Se você puder me esclarecer, JUS, outra: jurisprudencialmente falando, até que ponto o contrato anula uma propaganda enganosa? Quero dizer: no caso do Bucetê a alegação da operadora de telemarketing foi de que a cobrança do chip e do sei lá mais o quê estavam previstos em contrato... e deviam estar mesmo.
Acontece que as tais ressalvas estavam bem ocultas na propaganda e na abordagem do operador de telemarketing ou do sei lá quem que negociou com o Mulçumano Bocetinho (ou talvez nem tenham sido mencionadas, só aparecendo no contrato); ao passo que as vantagens devem ter sido ostensivamente anunciadas. É assim que agem as empresas de crédito fácil ou de venda de celulares ou de zilhões de outros produtos.
O que eu queria saber (eu sei que você cobra por este tipo de informação então se não quiser dizer não ligue que eu só fico de mal
) é se na prática os juízes costumam levar mais em conta esta alegação de que "estava no contrato, não leu porque foi burro" ou entendem que "se estava no contrato a empresa deveria ter deixado explícito na propaganda, não deixou porque foi desonesta"? (isto na hipótese de o consumidor levar o caso a juízo)
Sem problemas em te responder

.
O juiz tem por emprego decidir litígios de forma imparcial e com base nas normas e princípios, sob pena de ver sua sentença anulada e em casos extremos e reiterados perder o cargo.
Desta forma, o autor ingressa com a ação (tese), o réu contesta (antítese), e o juiz sentencia (síntese), sempre de acordo com o paradigma, que é a norma e os princípios.
Nos casos de propaganda enganosa, o paradigma a ser utilizado é o seguinte:
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 1º É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.
§ 2º É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.
§ 3º Para os efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço.
§ 4º (VETADO).
Art. 38. O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina.Como se vê, uma vez constatada a propaganda enganosa, que se revela por ser inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, ser capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços, o juiz não tem escolha a não ser dar ganho de causa ao consumidor.
Desta forma, respondendo à pergunta, infindáveis são os casos em que se reconheceu a propaganda enganosa, caso em que acarretam restituição do dinheiro e/ou indenização por danos morais ao consumidor:
RECURSOS DAS RÉS. Aquisição de linhas com promessa de passagem aérea. Propaganda enganosa. Restituição do valor pago e dano moral. Conduta abusiva, arbitrária e ilegal das rés. Conjunto probatório caracterizador do ato ilícito, do nexo de causalidade e dos efeitos danosos suportados pela vítima que adquiriu dois aparelhos com a vantagem de que compraria a passagem aérea de ida na tam para qualquer lugar do Brasil e que o seu retorno sairia gratuito, o que não foi confirmado, vez que o preço da passagem estava superior ao valor de mercado, o que se constitui propaganda enganosa. Correto o entendimento sentencial determinador da condenação por danos morais. Recurso do oi. Tnl deserto e improvido o recurso da nokia do Brasil. Sentença mantida. Condenação em custas processuais e honorários advocatícios a base de 20% sobre o valor da condenação.
(TJ-BA; Rec. 76668-2/2004-1; Quinta Turma Recursal; Relª Juíza Delma Margarida Gomes Lôbo; Julg. 28/11/2007; DJBA 30/11/2007)
DIREITO DO CONSUMIDOR. ANÚNCIO DE DETERMINADO PREÇO EM PRODUTO. COBRANÇA DE PREÇO SUPERIOR. PROPAGANDA ENGANOSA. CONDUTA QUE PREJUDICA O CONSUMIDOR EM SUA BOA-FÉ. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. CONDUTA ABUSIVA. MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. ACERTO DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. Manutenção da sentença pelos próprios fundamentos. Improvimento do recurso.
(TJ-BA; Rec. 84670-8/2005-1; Terceira Turma Recursal; Rel. Juiz Antônio Serravalle Reis; Julg. 28/11/2007; DJBA 30/11/2007)
AÇÃO INDENIZATÓRIA. INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DIVERSO DO CONTRATADO. PROPAGANDA ENGANOSA. DANOS MATERIAIS COMPROVADOS PARCIALMENTE. MANUTENÇÃO DO VALOR. DANOS MORAIS. VALOR RAZOÁVEL. MANUTENÇÃO DO QUANTUM. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. O valor da indenização deve ser arbitrado segundo o prudente entendimento do julgador, tendo em vista a extensão da dor moral, não podendo se constituir em enriquecimento do beneficiário, nem causar estímulo à reiteração da mesma prática pelo ofensor.
(TJ-MG; APCV 1.0183.05.091587-9/0011; Conselheiro Lafaiete; Nona Câmara Cível; Rel. Des. Antônio de Pádua; Julg. 11/09/2007; DJMG 20/10/2007)
REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. PROMOÇÃO FALE DE GRAÇA (NATAL CLARO). CLIENTE ATRAÍDO PELA PROPAGANDA ENGANOSA JÁ QUE ADQUIRIU O TELEFONE DURANTE A PROMOÇÃO. Tendo o autor adquirido seu aparelho celular durante a vigência da referida promoção, lançada pela propaganda enganosa e certamente por ela atraído, sofreu ele danos morais reparáveis. Quantum indenizatório em observância aos postulados normativos da razoabilidade e da proporcionalidade. Recurso improvido.
(TJ-RS; RInom 71000718288; Osório; Primeira Turma Recursal Cível; Rel. Des. Ricardo Torres Hermann; Julg. 26/01/2006)
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. BANCO. FUNDO DE INVESTIMENTO. PROPAGANDA ENGANOSA. ANÚNCIO DANDO CONTA DE RETORNO DA ORDEM DE 150%. INVESTIMENTO CUJO ALTO RISCO NÃO FOI INFORMADO AO CLIENTE. Perda do capital aplicado. Má gestão dos fundos. Ocorrência. Direito ao resgate do valor inicialmente aplicado. Incidência, ademais, do artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor. Recurso parcialmente provido.
(TJ-SP; AC 952.569-5; São Paulo; Vigésima Terceira Câmara de Direito Privado; Rel. Des. José Marcos Marrone; Julg. 09/11/2005)