Obviamente o "fundamentalismo" (como se não bastasse todo o papo-furado sobre ateísmo ser religião, também agora pode ser fundamentalista; é meio como se acusassem que ser careca não só é um penteado, mas que é especialmente dispendioso em xampu) ateu é incomparavelmente mais inofensivo em si mesmo que o religioso, mas o problema não é oferecer um perigo exatamente análogo. O perigo é justamente atiçar a ira dos fundamentalistas religiosos.
A popularidade dos ataques mais frontais à religião deve mexer mais os religiosos de modo geral do que a exposição científica mais "pacífica", e ainda que talvez possa dar um empurrãozinho rumo ao agnosticismo e ao ceticismo numa parte dos mais amenos, do pessoal que coloca no orkut "espiritual, mas não religioso", é bem provável que boa parte dos moderados-mas-nem-tanto reajam de forma defensiva, e se tornem menos moderados. E aumenta a aversão à ciência. Os que já não são moderados, se tornam mais radicais, e os radicais, mais vocais.
Penso que toda essa estratégia dos "não-acomodacionistas" -- como se rotulam, em oposição aos "acomodacionistas", os que, como Gould, defendem um discurso consideravelmente menos "agressivo", enfatizando o fato das pessoas poderem ser religiosas e perfeitamente normais -- é meio irônica ao se colocar como o lado cientificamente verdadeiro, sem concessões, ao mesmo tempo em que parece negligenciar a psicologia.
Eu particularmente penso que a divulgação científica avança mais se não procurar sarna para se coçar, e a moderação religiosa também tende provavelmente a avançar mais se os moderados tiverem seus pontos de vista menos "atacados". Atacar o discurso moderado é como queimar uma ponte que pode levar do radicalismo a algo melhor.