Mas você parte da premissa de que o mercado é uma "ditadura", ou seja, que as pessoas são "forçadas" a consumir a cultura que é oferecida pelo mercado e não o contrário: que o mercado oferece justamente aquilo que as pessoas querem consumir em termos de cultura.
Não, o mercado oferece aquilo que os publicitário acreditam que seja o que a maioria das pessoas quer consumir. Claro que existem pessoas que adorariam assistir o Concerto para violino de Berg na TV, mas isso não gera lucro. Pode ser até que muitas viessem a gostar do serialismo após ouvir esse concerto. Mas seria um risco que as empresas não estão dispostas a correr. É muito mais seguro mostrar um show do DJ Marlboro. Ou seja, o Estado pode atuar para gerar diversidade, criar opções.
O mercado não oferece aquilo que os publicitários acreditam que seja desejado pela maioria. Ele oferece justamente o que é desejado. Se um publicitário achar que determinada idéia é de valor mas ninguém consumi-la, não vai durar por muito tempo.
E como é que eles vão saber de antemão? Estou me referindo especificamente à produção cultural. Ninguem consegue prever
com precisão que música ou estilo vai estar na moda no ano que vem. Simplesmente não dá. É verdade que se uma idéia não
atrair nenhum interesse ela não vai durar. Mas como prever o que vai atrair? Em uma atividade que exige investimento pesado
(cinema, por exemplo), é muito mais seguro investir no denominador comum. Só pode se dar ao luxo de explorar aqueles que
já faturam bastante com a produção de massa. É por isso que os estúdios americanos fazem: montam subsidiárias que investem
em produções mais ousadas e arriscadas. Em lugares onde não exista essa economia de escala, resta ao governo investir.
E não é verdade que o mercado age apenas satisfazendo a maioria. O processo satisfaz todo o tipo de gosto desde que o número de consumidores seja suficiente para bancar os custos de produção mais o lucro. Nada mais sensato do que isso, afinal. Por que incentivar uma produção se há poucos que dão valor a ela?
Para incentivar novos talentos. Para buscar novas formas de expressão. Na verdade não discordo inteiramente de você. Antes de
mandar a mensagem anterior, apaguei uma parte onde eu citei o exemplo dos restaurantes de luxo: ninguem é obrigado a comer
fast food. Mas isso não impede que existam restaurantes onde os chefs tenham condições de testar sua criatividade. Isso porque
existem pessoas dispostas a pagar por isso. Só que isso é mais difícil em negócios (novamente: cinema) que exigem um pesado
investimento inicial. O ideal é que a própria indústria de entretenimento de massa financie os artistas mais de vanguarda. Mas para
isso é preciso que essa indústria exista. Não é o caso do Brasil.
Mas se ainda assim decidirmos que o estado deve patrocinar a cultura, há mais um detalhe.
Vamos partir da seguinte premissa: ninguém pode obter privilégios sobre nenhum centavo do dinheiro público e sobre nenhum centímetro quadrado do espaço público. Só por um conjunto de critérios altamente objetivos e impessoais podemos decidir quem merece ser beneficiado com o espaço e dinheiro públicos.
Desta forma, como se decide qual arte, qual cultura deve ser incentivada com os recursos do estado? Perguntando de outra forma: por que exatamente os rabiscos feitos em um minuto por um desconhecido qualquer merecem menos espaço (se é que merecem menos) em um museu de artes do estado do que os quadros de um "Portinari"?
Boa pergunta. Não sei se isso a responde, mas talvez se possa julgá-los por critérios puramente artísticos, e não comerciais.
Não deixa de ser subjetivo. Mas nesse caso critérios objetivos são meio difíceis de serem incluidos.
Sobre "protejer a identitade nacional" = patriotic bullshit.