestes a apertar o botão. A política do país é retaliar na mesma moeda um ataque nuclear. Essa política foi concebida para intimidar os atacantes; se você não a seguir, a intimidação terá sido uma farsa.

Por outro lado, você reflete, o mal já está feito. Matar milhões de russos não trará milhões de americanos mortos de volta à vida. A bomba acrescentará precipitação radioativa na atmosfera, prejudicando seus próprios compatriotas. E você entrará para a história como um dos piores assassinos de multidões de todos os tempos.. A retaliação agora seria puro rancor.

Mas foi precisamente essa linha de raciocínio que encorajou os soviéticos a atacar. Eles sabiam que, uma vez lançada a bomba, você nada teria a ganhar e teria muito a perder se retaliasse. Julgaram que estava blefando e pagaram para ver. Portanto, é melhor você retaliar para mostrar a eles que não estava blefando.

Mas, pensando bem, de que serve provar agora que você não estava blefando antes? O presente não pode afetar o passado. Permanecerá o fato de que, se você apertar o botão, extinguirá milhões de vidas sem razão.

Mas espere -- os soviéticos sabem que você pensaria que não tem sentido provar que você não estava blefando depois de eles terem tentado provar que você estava blefando. É por isso que eles pagaram para ver. O próprio fato de você estar pensando dessa maneira acarretou a catástrofe  -- por isso, você não deve pensar dessa maneira.

Mas não pensar dessa maneira agora é tarde demais...

Do livro Como a mente funciona de Steven pinker

Senhores foristas, ante o dilema que se apresenta, o que você faria, apertaria o botão?





O paradoxo da estratégia nuclear se aplica a qualquer conflito entre partes cujos interesses sejam parcialmente concorrentes e parcialmente comuns. Refiro-me à ação americana ante os ataques de 11 de setembro. Deve retaliar, como a dizer ao mundo inteiro, e especialmente aos terroristas, que ato nem atores ficaram impunes, buscando e capturando os responsáveis para desbaratar as organizações terroristas, arriscando o acirramento de posições antiamericanas, fomentando o fanatismo dos radicais islâmicos e criando mais violência que provavelmente matará inúmeros civis inocentes; ou não retaliando, poupando o Islã de mais violência, captando a solidariedade internacional, talvez sensibilizando o mundo árabe pela complacência e estoicismo do povo americano, arriscando deixar incólumes as organizações terroristas para organizarem novos ataques que exporão o povo a novos perigos.

De novo senhores a pergunta: O que fazer? Qual a melhor estratégia?



E o que dizer de Israel? Deve expandir seu território para defender seu povo de ataques terroristas que acirrarão os ânimos dos árabes. Ou diminuí-lo o que trará contentamento de parte do povo árabe, mas exporá o próprio povo a ataques dos terroristas.

Mais uma vez: O que fazer? Qual a melhor estratégia?
« Última modificação: 09 de Novembro de 2006, 05:14:00 por quereu »
A Irlanda é uma porca gorda que come toda a sua cria - James Joyce em O Retrato do Artista Quando Jovem

Offline Luis Dantas

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Re: O paradoxo da retaliação
« Resposta #1 Online: 09 de Novembro de 2006, 05:52:40 »
Essa é uma variação do Dilema do Prisioneiro.

A melhor estratégia, é claro, é não apertar o botão.  Aliás, o melhor é destruir o tal botão.

Um ponto importante que ajuda a lidar com essa família de dilemas é considerar a história passada e futura; não adianta conseguir alguma vantagem imediata se isso comprometer seriamente as interações futuras.
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Em 18 de janeiro de 2010, ainda não vejo motivo para postar aqui. Estou nos fóruns Ateus do Brasil, Realidade, RV.  Se a Moderação reconquistar meu respeito, eu volto.  Questão de coerência.

Offline Dr. Manhattan

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Re: O paradoxo da retaliação
« Resposta #2 Online: 09 de Novembro de 2006, 08:09:23 »
Essa é uma variação do Dilema do Prisioneiro.

A melhor estratégia, é claro, é não apertar o botão. Aliás, o melhor é destruir o tal botão.

Um ponto importante que ajuda a lidar com essa família de dilemas é considerar a história passada e futura; não adianta conseguir alguma vantagem imediata se isso comprometer seriamente as interações futuras.

O Luiz praticamente leu meus pensamentos  :) . Um dado: pouco depois do 11 de Setembro, assisti a uma palestra
de um jornalista canadense especialista em Oriente Médio. Ao ser perguntado sobre a melhor reação aos atentados,
ele disse justamente que a opção ideal era não fazer nada... Só que deixou claro que essa era uma opção
politicamente inviável. O povo americano exigia uma resposta. Todos estavam com raiva (hell, eu estava
com raiva. No dia seguinte aos ataques eu dizia que os americanos deveriam jogar umas bombas atômicas
no Afeganistão!) É um dos defeitos da democracia: o poder está nas mãos do povo, mas isso não quer dizer que
a decisão do povo é sempre a melhor [1].

Quanto à questão do botão, estou ciente que é um problema idealizado. Na prática, a primeira leva de mísseis
seria em grande parte dirigida contra silos de mísseis americanos e outras instalações militares. Não retaliar
nesse caso seria aceitar a destruição de seu poderio militar (sem falar que o ataque poderia ser limitado).
Outro dado importante é que, ao contrário do que se pensa, um ataque nuclear não destruiria todo os
EUA e Russia, por isso (do ponto de vista dos estrategistas - pra mim isso é loucura desde o começo) não
destruir as instalações do inimigo seria arriscar ocupação. Obviamente, nesse caso seria impossível na prática
definir "quem ganhou".

[1] Um outro defeito é que, numa ditadura, podemos sempre colocar a responsabilidade por crimes contra a
humanidade nos ombros do ditador. Numa democracia a responsabilidade é compartilhada. Por isso temos todo o
direito de culpar o povo americano por Guantánamo, por exemplo [2].

[2] Naturalmente, a democracia, mesmo defeituosa, é muito melhor que a alternativa.

You and I are all as much continuous with the physical universe as a wave is continuous with the ocean.

Alan Watts

Offline Quereu

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Re: O paradoxo da retaliação
« Resposta #3 Online: 09 de Novembro de 2006, 11:27:55 »
Interessante a similaridade com o dilema do prisioneiro, não havia observado.

O autor, no entanto, oferece uma solução que me surpreendeu também. Vou continuar a citação exatamente de onde parei:

Citar
Você amaldiçoa sua liberdade. Seu apuro está em em ter a opção de retaliar e, como retaliar não é do seu interesse, você pode decidir não fazê-lo, exatamente como previram os soviéticos. Que bom seria se você não tivesse escolha! Se os seus mísseis houvessem sido conectados a um detector confiável de projétil nuclear e disparassem automaticamente! Os soviéticos não teriam ousado atacar, pois saberiam que a retaliação era certa.

Esse automatismo das decisões, tal como explicado acima, é batizado de máquina do fim do mundo cuja temática é desenvolvida no filme e romance Dr. Strangelove (Dr. Fantástico).

Outro trecho:

Citar
Mas o perturbador paradoxo da estratégia aplica-se a qualquer conflito (...) O bom senso diz que a vitória vai para o lado com mais inteligência, egoísmo, frieza, opções e claras linhas de comunicação. O bom senso está enganado. Cada um dessas vantagens podem ser uma desvantagem em disputas estratégicas (...)

Citar
(...) Um bom modo de de vencer o jogo adolescente no qual dois carros se aproximam um do outro em alta velocidade e o primeiro motorista que desviar é humilhado é mostrar a todos que você removeu o volante de seu carro e o jogou fora.

O autor argumenta que a melhor decisão é cercear a própria liberdade. Tornando a retaliação automática o agressor não atacará.
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Offline Agnostic

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Re: O paradoxo da retaliação
« Resposta #4 Online: 09 de Novembro de 2006, 16:55:38 »
Citar
Estamos em 1962, e você é o presidente dos Estados Unidos. Acabou de ser informado de que a união Soviética lançou uma bomba atômica sobre Nova York. Você sabe que eles não voltarão a atacar. À sua frente está o telefone para o pentágono, o proverbial botão, com o qual você pode retaliar bombardeando Moscou.

Você está prestes a apertar o botão. A política do país é retaliar na mesma moeda um ataque nuclear. Essa política foi concebida para intimidar os atacantes; se você não a seguir, a intimidação terá sido uma farsa.

Por outro lado, você reflete, o mal já está feito. Matar milhões de russos não trará milhões de americanos mortos de volta à vida. A bomba acrescentará precipitação radioativa na atmosfera, prejudicando seus próprios compatriotas. E você entrará para a história como um dos piores assassinos de multidões de todos os tempos.. A retaliação agora seria puro rancor.

Mas foi precisamente essa linha de raciocínio que encorajou os soviéticos a atacar. Eles sabiam que, uma vez lançada a bomba, você nada teria a ganhar e teria muito a perder se retaliasse. Julgaram que estava blefando e pagaram para ver. Portanto, é melhor você retaliar para mostrar a eles que não estava blefando.

Mas, pensando bem, de que serve provar agora que você não estava blefando antes? O presente não pode afetar o passado. Permanecerá o fato de que, se você apertar o botão, extinguirá milhões de vidas sem razão.

Mas espere -- os soviéticos sabem que você pensaria que não tem sentido provar que você não estava blefando depois de eles terem tentado provar que você estava blefando. É por isso que eles pagaram para ver. O próprio fato de você estar pensando dessa maneira acarretou a catástrofe  -- por isso, você não deve pensar dessa maneira.

Mas não pensar dessa maneira agora é tarde demais...

Do livro Como a mente funciona de Steven pinker

(O nível do fórum está mesmo subindo)

Essa situação se parece muito com a mostrada no filme A Soma de Todos os Medos.
Who cares?

Offline Quasar

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Re: O paradoxo da retaliação
« Resposta #5 Online: 09 de Novembro de 2006, 18:48:25 »
Justamente por isso que o sistema é "meio que automático" a ordem de lançamento é dada, mas o lançamento efetivo depende de decisões humanas, no caso dos russos (soviéticos na época) o sistema manda ordens de lançamento para lançadores em silos e móveis e o comandante de cada unidade é responsável por executar os procedimentos de lançamento.
"Assim como são as pessoas, são as criaturas" -  Didi Mocó

 

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