Se a natureza é Quântica, o Determinismo não surge nunca. A pergunta não é quando surge o Determinismo, mas quando o Indeterminismo passa a ser irrelevante.
Poderíamos dizer, em uma primeira feita, que o indeterminismo passa a ser irrelevante assim que ocorrer a Decoerência (vide link que o Ângelo postou no tópico das Variáveis Ocultas, Decoerência por emissão de Radiação Térmica, e os comentários do físico Luiz Davidovich, que eu postei no mesmo tópico), mas as coisas não são tão simples. Gell-Mann chama a tenção de que a interferência vai se reduzindo conforme aumenta o tamanho dos objetos em questão, sua capacidade de interagir com o meio que o cerca, etc. Inclusive, em seus trabalhos, ele mostra como o mundo ao nosso redor, o nosso cotidiano, emerge dessa realidade quântica como uma aproximação, a qual ele chama de Domínio Quase-Clássico Familiar.
Mas vamos a um exemplo diferente, que creio poderá melhor exemplificar o que estou querendo passar. Muito se discute em Filosofia sobre a natureza da Realidade, e uma das questões mais fundamental é como percebemos a realidade. De fato, tudo o que percebemos se dá através de inteirações, muitas vezes chamadas de observações ou medidas.
A questão é: é possível se fazer medidas absolutas (com precisão absoluta, absolutamente exatas) no mundo macroscópico?
Vamos imaginar algo corriqueiro, como medir a espessura da uma mesa de cozinha. Digamos que esta mesa tem um tampo de mármore liso, e quero medir sua espessura. Para fazer isso, posso pegar uma régua comum e medir, anotando o resultado. Esse valor é preciso até certa magnitude, mas e se quero uma precisão maior? Bem, posso executar uma nova medida utilizando um paquímetro. Se compararmos as duas medidas, veremos que a segundo é mais precisa que a primeira. Consigo mais? Com certeza. Eu poderia agora utilizar um micrômetro e assim por diante.
Contudo, o que teria de fazer para obter a medida absolutamente precisa? Bem, para isso seria necessário determinar exatamente o limite preciso entre o tampo da mesa e o espaço acima dele. Para fazê-lo, teríamos que medir a localização de cada átomo na superfície do tampo da mesa, e repetir a operação toda para a parte debaixo do tampo.
Contudo, quando chegássemos a esse nível, não teríamos mais localizações exatas, e essa característica de interferência de objetos micros, se traduziria em características similares em relação à forma, localização e momento da mesa (objeto macro)!
Um dos pontos fracos da Interpretação de Copenhague era que Bohr imaginava que havia uma região do mundo onde era válida a MQ, e outra, onde era válida a Mecânica de Newton, muito embora, essa divisão não fosse algo preciso. Gell-Mann chegou a chamar essa idéia de tosca, entendendo que deveria haver apenas uma Física e esta é quântica. Seus trabalhos mostram como em objetos macros, a sobreposição desaparece, ou torna-se irrelevantes para as medidas (sejam ela quais forem) que pretendemos executar.
Para fins práticos, e tarefas do dia a dia, como passar uma mesa por uma porta, que diferença faz a precisão de um paquímetro na medida da largura da mesa, por exemplo? O valor medido com a régua é suficiente, porém, aproximado.
Em nosso mundo, tudo é aproximado, sejam mesas, cadeiras, carros, etc. A natureza quântica se torna relevante à medida que a precisão se torna relevante.
Daí vem a pergunta inicial: não é quando aparece o determinismo (uma aproximação), mas sim, a partir de quando o indeterminismo pode ser desprezado. Não há uma resposta exata para isso, dependendo da precisão requerida em nossa medição e das características daquilo que estamos medindo (interagindo)
Curiosamente, no domínio da Nanotecnologia, já se trabalha com muitas equações chamadas de semi-clássicas, onde efeitos quânticos já são percebidos e começam a ficar relevantes, mas ainda não de uma maneira necessária a se abandonar completamente a Física Clássica.