Autor Tópico: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)  (Lida 6350 vezes)

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Offline Donatello

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A novela Cambalacho marcou minha infância : havia uma personagem que me matava de rir cada vez que aparecia, mesmo que eu, como criança, não entendesse muito bem o que passava na estorinha global: Ana Machadão.

Era Débora Bloch fantasiada de mecânica, com as mãos sempre cheias de graxa e um jeito completamente masculinizado (embora não fosse lésbica) e desengonçado. Era 1986 e o choque que a personagem causava era exatamente este: onde já se viu uma mulher que suja as mãos de graxa? Não pode ser uma mulher de verdade! Uma mulher de verdade não teria as mãos sujas e nem teria uma aparência tão bruta, tá na cara que ela é meio homem, olha o jeito dela falar...

O mito da feminilidade que ajudou a construir (ao ser confrontado) a personagem mais engraçada (sob os critérios de um Donatello que tinha 6 anos, não sei se ia achar qualquer graça hoje) da minha infância é o mesmo que sustenta a idéia de que mulheres são mais pacíficas que os homens. E entre a idéia de que mulheres são mais pacíficas e o riso que a tal personagem causava há um elemento comum: mulheres não costumam sujar as mãos.

No Rio de Janeiro, em um dos conflitos armados atuais da minha cidade, uma relação familiar tem dado um toque novelístico a um confronto que já matou algumas dezenas de criminosos e alguns inocentes (um deles: um pobre homem de bem que foi acordado de madrugada e obrigado a ajudar 3 membros de uma quadrilha a fugirem da favela, entrou no carro e levou os caronas indesejáveis sob a mira de pistolas, mas o automóvel foi interceptado pelos inimigos que apagaram os 3 traficantes e o azarado motorista).  

Talvez por conta do enredo desta nova guerra na Vila Vintém eu tenha me lembrado de Cambalacho e de Ana Machadão.

Celsinho da Vila Vintém (um dos superstars do crime organizado do Rio, fundador da facção Amigos dos Amigos e atualmente preso em Bangu 1) é amigo de infância do traficante Palhaço, que sempre foi seu braço direito. Eram tão amigos que Celsinho deu a mão de sua querida filha ao Palhaço. A tal herdeira de Celsinho já lhe deu um neto com o antigo comparsa e deve parir mais um nos próximos meses.

Eis que alguns dias atrás o Palhaço resolveu que "amigos, amigos, negócios a parte" e passou o rodo em boa parte da quadrilha do Celso, que por sua vez, da cadeia, pediu ajuda de seus comparsas de outras favelas (inclusive da distante Rocinha, do outro lado da cidade) que invadiram os domínios da Mocidade Independente e passaram o rodo em boa parte da trupe do Palhaço.

O circo pegou fogo. A filha de Celsinho chegou a ficar sob a mira da arma do marido que a fez escolher entre ele ou Celsinho. Ela escolheu o lado do pai mas teve a vida poupada sob a seguinte frase, digna de uma personagem da Glória Perez: "não vou te matar porque senão vão me chamar de juda" (leia-se: se eu fizer isto além de correr o risco de perder o apoio dos meus comandados [matar a própria mulher grávida é judaria demais pro estômago de alguns assassinos mais, digamos, cristãos] eu vou ser caçado pelo seu pai até no inferno).

Tudo isso para dizer que ontem, eu estava conversando sobre o assunto com duas colegas do trabalho e uma delas me solta com extremo pesar: "Coitada desta menina, deve ser horrível pra ela, está praticamente refém de dois criminosos: o pai de um lado, o marido de outro, ela não tem como sair dessa vida..."

Eu que não consigo entender como um rapariga que, desde que nasceu, sabe melhor do que ninguém o que os traficantes fazem e mesmo assim escolheu viver com um deles -- provavelmente sendo mandante de vários crimes (mulher de bandido a-d-o-r-a mandar o marido matar qualquer um de quem ela não goste) e com certeza cúmplice de tantos outros -- consegue ser vista como vítima e nem entendo como mulheres de criminosos quase nunca são presas (nem ao menos pelo indiscutível crime de receptação).

Eu que nunca entendo como mulheres que largam suas vidas de princesa no "asfalto" para viverem com traficantes são consideradas de qualquer modo "vítimas da sedução dos criminosos" e não cúmplices; eu que não consigo entender o mito de que mulheres não gostam de guerra quando os índices de aprovação popular estadunidense à Guerra do Iraque foram quase idênticas entre homens e mulheres; eu que não consigo entender o porquê de uma flutuação hormonal ser atenuante para crimes cometidos por mulheres (lembrando que tesão também é resultado de flutuação hormonal, o que bem poderia ser alegado em favor dos estupradores); eu que não consigo entender o porquê de mulheres serem consideradas de fato mais pacíficas que os homens só pelo fato de não sujarem as mãos... quase infartei.
« Última modificação: 01 de Agosto de 2009, 12:00:35 por Donatello van Dijck »

Offline Tupac

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #1 Online: 01 de Agosto de 2009, 11:04:41 »
Sou seu fã...
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"O que é afirmado sem argumentos, pode ser descartado sem argumentos." - Navalha de Hitchens

Offline Panthera

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #2 Online: 01 de Agosto de 2009, 17:04:38 »
Hehehe. Muito legal. Tu tinha que publicar isso em algum lugar na net (além daqui, claro).
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Offline N3RD

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #3 Online: 01 de Agosto de 2009, 19:36:32 »
Cuidado! Elas podem te boicotar...  :feminista:
Não deseje.

Offline Donatello

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #4 Online: 01 de Agosto de 2009, 20:59:01 »
Tu tinha que publicar isso em algum lugar na net (além daqui, claro).
Você sabe um modo de invadir o sistema de O Globo ou da Folha?  :)  

Seria mesmo bom que fosse possível encontrar não este mas outros textos pela internet e em sites mais relevantes. O problemático em se questionar este ou qualquer outro dos mitos feministóides é que as meias verdades feministas (mulheres recebem menos que os homens1, mulheres trabalhadoras trabalham mais nas atividades domésticas2, mulheres são mais escolarizadas por serem mais persistentes3, mulheres são mais pacíficas4, et cetera) estão tão impregnadas no imaginário coletivo como verdades irrefutáveis e são repetidas tantas vezes por quem tem poder de moldar o imaginário coletivo que das duas uma: ou você leva um "vai tomar bem no olho do seu cú seu machista filho da puta" raivoso que encerra a discussão antes que ela comece ou você é solenemente ignorado, independente de quão firmes sejam seus argumentos, como um louco estravagante que quer aparecer dando uma de "do contra".

Esta semana mesmo eu editei a página de masculinismo na Wikipedia (a lusófona não tinha). Foi um sufoco para encontrar fontes secundárias em português, elas simplesmente não existem, não há discurso crítico às desigualdades de gênero por uma ótica masculina por aqui. Acabei tendo que colocar todas as fontes em Espanhol e Inglês. Eu fico chateado com isso porque é uma fonte natural de uma porrada de debates que poderiam render mas que não acontecem porque está quase todo mundo condicionado a pensar que "coitadinhas delas" e quem não estiver, esqueça, nem adianta falar porque não vai ser ouvido.
Cuidado! Elas podem te boicotar...  :feminista:
:/ Já me boicotam... :biglol:

1 ...em boa parte porque trabalham menos e também porque se interessam por carreiras menos rentáveis e trocam menos de emprego em busca de melhores salários.
2 ...porque seus maridos e irmãos em geral trabalham fora mais horas por semana, em locais mais distantes (gastam mais tempo e esforço para se locomoverem de casa para o trabalho e vice-versa) e em atividades mais laboriosas.
3 ... e também porque quando a coisa aperta do ponto de vista econômico são seus companheiros e irmãos que costumam abandonar os estudos para sustentá-las
4 ... vide tópico.
« Última modificação: 03 de Agosto de 2009, 14:58:19 por Donatello van Dijck »

Offline Tupac

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #5 Online: 01 de Agosto de 2009, 22:10:32 »
Só porque você não gosta delas não precisa fazer uma cruzada, né?!!
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Offline Donatello

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #6 Online: 02 de Agosto de 2009, 08:10:26 »
Hahaha, eu gosto delas. Elas que não gostam de mim :/ :P

Offline Gaúcho

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #7 Online: 03 de Agosto de 2009, 11:06:40 »
Mulheres são frágeis e indefesas u.u
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Offline Sr. Alguém

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #8 Online: 03 de Agosto de 2009, 19:51:13 »
Se você acha que sua crença é baseada na razão, você a defenderá com argumentos e não pela força e renunciará a ela se seus argumentos se mostrarem inválidos. (Bertrand Russell)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Humanismo_secular
http://pt.wikipedia.org/wiki/Liberalismo_social

Offline Maeve Brooks

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #9 Online: 03 de Agosto de 2009, 21:06:02 »
Vou comentar esse texto em duas partes:

Como mulher mulherzinha
Nesse caso ela pode sim ter sido vítima das circunstâncias, teve uma educação machista, acreditou nela e escolheu um membro do seu mundo, aposto que o pensamento dessa mulher era de que só havia um caminho pra sua vida, com homens como o pai, repetindo a história da mãe, sem nenhuma chance de sair dessa vida sozinha, é claro que podia ter rompido com tudo isso como muitas fazem, mas será que parou pra refletir que poderia? Muitas mulheres em situação de risco acreditam mesmo que merecem aquilo, que não tem capacidade pra mudar e que o mundo fora dali é bem pior. Minha mãe sempre disse que se uma irmã dela apanhasse do marido e saísse de casa minha avó bateria a porta na cara dela, porque lugar de mulher é em casa com o marido.

Como mulher moderninha
Detesto essa vitimização gratuíta, pros homens é difícil porque geralmente são os vilões, mas enche o saco ser tratada como incapaz, se por um lado existe a reclamação por não sujarmos as mãos são bem maiores os protestos das mulheres que querem agir e são "impedidas" por um cavalheirismo limitador dos homens. Se existem mitos femininos é porque alimentamos, muitas diferenças são culturais mas é muito difícil enxergar e romper com elas.

Acho que estamos passando por um período de redefinição dos gêneros, os limites não são claros e mudam rapidamente, espero que o equilibrio seja a próxima etapa, se homens tem força física porque não fazer os trabalhos braçais? Se mulheres são mais delicadas porque não fazer trabalhos de precisão? E porque não inverter tudo isso de acordo com a capacidade de cada um?
"Não existem inocentes. Apenas diferentes graus de responsabilidade."  Stieg Larsson

Offline Donatello

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #10 Online: 03 de Agosto de 2009, 23:35:30 »
Citação de: Maeve
Nesse caso ela pode sim ter sido vítima das circunstâncias, teve uma educação machista, acreditou nela e escolheu um membro do seu mundo, aposto que o pensamento dessa mulher era de que só havia um caminho pra sua vida, com homens como o pai, repetindo a história da mãe, sem nenhuma chance de sair dessa vida sozinha, é claro que podia ter rompido com tudo isso como muitas fazem, mas será que parou pra refletir que poderia? Muitas mulheres em situação de risco acreditam mesmo que merecem aquilo, que não tem capacidade pra mudar e que o mundo fora dali é bem pior. Minha mãe sempre disse que se uma irmã dela apanhasse do marido e saísse de casa minha avó bateria a porta na cara dela, porque lugar de mulher é em casa com o marido.
O problema é exatamente este: justificativas especiais para a criminalidade/violência/desonestidade feminina. Quero dizer: eu não refuto esta alegação de que a estória de vida da mulher do Palhaço possa ter condicionado a sua permanência no crime, mas o bizarro é exatamente que este tipo de discurso seja usado para explicar o porquê de MULHERES assumirem posições criminosas quando na verdade esta é uma possível explicação genérica, que vale tanto para homens quanto para mulheres.

Quer dizer: este tipo de alegação pode fazer todo o sentido para explicar, em parte, porque pessoas são criminosas, mas não para absolver ou tratar como caso especial (como a mulherzinha dentro de você faz) as mulheres criminosas.

Citação de: Maeve
Detesto essa vitimização gratuíta, pros homens é difícil porque geralmente são os vilões, mas enche o saco ser tratada como incapaz, se por um lado existe a reclamação por não sujarmos as mãos são bem maiores os protestos das mulheres que querem agir e são "impedidas" por um cavalheirismo limitador dos homens. Se existem mitos femininos é porque alimentamos, muitas diferenças são culturais mas é muito difícil enxergar e romper com elas.
Não entendí este parágrafo...
pros homens é difícil porque geralmente são os vilões o quê que é mais difícil e onde que geralmente somos os vilões?  :?

se por um lado existe a reclamação por não sujarmos as mãos Eu não reclamo de não sujarem as mãos, mas da percepção coletiva de que pelo fato de não sujarem as mãos sejam mais inocentes. Quem não entra na arena mas fica do lado de fora berrando "decepa!decepa!decepa!" é tão carniceiro quanto o gladiador que corta a cabeça do outro. É este o papel feminino típico nas questões de violência, tipo: num mundo imaginário onde todas as pessoas cometem crimes de violência contra seus companheiros os homens bateriam em suas esposas e as mulheres pediriam aos primos para "darem uma lição" no marido... e nós ficaríamos com a falsa percepção de que só os homens gostam de/cometem violência.

Quanto à visão de mulher moderninha, eu acho que é mais por aí: as questões de gênero deveriam deixar de ser vistas, absolutamente, como questões femininas: não se trata mais de acabar com a opressão sofrida pelas mulheres que já foi faz tempo, mas de discutir dentre as diferenças que ainda sobraram (ou das que foram criadas por conta da luta feminista) se alguma faz sentido e por que...

Um exemplo excelente (que não tem nada a ver com violência mas tem a ver com nosso olhar viciado quanto às questões de gênero) é a diferença entre as famílias mais pobres, no que tange a trabalho.

Homens pobres geralmente trabalham demais (múltiplos empregos, jornadas de trabalho excessivas...)... e suas mulheres -- mesmo que em geral tenham maior escolaridade -- são muito raramente empregadas, se limitando a cuidarem de casa, dos filhos e a fazer alguns bicos como vender Avon ou fazer quitutes pro marido vender na feira no fim de semana. E aí geralmente se define esta maior disparidade como uma questão de gênero, de machismo dos mais pobres que por não terem estudado ainda são uns trogloditas do século retrasado.

Mas a questão é muito mais utilitária, tem a ver com a condição econômica. Os filhos não podem ficar jogados em qualquer canto, não podem ficar sozinhos em casa... pagar uma babá consumiria todo o salário adicional que a mulher porventura recebesse se estivesse empregada, o que tiraria a utilidade desta opção... Já nas famílias mais ricas esta disparidade é infinitamente menor: as tarefas de sustento da casa, cuidado dos filhos, atividades domésticas são muito melhor divididas; não porque os homens ricos são mais cultos e de mente aberta, mas porque existem mais opções para a simples e crucial pergunta: "com quem nós vamos deixar os moleques?"

É claro que existem idéias preconcebidas que definem, neste caso, quem vai ficar com o papel de se foder de trabalhar e abandonar os estudos e tarará tarará e quem vai ficar com o papel de desistir da possibilidade de desenvolver uma carreira para pilotar fogão, cuidar dos filhos e vender Avon. Mas note que não são os preconceitos que criam o problema, eles apenas moldam as opções mais utilizadas, e no fim das contas tanto os machos quanto as fêmeas se ferram então não têm esta estória de opressão machista.

Se a gente começar a olhar por este ângulo ao invés de simplesmente taxar que "as mulheres pobres são vitimizadas pelos seus maridos trogloditas que não as deixam trabalhar e as querem manter como escravas domésticas" talvez a gente comece a fazer perguntas diferentes e encontrar respostas (em âmbito de políticas públicas, de criação de valores coletivos...) que sejam mais úteis do que feministas com seu discurso de guerrilha encontraram até hoje.

Eu acho que existe um raciocínio análogo pra cada questão de gênero, hoje.

« Última modificação: 04 de Agosto de 2009, 00:11:41 por Donatello van Dijck »

Offline Maeve Brooks

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #11 Online: 05 de Agosto de 2009, 17:59:29 »
Donatello, concordo que não seja justificativa nem explicação pra absolver as mulheres, em teoria violência familiar influencia a todos. Mas acho que o fato das mulheres "criminosas" geralmente serem tratadas como um caso especial é que no imaginário comum a cena de um cara mais forte batendo numa mulher indefesa é muito mais impactante do que ela depois pedindo pros primos darem uma surra nele. Aí entra o mito, que faz a maioria achar que esse fato em particular decidiu tudo, o que não é verdade.

No paragráfo que você não entendeu eu tentei dizer que nem sempre são as mulheres que se vitimizam, mesmo assumindo uma postura diferente os homens e outras mulheres ainda enxergam a vítima. Exemplo pessoal, uma vez fui fazer uma trilha com amigos, homens e mulheres, nas partes mais difíceis sempre aparecia um cara pra oferecer ajuda. Muito legal, eles eram muito gentis, eu agradecia e recusava porque poderia continuar sem dificuldade, só que depois de recusar a ajuda umas mil vezes comecei a me irritar. Porra, seu eu quisesse ser carregada não teria ido fazer a trilha, eles no mínimo me achavam incapaz. Eu não me vitimizei, nitidamente não precisava de ajuda, mas na cabeça deles não deveria estar "sujando as mãos", acho que com as mulheres de bandido deve ser parecido, mesmo que elas não mandem matar ninguém um cara pode achar que precisa fazer algma coisa.

Concordo com sua visão econômica, é realmente o que acontece.

Citar
Eu acho que existe um raciocínio análogo pra cada questão de gênero, hoje.
Com isso aqui não concordo mesmo!! Os casos que fazem parte da minha realidade dizem que o Brasil ainda é muito machista, que as mulheres ainda são muito oprimidas e encaradas como cidadãs inferiores em muitos lugares. Só consigo pensar no enorme número de mulheres que apanham dos maridos por anos e não reagem.
Não sou feminista, nem levanto bandeiras, homens e mulheres são diferentes mas tem capacidades iguais em muitas áreas, hoje praticamente desapareceram os espaços exclusivamente femininos ou masculinos, mas nem todas as questões foram superadas.

Você tem razão na tese de que as mulheres não são mais pacíficas que os homens, só se sujam menos, mas não entendo esse encômodo específico, não tenho nenhuma propriedade pra afirmar isso, mas acho que posso dizer que é inerente ao ser humano justificar seus atos.... na IURD tá cheio de gente dizendo que o Diabo mandou fazer, Jeremias também não teve dúvida "foi o cão que pôs pra nóis bebê", e mulheres são encaradas como vítimas e não agressores.
 
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Offline Donatello

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #12 Online: 06 de Agosto de 2009, 09:30:55 »
Citação de: Maeve
No paragráfo que você não entendeu(...)

Ah, sim... mas eu não indiquei que fosse culpa das mulheres (ou das mulheres criminosas) em momento algum. Eu acho que, aliás, um grande erro do "grosso" do movimento feminista (eu sei que há feministas que realmente lutam e pregam igualdade, mas este é "o ralo" do movimento) é tratar suas pendengas como culpa dos homens. É claro que naturalmente as mulheres vão ser mais enfáticas na defesa de seus privilégios e os homens idem em relação aos próprios, mas a reprodução ideológica destas diferenças é culpa de todos sim.

Em momento algum disse que as mulheres se veem como vítimas, eu disse que elas são vistas como vítimas (como você disse: por elas próprias, pelas outras mulheres e, ainda mais tristemente, pela imensa maior parte dos homens) então quanto a isso parece que nunca discordamos também. :ok:

Quanto ao ponto em que, enfim, discordamos:
Citação de: Maeve
Os casos que fazem parte da minha realidade dizem que o Brasil ainda é muito machista, que as mulheres ainda são muito oprimidas e encaradas como cidadãs inferiores em muitos lugares. Só consigo pensar no enorme número de mulheres que apanham dos maridos por anos e não reagem.
Eu poderia fazer um ping-pong dizendo que:
Citação de: van Dijck
Os casos que fazem parte da minha realidade dizem que o Brasil ainda é muito femista, que os homens ainda são muito oprimidos e encarados como cidadãos inferiores em muitos lugares. Só consigo pensar no enorme número de homens que são agredidos pelas mulheres por anos e não reagem.

Quando eu dizia que o mesmo raciocínio pode ser aplicado eu me referia a situações em que pode se encontrar vitimização em ambos os lados, mas nós (a coletividade) supervalorizamos a vitimização feminina e minimizamos (quando não simplesmente ignoramos) a vitimização masculina. É o que eu falei acima sobre as meias verdades feministas... o discurso feminista não é composto de mentiras completas: não é mentira que as mulheres recebam menos ou que muitas delas sejam vítimas de violência doméstica ou que sejam super-exigidas esteticamente ou que sejam menosprezadas socialmente quando têm muitos parceiros... são só meias verdades. Supervaloriza-se os pontos que prejudicam as fêmeas (ou beneficiam os machos) e minimiza-se o valor dos privilégios femininos (ou prejuízos masculinos).

Um discurso que realmente visasse igualdade necessitava de ser menos condicionado.

Quanto à violência doméstica, que você puxou... dê uma olhada nestes links:

http://apsicologa.blogs.sapo.pt/39668.html (Aliás, este redigido por uma mulher e que vale muito a pena ler inteiro)
http://www.sidneyrezende.com/noticia/1023+eles+tambem+sao+vitimas+de+violencia+domestica.

Se por um lado o número de mulheres vítimas de violência física direta deva mesmo ser muito maior e por motivos óbvios (exceto quando se é namorado da Daniela Falavinho ou da Edinanci Silva), por outro lado é inegável que o homem vítima de violência (física direta ou de qualquer outro tipo) sofre de uma série de agravantes exatamente por ser homem.

Eu me lembro que quando as DP de mulheres foram criadas a justificativa era que as mulheres não tinham suas queixas atendidas nas "delegacias de homens" como se isso fosse uma prova de que as mulheres são discriminadas. Mas imagine que você é um cara barbudo que chega numa delegacia policial com uma mancha roxa na altura das costelas dizendo que sua mulher pegou o rolo de massa e te deu um porretada. A delegacia vai virar um circo, com você no papel de palhaço.

E eu também acredito, quanto aos indicadores muito mais baixos de violência doméstica contra os homens, que muitos dos casos são difíceis de ser captados mesmo em uma pesquisa acadêmica, tipo: aquela panela que voa despretensiosamente na cabeça de um pobre marido que chegou mais tarde do futebol dificilmente provocará um sim à pergunta "o senhor já foi vítima de violência doméstica?" a menos que tenha provocado uma lesão grave. Inversamente, nosso condicionamento intelectual de que "em mulher não se bate nem com..." nos fez acreditar que um tapa na cara de uma menina em uma discussão mais acalorada que vai terminar num motel já pode ser considerada violência de gênero. E eu disconfio que isso influencie decisivamente na idéia de que mulheres apanham do marido muito mais do que maridos apanham das mulheres. De qualquer modo...

Offline Týr

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #13 Online: 06 de Agosto de 2009, 10:00:03 »
Esse tópico vai indo bem! Me lembro de um que não terminou nada legal. É talvez justamente a forma de abordagem que se faz do assunto, que determina o rumo que ele vai seguir. Até porque as mulheres, na maioria das vezes, se ofendem facilmente com algumas colocações.

A verdade é que algumas mulheres, têm as mãos tão sujas quanto muitos homens, e há um crescimento vertiginoso dessa situação. Dês das que manipulam situações até as que se escondem atrás da máscara da feminilidade.

Mas é legal como as concepções mudam com o tempo, a lei que veio para defendê-las já pode ser usada contra elas, e a guarda nem sempre mais deve ficar com a mãe, apesar de ainda ser a preferência.

Chegará uma época em que os direitos femininos serão um tormento, afinal, para que contratar uma mulher que tem direito a seis meses de licença maternidade, quando se pode contratar um homem que nem fica mal uma vez por mês? Parece bobo o exemplo, mas te juro que se eu fosse patrão pensaria nessa situação, principalmente se fosse pequeno empresário.

Acho que se querem igualdade, as mulheres deve começar a se portar como iguais.


Ps.: Isso não vale para todas as mulheres, sei que muitas são tão, ou mais, esforçadas que os homens. E muitas também são são virtuosas quanto.

Offline Südenbauer

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #14 Online: 06 de Agosto de 2009, 12:21:54 »
Eu conheço algumas mulheres que batem no peito e dizem: queremos igualdade! Mas no primeiro ônibus lotado fazem questão que algum homem generoso dê o seu lugar. Questão de interesses.



Eu acho que o principal preconceito sofrido pelas mulheres hoje em dia seja quanto a questões de comportamento social. Aquela história de que, se o cara é pegador, ele é o Tony Stark, mas a mulher será a Pamela Anderson.

Offline Maeve Brooks

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #15 Online: 06 de Agosto de 2009, 16:32:01 »
Pois é Donatello, nunca achei que fosse fazer isso mas vou concordar. A sociedade supervaloriza a vitimização feminina. Mas o que fazemos com aqueles pessoas que enxergam o homem como o macho provedor agressivo e a mulher como a pobre e indefesa rainha do lar? Por mais que seja tudo relativo e seu ping-pong tenha sido esclarescedor os estereótipos ainda fazem parte do imaginário coletivo. Homens e mulheres desempenham papeis pré-concebidos e por mais que eu admita todos os acertos da sua argumentação ainda tenho dificuldade em lidar com o inesperado, homens apanham de mulheres e elas podem ser terrivemente cruéis, mas ri quando li o artigo da psicóloga, se fosse um caso feminino teria ficado irritada.....foi minha resposta imediata, é o que está no meu incosciente e possivelmente no da maioria. Tentando ser mais igualitária vou me policiar pra não enxergar sempre a vítima em toda mulher, mas infelizmente você vai continuar ouvindo os "Ah, coitadinha".

Dr. Strangelove, acho que não tem mais tanta diferença de tratamento com "pegadores", nas últimas pesquisas sobre relacionamento e sexualidade homens e mulheres ficaram empatados em quase tudo....só vou ficar devendo a fonte porque to confiando na memória, mas se me lembro bem a frequência sexual, o número de parceiros e as traições estão equilibradas, interpreto que os dois gêneros se sentem a vontade pra caçar.   
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Offline Donatello

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #16 Online: 06 de Agosto de 2009, 16:42:40 »
Citação de: Maeve Brooks
Mas o que fazemos com aqueles pessoas que enxergam o homem como o macho provedor agressivo e a mulher como a pobre e indefesa rainha do lar?
Fazemos isso que acabamos de fazer Maeve.

A percepção coletiva muda é assim mesmo, de um em um. Provavelmente se não tivessemos tido esta conversa você demoraria mais 1, 10, 25 anos pra sofrer esta mudança... e eu entendo: como eu disse lá em cima o discurso é tão homogeneizado, as matérias jornalísticas são tão decoradinhas e cópias uma da outra, até os "estudos" acadêmicos são tão pré fabricados e a falta de crítica a eles é tanta que soa absurdo pensar o contrário do que eles pregam.

Foi o que eu disse: quem faz qualquer crítica ao discurso estabelecido sobre diferença de gêneros fica com 49,5% de chance de ser xingado raivosamente, com outros 49,5% de chance de ser solenemente ignorado e com o 1% restante de conseguir iniciar um debate produtivo.

O melhor dos mundos aconteceu por aqui, e não foi graças a mim, foi graças a você. Parabéns! :ok:
« Última modificação: 06 de Agosto de 2009, 16:44:52 por Donatello van Dijck »

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #17 Online: 06 de Agosto de 2009, 17:33:06 »

Acho que se querem igualdade, as mulheres deve começar a se portar como iguais.


Concordo. Mas eu vou um pouco mais além... Não adianta muito uma mulher que se comporta como igual numa sociedade que a vê como um ET.

Por exemplo, não adianta ela sair para trabalhar e dar o mesmo duro que qualquer homem (enfrentar trem, ônibus, metrô - em pé e espremida - comer churrasco de gato pra poupar o vale, etc.), e ainda chegar em casa e enfrentar um tanque de roupa pra lavar, uma pia de louça, o banheiro mijado (por um filho e/ou marido ruim de mira) sozinha. A balança continuará a pender para um dos lados.

E infelizmente, ainda tem marido por aí que acha que isso é atribuição feminina, mas quando o salário dela entra em casa aí ela é uma igual. A verdade é que muitas mulheres ainda fazem jornada dupla. A grande maioria. Aqui é comum que vão pra roça juntos... agora é época de colher café. Mas quando chegam em casa, quem vai fazer janta, lavar roupa e louça e preparar a marmita para o outro dia é ela. Ele toma uma cachacinha e deita para assitir ao jornal.

A coisa seria mais igual se o cara fosse para o tanque lavar suas cuecas na mesma proporção em que ela lava as calcinhas dela, por exemplo.  :P

Eu realmente gostaria de viver numa sociedade totalmente igualitária neste sentido. Mas acho que é meio utópico... o mesmo machismo que pinta as mulheres como sexo frágil também as mantém no tanque. E as burras das mulheres ensinam esse machismo para suas filhas e filhos... parece um meme imortal.

*Claro que não falo daquelas em que o companheiro tem senso de ridículo ou que são mocinhas morando na casa do pai e ganham tudo da mamãe, ou ainda das que tem empregada faz-tudo.
« Última modificação: 06 de Agosto de 2009, 17:38:43 por Nina »
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #18 Online: 06 de Agosto de 2009, 17:37:40 »
Foi o que eu disse: quem faz qualquer crítica ao discurso estabelecido sobre diferença de gêneros fica com 49,5% de chance de ser xingado raivosamente, com outros 49,5% de chance de ser solenemente ignorado e com o 1% restante de conseguir iniciar um debate produtivo.

Não sei Donatello... faz tanto tempo que vejo esse assunto em pauta e ando bastante cética quanto a eficácia da conversa. Estou começando a achar que este tipo de mudança dificilmente acontecerá em nossa sociedade...
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #19 Online: 06 de Agosto de 2009, 19:35:39 »
Citação de: Nina
E infelizmente, ainda tem marido por aí que acha que isso é atribuição feminina, mas quando o salário dela entra em casa aí ela é uma igual. A verdade é que muitas mulheres ainda fazem jornada dupla. A grande maioria. Aqui é comum que vão pra roça juntos... agora é época de colher café. Mas quando chegam em casa, quem vai fazer janta, lavar roupa e louça e preparar a marmita para o outro dia é ela. Ele toma uma cachacinha e deita para assitir ao jornal.
(...)mulheres trabalhadoras trabalham mais nas atividades domésticas...

......porque seus maridos e irmãos em geral trabalham fora mais horas por semana, em locais mais distantes (gastam mais tempo e esforço para se locomoverem de casa para o trabalho e vice-versa) e em atividades mais laboriosas.

Nina, dê uma olhada na síntese dos indicadores da PNAD que está linkado. Se você fizer uma leitura global e não direcionada e se olhar os dados com isenção vai ver quão claramente esta estória da meia-jornada é uma das meias verdades de que eu estava falando.

Eu acho que cheguei a abrir um tópico falando específicamente deste tema mas ele não saiu do post inicial. Quando lemos a manchete no jornal "Maioria das mulheres trabalhadoras tem dupla jornada, constata IBGE" nós criamos uma imagem mental que definitivamente não condiz com a verdade, por quê?

Basicamente porque o conceito do IBGE para "trabalhadores" é bem diferente daquele que nós temos e de igual modo quando lemos "serviços domésticos" temos uma visão menos ampla do que a que o Instituto adota.

Quando nós lemos esta matéria somos levados a visualizar a seguinte (e macabra) cena:

Quadro 1:
Maria Fulana, 37 anos, 2 filhos, balconista, trabalha 44 horas por semana em um Shopping em Botafogo, mora no Chapéu Mangueira, recebe 650 reais por mês líquidos, quando chega em casa vai lavar, passar, cozinhar e dar banho nos filhos que estavam na casa da mãe.
João Ciclano, 32 anos, repositor de mercadorias, 44 horas semanais, mesmos filhos de Maria, casado com ela, 510 reais mensais, chega em casa, pega uma breja, faz um strip entre a cozinha e a sala, põe os pés na mesinha de centro, liga a tv.


Se fosse esta a cena seria uma clara prova de que as mulheres são escravizadas em seus lares, eu não discutiria com você. Mas as informações que também estão lá nos resultados da PNAD (juntinhas com a carga horária de trabalho doméstico feminino) e que incrivelmente passam despercebidas são tantas que me irrita ver alguém falar em opressão por dupla-jornada de trabalho.

Vamos a elas:
1- O conceito de "trabalhador" para o IBGE é mais amplo do que o que se forma de imediato em nossas cabeças: a moça que vende sacolé na própria casa, a professora de catecismo da paróquia da praça, o técnico de eletrônicos que colocou uma plaquinha na porta de casa "consserta-ce bissiclétas" mas que não recebeu nenhum cliente durante as duas últimas semanas, o sujeito que planta mandioca nos fundos do quintal pra deixar a dona Maria gordinha, o balconista de loja de conveniência, o funcionário público do paletó na cadeira e o advogado famoso com escritório no Humaitá são igualmente ocupados pelos critérios do IBGE.

2- Muito em função do critério acima descrito a média de carga horária de trabalho não doméstico feminina é muitíssimo inferior à média de carga de trabalho não doméstico masculina. De memória eu me lembro por exemplo que em 2006 enquanto 12% das mulheres ocupadas (segundo os critérios do IBGE) trabalhavam menos de 14 horas semanais entre os homens este percentual era de 3%. No outro extremo 25 por cento dos homens ralavam mais do que 49 horas por semana fora de casa, contra 12 por cento das mulheres.

3-Assim como ocupação para o IBGE não é só carteira assinada com jornada de 40 horas, trabalho doméstico para o IBGE não é só lavar pratos e preparar a sopa de legumes com carne (que aliás, é o que o machista troglodita aqui acabou de fazer :P ). O IBGE considera algumas atividades tipicamente masculinas e que não vêm à nossa mente naquela imagem imediata que nós criamos lá em cima: capinar o quintal, limpar a piscina, carregar as bolsas de compra...

4- Existe uma clara e inequívoca proporcionalidade entre o tempo de serviço não doméstico feminino e a assunção masculina de atividades domésticas. Isto é visto claramente quando se percebe que quanto maior for o nível educacional maior o índice de mulheres empregadas e maiores as suas jornadas semanais e, ao mesmo tempo, quanto maior a escolaridade dos homens, mais tempo eles gastam em atividades domésticas.

5- Homens gastam mais tempo com deslocamento de casa para o trabalho (por conta de trabalharem geralmente na indústria e na agricultura que têm postos de atividade menos espalhados) que as mulheres (que por trabalharem nos setores de serviço e comércio geralmente atuam mais próximo da residência, quando não na própria)

6-Homens são maioria nas atividades mais cansativas (indústria, extração) e mulheres nas menos cansativas (comércio, serviços, funcionalismo público)...

7- Et cetera, et cetera...

Revendo estes pontos nós somos obrigados a tirar aquela imagem equivocada do quadro 1 por diversas outras imagens possíveis e que expressam muito melhor e muito menos tendenciosamente o que verdadeiramente acontece nos lares brasileiros:

Quadro 2:
Maria Fulana, 37 anos, 2 filhos, balconista, trabalha 44 horas por semana em um Shopping em Botafogo, mora no Chapéu Mangueira, recebe 650 reais por mês líquidos, quando chega em casa vai lavar, passar, cozinhar e dar banho nos filhos que estavam na casa da mãe.
João Ciclano, 32 anos, ajudante de obras, 40 horas semanais, mesmos filhos de Maria, casado com ela, 510 reais mensais, chega em casa, e divide todas as tarefas domésticas com Maria em condições de igualdade ou próximo a isso.


Quadro 3:
Maria Fulana, 37 anos, 2 filhos, desempregada, beata evangélica, trabalha voluntariamente 4 horas por semana como ministra de louvor da Igreja Metodista do Jardim Botânico, mora no Largo do Machado, lava, passa, cozinha e da banho nos filhos, faz a feira.
João Ciclano, 32 anos, tenente do Corpo de Bombeiros, regime de 24 por 72 horas, mesmos filhos de Maria, casado com ela, 4000 reais mensais, chega em casa, pega uma breja, faz um strip entre a cozinha e a sala, põe os pés na mesinha de centro, liga a tv. Vez por outra cuida das plantas. Nos domingos gosta de preparar a própria carne assada, receita de família aprendida com a vó turca.


Quadro 4:
Maria Fulana, 37 anos, 2 filhos, auxiliar de enfermagem, trabalha 30 horas por semana em um posto de saúde em Madureira, mora em Rocha Miranda, recebe 650 reais por mês líquidos lava, passa, cozinha e dá banho nos filhos, faz a feira.
João Ciclano, 32 anos, repositor de mercadorias, 48 horas semanais, mesmos filhos de Maria, casado com ela, 510 reais mensais, todo dia chega em casa, pega uma breja, faz um strip entre a cozinha e a sala, põe os pés na mesinha de centro, liga a tv. Entretanto, nos dias de folga sempre cuida do quintal e dá uma folga para Maria na cozinha.


Quadro 4:
Maria Fulana, 37 anos, 2 filhos, vende sacolé na própria casa, planta uns pés de couve no fundo do quintal pra consumo próprio, também cria umas galinhas que botam ovos para a gemada dos filhos, mora em Queimados (onde Judas perdeu as...), tem lucros mensais de cerca de 100 reais, lava, passa, cozinha e dá banho nos filhos, faz a feira.
João Ciclano, 32 anos, repositor de mercadorias, 48 horas semanais, mesmos filhos de Maria, casado com ela, 510 reais mensais, todo dia chega em casa, pega uma breja (quando tem), faz um strip entre a cozinha e a sala, põe os pés na mesinha de centro, liga a tv. Entretanto, nos dias de folga ajuda Maria a cuidar das galinhas, faz as compras do mês...



É claro que aquele cenário do quadro 1 pode existir em uma ou outra casa, como também pode existir um quadro 5 onde a mulher só coce o dia inteiro enquanto o marido rala para dar a ela do bom do melhor, mas ao contrário do que está fixo no imaginário coletivo a regra é que a dupla-jornada de trabalho atinja homens e mulheres na mesma proporção, com a única diferença que mulheres vão trabalhar menos (em geral muito menos) fora de casa e trabalhar mais dentro dela enquanto os homens vão trabalhar mais (em geral muito mais) fora dela para trabalharem menos dentro... é isso que todos os dados da PNAD ser analizados em conjunto e não de forma tendenciosa indicam.

Se isto está certo? Eu acho que não. Eu acho que o ideal é que homens e mulheres tivessem papeis menos diferentes , que as mulheres trabalhassem mais fora de casa, que dividissem melhor a obrigação do sustento econômico... e que em contrapartida os homens dividisssem melhor as atividades domésticas, o cuidado dos filhos... mas com certeza a cena real não é tão horrível quanto o discurso fantasioso das mulheres escravizadas pela dupla-jornada de trabalho enquanto seus maridos coçam o saco.
« Última modificação: 06 de Agosto de 2009, 19:52:03 por Donatello van Dijck »

Offline Nina

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #20 Online: 06 de Agosto de 2009, 21:22:20 »
Nina, dê uma olhada na síntese dos indicadores da PNAD que está linkado. Se você fizer uma leitura global e não direcionada e se olhar os dados com isenção vai ver quão claramente esta estória da meia-jornada é uma das meias verdades de que eu estava falando.

Bom, eu achava que estava sendo isenta, visto que o meu troglotida não me escraviza... ::)

Mas é normal que cada um tenha uma visão sobre cada tema, visto que as experiências de vida são completamente diferentes.

É claro que aquele cenário do quadro 1 pode existir em uma ou outra casa, como também pode existir um quadro 5 onde a mulher só coce o dia inteiro enquanto o marido rala para dar a ela do bom do melhor, mas ao contrário do que está fixo no imaginário coletivo a regra é que a dupla-jornada de trabalho atinja homens e mulheres na mesma proporção, com a única diferença que mulheres vão trabalhar menos (em geral muito menos) fora de casa e trabalhar mais dentro dela enquanto os homens vão trabalhar mais (em geral muito mais) fora dela para trabalharem menos dentro... é isso que todos os dados da PNAD ser analizados em conjunto e não de forma tendenciosa indicam.

Engraçado, mas para mim esses dados não parecem refletir a realidade do povo brasileiro tão bem. Sabe, eu gostaria de conhecer melhor o Brasil. Eu morei em apenas 4 dos tantos Estados que temos, visitei uns 5 mais e não conheço muito bem a região Nordeste e Centro-Oeste. Mas eu acho que com exceção dos grandes centros, o interior do país me parece ser mais ou menos homogêneo nestas questões.

Eu realmente não sei até que ponto dá pra estrapolar essas realidades, mas no interior do Brasil é muito diferente da metrópole de São Paulo. Isso é fato. Certamente existe uma grande parcela das mulheres que são apenas donas de casa, até porque há muitos homens que preferem que a mulher sirva somente a eles e porque muitas mulheres são "encostadas" demais para trabalhar fora.

Eu realmente acho que conforme o nível de escolaridade aumenta é esperado que essa proporção diminua. Certamente entre os usuários deste fórum essa realidade da dupla-jornada exclusivamente feminina deve ser pequena, se não for inexistente. Mas nas classes mais baixas, isso não é a regra. Principalmente onde não há opções como indústrias para trabalhar (cujos empregos são historicamente mais ocupados por homens). Em regiões agrícolas onde existe grande quantidade de bóias-frias, acho que essa anedota do "imaginário popular" não é tão imaginária assim. Aqui, onde existe a cata manual do café que fica no pé ou que cai da colhedeira, homens e mulheres trabalham igualmente. Tanto, que nesta época do ano não se acha doméstica na cidade. E que na outra época, em que finda a colheita, os botecos enchem. Eles chegam às 8:00 da manhã e só saem a noite...



Se isto está certo? Eu acho que não. Eu acho que o ideal é que homens e mulheres tivessem papeis menos diferentes , que as mulheres trabalhassem mais fora de casa, que dividissem melhor a obrigação do sustento econômico... e que em contrapartida os homens dividisssem melhor as atividades domésticas, o cuidado dos filhos... mas com certeza a cena real não é tão horrível quanto o discurso fantasioso das mulheres escravizadas pela dupla-jornada de trabalho enquanto seus maridos coçam o saco.

Também acho que seria o ideal, mas a cena do marido que coça o saco não é tão irreal assim, a ponto de falarmos que este cenário do homem que trabalha mais e ainda divide funções domésticas seja uma regra. Eu realmente não acho que os dados indiquem isso. Apenas poderia ser dito isso, se houvesse uma pesquisa que indicasse claramente com perguntas específicas qual o nível de participação masculina nos afazerem domésticos. Acho que qualquer estrapolação dos outros dados sobre o trabalho bastante inconclusivos.

Na minha experiência, a função de pai ainda é adotada antes da de "dono de casa" pelos homens. E mesmo assim, a imensa maioria dos homens não a cumpre, são apenas procriadores. Isso pode claramente ser visto no número de famílias em que não há pais em casa, no número de homens abandonando seus lares.

Imagine o seguinte cenário: uma empresa é aberta no interiorzão e vários funcionários de diversas partes do país são mandados para lá, todos muito qualificados. Vários deles tem cerca de 30 anos e uma família recente, com filhos de colo. Como eles moram numa cidade sem estrutura, esporadicamente viajam para cidades maiores nas proximidades, para fazer compras, consultas médicas, etc... Qual a probabilidade de vários dos os que possuem bebês de colo serem questionados por pessoas estranhas (diferentes, em locais diferentes), durante suas andanças no comércio, na cidade onde residem e nestas outras, sobre serem de fora, pois na região "pai não segura filho no colo", muito menos ajuda a mãe com coisas básicas como dar mamadeira ou acompanhá-la no trocador?

Acho que isso é um indício bastante alarmante de como a sociedade local vê os papéis dos homens e mulheres. Não é nem um, dois ou três casos que conheço em que os pais chegam do serviço e sua companhia não é a esposa e os filhos, mas a cachaça... e muitas vezes, os dois voltaram "da lida" juntos.

Aí você vai perguntar: a sua região, pouco populosa, reflete bem o país? Não sei. Pelas minhas andanças por aí eu facilmente diria que acho que sim. Até porque eu não acho que Sampa seja o Brasil.

"Mas é claro que posso estar errada". :ok:
« Última modificação: 06 de Agosto de 2009, 21:26:15 por Nina »
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #21 Online: 06 de Agosto de 2009, 21:57:21 »
Citação de: Nina
a ponto de falarmos que este cenário do homem que trabalha mais e ainda divide funções domésticas seja uma regra.
Mas isto não seria mesmo o ideal né Nina? O que me incomoda nesta reclamação específica é isso... fica parecendo que mesmo os homens trabalhando muito mais fora de casa ainda têm que dividir igualmente o trabalho doméstico. Aí não violão :hihi:...

Citação de: Nina
Eu realmente não acho que os dados indiquem isso. Apenas poderia ser dito isso, se houvesse uma pesquisa que indicasse claramente com perguntas específicas qual o nível de participação masculina nos afazerem domésticos. Acho que qualquer estrapolação dos outros dados sobre o trabalho bastante inconclusivos.
A única pergunta da PNAD sobre trabalhos domésticos é "Quantas horas ______________ gasta por dia com os afazeres domésticos?" Esta pergunta é feita relativamente sobre todos os moradores de uma casa que tenham mais de 5 anos de idade. Se é algo que se possa dizer nossssssssaaa , mas como é confiável? Não, não é. Inclusive eu sempre tinha a impressão de que as mulheres supercalculavam as suas respostas neste quesito e subcalculavam as dos maridos (geralmente são as mulheres quem respondem os questionários, acho que numa proporção de 4 pra cada 5).

Mas levando em conta que ela é a única fonte que temos para este assunto no país e levando em conta que é exatamente esta a pesquisa comumente usada para pautar matérias e estudos acadêmicos sobre a dupla-jornada de trabalho "feminina" ...


Citar
Acho que isso é um indício bastante alarmante de como a sociedade local vê os papéis dos homens e mulheres. Não é nem um, dois ou três casos que conheço em que os pais chegam do serviço e sua companhia não é a esposa e os filhos, mas a cachaça... e muitas vezes, os dois voltaram "da lida" juntos.

Aí você vai perguntar: a sua região, pouco populosa, reflete bem o país? Não sei. Pelas minhas andanças por aí eu facilmente diria que acho que sim. Até porque eu não acho que Sampa seja o Brasil.
Realmente percepções "visuais" são problemáticas. Não que dados estatísticos sejam infalíveis (até porque eles têm que ser interpretados e isso não é uma tarefa nem tão simples nem tão exata) mas são alguns passos mais confiáveis. A PNAD é feita em todo o país, e obedece regras para evitar desvios demográficos (i.e.: para garantir que cada estado, cidade, distrito represente no bolo estatítico o mesmo que representa na totalidade).
« Última modificação: 06 de Agosto de 2009, 22:31:27 por Donatello van Dijck »

Offline Nina

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #22 Online: 06 de Agosto de 2009, 22:55:40 »
Citação de: Nina
a ponto de falarmos que este cenário do homem que trabalha mais e ainda divide funções domésticas seja uma regra.
Mas isto não seria mesmo o ideal né Nina? O que me incomoda nesta reclamação específica é isso... fica parecendo que mesmo os homens trabalhando muito mais fora de casa ainda têm que dividir igualmente o trabalho doméstico. Aí não violão :hihi:...

Certamente que seria... só que a minha roupa eu faço questão de lavar!  :lol:

Mas aí é que está... quem divide as funções domésticas, pelo que você mesmo averigua, normalmente são os casais com maior escolaridade. Nestes, as jornadas de trabalho são muito parecidas entre o homem e mulher, muito mais do que nas classes mais baixas, com menor escolaridade. Não é isso?

Citação de: Nina
Eu realmente não acho que os dados indiquem isso. Apenas poderia ser dito isso, se houvesse uma pesquisa que indicasse claramente com perguntas específicas qual o nível de participação masculina nos afazerem domésticos. Acho que qualquer estrapolação dos outros dados sobre o trabalho bastante inconclusivos.
A única pergunta da PNAD sobre trabalhos domésticos é "Quantas horas ______________ gasta por dia com os afazeres domésticos?" Esta pergunta é feita relativamente sobre todos os moradores de uma casa que tenham mais de 5 anos de idade. Se é algo que se possa dizer nossssssssaaa , mas como é confiável? Não, não é. Inclusive eu sempre tinha a impressão de que as mulheres supercalculavam as suas respostas neste quesito e subcalculavam as dos maridos (geralmente são as mulheres quem respondem os questionários, acho que numa proporção de 4 pra cada 5).

Bom, se minha percepção não é um bom argumento, sua teoria da conspiração também não vai contar... :histeria:

Eu não vejo motivos para mentir nesse quesito. Qual o objetivo de dizer para quem aplica o questionário alguma inverdade? Paracer mais bonita? ::)

Sei que não é seu argumento, mas pode parecer que ele é algo parecido com isso: mulher ganha menos, mas pudera... trabalha bem menos e mais perto, não faz as coisas em casa e ainda posa de frágil. E mente nas pesquisas... ou seja, esse bem menos que ela trabalha deve ser inexistente!

Só sugiro que não direcionemos a discussão para esse caminho...

Mas levando em conta que ela é a única fonte que temos para este assunto no país e levando em conta que é exatamente esta a pesquisa comumente usada para pautar matérias e estudos acadêmicos sobre a dupla-jornada de trabalho "feminina" ...

Concordo que não é absolutamente confiável. Como os demais dados também devem ser aproximados, inclusive o tempo da jornada de trabalho. Mas acho que esse desvio pode ser mais relacionado com amostragem do que com falta de sinceridade dos entrevistados... (só que não tenho certeza sobre isso).

Eu fico imaginando o matuto respondendo esse questionário... Sabe, uma semana dessas um seriços gerais entrou no laboratório e perguntou o que era esse aparelho que o aluno estava usando... ele explicou que se chamava microscópio e que servia para ver as coisas muito pequeninas. A resposta o matuto foi hilária: "êta, isso tá cheio de lorota!".

O povo é muito simples... muito mesmo.

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Acho que isso é um indício bastante alarmante de como a sociedade local vê os papéis dos homens e mulheres. Não é nem um, dois ou três casos que conheço em que os pais chegam do serviço e sua companhia não é a esposa e os filhos, mas a cachaça... e muitas vezes, os dois voltaram "da lida" juntos.

Aí você vai perguntar: a sua região, pouco populosa, reflete bem o país? Não sei. Pelas minhas andanças por aí eu facilmente diria que acho que sim. Até porque eu não acho que Sampa seja o Brasil.
Realmente percepções "visuais" são problemáticas. Não que dados estatísticos sejam infalíveis (até porque eles têm que ser interpretados e isso não é uma tarefa nem tão simples nem tão exata) mas são alguns passos mais confiáveis. A PNAD é feita em todo o país, e obedece regras para evitar desvios demográficos (i.e.: para garantir que cada estado, cidade, distrito represente no bolo estatítico o mesmo que representa na totalidade).

Certamente que deve obdecer a critérios estatísticos... mas a "típica família mineira", por exemplo, é bem arraigada, da zona da mata ao triângulo mineiro. Nela, pai supri o finaceiro, mãe faz bicos com costura e biscoitos ou é doméstica... ou ainda, vai pra roça junto com o marido. Mas é claro que algumas são apenas donas de casa. As filhas sempre casam virgem e namorado fica sentado na sala junto com os pais da moça. Eles saem e aprontam, obviamente... mas o pai sempre acha que a filha é virgem...   :histeria:

Só que eu vejo que certas mudanças no interior são bem mais lentas que na capital.

E alguns costumes que eu considerava extintos quando morava em Sampa aqui são muito vivos.
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #23 Online: 07 de Agosto de 2009, 12:14:47 »
Certamente que deve obdecer a critérios estatísticos... mas a "típica família mineira", por exemplo, é bem arraigada, da zona da mata ao triângulo mineiro. Nela, pai supri o finaceiro, mãe faz bicos com costura e biscoitos ou é doméstica... ou ainda, vai pra roça junto com o marido. Mas é claro que algumas são apenas donas de casa. As filhas sempre casam virgem e namorado fica sentado na sala junto com os pais da moça. Eles saem e aprontam, obviamente... mas o pai sempre acha que a filha é virgem...   :histeria:

Só que eu vejo que certas mudanças no interior são bem mais lentas que na capital.

E alguns costumes que eu considerava extintos quando morava em Sampa aqui são muito vivos.
É, nóis aqui do triangulu mineiru samos muito fexados a coisas novas. Bão mess é coçar bixo de pé.

Offline Nina

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Re: Ana Machadão e o mito das mulheres de mãos limpas (a.k.a. Sesso Fragile)
« Resposta #24 Online: 07 de Agosto de 2009, 13:14:24 »
Sabe o que mais estranhei? O conceito de que mulher de sucesso é mulher bem casada, com cara rico e com carrão. ::)
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

 

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