Autor Tópico: Como a picaretagem conquistou o mundo  (Lida 1539 vezes)

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Offline Fernando Silva

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Como a picaretagem conquistou o mundo
« Online: 27 de Janeiro de 2007, 12:00:21 »
Como a picaretagem conquistou o mundo

 Francis Wheen     "O Globo"  27/01/07

 LONDRES. Em 1985, às vésperas de um encontro com o então presidente da extinta União Soviética, Mikhail Gorbachev, em que discutiria avanços num tratado de desarmamento nuclear, era mais do que natural que Ronald Reagan consultasse as opiniões de seus assessores.

Na época, porém, pouca gente sabia que uma das pessoas ouvidas pelo presidente dos EUA era uma astróloga de São Francisco, cuja contribuição para a negociação entre as duas superpotências foi um dossiê sobre peixes, o signo do dirigente soviético. Esse é um dos exemplos utilizados pelo jornalista britânico Francis Wheen para argumentar que a humanidade também caminha com passos de siri. Em "Como a picaretagem conquistou o mundo" - lançado no Reino Unido em 2004 e que chega esta semana ao Brasil, pela Record (364 páginas, R$ 49,90) - Wheen lamenta que os valores instituídos pelo Iluminismo estejam perdendo espaço para gurus, superstições e histerias.

Um processo que, para o autor, começou em 1979, com a revolução islâmica no Irã e a ascensão de Margaret Thatcher ao poder, e passou pelo debate sobre a teoria darwiniana e mesmo a morte de Lady Di.

Fernando Duarte

O GLOBO: Por que 1979 como o "ano zero?"
 FRANCIS WHEEN: Queria discutir como os dois principais eventos daquele ano - a Revolução Iraniana e a eleição de Thatcher - tiveram influência direta em pelo menos um quarto de século seguinte. A vitória do fundamentalismo islâmico no Irã, na época um estado até bastante secular para o contexto do Oriente Médio, teve como uma das causas o apoio da CIA na derrubada de um governo de esquerda para que o xá Reza Phalevi voltasse ao trono.
Thatcher chegou ao poder pregando um fundamentalismo de mercado e falando na retomada de valores vitorianos.

 E como surgiu a conexão com o século XVIII?
 WHEEN: Minha idéia original para o livro não tinha nada a ver com o Iluminismo.
O fato é que, em minhas pesquisas, comecei a perceber que tanto o pensamento pré-moderno quanto o pós-moderno pareciam dispostos a rebobinar a fita, com posições invariavelmente hostis a valores iluministas como a razão, o empírico e os questionamentos. Alguns exemplos são a adoção das teorias criacionistas no currículo de escolas americanas e o argumento de que o Gênesis pode ser considerado material didático. Isso fez parte dos debates presidenciais dos Estados Unidos em 2000, entre Bush e Al Gore. E, embora Gore fosse contrário ao criacionismo, ele se calou por questões políticas. É como se eu defendesse hoje a hipótese de que a Terra é plana e alguém simplesmente dissesse: "OK, é a sua opinião."

 Mas o Iluminismo também não pregava uma pluralidade de pensamentos?
WHEEN: Sim, mas com questionamentos.
O problema é quando falamos em relativismo. Varrer as coisas para debaixo do tapete é o que permite a algumas pessoas questionar o Holocausto, por exemplo. Não é possível que uma parcela substancial de americanos acredite piamente que o mundo tem cinco mil anos de idade e isso não cause um furor internacional. Mas não é uma exclusividade dos EUA. No Reino Unido, Tony Blair permitiu parcerias entre a rede pública de ensino e empresários cristãos fundamentalistas.
Quando questionado sobre o efeito dessa combinação, ele disse estar feliz com a diversidade de resultados.
É a mesma coisa que defender a existência do Papai Noel.

 Em sua edição original, "Como a picaretagem conquistou o mundo" tinha um subtítulo falando sobre ilusões modernas. O senhor perdeu a fé na humanidade?
WHEEN: Se tivesse, não teria escrito o livro (risos ). O paradoxo para mim é este: numa era em que temos avanços como o telescópio Hubble e o mapeamento dos genes humanos, ainda há espaço para gurus e superstições. Poucas semanas depois do 11 de Setembro, por exemplo, um livro sobre Nostradamus chegou à lista dos mais vendidos do "The New York Times" porque alguém começou a achar co-relações com as suas chamadas profecias - isso depois de livros do século XIX zombarem de Nostradamus. Eu acredito que muita gente hoje se sinta um pouco perdida com o ritmo da vida moderna e, talvez por isso, se volte para gurus e auto-ajuda.

 O problema é que, como está bastante exemplificado no livro, tal atitude não se resume ao cidadão comum, certo?
 WHEEN: Mesmo alguns dos indivíduos mais inteligentes da História tinham alguma inclinação bizarra.
Isaac Newton acreditava em alquimia, e Arthur Conan Doyle, ao mesmo tempo em que criou um personagem que era o símbolo do raciocínio lógico, acreditava em fadas.
Mas o problema é saber que Ronald Reagan consultava a astrologia para tomar decisões políticas e que Tony Blair se submeteu a um ritual de renascimento maia. Não somos tão racionais quanto pensamos.

 O senhor dedica boa parte de um dos capítulos do livro à princesa Diana, uma personagem delicada do imaginário britânico...
 WHEEN: Pouco antes de morrer, Diana não era tratada como santa e muita gente estava bastante desconfortável com as fotos em que ela aparecia se esbaldando no iate de um playboy. Sua morte causou uma histeria coletiva que ofuscou até mesmo o falecimento de Madre Teresa de Calcutá, pouco depois. Esse tipo de clima pode ser explorado por demagogos. É assustador pensar em como as pessoas podem ser manipuladas, algo que o Iluminismo combateu. O Iluminismo evitou que fôssemos torturados por ousar dizer que o sol não girava em torno da Terra. Ninguém pode ter medo de dizer que o imperador está nu.

Trecho do livro:

NA GRÃ-BRETANHA, A CAMPEÃ
 incontestável da autocomiseração implausível foi Lady Diana Spencer. Na época de seu noivado com o príncipe Charles, em 1981, ela era apenas mais uma garota apagada e de rosto redondo da região de Sloane Square, do tipo que se poderia ver em quase qualquer rua de Pimlico, Kensington ou Earl's Court, vestindo o uniforme pouco atraente que levou alguns observadores a assemelhá-la, de maneira cruel, mas exata, a uma aeromoça da Air Bulgaria. Quando de seu funeral, dezesseis anos depois, ela era rotineiramente descrita, embora isto fosse risível, como uma das mulheres mais bonitas do mundo, e a mais santa.


Offline PauloCesar

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #1 Online: 29 de Janeiro de 2007, 11:06:51 »
Assisti um documentário sobre o casal Reagan no GNT, que não só confirmou esses fatos como foi muito além (parece que a dona Nancy era bastante adepta de práticas ocultistas e pseudo-científicas) e fazia questão que o pres. Reagan agisse segundo suas convicções até nas questões de Estado.
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Offline Fabulous

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #2 Online: 29 de Janeiro de 2007, 23:13:16 »
enquanto tiver religião vai existir miticismo, enquanto existir miticismo vai existir lado obscuro, enquanto existir lado obscuro irá existir pessoas acreditando nessas coisas... enquanto existir isso vários charlatões continuarão ganhando e a picaretagem também, infelizmente.
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Offline Latorre

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #3 Online: 30 de Janeiro de 2007, 09:24:47 »
…e quiropraxia, e acupuntura, RPG, pilates, "cadeias musculares", TENS, corrente russa, ultrassonoterapia, tratamento de lesões musculares com infravermelho e ultravioleta, body systems, etc, etc, etc.

A próposito, se alguém aí tiver necessidade de fazer fisioterapia e o fisioterapeuta apresentar algum aparelho que pisque luzes e faça barulhinho, fujam. Fortalecimento muscular (com carga, como na musculação) e alongamento são as únicas coisas comprovadas cientificamente. Todas as outras além de não comprovadas, exibem vasta gama de evidências (acadêmicas) contra.
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Offline Fred

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #4 Online: 30 de Janeiro de 2007, 11:37:49 »
… e acupuntura...

Latorre, por que você acha que a acupuntura é picaretagem ? :umm:

Podem até existir acupunturistas picaretas, mas já foram mais do que comprovados os efeitos benéficos da acupuntura em casos específicos de fisioterapia. Desde que feito por um profissional sério, evidentemente. Muitos médicos aconselham, inclusive. Acupuntura não é uma pseudo-ciência igual à todas as demais que você citou.

Não sou expert no assunto, mas pelo que sei Body System é apenas uma franquia de coreografias para academias de ginástica. E o RPG é um procedimento para atenuar problemas de postura e dores na coluna. Como disse antes, não conheço bem estes procedimentos pois não sou da área, mas me parece que ao colocar tudo no mesmo saco, você pode ter cometido algumas injustiças...

Se eu estiver enganado, gostaria que você me desse maiores informações a respeito da idoneidade destas práticas. Valeu ! :ok:
“Não tenho medo das perguntas difíceis: tenho pavor das respostas fáceis.” A. Malcot

Offline Onaiab

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #5 Online: 02 de Fevereiro de 2007, 00:18:21 »

Latorre, por que você acha que a acupuntura é picaretagem ? :umm:


Deve ser porque ele "acha". 
A dúvida pode ser uma pedra no caminho ou uma ponte sobre o rio.
A simples atitude de negação não conduz a nenhuma certeza.
O improvável pode ser perfeitamente possível.

Offline Alenônimo

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Re: Como a picaretagem conquistou o mundo
« Resposta #6 Online: 02 de Fevereiro de 2007, 00:31:52 »

Latorre, por que você acha que a acupuntura é picaretagem ? :umm:


Deve ser porque ele "acha". 
Ou porque os efeitos não foram muito estudados ainda. Talvez ela em sí não funcione como o esperado, mas as agulhadas podem ativar a curculação sangüínea, por exemplo. Ou pode haver um efeito placebo.

Como eu disse, faltam estudos ainda. Teríamos que conhecer melhor como funciona a acupuntura.
“A ciência não explica tudo. A religião não explica nada.”

 

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